RESUMO: A redução da maioridade penal sempre foi um assunto de grande controvérsia para o mundo jurídico, pois muito tem se discutido sobre as consequências que a redução poderia causar na vida dos jovens infratores, principalmente no que diz respeito aos direitos e garantias estabelecidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Esse assunto busca ressaltar os impactos que o advento de uma nova lei poderia causar aos direitos do menor, cuja redução da maioridade dos 18 para os 16 anos conferiria responsabilidade aos fatos a ele imputados, nesse entendimento ao completar os 16 anos o jovem seria capaz (para fins civis e criminais) de se responsabilizar criminalmente conferindo a ele uma pena que o igualaria aos demais detentos de tenra idade. Embora muitos juristas vejam essas mudanças como necessárias, existem aqueles que apresentam entendimento diferenciado ao compreender que as eventuais mudanças na lei penal suprimiriam um direito que o estatuto há muito tempo tem lutado, ainda mais no que se diz respeito a aplicação das medidas socioeducativas que se diferenciam da aplicação de pena para fins penais.
PALAVRAS-CHAVE: Maioridade. Adolescente. Criança. ECA.
ABSTRACT: Reducing the age of criminal responsibility has always been a matter of great controversy in the legal world, as there has been much debate about the consequences that the reduction could cause in the lives of young offenders, especially with regard to the rights and guarantees established by the Child Statute and Adolescents (ECA). This subject seeks to highlight the impacts that the advent of a new law could have on the rights of minors, whose reduction of the age of 18 to 16 years would make the facts attributed to them responsible, in this understanding, upon completing 16 years, the young person would be able to (for civil and criminal purposes) to be criminally responsible by conferring on him a penalty that would equal him to other detainees of an early age. Although many jurists see these changes as necessary, there are those who have a different understanding when they understand that any changes in criminal law would suppress a right that the statute has been fighting for a long time, especially with regard to the application of socio-educational measures. Differ from the application of punishment for criminal purposes.
KEYWORDS: Adulthood. Adolescent. Kid. ECA.
INTRODUÇÃO
O direito Penal encontra-se em constante evolução, a cada dia e a cada semana surgem novos questionamentos que nos fazem refletir acerca de fatos nunca vistos antes pelo legislador, e foi por meio desses inúmeros avanços que se viu a necessidade da criação de novas leis capazes de corresponder as atuais expectativas visando modernizações nos textos legais.
Contudo, apesar de sua importância, não podemos negar os novos problemas relacionados ao estudo do direito penal, e dentre eles o estudo de viabilidade quanto a redução da maioridade penal, trazendo a tona a divergência de posicionamentos apresentados por doutrinadores e especialistas favoráveis ou não quanto a aplicabilidade do projeto em fase de aprovação.
O estudo do tema sobre a “redução da maioridade penal” se faz necessária devido a importância de inúmeros questionamentos trazidos acerca da sua matéria, principalmente no que diz respeito as repercussões sociais que envolvem a pauta jurídica, pois não se trata apenas do mero direito a liberdade, e sim, um assunto que envolve as condutas praticadas por um adolescente em plena fase de desenvolvimento.
De inúmeros apontamentos sobre o tema, o artigo focará o seu trabalho na compreensão do projeto de lei que envolve a redução da maioridade, ressaltando que havendo a aplicação da lei penal sobre as condutas praticadas pelo jovem infrator, teremos o eventual afastamento da proteção conferida pelo ECA, fato este que resultará em uma possível retirada das medidas socioeducativas, para em seu lugar fixar pena prevista no tipo penal imputado.
Com bases nessas justificativas, será valido destacar a linha tênue entre o ECA e o Código Penal, visando a compreensão dos limites de aplicabilidade de seus dispositivos conforme cada caso em concreto.
1. OBSERVAÇÕES INICIAIS
A redução da maioridade penal é um tema delicado para ser discutido, por não apenas tratar da mera aplicabilidade da lei penal, e sim, na tomada de decisões na vida do menor infrator. Muito se sabe da importância atribuída ao ECA na proteção e promoção aos direitos da criança e do adolescente.
