Resumo: O presente artigo tem como objetivo mostrar como a violação de direitos e garantias fundamentais do trabalhador, causa inúmeros danos à sua dignidade, liberdade, intimidade, entre tantos outros problemas decorrentes da submissão destes às condições análogas à de escravo.Também mostra como órgãos internacionais criam mecanismos de combate à esta pratica, e quais as medidas adotadas pelo Brasil para coibir este crime. Ao fim da pesquisa concluiu-se que qualquer trabalho ou atividade econômica, que contrarie direitos fundamentais do trabalhador, não comete apenas um crime, mas viola o bem jurídico mais importante na vida de alguém: sua dignidade.
Palavras-chave: Direitos e garantias fundamentais. Dignidade da pessoa humana. Trabalho em condições análogas escravo.
INTRODUÇÃO
No dia 13 de maio de 1888, a princesa Isabel assinou a lei Áurea, que aboliu a escravidão no Brasil. A palavra “aurea” significa ouro, sentido dado ao caráter valioso da lei que pôs termo à essa terrível forma de exploração de mão de obra no país.
Entretanto passados 126 anos de sua assinatura, o Brasil, e muitos outros países, ainda convivem com a existência de milhares de trabalhadores, que ainda são submetidas às condições de trabalho semelhantes à escravidão, ou seja, formas contemporâneas de trabalho escravo.
E, é exatamente isso que será verificado neste artigo,cujo tema volta a se tornar notícia no Brasil, em razão da recente promulgação da PEC do trabalho escravo,onde determina que tanto propriedades rurais quanto urbanas, de qualquer região do país onde houver exploração de trabalho escravo, serão expropriadas e destinadas à reforma agrária ou a programas de habitação popular quando forem flagradas situações similares à escravidão.
PANORAMA ATUAL DA SITUAÇÃO DOS TRABALHADORES SUBMETIDOS ÀS CONDIÇÕES ANALÁGOAS Á DE ESCRAVO NO BRASIL
Atualmente, estima-se que o país tem 155,3 mil pessoas em situação análoga à escravidão, segundo o relatórioÍndice de Escravidão Global 2014, da Fundação WalkFree, divulgado em 17.11.2014[1], tais dados constituem uma realidade de grave violação aos direitos humanos, que envergonham não somente brasileiros, mas toda a comunidade internacional.
Além disso, o Ministério do Trabalho Emprego (MTE), divulgou em 13.05.2014 um balanço do trabalho escravo em 2013[2], que apontam um recorde em ações fiscais e resgate,num total de 2.063 trabalhadores em situação análoga a de escravo, efetuadas em 179 operações realizadas em todo país.
Apesar de o trabalho escravo estar geralmente associado ao campo e agropecuária, essa realidade vem se transformando. O mesmo relatório do MTE, mostra que, em 2013, pela primeira vez o número de libertações de trabalhadores na cidade foi maior que o da área rural. Um dos motivos apontados é o aumento da demanda na construção civil no Brasil.
Sobre o trabalho escravo contemporâneo, o Procurador doTrabalho Ronaldo Lima dos Santos destaca suas diferentes denominações:
“Independentemente da denominação adotada – “trabalho escravo contemporâneo”, “escravidão por divida”, “trabalho forçado”, “trabalho obrigatório”, “redução à condição análoga à de escravo” [...] – em todas as hipóteses levantadas, constatamos flagrantemente a sempre presença de vícios de vontade, seja no início da arregimentação do trabalhador, no começo da prestação de serviços, no curso da relação de trabalho a até mesmo por ocasião do seu termino. Os mais diversos métodos de coação, simulação, fraude, dolo, indução ao erro, são empregados para cercear a vontade do empregado e obriga-lo à prestação de serviços contra sua vontade”[3]
Desta forma, o trabalho em condições análogas ao de escravo, caracteriza-se por restringir a liberdade do trabalhador e também quando não forem observadas as condições necessárias para que o ser humano possa trabalhar dignamente, respeitados os seus direitos e garantias.
