RESUMO: O princípio da insignificância, também conhecido como princípio da bagatela, recomenda que o Direito Penal somente intervenha em casos de maior gravidade, reconhecendo a atipicidade do fato nas hipóteses de perturbações jurídicas que causem lesão ou perigo de lesão ínfimos ao bem jurídico tutelado. Tal princípio, nesse passo, não tem previsão legal no ordenamento jurídico brasileiro, tratando-se de criação doutrinária e jurisprudencial. Nesse sentido, é importante verificar se o princípio se aplica sobretudo aos crimes contra a Administração Pública, cuja reprimenda tem crescido cada vez mais na sociedade contemporânea. Tais delitos têm como objetivo resguardar não apenas o aspecto patrimonial, porém, principalmente, a moralidade administrativa, sendo de extrema importância verificar quais são os limites de sua aplicação no âmbito da jurisprudência dos Tribunais Superiores. Destarte, faz-se imprescindível verificar como se dá a incidência do princípio da insignificância nos crimes contra a Administração Pública, eis que tal princípio tem como principal efeito a absolvição em razão do reconhecimento da atipicidade material.
Palavras-chave: princípio da insignificância; direito penal; crimes contra a administração pública; Supremo Tribunal Federal; Superior Tribunal de Justiça.
ABSTRACT: The principle of insignificance, also known as principle of trifle, recommends that the criminal law only interferes in cases of great severity, recognizing the absence of criminal’s offense in hypothesis that causes tiny injury or danger of injury to the protected legal interest. That principle, therefore, doesn’t have legal provision in our legal order, being doctrinal and jurisprudential creation. In this regard, it is important to verify if the principle especially applies in crimes against the Public Administration, whose reprimand has grown increasingly in contemporary society. Those crimes have the purpose to protect not only the asset aspect, but also mainly the public morality, which is why it is so important to verify what the limits to this principle’s application are in the Superior Courts’ jurisprudence. Consequently, it is indispensable to investigate how the principle of insignificance is applied in crimes against the public administration, since that principle’s main effect is to allow an acquittal, due to the absence of criminal’s offense recognition.
Keywords: principle of insignificance; criminal law; crimes against the public administration; Federal Supreme Court; Superior Court of Justice.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1 – O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO. 1.1 Conceito e aspectos doutrinários. 2 – O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA EM CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES. 2.1 O princípio na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 2.2. O princípio da insignificância na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.
O fato típico é composto pela conduta do agente, dolosa ou culposa, comissiva ou omissiva; pelo resultado e nexo de causalidade entre a conduta e o resultado. Além de tais elementos, é preciso também que a conduta praticada se amolde a um modelo abstrato previsto em lei.
Tem-se, assim, o conceito de tipicidade formal, que significa a adequação entre o fato praticado e a norma incriminadora. Entretanto, essa simples noção de tipicidade enquanto acomodação do comportamento do indivíduo ao tipo não é suficiente para configurar a tipicidade penal. Além da tipicidade formal, é necessário, no caso concreto, que também esteja presente a tipicidade material.
Em uma análise do duplo juízo de tipicidade, a tipicidade material é entendida como o juízo de subsunção capaz de lesar ou colocar em perigo o bem jurídico penalmente tutelado. A conduta ofensiva, além de estar prevista em um tipo previsto em lei, deve também se apta a afetar o bem jurídico objeto de tutela penal de maneira que justifique o exercício do jus puniendi pelo Estado. Assim, verificar a ausência de tipicidade material no caso concreto significa reconhecer a incidência do princípio da insignificância.
Nesse sentido, o princípio da insignificância, ou da bagatela, somente intervém nos casos de lesão jurídica de certa gravidade, ensejando a atipicidade do fato nas hipóteses de perturbações jurídicas mais leves. Trata-se, portanto, de criação doutrinária, que desempenha uma função restritiva do direito penal, revelando-se como verdadeira causa de exclusão de tipicidade.
O princípio da insignificância, assim, é aplicado em hipóteses de irrisória ofensa ao bem jurídico tutelado, não representando, em razão disso, um dano, nos crimes de dano, uma certeza de risco de dano, nos crimes de perigo concreto, ou, ao menos, uma possibilidade, de risco de dano, nos crimes de perigo abstrato, ainda que haja uma subsunção formal do comportamento ao tipo previsto na legislação penal.
Com o intuito de se verificar o alcance do princípio da insignificância, o trabalho é iniciado com a análise doutrinária acerca do referido princípio, com um breve histórico de sua constituição. Em seguida, é realizada a análise conceitual do referido princípio, abordando-se, ainda a conceituação e aplicação conferida pela jurisprudência dos Tribunais Superiores à insignificância, bem como os vetores utilizados para a sua incidência no caso concreto.
