RESUMO: A pretensão deste artigo é demonstrar, mediante argumentos jurídicos, que a inserção de alíquota do ISS superior aquela efetivamente praticada pelo Município nas propostas de preços das licitações pode sujeitar as empresas a devolver aos cofres públicos a diferença entre a alíquota paga e a alíquota efetivamente recolhida.
Palavras-chave: Licitação. BDI. Alíquota. ISS. Estorno.
INTRODUÇÃO
Nos certames licitatórios, a administração disponibiliza uma tabela a ser preenchida pela empresa para que informe os custos indiretos em que irá incorrer. Dentre estes custos está o imposto sobre serviços de qualquer natureza - ISS. Como não existe uma legislação que fixe de maneira uniforme as alíquotas a serem praticadas pelos Municípios, os órgãos públicos permitem a inserção de valores dentro de uma margem que varia de 1% a 5%.
No entanto, todo edital exige que o preenchimento desta planilha de custos indiretos, denominada de BDI, seja condizente com a realizada. Ou seja, a empresa deve informar de maneira correta qual alíquota irá incidir sobre os serviços prestados. Normalmente, a alíquota corresponde àquela prevista no Município de prestação dos serviços. Cabe à empresa realizar essa pesquisa e inserir em sua planilha de custos indiretos a alíquota real que irá incidir na fatura dos serviços prestados.
Caso a empresa apresente uma alíquota superior àquela efetivamente praticada pelo Município, deve se sujeitar à correção da planilha e devolver aos cofres públicos a diferença paga a maior pela administração, sob pena de lesão ao erário.
Embora as empresas se insurjam contra tal procedimento da administração, embasado em decisão do TCU, existem argumentos suficientes para demonstrar o acerto da exigência deste estorno.
DESENVOLVIMENTO
a) ISS: imposto indireto. O consumidor final (administração) é o contribuinte de fato
Primeiramente, deve-se atentar para a classificação do tributo ISS no que pertine à possibilidade de transferência de seu encargo ao consumidor final do serviço.
É preciso, para correta visualização do problema, ter em consideração que o ISS classifica-se como imposto indireto. Ou seja, seu encargo é transferido pelo contribuinte de direito ao contribuinte de fato, ao consumidor final, que na espécie é a administração pública.
O imposto indireto é o que incide sobre transações de mercadorias e serviços. Nesses tipos de tributo, a firma que recolhe o imposto não necessariamente arca com o seu ônus, porque o recolhimento é feito de forma que se possa transferi-lo para terceiros. Ou seja, nem sempre quem recolhe esse tributo é a pessoa (física ou jurídica) que arca com o ônus do imposto, já que ele pode ser transferido ao consumidor por meio do aumento do preço do produto.
O encargo tributário referente ao ISS, portanto, não onera a empresa-contratada, mas sim a administração-contratante, que é o consumidor final da prestação dos serviços e quem, ao fim, arca com esse ônus financeiro do ISS, repassado pela empresa prestadora dos serviços.
Tanto é assim que o judiciário não tem reconhecido a possibilidade da empresa prestadora do serviço postular a repetição de indébito tributário quando não comprovar que, efetivamente, foi ela quem suportou o ônus financeiro do imposto indireto.
Para que seja possível a repetição de indébito tributário dos impostos indiretos é indispensável que a interessada comprove que não houve o repasse desse ônus fiscal ao consumidor final. Nesse sentido, o art. 166 do CTN, segundo o qual, a repetição do indébito daqueles tributos que, por sua natureza, comportem a transferência do encargo financeiro, somente será feita a quem provar que tenha assumido o referido encargo ou então que esteja autorizado pelo terceiro, que o sofreu, a receber a quantia devolvida.
A respeito, existe importante acordão do STJ que, em Recurso Especial sujeito ao regime do art. 543-C do CPC, reconhece que o ISS pode assumir feição de tributo indireto (REsp 1.131.476)¹.