DIRETRIZES INTERNACIONAIS E A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
Neste contexto, aOrganização Internacional do Trabalho (OIT), agência multilateral ligada à ONU (Organização das Nações Unidas) que tem por missão promover as garantias fundamentais dos trabalhadores, editou em 1930 a Convenção nº 29[4], - ratificada pelo Brasil em 1957, que definiu trabalho forçado como: “todo trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob a ameaça de sanção e para o qual ela não tiver se oferecido espontaneamente”.
Posteriormente, houve a promulgação da Convenção nº 105[5], também da OIT, da qual o Brasil é signatário, que determina a proibição de qualquer forma de trabalho forçado ou obrigatório como meio de coerção ou de educação política, bem como a mobilização de mão de obra como medida disciplinar no trabalho, punição por participação em greves ou como medida de discriminação.
Entretanto, consciente de que a eliminação do trabalho escravo constitui condição básica para o Estado Democrático de Direito, aConstituição Federal do Brasil, reprime o trabalho escravo e qualquer outra forma que atente à dignidade da pessoa humana em diferentes formas, conforme o artigo 1º, III e IV que tem por objetivos principais a redução das desigualdades sociais e acabar com qualquer forma de discriminação. No mesmo diploma legal,o artigo 5º, XIII e XLVIII, traz a liberdade de exercício de qualquer trabalho, oficio ou profissão, sendo vedada a submissão a qualquer trabalho forçado.
Ainda neste tocante, o artigo 149 do Código Penal Brasileiro, tem como bem jurídico protegido a liberdade da vítima, que se vê limitada em seu direito de ir e vir, abaixo transcrito:
“Artigo 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto.
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa, além da pena correspondente à violência.
§1º Nas mesmas penas incorre quem:
I - cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho;
II - mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.
§2º A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido:
I - contra criança ou adolescente;
II - por meio de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.”
Além disso, o código penal ainda prevê como crime contra a organização do trabalho a frustração de direito assegurado por lei trabalhista (artigo 203 do CP) e o aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional (artigo 207 CP).
Assim, vemos que o trabalho forçado não pode simplesmente ser equiparado a baixos salários ou a más condições de trabalho, mas inclui também uma situação de cerceamento da liberdade dos trabalhadores, e para a punição do responsável pela pratica do delito, verifica-se que tão somente, a presença de um de seus fatores é suficiente para caracterização do crime.
Ressalta-se portanto, que a proteção da liberdade é um fator primordial, mas não o principal, pois o tipo penal exige, para sua caracterização, a partir de quaisquer das condutas nele descritas, uma relação de sujeição que, direta ou indiretamente, atinge, fere, a liberdade da pessoa e direitos trabalhistas fundamentais.
Nota-se que primeiro princípio violado é o da dignidade da pessoa humana, pois é inaceitável caracterizar um ser humano como mercadoria, tratando-o como objeto.
Como defende Bitencourt, a conduta descrita no tipo penal “fere, acima de tudo, o princípio da dignidade humana, despojando-o de todos os seus valores ético-sociais, transformando-o em res, no sentido concebido pelos romanos”[6].
No combate à esta prática, verifica-se a ocorrência de inúmeros julgados em diversosTribunais do país, na esfera trabalhista, como exemplo:
“TRABALHO EM CONDIÇÃO ANÁLOGA Á DE ESCRAVO. Qualquer trabalho que não reúna as mínimas condições necessárias para garantir os direitos do trabalhador há que ser considerado trabalho em condição análoga à de escravo.O contraponto do trabalho escravo moderno está nas garantias constitucionais da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (inciso IV), na proibição de tratamento desumano ou degradante (art. 5º, III), na função social da propriedade (XXIII), na ordem econômica fundada na valorização do trabalho humano e livre (art. 170), na exploração da propriedade rural que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores (art. 186, IV). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TRT-10 - RO: 00684201301210008 DF 00684-2013-012-10-00-8 RO, Relator: Desembargadora ElkeDoris Just, Data de Julgamento: 09/04/2014, 2ª Turma, Data de Publicação: 30/05/2014 no DEJT)”