Já no segundo capítulo, é estudada a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, com o escopo de se analisar, nas decisões por eles proferidas, a aplicação ou não do princípio da insignificância nos crimes praticados em detrimento da Administração Pública. Assim, será verificado se as referidas Cortes têm considerado a incidência da insignificância em tais delitos, e, em caso positivo, de que maneira ela tem ocorrido no âmbito de sua jurisprudência.
1.O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
1.1 Conceito e aspectos doutrinários
O princípio da insignificância, ou princípio da criminalidade de bagatela, foi incorporado ao Direito Penal pela primeira vez em 1964, através dos estudos de Claus Roxin, em sua obra Política Criminal y Sistema Del Derecho Penal. Tal princípio deriva da máxima romana minitmus non curat praetor, segundo a qual o Direito Penal não deve se ocupar de assuntos irrelevantes e inaptos a lesionar o bem jurídico.[1]
Trata-se, portanto, de criação doutrinária, que desempenha uma função restritiva do direito penal, revelando-se como verdadeira causa de exclusão de tipicidade.
Inicialmente, para se compreender o princípio da insignificância, é necessário traçar, de forma breve, o conceito de tipicidade penal.
O conceito analítico de crime o prevê como fato típico, antijurídico e culpável. A função do conceito analítico, nesse sentido, é de analisar todos os elementos que integram o conceito de infração penal. O crime, portanto, é um todo indivisível, e, a partir de seu estudo estratificado, consegue constatar que ou o agente como um fato típico, ilícito e culpável, ou o fato por ele praticado será considerado um indiferente penal.[2]
Especificamente, o fato típico é composto pela conduta do agente, dolosa ou culposa, comissiva ou omissiva; pelo resultado e nexo de causalidade entre a conduta e o resultado. Além de tais elementos, é preciso também que a conduta praticada se amolde a um modelo abstrato previsto em lei.
Tem-se, assim, o conceito de tipicidade formal, que significa a adequação entre o fato praticado e a norma incriminadora, ou seja, se “o comportamento praticado pelo agente encontra moldura em alguma das figuras típicas previstas em nosso ordenamento penal”[3].
Segundo as lições de Rogério Greco, quando afirmamos que só haverá tipicidade se existir adequação perfeita da conduta do agente ao tipo, estamos querendo dizer que, “por mais que seja parecida a conduta levada a efeito pelo agente com aquela conduta descrita no tipo penal, se não houver um encaixe perfeito, não se pode falar em tipicidade”.[4]
Guilherme Nucci expõe que a “tipicidade é o fenômeno representado pela confluência entre o fato ocorrido no mundo real e o fato previsto no mundo abstrato das normas”[5], exemplificando: “quando A mata B (fato), o operador do direito elabora o juízo de tipicidade, ou seja, promove a adequação desse fato ao modelo de conduta previsto no art. 121 do Código Penal (“matar alguém”)”.[6]
Entretanto, essa simples noção de tipicidade enquanto acomodação do comportamento do indivíduo ao tipo não é suficiente para configurar a tipicidade penal. Além da tipicidade formal, é necessário, no caso concreto, que também esteja presente a tipicidade material.
Em uma análise do duplo juízo de tipicidade, a tipicidade material é entendida como o juízo de subsunção capaz de lesar ou colocar em perigo o bem jurídico penalmente tutelado. Em outras palavras, a conduta ofensiva, além de estar prevista em um tipo previsto em lei, deve também se apta a afetar o bem jurídico objeto de tutela penal de maneira que justifique o exercício do jus puniendi pelo Estado.
Assim, verificar a ausência de tipicidade material no caso concreto significa reconhecer a incidência do princípio da insignificância. Reconhecer insignificante um fato típico, nesse passo, “implica reconhecer a completa ausência de lesividade em face da conduta praticada”.[7] Nesse sentido, cabe destacar as Lições de Cézar Roberto Bitencourt:
A tipicidade penal exige uma ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos, pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico. Segundo esse princípio, que Klaus Tiedemann chamou de princípio de bagatela, é imperativa uma efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal. Amiúde, condutas que se amoldam a determinado tipo penal, sob o ponto de vista formal, não apresentam nenhuma relevância material. Nessas circunstâncias, pode-se afastar liminarmente a tipicidade penal porque em verdade o bem jurídico não chegou a ser lesado.[8]
Gilmar Mendes ensina que, para que seja razoável concluir, em um caso concreto, no sentido da tipicidade, mister se faz a conjugação da tipicidade formal com a tipicidade material, sob pena de abandonar-se o desiderato do próprio ordenamento jurídico criminal. Em suas palavras, evidenciando o aplicador do direito a presença da tipicidade formal, mas a ausência da tipicidade material, encontrar-se-á o caso manifestamente atípico.[9] Portanto, além da necessidade de que exista um modelo abstrato que preveja a conduta praticada pelo agente, é preciso que, para que ocorra essa adequação, seja levada em consideração a relevância do bem que está sendo objeto de proteção.