No que importa ao caso aqui em discussão, destaco o Acordão no EResp n. 873.616, no qual o STJ sedimentou entendimento no sentido de que quando a base de cálculo do ISS for o preço do serviço este imposto caracteriza-se como indireto:
ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. ISS. SOCIEDADE UNIPROFISSIONAL QUE TEM DIREITO AO TRATAMENTO PRIVILEGIADO PREVISTO NO ART. 9º, § 3º, DO DECRETO-LEI 406/68. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. RECOLHIMENTO DO TRIBUTO QUE LEVOU EM CONSIDERAÇÃO OS SERVIÇOS PRESTADOS. APLICAÇÃO DA REGRA CONTIDA NO ART. 166 DO CTN.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vem reconhecendo que o ISS pode ser classificado tanto como tributo direto quanto indireto. A base de cálculo do ISS é, em regra, o preço do serviço, hipótese em que a exação assume a característica de tributo indireto, permitindo o repasse do encargo financeiro ao tomador do serviço. Por outro lado, em se tratando de ISS recolhido na forma prevista no art. 9º, § 3º, do Decreto-Lei 406/68, não há vinculação direta entre o tributo devido e os serviços prestados. Nessa hipótese, ele possui natureza de tributo direto.
2. No caso dos autos, não obstante tenha se reconhecido que no período em que se pleiteia a repetição o contribuinte tinha o direito de recolher o tributo na forma do art. 9º, § 3º, do Decreto-Lei 406/68, o recolhimento do ISS no período mencionado levou em consideração os serviços prestados, de modo que era possível o repasse do valor do tributo ao tomador do serviço. Nesse contexto, a repetição do tributo pago indevidamente sujeita-se à regra prevista no art. 166 do CTN, ou seja, é necessária a comprovação de que não houve repasse do referido encargo. Considerando que não houve tal comprovação, não é possível a repetição, como bem observou o acórdão embargado.
3. Embargos de divergência não providos.
Tendo isto em consideração, fica evidente que a empresa, não sendo a contribuinte de fato do ISS, não se sujeita ao referido encargo financeiro, sendo tudo repassado ao consumido final.
Assim sendo, não há como aceitar as alegações das empresas de que a cobrança/dedução do ISS pago a maior pela Poder Público ocasionaria o desequilíbrio econômico-financeiro do contrato, uma vez que todo o encargo tributário é repassado ao tomador dos serviços, no caso a administração contratante.
Sendo o encargo tributário totalmente transferido ao tomador, não há que se falar em violação do equilíbrio econômico-financeiro já que o lucro inicialmente previsto será mantido, decotando-se apenas a parcela paga a mais e indevidamente embolsada pela empresa contratada.
Com o estorno dos valores pagos indevidamente pela administração a título de ISS, apenas se corrigirá os dados referentes aos encargos indiretos constantes da proposta. No entanto, a equação serviço-contraprestação, no qual a diferença é o lucro, continuará irretocável.
Em suma, a equação econômico-financeira do contrato permanecerá. O reembolso dos valores pagos indevidamente pela inserção na planilha de alíquota maior que a real não influirá nesta equação. A devolução dos valores irá, isto sim, corrigir uma distorção nesta equação, que agora pende para a empresa-contratada, tendo em conta que a administração-contratante vem desembolsando valores a mais que o efetivamente devido, e isso tem acarretado um acréscimo indevido ao lucro da empresa.
b) Apropriação pela empresa-contratada da diferença entre a alíquota real e a alíquota prevista na proposta. Lesão ao erário
Anteriormente, ressaltamos o fato do ISS possuir natureza indireta, significando que todo o custo do imposto é repassado ao tomador do serviço, qual seja, a administração-contratante.
Desse modo, cumpre reconhecer que é a administração-contratante, como tomadora dos serviços, o contribuinte de fato do imposto.
Assim sendo, na qualidade de consumidor final e suportando o ônus tributário específico, nada mais natural que se solicite à empresa-contratada prestadora dos serviços o reembolso da quantia paga a maior em relação ISS efetivamente devido e que vem engordando seus lucros.
Com efeito, a empresa, ao invés de indicar a alíquota real do ISS devido ao município (ou a média ponderada entre as alíquotas, se diversos são os municípios) em sua proposta, apresentou uma alíquota superfaturada, causando, assim, lesão aos cofres públicos.