Neste último caso, em relação aos atos infracionais praticados, a justiça atribui ao mesmo a aplicação de medida socioeducativa com o fim de apaziguar, solucionar e conscientizar o adolescente da conduta proibida que veio a praticar. Contudo, muito tem se preocupado com a elaboração do projeto de lei em questão, pois, no caso de eventual aprovação, muitos dos direitos conferidos ao adolescente pelo estatuto poderiam vir a passar por mudanças significativas a ponto de reger-se pelas novas regras estabelecidas pela lei penal (HENRIQUE, 2004, P. 12).
Acerca desses questionamentos que o artigo se aterá, com o fim de propiciar melhores entendimentos acerca da temática escolhida para ser trabalhada.
2. A CRIANÇA E O ADOLESCENTE
Antes de tudo, é preciso primeiramente entender o conceito e a designação conferida a classificação de criança e adolescente pelo ECA. O Artigo 2° da lei 8069/1990 preceitua a criança como sujeito de direitos no momento do seu nascimento até os 12 anos de idade incompletos, mais a frente temos o adolescente, visto pela lei como uma fase da vida que se inicia a partir dos 12 anos e vai até os 18 anos incompletos. Essa classificação se fez necessária na definição de quais sujeitos seriam asseguradas pela proteção da referida lei (LIBERATI, 2021. P. 32).
Em consequência disso, o Estatuto é baseado no princípio da proteção integral, ou seja, o aludido princípio decorreu com o advento do ECA a qual estabelece que a lei protegerá toda criança e todo adolescente independentemente de sua condição social, não fazendo, portanto, acepções que as diferenciassem de suas condições financeiras. Este princípio se faz necessário, tendo em vista que no passado as lutas pelos direitos dos menores baseavam-se no critério da não integralidade, onde estabelecia que apenas as crianças e adolescente em situação de vulnerabilidade seriam beneficiados pela lei (MINISTERIO DA SAÚDE, 2007. P. 03).
Essa exclusão no passado acarretava uma série de consequências negativas que lavavam a diferenciação, exclusão e até mesmo arbitrariedade por parte do Estado quanto a aplicação desses direitos.
Portanto, com o intuito de coibir as negligencias desses acontecimentos que surgiu o ECA, que promoveu inúmeros avanços jurídicos e sociais na vida de crianças e adolescentes como pessoa física em situação de desenvolvimento.
Acerca desse posicionamento, Furini destaca que:
É possível pensarmos o ser humano como pessoa em constante processo de formação e aprendizagem. No entanto, são as faixas etárias que envolvem crianças e adolescentes as que mais recebem atenção como fases de formação para o convívio social. Ao ser considerado adulto, o ser humano passa a compor um universo simbólico no qual ele é considerado completo (FURINI, 2001. P. 93).
Dessa forma, embora a criança e o adolescente se encontrem em fase de desenvolvimento e formação, eles nada mais do que sujeitos socialmente ativos que se encontram sempre se manifestando e posicionando diante de toda e qualquer ação que lhe é dada, tendo, portanto, a necessidade de terem os direitos devidamente resguardados, com a premissa de que futuramente se tornem sujeitos responsáveis e conscientes de suas condutas perante a sociedade.
3. O PAPEL DA FAMÍLIA
O artigo 227 da Constituição Federal reconhece a família como o primeiro núcleo de contato, cujos pais ou responsáveis conferem proteção e afeto aos seus filhos de maneira a educá-los e prepará-los para a sociedade. Dentre inúmeras situações de vulnerabilidade, o que mais tem afetado as crianças e adolescentes nos últimos anos se devem por conta da decorrência dos problemas familiares vivenciados e de suas desestruturas internas, cuja a ausência dos pais resultam em problemas na formação dos menores.
A doutrina moderna compreende a afetividade como o principal liame para uma relação familiar saudável, onde o amor e o diálogo se tornam os principais pontos para o desenvolvimento e aprimoramento dessas relações (JERSILD, 1971. P. 14).