Nesse cenário, leciona Rogério Greco:
Quando o legislador chamou a si a responsabilidade de tutelar determinados bens – por exemplo, a integridade corporal e o patrimônio –, não quis abarcar toda e qualquer lesão corporal sofrida pela vítima ou mesmo todo e qualquer tipo de patrimônio, não importando o seu valor.[10]
O juízo de tipicidade, em suma, deve ser dividido em duas etapas: a formal, em que há a subsunção entre a previsão abstrata e a conduta; e a material, em que se verifica se houve ou não lesão ao bem jurídico. Exemplificativamente:
(...) não se deve pensar que, quando uma conduta se adequa formalmente a uma descrição típica, só por esta circunstância é penalmente típica. Que uma conduta seja típica não significa necessariamente que seja antinormativa, isto é, que esteja proibida pela norma (pelo ‘não matarás’, ‘não furtarás’ etc.). O tipo é criado pelo legislador para tutelar o bem contra as condutas proibidas pela norma, de modo que o juiz jamais pode considerar incluídas no tipo aquelas condutas que, embora formalmente se adequem à descrição típica, realmente não podem ser consideradas contrárias à norma e nem lesivas do bem jurídico tutelado. (…) A tipicidade penal requer que a conduta, além de enquadrar-se no tipo legal, viole a norma e afete o bem jurídico[11]
Sobre o princípio da insignificância, nos ensinamentos de Damásio de Jesus:
Ligado aos chamados “crimes de bagatela” (ou “delitos de lesão mínima”), recomenda que o Direito Penal, pela adequação típica, somente intervenha nos casos de lesão jurídica de certa gravidade, reconhecendo a atipicidade do fato nas hipóteses de perturbações jurídicas mais leves (pequeníssima relevância material). Esse princípio tem sido adotado pela nossa jurisprudência nos casos de furto de objeto material insignificante, lesão insignificante ao Fisco, maus--tratos de importância mínima, descaminho e dano de pequena monta, lesão corporal de extrema singeleza etc. Hoje, adotada a teoria da imputação objetiva, que concede relevância à afetação jurídica como resultado normativo do crime, esse princípio apresenta enorme importância, permitindo que não ingressem no campo penal fatos de ofensividade mínima.[12]
Para o Supremo Tribunal Federal:
O princípio da insignificância é vetor interpretativo do tipo penal, tendo por escopo restringir a qualificação de condutas que se traduzem em ínfima lesão ao bem jurídico nele (tipo penal) albergado. Tal forma de interpretação insere-se num quadro de válida medida de política criminal, visando, para além da descarcerização, ao descongestionamento da Justiça Penal, que deve ocupar-se apenas das infrações tidas por socialmente graves. Numa visão humanitária do Direito Penal, então, é de se prestigiar esse princípio da tolerância, que, se bem aplicado não chega a estimular a ideia de impunidade. Ao tempo que se verificam patentes a necessidade e a utilidade do princípio da insignificância, é imprescindível que aplicação se dê de maneira criteriosa, contribuindo sempre tendo em conta a realidade brasileira, para evitar que a atuação estatal vá além dos limites do razoável na proteção do interesse público.[13]
Cezar Roberto Bitencourt leciona que a insignificância não é sinônimo de pequenos crimes, mas se refere à gravidade, extensão ou intensidade da ofensa produzida a determinado bem jurídico penalmente tutelado, independentemente de sua importância. Nesse sentido:
A insignificância situa-se no abismo que separa o grau da ofensa produzida (mínima) ao bem jurídico tutelado e a gravidade da sanção que lhe é cominada. É nesse paralelismo – mínima ofensa e desproporcional punição – que deve ser valorada a necessidade, justiça e proporcionalidade de eventual punição do autor do fato.[14]
Exemplificando a necessidade de se aferir o grau de extensão da lesão produzida, ilustra Roxin:
Mau-trato não é qualquer tipo de lesão à integridade corporal, mas somente uma lesão relevante; uma forma delitiva de injúria é só a lesão grave a pretensão social de respeito. Como força deve ser considerada unicamente um obstáculo de certa importância, igualmente também a ameaça deve ser sensível para ultrapassar o umbral da criminalidade.[15]
Assim, partindo-se do raciocínio de que crime é fato típico, antijurídico e culpável, tem-se que, uma vez excluído o fato típico, elemento integrante da estrutura do crime, em razão do princípio da insignificância, estar-se-á diante de um indiferente penal.