Além de condenações na esfera criminal:
“APELAÇAO CRIMINAL PRELIMINARES DE NULIDADE PROCESSUAL: IMPROCEDENTE - MÉRITO - CRIMES DE REDUÇAO DE PESSOA A CONDIÇAO ANÁLOGA À DE ESCRAVO - CRIME DE ALICIAMENTO DE TRABALHADORES - ADEQUAÇAO TÍPICA - POTENCIAL CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) - Mérito:1) Crime de redução de pessoa a condição análoga à de escravo (art. 149 do CP). O apelante, proprietário de uma fazenda, mantinha diversas pessoas em condições subumanas e degradantes, obrigando-as a trabalhar até o final da safra, pois, por seus cálculos, o valor percebido pelas vítimas era inferior ao gasto com alimentação, higiene e aquisição de equipamento de proteção custeado pelas mesmas.2) O desconhecimento da lei é inescusável, a teor do art. 21 do Código Penal, especialmente quando o Apelante, proprietário rural, técnico agrícola e membro de Cooperativa Agrária de Produtores, que responde pelo delito incurso no art. 149 do CP, restando configurado que o mesmo detinha potencial consciência de ilicitude, até porque mantinha outros obreiros trabalhando em sua propriedade rural em normais condições de trabalho. 3) Há que se reconhecer, entretanto, que os fatos alhures narrados ocorreram antes da entrada em vigor da lei penal mais severa, e, em consonância com o inciso XL, do art. 5º da Constituição Republicana, prevalece a norma mais benéfica, qual seja, aquela que prevê para o delito apenas a pena privativa de liberdade, devendo ser retirada a pena de multa aplicada. 4) A observância ao princípio da adequação social está justamente em punir aquele que ludibria trabalhadores, com proposta de trabalho rentável, mas com o fim escuso de explorá-los. 5) Crime de aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional (art. 207 do CP). Apelante que mandava trazer, de outros Estados da federação, trabalhadores rurais, sob promessa de bons salários. Diligência de autoridades federais e estaduais na apuração do ilícito, determinando, inclusive, que os trabalhadores retornassem aos locais de origem, às expensas do Apelante. Delito caracterizado.III - Recurso a que se dá parcial provimento. (TJ-ES - ACR: 44040009936 ES 044040009936, Relator: SÉRGIO LUIZ TEIXEIRA GAMA, Data de Julgamento: 11/12/2006, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 17/01/2007)”
Em que pese a relevância do tema, o trabalho é o meio para a pessoa alcançar sua dignidade, garantir seu sustento, sua alimentação, educação, proteção, lazer entre muitos outros[7]. Estes julgados mostram que, mesmo com todas diretrizes que objetivam a erradicação do trabalho em condições análogas à de escravo, a escravidão contemporânea retrata a situação do país, onde a pobreza ainda afeta grande parte da população e dos trabalhadores, tanto da zona rural quanto da urbana, que não possuem qualquer tipo de qualificação profissional, são obrigados à aceitarem condições precárias e degradantes de trabalho, nas quais sua dignidade e liberdade são desconsideradas, incorrendo em grave lesão a estas prerrogativas.
Ao efetuarmos um comparativo com a escravidão dos tempos antigos, dezenas de características mudaram ao longo do tempo, incluso a própria sociedade, entretanto, atualmente este tema inclui contornos mais complexos, tendo em vista a discussão sobre aspectos e valores sociais, econômicos, jurídicos e políticos.
O trabalho análogo à condição de escravo, se constitui pela falta de liberdade, a ponto de impedir que o indivíduo posto nestas condições, exerça de modo livre e por sua própria vontade suas atividades cotidianas, seu direito de ir e vir, situações onde “empregadores” atentam contra a moral, ao atrair o trabalhador de forma fraudulenta, por falsas promessas de condições dignas de trabalho; pressionam de forma psicológica, por promover constante ameaças, abusos e violência contra o trabalhador para que continue no labor e o agridem de forma física, por castigar ou até assassinar os para queestes não fujam.
Verifica-se que diversas publicações concernentes ao tema, mostram que a esperança de melhores condições de vida, ludibriam o trabalhador a aceitar uma situação de exploração, da qual não consegue sair, por supostamente contrair uma dívida infindável com seu explorador.