Atualmente, o vínculo existente entre a criança e seus cuidadores não se resumem apenas a ligação de sangue (biológica), como também se estende a todo o vínculo de afeto existente entre as partes, seja eles por consanguinidade ou não, pois como muitos já devem saber, o Direito de família entende que a adoção, além de ser considerada um mecanismo de formação familiar, traz como um de seus fundamentos a ligação de amor e afeto que existe entre pai e filho na formação deste novo núcleo.
Para o reconhecimento do vínculo conjugal e sua consequente materialização é preciso que os pais ou responsáveis eduquem seus filhos de maneira a prepará-los para o meio social, garantindo que o mesmo na condição de filho preste a devida obediência aos seus pais e compreenda a importância dos ensinamentos que são passados. Com isso, a criança passará a ter liberdade de se autoconhecer e entender o processo e os desafios que os rodeiam em sua idade.
A oportunidade de acompanhar os passos de uma criança ou de um adolescente tem sido um ponto decisivo para o crescimento do mesmo, ainda mais quando se tem pais que possuem o cuidado em acompanhar diariamente seus passos vendo o seu progresso. Segundo o entendimento de psicólogos e especialistas da área, a proteção e o amor que os pais empregam aos seus filhos possibilitam a criação de um ambiente onde o menor possa ter maiores liberdades para desenvolver seus processos criativos sem receios ou riscos para si, como perante aos demais participantes de sua convivência diária (OUTEIRAL, 2003).
Muitos dos limites que os pais estabelecem na educação dos filhos permitem o domínio da agressividade natural, com a consequente obediência as suas ordens. Fatores estes que favorecem o desenvolvimento da autoconfiança; o sentimento de ser amado e o entendimento da existência dos valores morais e suas responsabilidades; aprender sobre o dever e sua importância em cumprir as obrigações a eles impostas, como forma de respeitar não apenas os mais velhos como também o próximo, dentre outros. Com esse entendimento, a fase de crescimento e amadurecimento da criança e do adolescente e os consequentes limites impostos pela educação auxiliam em seu processo de desenvolvimento (BOLLE DE BAL, 2001).
A vulnerabilidade que muitas vezes existe no seio familiar ocorre sempre quando não há o devido apoio dos pais, é muito comum encontramos diversas situações que envolvam famílias desestruturadas, cujos pais enfrentam problemas diversos tais como a dependência química, o alcoolismo, dentre outros. Essas situações são vistas como alguns dos problemas enfrentados no mundo jurídico, uma vez que se encontre em famílias desestruturadas, a criança e o adolescente ficam desamparadas e sem o devido auxilio e proteção que merecem.
Com isso a Constituição Federal estabelece que o dever de criar, cuidar e prover o sustento do menor provêm da família, o Estado só intervêm em último caso de forma subsidiária (SLUZKI, 1997).
A partir do momento que os pais compreendem a real necessidade de sua importância na vida dos filhos, isso permite maiores aberturas para identificar e compreender suas responsabilidades na vida daqueles que o dependem (PEREIRA, 2009).
Todavia, a ausência desses limites tem sido cada vez mais frequentes na vida dos jovens. Embora muitos compreendam a importância do uso do exercício da autoridade, muitos estudos têm constatado situações que resultaram na dificuldade que crianças e adolescentes encontraram na construção e desenvolvimento de vínculos afetivos.
Isto posto, cumpre destacar que cada família tem o seu próprio jeito de criar seus filhos, e muito desse conhecimento decorre de aspectos sociais e culturais.