Denota-se, por conseguinte, que a empresa embolsa-se da diferença entre a alíquota real e a alíquota efetivamente paga pela administração, superlativando seus lucros.
O estorno dos valores pagos a maior busca o ressarcimento dos cofres públicos de uma quantia paga indevidamente à empresa (diferença entre a alíquota real e a alíquota indicada na proposta).
Note-se que a alíquota do ISS incide sobre o valor da nota fiscal. À administração-contratante, como tomadora dos serviços, cabe o dever de reter o montante correspondente ao ISS.
Suponha-se, assim, que pela alíquota real o valor do imposto corresponda a R$ 11.000,00, sendo esta quantia encaminha aos cofres municipais.
Todavia, em virtude da incorreta previsão na proposta elaborada pela empresa, a administração sujeita-se ao pagamento indevido, por exemplo, de R$ 14.000,00, R$ 3.000,00 a mais que o devido, à empresa-contratada, que não irão para os cofres municipais, mais sim para a conta da empresa prestadora dos serviços, aumentando, com isso, seus lucros.
Depreende-se, desta constatação, que, com o reembolso dos valores pagos a maior, se promoverá o equilíbrio financeiro do contrato e não o contrário, tendo em conta que, com a alíquota superfaturada da proposta, o contrato administrativo está desequilibrado, já que a empresa está auferindo lucros em demasia em detrimento dos cofres públicos.
c) Alegação de desequilíbrio econômico financeiro por ato unilateral. Restabelecimento do equilíbrio econômico financeiro e não o contrário
As empresas que realizam tal pratica procuram demonstrar que devem ser preservadas as condições econômico-financeiras da proposta não se podendo, por ato unilateral, promover o desequilíbrio do contrato, com a promoção dos estornos dos valores nas faturas ainda não pagas.
Todavia, deve-se ter presente que o procedimento de estorno visa a cobrança de parcela indevidamente paga às empresas.
As empresas-contratadas ao afirmarem incorrerem em custos tributários inexistentes, como a alíquota a maior no ISS, e ao cobrarem e receberem por esses custos inexistentes recebem indevidamente determinados valores visando aumentar suas receitas.
Não se está, com a determinação de ressarcimento das quantias pagas indevidamente à empresa, afetando o equilíbrio econômico-financeiro da avença, pois esse equilíbrio refere-se ao respeito às condições inicialmente pactuadas em razão de fatos supervenientes à celebração da contratação.
No caso, está-se a questionar a própria proposta da contratação, situação diversa, portanto.
Na espécie, vislumbra-se que empresa-contratada acabou repassando para o poder público um encargo irreal, na medida em que o custo tributário é considerado em sua plenitude, segundo o percentual máximo admitido pela administração-contratante.
Daí se poder afirmar que nos contratos em que na planilha de preços foi inserida uma alíquota superior à real está ocorrendo flagrante desequilíbrio econômico-financeiro, repudiado pela Lei nº 8.666/93, colocando-se a administração pública em injustificada desvantagem perante o particular.
Nem se diga que da proposta somente devem ser considerados os valores globais da avença e que caso houvesse minoração dos encargos tributários constantes da proposta, outros itens deveriam sofrer majoração de modo a ser mantido o mesmo preço global, o que equivaleria a afirmar-se que os valores finais da proposta seriam previamente definidos e daí seriam efetuadas contas de chegada para indicar o valor de cada subitem.
Tal alegação não deve prosperar porque caso alguma empresa tenha assim procedido, agiu de má-fé e não pode beneficiar-se da própria torpeza.
Assim, a presunção de boa-fé inerente aos contratantes, permite a conclusão de que as despesas fiscais indicadas nas propostas não interferiram na indicação dos valores dos demais itens da mesma e, desta feita, não há como não se considerar que houve o pagamento indevido. Explico. Em estando os demais itens da proposta com os valores corretos e justos, não se pode receber outros valores por esses itens a qualquer título, nem mesmo a título de despesas tributárias.
Destaco, ainda, que a composição dos preços contratados não é mera peça informativa, pois passa a integrar a avença, servindo como parâmetro para a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro. Por exemplo, essa composição serve de base para a análise do impacto financeiro de eventuais mudanças na legislação trabalhista e/ou tributária ou da ocorrência de casos fortuitos ou de força maior.