À exemplo disso, Ricardo Rezende Figueira[8],esclarece em seu livro, que em muitas situações, o próprio trabalhador pode ir ao encontro do explorador, ou este o encontra e oferece o emprego, deste modo, o trabalhador ao aceitar tal oferta, inicialmente, pode ter suas despesas de locomoção pagas, e sem ter consciência da situação, adquire uma dívida que só tende ao crescer, pois o trabalhador ainda terá despesas de alimentação, moradia, roupasetc, que supostamente serão arcadas por seu empregador, enquanto este ainda não puder se manter.
Desta maneira, sabendo que o trabalhador não terá dinheiro para arcar com tais despesas, esta continuará a trabalhar indefinidamente até que possa quitá-las, fato que nunca ocorrerá. Verifica-se ainda que o trabalhador pode ser “aprisionado” por meio de retenção de seus documentos, podendo até mesmo receber punições físicas.
Tal situação, cria a ideia da existência de um contrato de trabalho que deve ser cumprido, e no caso de descumprimento da parte do trabalhador, o explorador teria o suposto direito de impor determinadas sanções, como anteriormente explanado, criando o ambiente para o trabalho forçado e degradante.
MEDIDAS ADOTADAS PELO GOVERNO BRASILEIRO
O Brasil tenta diminuir o número de trabalhadores submetidos às tais condições, por meioda criação de leis, adesões à tratados internacionais anteriormentemencionados, além da atuação do Ministério Público do Trabalho que criou diversos órgãos especiais para atender as denúncias acerca do problema.
E de forma gradativa, o Governo Federal vem tomando as medidas necessárias para combater este crime, como a Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo[9], criada em 2003, para coordenar e avaliar a implementação das ações previstas no Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, além de acompanhar a tramitação de projetos de lei, no Congresso Nacional, e avaliar a proposição de estudos e pesquisas sobre o trabalho escravo no país.
O Plano Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo[10],apresentou medidas a serem cumpridas pelos diversos órgãos dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, Ministério Público e entidades da sociedade civil brasileira, no combate à erradicação de todas as formas contemporâneas de escravidão.
E, uma das propostas do plano, previu a inserção de cláusulas contratuais impeditivas, para a obtenção e manutenção de crédito rural e de incentivos fiscais, nos contratos das agências de financiamento, quando comprovada a existência de trabalho escravo ou degradante.
Ainda em 2003, por determinação do Ministro da Integração Nacional, foi publicada a portaria 1.150/03[11],para que o Departamento de Gestão dos Fundos de Desenvolvimento Regional encaminhasse a “lista suja” semestralmente aos bancos administradores dos Fundos Constitucionais de Financiamento. E recomendava que os agentes financeiros “se abstenham de conceder financiamentos” às pessoas físicas e jurídicas que integrem a relação.
Em resultado disso, no ano de 2004, foi publicada a portaria 540[12] do Ministério do Trabalho e Emprego que listava nomes associados à prática de trabalho escravo ou em condições análogas. Surgiu, a chamada "lista suja", identificando os agentes dessa prática ilegal, que inicialmente trouxe a público 52 empresas e indivíduos com condenação definitiva na esfera administrativa.