Ao garantir o respeito a cultura familiar dentro em cada contexto histórico e as peculiaridades que existem dentro de cada núcleo, os pais tem a difícil tarefa de manter o controle sobre seus filhos, buscando dentro dessa medida a flexibilidade na rigidez e no ensinamento ao abrir e conceder espaço para que a criança e o adolescente também participem do processo ao apresentarem suas opiniões. Contudo, quando isso não acontece se torna comum em razão dos não cuidados que os pais percam o poder de autoridade sobre seus filhos, isso decorre em grande parte nos casos em que eles se tornam indiferentes ao comportamento e aos sentimentos dos filhos, ou deixam de pensar nos filhos para pensar apenas em si deixando-os de lado. Nessas situações se percebe que muitos dos problemas comportamentais relacionados as crianças e aos adolescentes estão mais ligados a questão da ausência dos pais do que ao excesso de supervisão e controle dos mesmos, pois a ausência em si faz com que os filhos fiquem na solidão, sentimento negativo este que pode desencadear uma série de fatores negativos não apenas para a família, como também para o desenvolvimento familiar como um todo (OMER, 2002).
De outra forma, a rigidez na educação dos filhos também pode comprometer o controle dos pais sobre seus filhos. O costume ‘do bater’ como forma de disciplinar e educar faz parte de uma prática popular e cultural que tem sido estendida ao longo dos últimos anos. Embora tais atos disciplinassem o comportamento dos filhos, muitos especialistas não poderiam deixar de expressar que essa forma de educação era extremamente violenta e incompatível com as leis de hoje (GUIMARÃES, 1998).
Com o resultado das grandes dificuldades vistas dentro do seio familiar e da árdua tarefa de educar e ensinar as crianças e jovens para prepará-los para a sociedade, os filhos também tiveram dificuldades na inserção da chamada “afiliação social”, ou seja, na possibilidade da criança e do adolescente em relacionar e criar novos vínculos fora do núcleo familiar (bairro, escola, dentre outros) (GUIMARÃES, 1998).
4. O PAPEL DA ESCOLA E SUA IMPORTÂNCIA
Além do importante papel da família, a escola é uma instituição que também exerce forte influência no desenvolvimento do menor, é nesse ambiente de aprendizado que a criança e o adolescente passam o maior tempo de suas vidas, sendo a escola a principal mediadora da entrada dos mesmos a sociedade.
A escola, por meio de sua equipe de professores e pedagogos trabalham não apenas na educação, como também no processo de humanização do aluno, pois é através desses conceitos que o estudante poderá desenvolverá suas capacidades cognitivas ao compreender a importância de seu papel na sociedade e da necessidade de inserir-se dentro de um grupo social. É nesse contexto que o aluno deixa de ter apenas os pais como sua única referência no aprendizado.
Esse entendimento é importante de ser ressaltado, pois a escola tem como papel não apenas transmitir informações, como também formar cidadãos, ou seja, o ambiente escolar não se limita apenas em avaliar os alunos quanto ao conhecimento e aprendizado fornecidos, e sim o conhecimento que os levará a formação de seu autoretrato e firmação na sociedade.
A escola deve dispor de um ambiente que seja capaz de prover o aprendizado e o desenvolvimento da capacidade criativa do aluno ao analisar sua socialização e seus potenciais por meio de uma conduta ética de apoio e respeito (DABAS, 2005).
Por se tratar de uma instituição voltada para fins puramente educativos, a escola exerce papel secundário, subsidiário e complementar no apoio à criança e ao adolescente. Autoridade esta que é exercida conjuntamente com a família de forma legítima, dentro de suas disposições, regulamentos e restrições (LÉVY, 2001).
No entanto, nem sempre as relações que existem entre educador e aluno acabam sendo uma das mais fáceis, pois o jovem ao se encontrar em fase de desenvolvimento e amadurecimento encontra muitas fragilidades quanto ao entendimento da importância de se compreender a necessidade de regras e limites. E tudo isso deve construído e desenvolvido dentro do tempo de cada um, hoje em dia é muito comum encontrar jovens com alto sentimento de insegurança e não pertencimento a instituição por não se encaixarem dentro das regras, e é por conta de situações como essa que a escola recebe o papel de apoiar o aluno e guiá-lo nessa jornada (PEREIRA, 2009).
