RESUMO: O presente artigo tem o objetivo de demonstrar a possibilidade do militar cedido para ocupar cargo em comissão de natureza civil fora das Forças Armadas responder a Processo Administrativo Disciplinar capitulado na Lei nº. 8.112/1990, no âmbito do órgão cessionário.
Palavras-chave: Militar cedido. Cargo de natureza civil. Responsabilidade. Processo Administrativo Disciplinar. Lei nº 8.112/1990.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO – 2 APURAÇÃO DE RESPONSABILIDADE. MILITAR CEDIDO PARA OCUPAR CARGO DE NATUREZA CIVL QUE COMETE FALTA FUNCIONAL FUNDAMENTADA NA LEI 8.112/1990 – 3 CONCLUSÃO – 4 REFERÊNCIAS.
1 INTRODUÇÃO
O ponto chave do presente artigo é saber de quem é a competência para apurar a responsabilidade de ato potencialmente ilegal capitulado na Lei nº 8.112/1990 praticado por militar cedido a órgão civil para ocupar cargo comissionado.
Mais especificamente, a dúvida maior é se militares cedidos para ocuparem cargos em comissão em outros órgãos públicos podem responder por processo administrativo disciplinar instaurado no âmbito do órgão em que está localizado o cargo comissionado?
2 APURAÇÃO DE RESPONSABILIDADE DE MILITAR CEDIDO PARA OCUPAR CARGO DE NATUREZA CIVIL QUE COMETE FALTA FUNCIONAL FUNDAMENTADA NA LEI 8.112/1990.
Inicialmente, aponta-se que a especificidade da carreira militar pode ser extraída dos termos do art. 142 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - CRFB/88, destacando-se que o regime disciplinar das carreiras das Formas Armadas é necessariamente vinculado à hierarquia.
Ciente da especificidade da carreira militar, o Poder Constituinte brasileiro fez prever no art. 142, §3º, X, da CRFB/88 que compete à lei dispor, dentre outros aspectos, sobre os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares das Forças Armadas, consideradas as peculiaridades de suas atividades.
Assim, está consignado no art. 3º da Lei nº 6.880, de 9 de dezembro de 1980, que os membros das Forças Armadas, em razão de sua destinação constitucional, formam uma categoria especial de servidores da Pátria e são denominados militares.
Percebe-se que os militares estão submetidos a um regime jurídico distinto daquele aplicado aos servidores públicos federais. Aos militares, a princípio, não se aplicam os ditames da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, ou seja, não estariam sujeitos a processos administrativos disciplinares regidos pelos artigos 143 e seguintes desta lei.
Soma-se a essa ideia de especificidade, os termos da Lei nº 13.502, de 1 de novembro de 2017, que estabelece a organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios, em que há disposição aduzindo que a competência para tratar de legislação de defesa e militar, aí inserida a legislação referente a pessoal militar, é do Ministério da Defesa (art. 31, inciso IX) e, mais precisamente, dos Comandos Militares, principalmente quando se referir a desvio de comportamento do militar.
Não obstante essa premissa, frisa-se que militares podem vir a ocupar cargos públicos civis, não eletivos, na administração pública federal, situação em que ficam agregados. A princípio, o militar agregado deixa de ocupar vaga na escala hierárquica de seu Corpo, Quadro, Arma ou Serviço, nela permanecendo sem número (art. 80 da Lei nº 6.880, de 1980).
Porém, segundo o art. 81 da Lei nº 6.880, de 1980, o militar será agregado e considerado, para todos os efeitos legais, como em serviço ativo quando:
I - for nomeado para cargo, militar ou considerado de natureza militar, estabelecido em lei ou decreto, no País ou no estrangeiro, não-previsto nos Quadros de Organização ou Tabelas de Lotação da respectiva Força Armada, exceção feita aos membros das comissões de estudo ou de aquisição de material, aos observadores de guerra e aos estagiários para aperfeiçoamento de conhecimentos militares em organizações militares ou industriais no estrangeiro;
II - for posto à disposição exclusiva de outro Ministério Militar para ocupar cargo militar ou considerado de natureza militar;
II - for posto à disposição exclusiva do Ministério da Defesa ou de Força Armada diversa daquela a que pertença, para ocupar cargo militar ou considerado de natureza militar; (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.215-10, de 31.8.2001)
III - aguardar transferência ex officio para a reserva, por ter sido enquadrado em quaisquer dos requisitos que a motivaram;
IV - o órgão competente para formalizar o respectivo processo tiver conhecimento oficial do pedido de transferência do militar para a reserva; e
V - houver ultrapassado 6 (seis) meses contínuos na situação de convocado para funcionar como Ministro do Superior Tribunal Militar. (grifei).
Aqui, surge a possibilidade de o militar ser cedido para ocupar cargo de natureza militar ou para ocupar cargo de natureza civil.