Em seguida, os Tribunais Regionais do Trabalho, apresentaram decisões acerca da inclusão das empresas na chamada “lista suja”, vejamos:
“1.CADASTRO DE EMPREGADORES QUE UTILIZAM MÃO-DE-OBRA EM CONDIÇÕES ANÁLOGAS ÀS DE ESCRAVO (LISTA SUJA); CONSTITUCIONALIDADE DA PORTARIA. INCLUSÃO DO NOME DO IMPETRANTE. VALIDADE DO ATO. MANDADO DE SEGURANÇA. DENEGAÇÃO. A edição da Portaria nºº 540/2004, do MTE, empresta reverência aos fundamentos do Estado Democrático de Direito, com destaque para a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (CF, art. 1º, inciso III e IV). Amolda-se a iniciativa ministerial, também, ao axioma constitucional que persegue a valorização do trabalho humano e a função social da propriedade, encartado no artigo 170, da Carta Política, erigindo-se em instrumento eficaz e indispensável para que o Estado brasileiro atenda ao compromisso internacional de combater a chaga do trabalho escravo em nosso território. O ato de inclusão do nome do empregador na lista em cogitação não encerra ato punitivo, tendo o cadastro natureza meramente informativa, não se evidenciando, pois, ilegalidade no ato praticado pela autoridade pública. Na hipótese, verificada a conformação do ato estatal com as normas de regência, não há violação a direito líquido e certo. 2. Provimento negado ao recurso. (Redator: Des. Ribamar Lima Júnior. PROC. Nº 00022-2011-001-10-00-2- RO . Julgado em 3/8/2011). Recurso ordinário conhecido e desprovido, com ressalvas de entendimento pessoal. (TRT-10 - RO: 835201101510005 DF 00835-2011-015-10-00-5 RO, Relator: Desembargadora Márcia MazoniCúrcioRibeiro , Data de Julgamento: 23/11/2011, 3ª Turma, Data de Publicação: 02/12/2011 no DEJT)”
“INCLUSÃO DO NOME NO CADASTRO RESTRITIVO DE EMPREGADORES. LISTA SUJA. O cadastro de empregadores que já exploraram o trabalho escravo, mais conhecido como "Lista Suja", foi criado pela Portaria 540/04 do MTE. A medida serviu para intimidar aqueles empregadores que comprovadamente exploraram e empregaram trabalhadores de forma degradante, sem condições dignas e de forma desumana. Entretanto, a própria portaria prevê a exclusão daqueles empregadores que, ao longo de dois anos, contados da sua inclusão no cadastro, sanaram as irregularidades identificadas pela inspeção do Ministério do Trabalho e que pagaram as multas e os débitos trabalhistas. Demonstrando o autor que cumpriu esses requisitos, deve ter seu nome retirado da lista. (TRT-16 292200701316004 MA 00292-2007-013-16-00-4, Relator: JAMES MAGNO ARAÚJO FARIAS, Data de Julgamento: 13/07/2009, Data de Publicação: 20/08/2009)”
Verifica-se que tais julgados, evitam a perpetuação da prática do trabalho escravo, e visa punir quem comprovadamente cometeu esse crime, entretanto também retira da lista, as empresas que mudam sua conduta.
E, para dar continuidade as medidas de combate ao trabalho escravo, em abril de 2008 foi apresentado o 2º- Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo[13], produzido pela Conatrae – Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo e representa uma amplaatualização do primeiro plano, e introduz modificações que decorrem de uma reflexão permanente sobre as distintas frentes de luta contra essa forma brutal de violação dos Direitos Humanos.
Além disso, em junho de 2014, foi promulgada a Emenda Constitucional 81[14], conhecida como PEC do trabalho escravo, a proposta foi aprovada no Senado no dia 27.05.2014, e é uma importante medida que prevê a expropriação de imóveis rurais ou urbanos em que se verifique a prática de trabalho escravo, além de prever que os proprietários dos imóveis desapropriados, não terão direito à indenização e ainda estarão sujeitos às punições previstas no Código Penal. A emenda dá nova redação ao artigo 243 da CF, que determina a expropriação de propriedades rurais e urbanas onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas, acrescentando a possibilidade de aplicação da medida no caso deexploração de trabalho escravo.
Portanto, de modo geral, constatou-se que o Brasil, evoluiu consideravelmente na fiscalização e capacitação de mão de obra para combater o trabalho escravo, além de promover campanhas para conscientizar os trabalhadores sobre seus direitos. Mas ainda deixa a desejar, quanto às medidas para diminuir a impunidade desta prática, aumentar as ofertas de emprego em regiões menos desenvolvidas e efetivar de forma eficiente uma reforma agrária nas regiões fornecedoras de mão de obra escrava, tendo ainda muito à fazer.
CONCLUSÃO
O trabalho em condições análogas à de escravo, é crime, entretanto, ainda é uma prática comum em diversos locais do mundo, inclusive no Brasil.
O art. 149 do Código Penal tem papel fundamental no combate ao trabalho escravo contemporâneo no Brasil, juntamente com as legislações provenientes da Organização Internacional do Trabalho que chamam atenção do mundo para o problema.
Outro grande avanço na questão, foi a aprovação da PEC do trabalho escravo que prevê a expropriação da terra, onde a prática do trabalho em condições análogas à de escravo for encontrada.