No âmbito do direito comparado, há sistemas que abordam o princípio da insignificância, quando se faculta ao Parquet, com anuência do juiz, deixar de propor a ação. Outros descriminalizam condutas, colocando sob tutela do direito administrativo:
Por todos esses motivos, a descriminalização constitui, atualmente, importante meta de reforma do sistema penal em muitos países. O principal caminho tem sido converter a criminalidade de bagatela em infrações administrativas, puníveis apenas com multas de caráter disciplinar. Na Alemanha, por exemplo, todo direito penal de escassa importância e que não tenha sido derrogado foi convertido em direito administrativo. O novo ordenamento, como era de se esperar, comprovou a sua eficácia: a prevenção geral restou suficientemente assegurada mediante a imposição de multas, e ao infrator são mostrados claramente quais são os limites de sua liberdade. Ademais, a justiça criminal é desafogada, e o processo administrativo corre de forma mais fluente e menos burocrática. Mantêm sistemas semelhantes a Itália e a Suíça. O Japão, já em 1948, adotou medidas parecidas, embora prevendo penas pecuniárias de caráter criminal. Alguns sistemas permitem que o Judiciário suspenda a decisão sobre a imposição da pena, com a finalidade de dar ao acusado a oportunidade de reparar o dano causado. É o que ocorre na Alemanha, França, Inglaterra e Canadá. Atendida a exigência, não há aplicação de sanção criminal.[16]
A doutrina aponta, como fundamento do princípio da insignificância, alguns princípios do direito penal, tais como o da intervenção mínima, segundo a qual o direito penal só deve ser utilizado como ultima ratio; da fragmentariedade, que determina que o direito penal somente se destina a proteger determinadas ofensas a certos bens jurídicos; da subsidiariedade, que postula que o direito penal só deve ser aplicado quando outros ramos do direito não sejam capazes de oferecer uma resposta satisfatória; e, por fim, da lesividade, segundo o qual não há crime sem lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado.[17]
O Supremo Tribunal Federal, nesse sentido, já teve a oportunidade de se manifestar que o princípio da insignificância deve ser analisado em conexão com os postulados de fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal. O princípio da intervenção mínima estatui ser “legítima a intervenção penal quando a criminalização de um fato se constitui meio indispensável para a proteção de determinado bem ou interesse, não podendo ser tutelado por outros ramos do ordenamento jurídico”[18].
O princípio da reserva legal, nesse espectro, não é suficiente para proteger o indivíduo, eis que ele, de forma isolada, não impede o Estado de criar tipos penais e sanções atentatórios à dignidade da pessoa humana. Assim, ao legislador recomenda-se abster de criminalizar qualquer comportamento, e ao operador do direito, por sua vez, exige-se não proceder ao juízo de tipicidade quando constatar que a reprimenda à conduta pode ser efetivada através de outros ramos do ordenamento jurídico.[19]
O princípio da fragmentariedade, por sua vez, estabelece que somente configuram infrações penais os “ilícitos que atentam contra valores fundamentais para a manutenção do progresso do ser humano e da sociedade”[20]. Assim, o Direito Penal é a ultima ratio, a última etapa de proteção do bem jurídico, de modo que o legislador somente deverá criar tipos penais tão somente quando os demais ramos do Direito foram ineficazes na proteção de determinado bem.
Nas lições do respeitável ministro e doutrinador Gilmar Mendes, em uma leitura conjunta do princípio da ofensividade com o princípio da insignificância, haverá uma conduta atípica quando esta não representar, em razão da irrisória ofensa ao bem jurídico tutelado, um dano, nos crimes de dano, uma certeza de risco de dano, nos crimes de perigo concreto, ou, ao menos, uma possibilidade, de risco de dano, nos crimes de perigo abstrato, conquanto haja uma subsunção formal do comportamento ao tipo previsto na legislação penal.[21]
A doutrina aponta, ainda, relação direta com os princípios da razoabilidade ou proporcionalidade e os seus subprincípios da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Sobre tal princípio, discorre Barroso:
Em resumo sumário, o princípio da razoabilidade permite ao Judiciário invalidar atos legislativos ou administrativos quando: a) não haja adequação entre o fim perseguido e o instrumento empregado (adequação); b) a medida não seja exigível ou necessária, havendo meio alternativo menos gravoso para chegar ao mesmo resultado (necessidade/vedação do excesso); c) os custos superem os benefícios, ou seja, o que se perde com a medida é de maior relevo do que aquilo que se ganha (proporcionalidade em sentido estrito). O princípio pode operar, também, no sentido de permitir que o juiz gradue o peso da norma, em determinada incidência, de modo a não permitir que ela produza um resultado indesejado pelo sistema, fazendo assim a justiça do caso concreto.[22]
Além disso, Luiz Flavio Gomes pontua que, embora similar, o princípio da insignificância não se confunde com a adequação social:
O critério da insignificância está muito próximo ao da adequação social, mas são inconfundíveis: ‘Ainda que alguns autores o incluam naquele, pode-se distinguir do mesmo porque não supõe a total aprovação social da conduta, senão somente, uma relativa tolerância da mesma pela sua escassa gravidade. É o que acontece nas ofensas esportivas cometidas contra o regulamento, mas que se enquadram dentro do ‘normal’ no jogo (rasteiras, alguns chutes etc.)’. Por outro lado, a adequação social está principalmente regulada pelo desvalor da ação, enquanto que a insignificância se centra predominantemente no desvalor do resultado”[23]
Embora não previsto expressamente no ordenamento jurídico pátrio, o princípio da insignificância tem ampla aceitação e aplicação na jurisprudência brasileira. Nesse passo, torna-se imperioso destacar os requisitos, criados pelo Supremo Tribunal Federal, cuja presença, no caso concreto, legitima o reconhecimento do princípio da insignificância. São os vetores: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.