Como exemplo, a Portaria nº 871, de 11 de outubro de 2012, que aprova a Diretriz sobre Cessão de Militar da Ativa para Órgãos não Pertencentes ao Comando do Exército, diz que a cessão de militar do Exército para órgãos não pertencentes ao Comando do Exército poderá ocorrer para o exercício de cargo de natureza militar ou cargo público civil temporário, de natureza não eletiva, a fim de atender a interesses da Instituição.
Em relação ao militar que for cedido para o exercício de cargo que tenha natureza militar, não há dúvida de que a sua responsabilidade deverá ser apurada nos termos da legislação castrense sobre o tema e não nos termos da Lei nº. 8.112/1990.
Já em relação ao militar cedido para ocupar cargo público civil temporário (sem qualquer vínculo com a atividade castrense), não há um entendimento formado pela doutrina e nem pela jurisprudência de quem seria a atribuição para apurar a responsabilidade de ato potencialmente capitulado na Lei nº. 8.112/1990.
O certo é que ao tomar posse em cargo comissionado de natureza civil em órgão federal, o militar constitui novo vínculo estatutário com a administração pública federal, a ser regido pela Lei nº 8.112, de 1990.
Dessa forma, enquanto ocupante de cargo comissionado de natureza civil, o militar estará submetido aos deveres inerentes ao cargo comissionado, submetendo-se a eventual responsabilização por faltas funcionais, segundo os já citados artigos 143 e seguintes da Lei nº 8.112, de 1990.
Porém, ainda que o militar cedido para ocupar cargo civil venha sofrer punição em relação ao seu cargo comissionado (como destituição do cargo em comissão) em virtude de processo administrativo disciplinar no âmbito civil, seu vínculo com as Forças Armadas deve persistir incólume.
Como demonstrado, os militares estão sujeitos a regime jurídico distinto e somente podem ser disciplinarmente apenados pelos seus superiores hierárquicos, de acordo com a regulamentação pertinente a cada Força, no que diz respeito ao seu vínculo militar.
Portanto, conclui-se que o militar cedido para ocupar cargo de natureza civil pode responder a processo administrativo disciplinar, regido pela Lei nº 8.112, de 1990, mas que, a princípio, eventual punição somente poderá surtir efeitos sobre o vínculo estatutário decorrente do cargo comissionado.
Por fim, aponta-se que a instauração de PAD com fundamento nos termos da Lei nº 8.112, de 1990 não impede a instauração de procedimento idêntico no Comando Militar ao qual o militar tem seu vínculo originário, para apurar se o ato cometido no âmbito civil também pode configurar infração militar.
3 CONCLUSÃO
O presente estudo permite concluir que o militar cedido para exercer atividade de natureza civil poderá responder a PAD regido pela Lei nº 8.112, de 1990, mas que possíveis punições somente surtirão efeitos sobre o vínculo estatutário decorrente do cargo comissionado ocupado, não afetando automaticamente o vínculo do militar cedido com a Força a qual pertença.
Não obstante essa conclusão, frisa-se que o PAD instaurado com fundamento na Lei nº 8.112, de 1990 não impede a instauração de procedimento idêntico no Comando Militar ao qual o militar tem seu vínculo originário, o que poderá gerar eventual punição militar.
4 REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 26/09/2018.
BRASIL. Lei nº 6.880, de 9 de dezembro de 1980. Dispõe sobre o Estatuto dos Militares. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6880.htm. Acesso em 26/09/2018.
BRASIL. Lei nº 8112, de 11 de dezembro de 1990. Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8112cons.htm. Acesso em 26/09/2018.
BRASIL. Lei nº 13.502, de 1º de novembro de 2017. Estabelece a organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios; altera a Lei no 13.334, de 13 de setembro de 2016; e revoga a Lei no 10.683, de 28 de maio de 2003, e a Medida Provisória no 768, de 2 de fevereiro de 2017. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13502.htm. Acesso em 26/09/2018.
Bacharel em Direito - Faculdade de Ciências Sociais e Tecnológicas - FACITEC. Especialista em Direito Público (Pós-Graduação Lato Sensu) - Faculdade Projeção. Ex-Técnico Judiciário/TST, ex- Analista do MPU - Apoio Jurídico / Direito; ex-Analista Judiciário - Área Judiciária, atualmente Advogado da União<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CAVALCANTE, Marcos Vinicius Martins. Possibilidade de o órgão cessionário apurar a responsabilidade de ato capitulado na Lei nº. 8.112/1990 praticado por militar cedido para ocupar cargo comissionado. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 out 2018, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/52305/possibilidade-de-o-orgao-cessionario-apurar-a-responsabilidade-de-ato-capitulado-na-lei-no-8-112-1990-praticado-por-militar-cedido-para-ocupar-cargo-comissionado. Acesso em: 22 nov 2024.
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