Embora muito se fale hoje em dia sobre a importância da implementação de políticas públicas nas áreas de educação e cultura, muito ainda precisa ser feito, devido a este problema o cenário educacional enfrenta grandes desarticulações com a falta de programas e projetos pedagógicos eficientes e com poucos recursos orçamentários nas instituições públicas. Nesse cenário, o setor educacional ao carecer de recursos depende muitas vezes da desenvoltura do professor em não apenas ensinar e fornecer o conteúdo aos seus alunos como também garantir que aquele aluno entenda a real importância e necessidade da educação na sua vida (PEREIRA, 2009).
5. AS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS
No que diz respeito as medidas sócio educativas utilizadas pelo Estado na repressão dos atos infracionais praticados por crianças e adolescentes deixados à margem da sociedade. O ECA (estatuto da criança e do adolescente) buscou trazer mecanismos que não apenas repreendessem as condutas praticadas, como também conscientizassem o infrator sobre a prejudicialidade de sua conduta (LÉVY, 2001).
No que diz respeito aos estudos das condutas praticadas pelo menor infrator, a doutrina entente que o ato infracional apresentado pelo Estatuto é uma conduta antijurídica praticada pela criança ou pelo adolescente. Portanto, ao analisar que o cometimento de uma infração acarrete em sérios prejuízos para a vítima da conduta se faz necessária a repressão do Estado na solução desses litígios. Com base nessas informações, qual a real diferença que a doutrina e o estatuto conferem entre a infração apresentada no ECA e o Crime de natureza penal?
Para responder essa pergunta, o doutrinador André Estefam diz que o crime pode ser entendido como toda conduta praticada por ação ou omissão, que embora prevista em lei, tem que ser capaz de ofender um em jurídico penalmente relevante (ESTEFAM, 2012.p. 312).
Sobre o conceito apresentado, somente se atribuiria a prática de crime conforme a legislação penal, ao sujeito que fosse maior de 18 (dezoito) anos, por levar em cosideração que o mesmo teria plenas condições de entender a conduta praticada. Diferentemente da criança e do adolescente, que por serem menores de idade, não entendem a gravidade da situação, sendo protegidos pela legislação especial que atribuem a sua conduta antijurídica o termo “ato infracional”.
O estudo do presente artigo se debruça na compreensão dos atos infracionais e suas medidas de coibição que segundo o estatuto são seis vão a elas:
A primeira medida é a “advertência” prevista no artigo 115 do Estatuto, de acordo com o que o dispositivo preceitua a advertência se trata de uma admoestação verbal feita em juízo, em outras palavras, a advertência é a medida mais branda que costuma ser feita pelo juiz em frente ao infrator onde ele fala sobre os riscos e consequências negativas sobre os atos praticados, alertando-o apenas a não fazer novamente (LÉVY, 2001).
Depois de realizada a advertência, o juiz redige um termo que posteriormente é assinado pelas partes (LÉVY, 2001).
A segunda modalidade de medida socioeducativa prevista no Estatuto é a chamada “obrigação de reparar o dano” que se encontra no artigo 116, sua conduta recai sobre danos patrimoniais que muitas vezes foram subtraídos ou destruídos pelo infrator no momento da prática do ato infracional. Na solução dos problemas ocasionados a vítima, a autoridade judiciária atribui ao agente o dever de reparar os danos causados. (PEREIRA, 2009).
A terceira medida utilizada pelo Estatuto é a “prestação de serviços à comunidade” que se resume a realização de serviço que atenda o interesse de certa coletividade, o trabalho imposto para se dar cumprimento tem como objetivo repreender do ato infracional praticado. A medida imposta se encontra no artigo 117 de Estatuto e sua aplicação não poderá exceder o período de seis meses.
A prestação dos serviços de natureza comunitária será realizada prioritariamente em entidades assistenciais, hospitalares, educacionais ou similares, de maneira a permitir que o infrator também participe de programas assistenciais e governamentais junto aos membros da Vara da Infância e juventude para fiscalizar e acompanhar as atividades desenvolvidas e o seu progresso dentro a medida imposta (PEREIRA, 2009).