Aliás, não há que se falar em prejuízo, ante a necessidade de se retirar parcela do ISS constante dos contratos que, na prática, não está sendo paga pelas empresas.
De fato, cabe ressaltar que tal parcela, obviamente, não se insere na remuneração devida aos recorrentes pela efetiva prestação dos serviços contratados, como já demonstrado no subcapítulo “a”.
Fica evidente, assim, não poder prosperar a argumentação de que tal pretensão de cobrança/estornos ensejaria o desequilíbrio econômico-financeiro dos contratos, na medida em que não há modificação na composição dos preços dos demais itens constantes dos referidos contratos, nem aumento dos encargos dos contratados.
Note-se que o § 6º do supracitado art. 65 estabelece que a Administração deverá restabelecer, por aditamento, o equilíbrio econômico-financeiro inicial, no caso de ocorrer alteração unilateral do contrato que aumente os encargos do contratado.
Assim sendo, não se vislumbra com essa ocorrência prejuízo para as empresas, pois tal fato, como visto anteriormente, presumivelmente, não repercutirá nos outros itens orçados, sua única consequência é o auferimento indevido de receitas pelas empresas, não sofrendo elas qualquer lesão jurídica e é de justiça que haja a devolução desses valores ao Erário.
d) Entendimento do TCU acerca do assunto:
Em casos semelhantes, já se pronunciou o TCU no sentido de que nos pagamentos efetuados aos contratados a título de ISS deve ser considerada a alíquota real estabelecida pelos municípios envolvidos, e não aquela considerada no BDI proposto pela empresa licitante, devendo a Administração, se for o caso, descontar das próximas faturas o valor pago a maior.
Nessa linha, vale transcrever parte do Acórdão 32/2008-Plenário/TCU:
“Sumário
FISCOBRAS/2007. LEVANTAMENTO DE AUDITORIA. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DE IRREGULARIDADES GRAVES NA FISCALIZAÇÃO DE 2007. DETERMINAÇÕES. Nos pagamentos efetuados aos contratados a título de ISS deve ser considerada a alíquota real estabelecida pelos municípios envolvidos, e não aquela considerada no BDI da empresa.
(...)
6. Foram quatro as irregularidades identificadas no âmbito do Contrato TT-335/2006-00, que se repetiram no Contrato TT-336/2006-00. Tais irregularidades, na essência, consistiram em:
a) pagamentos a título de ISS feitos com base na alíquota constante no BDI apresentado pela contratada, quando deveriam respeitar a alíquota fixada pelo município onde ocorreu o fato gerador;
b) pagamento integral de despesa relativa à manutenção do canteiro das obras, quando, pela sua natureza, deveria ser diluído ao longo da execução dos contratos;
c) pagamentos à contratada sem documentos demonstrativos de que as medições apresentadas correspondam, inequivocamente, aos serviços realizados; e
d) disponibilização, pela contratada, de veículo e combustível para a fiscalização das obras pelo Dnit, serviço previsto no edital da licitação, porém o documento não estabeleceu a obrigação de que o custo decorrente desse serviço estivesse previsto na planilha de composição de lucros e despesas indiretas - LDI das licitantes.
(...)
10. No que se refere ao assunto abordado na alínea “a”, trago o entendimento desta Corte de Contas sobre pagamentos a contratada a título de INSS.
11. Nos autos do TC 007.828/2002-3, foi determinado ao Chefe da 21ª Unidade de Infra-Estrutura Terrestre em Sergipe, por meio do item 9.6.2 do Acórdão 583/2003 - Plenário, que calculasse, no âmbito do Contrato PD-21001/01-00, “os pagamentos a maior decorrentes das alíquotas reais do ISS a que se sujeita a contratada, procedendo ao desconto da quantia apurada nas próximas faturas”. Essa decisão foi alterada por causa de recurso interposto pelo responsável e, nos termos do Acórdão 2065/2004 - Plenário, teve a seguinte redação:
9.6.2. quanto ao Contrato PD-21001/01-00, verifique a correção dos pagamentos efetuados à contratada a título de ISS, levando em conta as alíquotas reais estabelecidas pelos municípios envolvidos, e proceda, se for o caso, aos acertos pertinentes nas próximas faturas.