Desta forma, espera-se que o Poder Judiciário atue de forma rigorosa, aplicando a legislação existente contra aqueles que a desrespeitam. Ao Poder Executivo cabe uma maior fiscalização em todo território brasileiro, principalmente nas localidades onde existe uma maior incidência desta prática.
Assim, reconhecer a dignidade humana, como bem jurídico que deve ser protegido e reprimir o trabalho em condições análogas à de escravo, é de suma importância para que a caracterização desse ilícito ganhe contornos mais uniformes, não somente na doutrina, mas também na jurisprudência, permitindo que a atuação dos órgãos estatais, seja mais eficaz.
Portanto, para o efetivo cumprimento da lei, sãonecessáriasações conjuntas dos órgãos governamentais e da sociedade, pois todos somos responsáveis para combater e erradicar esta condição degradante que ainda assola muitos trabalhadores.
REFERÊNCIAS
[1]http://www.ecodebate.com.br/2014/11/18/no-brasil-situacao-analoga-a-escravidao-atinge-1553-mil-pessoas-diz-o-relatorio-indice-de-escravidao-global-2014/. Acesso em: 23 de novembro de 2014.
[2]http://portal.mte.gov.br/imprensa/mte-divulga-balanco-do-trabalho-escravo-em-2013/palavrachave/trabalho-escravo-balanco.htm . Acesso em
[3] BRASIL. Ministério Publico da União. Procuradoria Geral do Trabalho. Trabalho escravo. Revista do Ministério Publico do Trabalho, Brasilia, ano 13, n.26,p. 55-56, 2003
[4]http://www.oit.org.br/sites/all/forced_labour/oit/convencoes/conv_29.pdf.Acesso em: 14 de dezembro de 2014.
[5]http://www.oit.org.br/sites/all/forced_labour/oit/convencoes/conv_105.pdf. Acesso em: 14 de dezembro de 2014.
[6] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, 2: parte especial: dos crimes contra a pessoa. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 398.
[7]BARACAT, Eduardo Miléo (Coord.). Direito penal do trabalho: reflexões atuais. Belo Horizonte: Fórum, 2010. 330p.
[8]FIGUEIRA, Ricardo Rezende, ano 2004, página 118. In: NETO, Paulo Neto. Conceito Jurídico e Combate ao Trabalho Escravo Contemporâneo.-São Paulo- Ltr 2008, página 46 e 47.
[9]http://www.sdh.gov.br/assuntos/conatrae/programas/comissao-nacional-para-a-erradicacao-do-trabalho-escravo. Acesso em: 06 de dezembro de 2014.
[10]http://portal.mte.gov.br/data/files/FF8080812B21345B012B2ABF15B50089/7337.pdf. Acesso em: 22 de novembro de 2014.
[11]http://www.mi.gov.br/c/document_library/get_file?uuid=b9f0a700-687a-47e3-9c1c 4d418f9e6cf8&groupId=407753. Acesso em: 22 de novembro de 2014.
[12]http://portal.mte.gov.br/data/files/FF8080812BE914E6012BF2B6EE26648F/p_20041015_540.pdf. Acessoem: 22 denovembro de 2014.
[13]http://www.sdh.gov.br/assuntos/conatrae/direitos-assegurados/plano-nacional-para-a-erradicacao-do-trabalho-escravo-2013-pnete. Acesso em: 06 de dezembro de 2014.
[14]http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc81.htm. Acesso em: 06 de dezembro de 2014.
Professora universitária, pedagoga, bacharel em Direito UFRJ, mestre em Direito UFRJ, mestre em Filosofia UFF, Doutora em Direito USP. Pesquisadora-Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Articulista e colunista dos sites www.invetidura.com.br, www.netlegis.com.br, www.jusvi.com , possuindo vasta produção acadêmica publicada nos sites como www.ibdfam.org.br , http://egov.ufsc.br/portal/buscalegis, www.abdpc.org.br ,www.ambito-juridico.com.br , www.abdir.com.br , www.jurid.com.br .<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LEITE, Gisele. O trabalho em condições análogas ao de escravo no Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 jan 2015, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/43169/o-trabalho-em-condicoes-analogas-ao-de-escravo-no-brasil. Acesso em: 23 nov 2024.
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