Faz-se necessário analisar, no caso concreto, a presença dos mencionados vetores, cuja constatação é essencial à descaracterização da tipicidade penal da conduta imputada ao agente, de tal maneiro que a ausência de qualquer um de tais vetores torna inaplicável o princípio da insignificância. A existência desses requisitos, destarte, é averiguada de acordo com as peculiaridades do caso concreto, e não no plano abstrato.
O eminente Ministro Luís Roberto Barroso afirma que o caráter aberto dos vetores supratranscritos não impede que situações relativamente idênticas sejam julgadas de forma diametralmente oposta, apesar da invocação dos mesmos parâmetros.[24] Nesse mesmo sentido, Bottini:
Nota-se que são critérios pouco precisos, vagos, abrangentes, que buscam abrigar toda uma gama de casos concretos heterogêneos, seja quanto ao bem protegido, seja quanto ao modo de agir. A ausência de parâmetros mais definidos resultou na aplicação díspar do princípio, que ora se alarga, ora se comprime, em uma sequência aleatória de decisões que reflete a dificuldade de trabalhar com um instituto ainda em construção. Uma primeira dificuldade é a aferição do valor da significância. Os critérios são distintos para cada Tribunal e para cada Ministro. Esboçou-se um critério para distinguir bens de ínfimo valor – aos quais seria aplicada a insignificância –, [de] bens de pequeno valor – aos quais seria aplicada a redução de pena do § 2º do art. 155 do Código Penal; no entanto, esses parâmetros não consolidaram uma pauta segura para a aplicação do princípio. Ora se reconhece a atipicidade de furto de valores como R$ 75,00, de R$ 20,00, de R$ 96,33, de R$ 220,00, ora se reconhece a incidência da norma penal em furtos de celular no valor de R$ 35,00 ou de gomas de mascar no valor de R$ 98,00, sem que haja distinção fática apta a justificar as diferentes decisões.[25]
Merece destaque o julgamento do habeas corpus nº 84.412, realizado no ano de 2004, de relatoria do Ministro Celso de Mello, reconhecido como verdadeiro marco da jurisprudência do STF na matéria, no qual foram expostos de forma analítica os fundamentos e vetores para aplicação do princípio da insignificância. O paciente, no caso, foi condenado pelo furto de uma fita de vídeo game, no valor de R$ 25,00 (vinte e cinco reais).
Em seu voto, o Ministro afirma que é desproporcional uma pena de 08 meses de reclusão, quando se verifica que o bem objeto de subtração possuía valor ínfimo (equivalendo, à época do delito, a 18% do valor do salário mínimo então vigente (janeiro/2000) e que não causou qualquer prejuízo a vítima, eis que recuperado. Senão vejamos trecho elucidativo do voto que aplicou, ao caso concreto, os quatro mencionados vetores para reconhecer o princípio da insignificância:
O princípio da insignificância - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público em matéria penal.
Isso significa, pois, que o sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificarão quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade.[26]
Além disso, o então eminente Ministro Ayres Britto, no julgamento do habeas corpus nº 111.017, reconheceu a insignificância penal como expressão de um necessário juízo de razoabilidade e proporcionalidade de condutas que, embora formalmente encaixadas no molde legal-punitivo, materialmente escapam desse encaixe, por exigência da própria justiça material enquanto valor prestigiado no preâmbulo de nossa Constituição. Destaca-se, nesse sentido, trecho do voto proferido, cujo brilhantismo exige sua transcrição.