12. O sumário que antecedeu o relatório e voto condutores do Acórdão 1451/2006 - Plenário, prolatado no âmbito do Fiscobras 2006, traduz com perfeição o entendimento que quero expor:
Nos pagamentos efetuados aos contratados a título de ISS deve ser considerada a alíquota real estabelecida pelos municípios envolvidos, e não aquela considerada no BDI da empresa.
Portanto, a proposta de encaminhamento da Unidade Técnica para a questão, no sentido de adequar os pagamentos às alíquotas reais do ISS, vai ao encontro do entendimento exposto. Resta, todavia, examinar o percentual do ISS que deveria recair sobre o BDI e, em conseqüência, o pagamento devido à contratada, haja vista a divergência entre os cálculos da equipe de auditoria e os do diretor da Secex/SE. Entendo que assiste razão a esse último, pois a equipe de auditoria deduziu o percentual de incidência do ISS diretamente do BDI, sem considerar os demais insumos que compõem essa rubrica, como foi feito nos cálculos apresentados pelo diretor. Dessa forma, acato sua proposta, adequando-a ao aspecto temporal a que me referi anteriormente. É importante frisar que a empresa Delta teve conhecimento dos fatos ora tratados e concordou com os ajustes e compensações sugeridos pela Unidade Técnica (fls. 14 e 21).
(...)
9.1 determinar ao Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes e, no que couber, à sua Superintendência no Estado de Sergipe que, se ainda não o fizeram:
9.1.1 efetue, a partir do pagamento da próxima medição da empresa Delta Construções S/A, no âmbito dos Contratos TT-335/2006-00 e TT-336/2006-00, a dedução de, respectivamente, 0,291% e 0,702% sobre o valor da medição, a título de correção da incidência do ISS, visto que a alíquota de ISS ponderada é de 4,57% e não de 5%, no primeiro contrato, e de 3,94% e não de 5%, no segundo contrato, como constou no BDI dessa empresa;
9.1.2 providencie a dedução no pagamento da próxima medição da empresa Delta Construções S/A, no âmbito dos Contratos TT-335/2006-00 e TT-336/2006-00, do montante correspondente a, respectivamente, 0,291% e 0,702% sobre cada medição já paga, para fins de compensação pelos valores indevidamente recebidos e não recolhidos pela empresa a título de ISS;
9.2. determinar ao Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes que:
9.2.1. revise, preventivamente, todos os seus contratos vigentes, a fim de verificar a adequação do percentual embutido no BDI a título de pagamento de ISS, com os percentuais efetivamente recolhidos, inclusive quanto à correção da base de cálculo desse imposto, uma vez que em outros contratos fiscalizados pela Secex/SE foram constatados problemas semelhantes aos detectados no âmbito dos Contratos TT-335/2006-00 e TT-336/2006-00;
9.2.2. preveja, nas futuras licitações, os percentuais de recolhimento a título de ISS a serem aplicados na composição de BDI dos licitantes, com base nas alíquotas adotadas pelos municípios situados nas área de influência das obras;”
Acórdão 32/2008- Plenário. Rel. Min. Ubiratan Aguiar. DOU 25/01/2008.
Com efeito, o procedimento recomendado pelo TCU, ocorre em razão da irregularidade advinda da divergência entre a alíquota constante no BDI, apresentado pela contratada, e a alíquota real estipulada pelo município onde ocorreu o fato gerador.
Tal entendimento foi mantido em acordão mais recente (Acórdão 2622/2013-Pl- TCU):
9.3.2.3. adotar, na composição do BDI, percentual de ISS compatível com a legislação tributária do(s) município(s) onde serão prestados os serviços previstos da obra, observando a forma de definição da base de cálculo do tributo prevista na legislação municipal e, sobre esta, a respectiva alíquota do ISS, que será um percentual proporcional entre o limite máximo de 5% estabelecido no art. 8º, inciso II, da LC n. 116/2003 e o limite mínimo de 2% fixado pelo art. 88 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;
(...)