Dando continuidade, a próxima medida socioeducativa a ser estudada é a “liberdade assistida” a qual encontra-se prevista no artigo 118 do ECA. Comumente essa modalidade é aplicada ao jovem infrator de forma preventiva e ela é compreendida como uma forma de coibir e reprimir da conduta praticada pelo jovem infrator, que é realizada por especialista da vara da infância e juventude (sendo elespsicólogos, educadores, assistentes sociais) que fazem o acompanhamento multidisciplinar designado pelo juiz, com o intuito de educar e fazer com que o jovem não cometa novamente outras infrações.
A quinta medida e não menos importante do Estatuto é a “semiliberdade”, prevista no artigo 120 do ECA, cuja relevância traz como destaque a possibilidade de realização de atividades externas pela parte da manhã, cabendo apenas ao adolescente inserido nesta medida a responsabilidade de retornar pela parte da noite para o estabelecimento institucional de recolhimento a qual está inserido.
Embora muitos juristas vejam a semiliberdade como uma medida severa, ela não se torna a pior dentre todas quando se leva em consideração sua reclusão parcial, cuja liberdade permite que em tempo livre a criança ou adolescente infrator realize atividades educativas e laborais com fim de aprimorar suas capacidades quando reinserido novamente em meio social (DABAS, 2005).
Pra fechar, a última medida socioeducativa prevista no Estatuto é a “intervenção”, que se encontra devidamente inserida no artigo 121 sendo a medida mais grave dentre todas as seis. Sua aplicação se dá em último caso, quando as demais medidas forem insuficientes diante do alto grau de lesividade provocado pelo jovem infrator. Motivo que o leva a sua privação total de sua liberdade.
E por mais que a medida seja vista como necessária, o Estatuto visa assegurar que a aplicação de respectiva modalidade deve ser feita em consonância ao principio da condição peculiar da pessoa em desenvolvimento, pois mais do que a repressão da mera conduta é preciso que seja realizada a proteção e a garantia da integralidade das condições físicas, mentais e emocionais do infrator (DABAS, 2005).
6. QUESTÕES AFETAS A INIMPUTABILIDADE
Primeiramente, a imputabilidade é um instituto previsto no direito penal que analisa a intercorrência de situações praticadas de forma subjetiva que implicam na prática do crime, sendo conceituada como o meio pelo qual o sujeito é capaz de realizar um ato estando em pleno discernimento de suas capacidades cognitivas, ou seja, ao cometer a infração, o indivíduo transforma a mera capacidade em um fato concreto (FRANÇA, 2008. P. 385).
Outro posicionamento a ser destacado é a Penteado quando conceitua a imputabilidade:
Imputável é a pessoa capaz de entender o caráter criminoso do fato e determinar-se de acordo com esse entendimento. Portanto, a imputabilidade é a capacidade que o indivíduo tem de compreender a ilicitude de seu ato e de livremente querer praticá-lo (PENTEADO, 1996. P. 59).
Por outro lado, temos também a figura do inimputável que está prevista no artigo 26 do Código Penal, onde estabelece o mesmo como todo aquele que ao tempo da ação ou omissão não tinha a devida capacidade de compreender os atos praticado, seja por motivos relacionados a doença mental, seja pelo desenvolvimento mental incompleto ou retardado.
No caso da questão discutida neste projeto, o adolescente se encontra entre os inimputáveis por conta de sua tenra idade e por não possuir o devido discernimento pelas suas práticas (KERSTENETAKY, 2011. P. 08).
Dessa forma, ainda que o mesmo venha a ser declarado como autor ou causador de ação ou omissão vedada por texto normativo, ele não responderá pelos efeitos da mesma, em virtude da presença da inimputabilidade, tornando-o isento de pena.
A isenção decorre da análise de ausência de culpabilidade por parte do menor infrator que o liame entre a conduta e o resultado (CAPEZ, 2018. P. 312).
7. A REDUÇÃO DA MENORIDADE PENAL
Inúmeros são os posicionamentos apresentados pela doutrina e jurisprudência, e como o projeto visa um breve esclarecimento da temática apresentada, será apresentada alguns posicionamentos que serão devidamente aprofundados mais a frente.