É nessa perspectiva de concreção do valor da justiça que se pode compreender o tema da insignificância penal como um princípio implícito de direito constitucional e, simultaneamente, de direito criminal. Pelo que é possível extrair do ordenamento jurídico brasileiro a premissa de que toda conduta penalmente típica só é penalmente típica porque significante, de alguma forma, para a sociedade e a própria vítima. É falar: em tema de política criminal, a Constituição Federal pressupõe lesão significante a interesses e valores (os chamados “bens jurídicos”) por ela avaliados como dignos de proteção normativa. Daí por que ela, Constituição, explicitamente trabalha com dois extremos em matéria de política criminal: os crimes de máximo potencial ofensivo (entre os quais os chamados delitos hediondos e os que lhe sejam equiparados, de parelha com os crimes de natureza jurídica imprescritível) e as infrações de pequeno potencial ofensivo (inciso I do art. 98 da CF). Mesmo remetendo à conformação legislativa ordinária a descrição dos crimes hediondos, bem como daqueles de pequeno potencial de ofensividade.[27]
Afirma o jurista, assim, que o dano que subjaz à categoria da insignificância penal não caracteriza, materialmente, sequer lesão de pequena monta; ou seja, trata-se de ofensividade factualmente nula, porquanto abaixo até mesmo da concepção constitucional de dano menor. Nesse cenário, aduz que o desafio do intérprete da norma é encontrar aqueles vetores que levem ao juízo da não-significância penal da conduta. E, em suas sempre pertinentes colocações, continua:
Vetores que decolam de uma leitura pluridimensional da figura da adequação típica, principiando pelo ângulo do agente; quero dizer: da perspectiva do agente, a conduta penalmente insignificante deve revelar muito mais uma extrema carência material do que uma firme intenção e menos ainda toda uma crônica de vida delituosa. Pelo que o reconhecimento da irrelevância penal da ação ou omissão formalmente delituosa passa a depender de uma ambiência factual reveladora da extrema vulnerabilidade social do suposto autor do fato. Até porque, sendo o indivíduo uma realidade única ou insimilar, irrepetível mesmo na sua condição de microcosmo ou de um universo à parte, todo instituto de direito penal que se lhe aplique há de exibir o timbre da personalização. Logo, tudo tem que ser personalizado na concreta aplicação do direito constitucional-penal (sobretudo os institutos da pena e da prisão), pois é a própria Constituição que se deseja assim orteguianamente aplicada (na linha do “Eu sou eu e as minhas circunstâncias”, como luminosamente enunciou Ortega Y Gasset). [28]
Para o doutrinador, ainda, do ângulo da vítima, o exame da relevância ou irrelevância penal deve atentar para o seu peculiarmente reduzido sentimento de perda por efeito da conduta do agente, a ponto de não experimentar revoltante sensação de impunidade ante a não-incidência da norma penal que, a princípio, lhe favorecia. Ademais, sob o prisma dos meios e modos de realização da conduta, não se pode reconhecer como irrelevante a ação que se manifesta mediante o emprego de violência ou ameaça à integridade física, ou moral, tanto da vítima quanto de terceiros. Ou seja, os meios e modos de execução da ação formalmente delitiva não podem consistir em atentado à vida, à saúde, à integridade física, nem à dignidade de qualquer pessoa. Por fim, do ângulo da repressão estatal, aduz:
Do ângulo da repressão estatal, a aplicação do princípio da não-significância penal é de se dar num contexto empírico de óbvia desnecessidade do poder punitivo do Estado. Situações em que a imposição de uma pena se auto-evidencie como tão despropositada que até mesmo a pena mínima de privação liberdade, ou sua conversão em restritiva de direitos, já significa um desbordamento de qualquer idéia de proporcionalidade.[29]
Além disso, Luiz Flávio Gomes esclarece que o princípio da insignificância incide nos casos em que não há relevante desvalor da ação e/ou do resultado:
Um ponto fundamental que talvez seja útil para o debate consiste em distinguir com clareza ambos os desvalores. A insignificância ora pode residir na conduta, ora no resultado (ou em ambos). Uma coisa é alguém arremessar uma bolinha de papel contra um transporte coletivo (CP, art. 264) e outra distinta é subtrair uma cebola ou um palito de fósforo de alguém (CP, art. 155). O desvalor da ação no primeiro caso é absolutamente nímio. A conduta não conta com periculosidade. Falta-se idoneidade. Já o desvalor da ação na subtração é muito grande, pequeno, no caso, é o desvalor do resultado. Há um terceiro grupo onde podemos constatar ambos os desvalores (é o caso de um acidente de trânsito com culpa levíssima e lesão corporal mínima).[30]
Luís Roberto Barroso ensina que uma das circunstâncias inerentes ao ofício jurisdicional é a apreciação de casos em que a solução prevista em lei levaria a resultados manifestamente injustos. Embora enquadráveis no relato geral de um enunciado normativo, há situações que não parecem merecer as consequências concebidas pelo legislador. Por isso a necessária mediação do intérprete, a fim de calibrar eventuais excessos e produzir a solução mais harmônica com o ordenamento jurídico[31]. Assim:
A dogmática contemporânea já não aceita o modelo importado do positivismo científico de separação absoluta entre sujeito da interpretação e objeto a ser interpretado. O papel do intérprete não se reduz, invariavelmente, a uma função de conhecimento técnico, voltado para revelar a solução contida no enunciado normativo. Em variadas situações, o intérprete torna-se co-participante do processo de criação do Direito, completando o trabalho do constituinte ou do legislador, ao fazer valorações de sentido para as cláusulas abertas e ao realizar escolhas entre soluções possíveis. Como consequência inevitável, sua pré-compreensão do mundo – seu ponto de observação, sua ideologia e seu inconsciente – irá influenciar o modo como apreende a realidade e os valores sociais que irão embasar suas decisões. Registre-se que juízes e tribunais são intérpretes finais da Constituição e das leis, mas não são os únicos. Boa parte da interpretação e aplicação do Direito é feita, fora de situações contenciosas, por cidadãos ou por órgãos estatais.[32]
Nas lições do doutrinador, o debate geral sobre o papel da norma, do problema e do intérprete encontra no princípio da insignificância uma de suas possíveis projeções no direito penal. Assim, objetiva-se, tal como será realizado ao longo do presente trabalho, “discutir, em síntese, se os fatos, concretamente apurados, embora formalmente enquadráveis em um tipo penal, são graves a ponto de justificar uma sanção criminal ao agente”.[33]
Concluídos, de forma breve, os estudos acerca da incidência da insignificância no âmbito doutrinário, será analisado, adiante, o posicionamento do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça quanto à aplicação do princípio, especificamente, quanto aos crimes contra Administração Pública.