9.3.2.5. prever, nos editais de licitação, a exigência para que as empresas licitantes optantes pelo Simples Nacional apresentem os percentuais de ISS, PIS e COFINS discriminados na composição do BDI que sejam compatíveis com as alíquotas a que a empresa está obrigada a recolher, previstas no Anexo IV da Lei Complementar n. 123/2006, bem como que a composição de encargos sociais não inclua os gastos relativos às contribuições que essas empresas estão dispensadas de recolhimento (Sesi, Senai, Sebrae etc.), conforme dispões o art. 13, § 3º, da referida Lei Complementar;
Ora, o repasse integral de supostas despesas fiscais não recolhidas é absolutamente ilegal, constitui enriquecimento ilícito da contratada e sujeita o Administrador que com ele compactue às penas da lei de improbidade administrativa.
Assim, a apuração das diferenças não pagas a título de ISS e o consequente acerto de conta não viola qualquer dispositivo legal vigente, que cumpre determinação legal e do TCU.
CONCLUSÃO
Por todo o exposto, é perfeitamente possível, posto que embasado em argumentos sólidos a demonstrar sua ilegalidade, efetuar a cobrança/estorno dos valores pagos a maior pela administração correspondente à diferença entre a alíquota inserida na proposta de preços e aquela efetivamente praticada pelo Município.
Tal procedimento não acarreta o desequilíbrio econômico-financeiro do contrato, tendo em conta que busca apenas ressarcir os cofres públicos de uma quantia indevidamente embolsada pelas empresas que assim procedem. Ao contrário, a correção desta indevida previsão a maior da alíquota do ISS corrige distorções e garante que a empresa-contratada receba apenas aquilo que lhe é devido.
NOTAS
[1] TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. ISS. LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PROVA DA NÃO REPERCUSSÃO. EXIGIBILIDADE, IN CASU. ART. 166 DO CTN.
1. O ISS é espécie tributária que admite a sua dicotomização como tributo direto ou indireto, consoante o caso concreto.
2. A pretensão repetitória de valores indevidamente recolhidos a título de ISS incidente sobre a locação de bens móveis (cilindros, máquinas e equipamentos utilizados para acondicionamento dos gases vendidos), hipótese em que o tributo assume natureza indireta, reclama da parte autora a prova da não repercussão, ou, na hipótese de ter a mesma transferido o encargo a terceiro, de estar autorizada por este a recebê-los, o que não ocorreu in casu, consoante dessume-se do seguinte excerto da sentença, in verbis:
"Com efeito, embora pudesse o autor ter efetuado a prova necessária, que lhe foi facultada, deixou de demonstrar que absorveu o impacto financeiro decorrente do pagamento indevido do ISS sobre a operação de locação de móveis, ou que está autorizado a demandar em nome de quem o fez. Omitiu prova de que tenha deixado de repassar o encargo aos seus clientes ou que tenha autorização destes para buscar a repetição, conforme exigência expressa inscrita no art. 166 do CTN."
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
GARCIA, Manuel Enriquez. O Setor Público. In: PINHO, Diva Benedines; VASCONCELLOS, Marco Antônio S. (org.). Manual de Economia. 5ª edição. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 523-524
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 22ª ed., atual e ampl. São Paulo: Malheiros, 2003
Acórdão n. 1090/2006 – TCU – Plenário
Acórdão n. 2622/2013 – TCU – Plenário
PROCURADOR FEDERAL. GRADUADO EM DIREITO PELA PUC-RIO, POS GRADUADO EM DIREITO PUBLICO PELO IDP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ARBACH, Mauricio Neves. O cabimento da cobrança/estorno dos valores pagos a maior pela Administração em decorrência da inserção de alíquota do ISS superior à real nas propostas de preços Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 jan 2015, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/42863/o-cabimento-da-cobranca-estorno-dos-valores-pagos-a-maior-pela-administracao-em-decorrencia-da-insercao-de-aliquota-do-iss-superior-a-real-nas-propostas-de-precos. Acesso em: 23 nov 2024.
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