Miguel Reale, um dos mais importantes cientistas do direito brilhantemente, destaca seu pronunciamento sobre o assunto dizendo:
A redução da maioridade penal não é a solução para os problemas derivados da criminalidade infantil, visto que o cerne da questão da criminalidade se reduz em decorrência das condições socialmente opressivas que expõem enorme contingente de crianças e adolescentes, no país, à situação de injusta marginalidade social.
Ademais, defende a ideia de que a proposta da redução da maioridade é inviável e que a sua mudança seria impossível, principalmente por levar em conta que a maioridade penal é, atualmente em nosso direito, uma cláusula pétrea, embora tal direito não esteja devidamente expresso no art. 5º da Constituição Federal e sim, em seu artigo 228 da seguinte forma (GOMES NETO. 2015. P, 213),
Art. 228 - “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas de legislação especial”.
Perceba que o artigo 5º da Constituição não é taxativo, pelo contrário, em várias partes encontramos outros direitos fundamentais esparsos pela lei, valendo sempre destacar a importância a interpretação e sua aplicabilidade nos casos concretos (NUNES JUNIOR, 2019. P 16).
A prova disso é o parágrafo segundo do mesmo artigo que estabelece:
Art. 5º - §2º: Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
Destarte, vale a pena ressaltar que os posicionamentos apresentados pela linha de raciocínio de Miguel Reale é um dentre muitos posicionamentos contrários a aprovação do projeto de lei (MIRABETE, 2020. P. 128).
Esse argumento possui grande força devida ao fato que a aprovação do projeto acarretará mudanças não apenas no ECA, como também acarretará contrariedade quanto as cláusulas pétreas na Constituição.
CONCLUSÃO
O projeto de redução da maioridade penal dos 18 para os 16 anos de idade tem sido controverso devido a divergência por parte de inúmeros doutrinadores e juristas em sua não aplicabilidade. Um dos fundamentos que ensejaram a contrariedade quanto a aprovação do projeto de lei reside no fato da proposta ir de contra a proteção constitucional que a carta magna confere a maioridade penal, ao considera-la uma cláusula pétrea.
Diante do exposto, apenas a legislação especial seria capaz de regular as matérias condizentes aos direitos das crianças e dos adolescentes. Por se tratar de um grupo vulnerável perante o meio social, somente a legislação especial seria precisa quanto a proteção e regulamentação desses direitos, e hoje dentre esses diversos dispositivos, a de maior destaque é o Estatuto da Criança e do Adolescente.
O ECA não apenas confere a proteção, como também se resguarda da regulamentação de matérias diversificadas, incluindo dentre elas a repressão quanto a prática de atos infracionais.
Dessa forma, foi com base nesse entendimento que muitos doutrinadores questionaram a real eficácia da aplicabilidade do projeto de lei, pois reduzir a maioridade penal seria o mesmo que comparar a prática de uma ilicitude realizada por um adolescente a mesma da que de um adulto. Embora tais penas acarretassem em punição severa, nem sempre o adolescente reagiria com maturidade ou nível de discernimento de suas condutas da mesma forma que um adulto, pois como já fora visto, a adolescência é uma fase em que o sujeito se encontra em profundas transformações, e não seria da maneira mais viável cercear sua liberdade em um momento tão importante de sua vida.
Assim, mais uma vez se compreende a importância das medidas socioeducativas, pois elas não só reprimem a conduta praticada pelo adolescente infrator, como também ensina os valores que o levarão a não praticá-la novamente quando reinserido novamente em meio social.
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Artigo publicado em 10/11/2021 e republicado em 23/07/2024
Graduado do Curso de Direito do Centro Universitário FAMETRO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DUARTE, Rafael Augusto Cruz. A redução da maioridade penal de 18 para 16 anos e sua repercussão e influencia no âmbito social das relações jurídicas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 jul 2024, 04:36. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/57537/a-reduo-da-maioridade-penal-de-18-para-16-anos-e-sua-repercusso-e-influencia-no-mbito-social-das-relaes-jurdicas. Acesso em: 22 nov 2024.
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