2 – O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA EM CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES
Realizada a análise doutrinária e jurisprudencial acerca do princípio da insignificância e dos crimes contra a Administração Pública no ordenamento jurídico pátrio, é necessário proceder à análise do entendimento dos Tribunais Superiores, notadamente STF e STJ, acerca da aplicação da insignificância, em casos concretos, envolvendo os delitos previstos no Título XI do Código Penal.
2.1 O princípio na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça
O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento pacífico de que não se admite, em regra, a aplicação do princípio da insignificância aos delitos praticados contra a Administração Pública. A consolidação de tal posicionamento se verificou com a edição da Súmula 599 da referida Corte, que dispõe que “O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a administração pública”. Diante do exposto, faz-se necessário, inicialmente, uma breve análise de alguns precedentes que originaram o aludido enunciado, com o fito de compreender a ratio decidendi dos julgados que levaram à fixação do entendimento nele disposto.
Inicialmente, será analisada, de forma breve, a decisão proferida no bojo do Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 572.572, oriundo do estado do Paraná e da lavra da Quinta Turma, com julgamento em 08 de março de 2016[34].
O caso versado pelo recurso abordava, em suma, a prática do crime previsto no artigo 312, §1º, do Código Penal. Nas razões do aludido recurso, a defesa do acusado pleiteou a incidência do princípio da insignificância, sob a justificativa de que o valor da coisa furtada – in casu, de R$ 2.550,00 (dois mil quinhentos e cinquenta reais) – teria sido irrisório, sendo irrelevante o fato de tratar-se de crime contra a Administração Pública.
Em sua decisão, o Ministro Relator Jorge Mussi afastou a incidência do referido postulado, asseverando ser inaplicável aos delitos contra a administração pública, em razão da natureza do bem jurídico tutelado. Destacou, ainda, que a norma objetiva tutelar, para além do aspecto patrimonial, ou seja, o valor em si do bem subtraído, a moral administrativa. Insuscetível, por sua vez, de valoração econômica.
A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do habeas corpus nº 310.458, considerado para a edição do citado enunciado sumular, também afastou o princípio da insignificância a crime contra a Administração Pública.[35]
Na hipótese, o agente, funcionário público, recebeu valores de clientes, apropriando-se destes. Em sede de primeiro grau, foi condenado à pena de 3 (três) anos de reclusão, inicialmente em regime aberto, substituída por penas restritivas de direitos, bem como ao pagamento de 20 (vinte) dias-multa, por infração ao artigo 312 do Código Penal. Interposta apelação pela defesa, o Tribunal a quo negou provimento à apelação, nos seguintes termos:
APELAÇÃO - PECULATO - FUNCIONÁRIO PÚBLICO QUE RECEBE VALORES DE CLIENTES, APROPRIANDO- SE DELES - ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE DOLO, JÁ QUE TENCIONAVA EFETUAR OS PAGAMENTOS PELOS CLIENTES - ABSOLVIÇÃO - Impossibilidade: Bem comprovados os fatos pela farta prova material e testemunhal, inviável aceitar a alegação de ausência de dolo de apropriação, já que o agente manteve o dinheiro em seu poder por meses até que a falcatrua fosse descoberta. DOSIMETRIA - PRÁTICA DE SETE CONDUTAS EM CONTINUIDADE DELITIVA - REDUÇÃO AO MÍNIMO LEGAL - Descabimento: O aumento pela continuidade delitiva deve observar relação com o número de condutas praticadas, sendo inviável a aplicação da fração mínima quando mais de duas foram as condutas praticadas. Recurso não provido.[36]
Inconformado com o acórdão, o defensor impetrou habeas corpus, sustentando que, na hipótese, afigurava-se desproporcional submeter o paciente a condenação, ao argumento de que, no exercício de sua função, se apropriou de pequeníssimas importâncias que, individualmente consideradas, não correspondem sequer à décima parte do salário mínimo vigente no país.
Em seu voto, o Ministro Relator Ribeiro Dantas decidiu pela inaplicabilidade do princípio da insignificância aos crimes contra a Administração, argumentando, mais uma vez, que o bem jurídico tutelado pelo tipo penal incriminador é a moralidade administrativa, insuscetível de valoração econômica.
Por fim, a Quinta Turma da Corte Cidadã, por unanimidade, não conheceu do pedido.
No julgamento do Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 648.194, em 03 de março de 2016, a Sexta Turma também se alinhou à mesma conclusão.[37] A hipótese versava sobre a prática de peculato, consistente na apropriação de encomendas da “Campanha Papai Noel” dos Correios. Em seu voto, o Ministro Relator Sebastião Reis Júnior também reforçou a inaplicabilidade do princípio da insignificância.
Afirmou, nesse sentido, que as condutas cometidas pelo agente possuem considerável grau de reprovabilidade, posto que prejudicam um programa destinado a crianças carentes, fragiliza a confiança em programas sociais entabulados pela EBCT, bem como desestimula as ações do voluntariado pela sociedade, em voto acompanhado pela Sexta Turma, sintetizado na ementa a seguir reproduzida:
PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PECULATO. APROPRIAÇÃO DE ENCOMENDAS DA CAMPANHA PAPAI NOEL DOS CORREIOS. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA AOS CRIMES COMETIDOS CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ. VERBETE APLICÁVEL A AMBAS AS ALÍNEAS DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. 1. Ao contrário do raciocínio defendido nas razões do agravo, segundo entendimento já pacificado nesta Corte, é possível a aplicação da Súmula 83/STJ aos recursos especiais interpostos tanto pela alínea a como pela alínea c do permissivo constitucional. 2. O entendimento adotado no acórdão impugnado encontra-se em sintonia com a jurisprudência desta Corte no tocante à inaplicabilidade do princípio da insignificância ao crime de peculato, uma vez que a norma visa resguardar não apenas a dimensão material, mas, principalmente, a moralidade administrativa, insuscetível de valoração econômica (AgRg no REsp n. 1.308.038/SP, de minha relatoria, Sexta Turma, DJe 29/5/2015). 3. Agravo regimental improvido.[38]
Interessante, ainda, destacar o Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.382.289 do Estado do Paraná, de relatoria do Ministro Jorge Mussi.[39] O caso em questão se refere à prática do crime de peculato, na forma tentada, por servidor público. Com efeito, o agente tentou desviar material do almoxarifado do setor de Ciências Exatas da Universidade Federal do Paraná exclusivamente em razão de sua condição funcional, que lhe permitia contar com a total confiança dos superiores, além do livre acesso que possuía no setor. Por tal motivo, fora o agente condenado, em sede de apelação, pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que deu provimento ao recurso de apelação interposto pelo Ministério Público para impor a pena de 2 anos, 5 meses e 10 dias pela prática do delito mencionado, além da perda do cargo público.
Perante o Superior Tribunal de Justiça, a defesa do condenado sustentou a aplicação do princípio da insignificância ao caso, tese rechaçada pela Quinta Turma em sua unanimidade. Em seu voto, mais uma vez, o Ministro Relator ressaltou que a norma penal busca resguardar a moral administrativa, sendo irrelevante o montante da lesão, haja vista a indisponibilidade do bem tutelado.
Oportuno destacar, ainda, o julgamento do Recurso em habeas corpus nº 51.356, oriundo do estado de Santa Catarina, de Relatoria do Ministro Felix Fischer, julgado em 03 de fevereiro de 2015.[40]
Segundo consta do caso fático que deu origem ao recurso, o paciente era comissário da Polícia Civil e, durante diligência que resultou na apreensão de diversos produtos de origem ilícita, apropriou-se de jaqueta da marca Adidas, deixando de incluir a peça no auto de exibição e apreensão. Destarte, o agente foi denunciado pelo delito tipificado no artigo 312, caput, do Código Penal. Irresignado, o denunciado impetrou habeas corpus perante o egrégio Tribunal do estado de Santa Catarina, que denegou a ordem. Em sede de recurso ordinário, o recorrente aduziu estarem presentes os requisitos necessários para a aplicação do princípio da insignificância, em virtude da inexpressividade da lesão causada, pugnando pelo trancamento da ação em razão da atipicidade da conduta.
Mais uma vez, em decisão unânime, a Quinta Turma ratificou a impossibilidade de se aplicar o princípio da insignificância ao crime praticado contra a Administração Pública.
Merecem destaque, ainda, alguns julgados recentes realizados pela Corte aplicando a Súmula 599, e, por conseguinte, afastando a incidência do aludido princípio nos delitos contra a Administração Pública.
O Agravo Regimental no habeas corpus nº 540.196, oriundo do estado do Acre, teve o seu julgamento realizado em 10 de junho de 2020, e também aplicou o entendimento ora dominante na Corte.[41]
O caso versava sobre a pratica de peculato por servidor público, ocupante do cargo de agente da polícia civil. Segundo restou apurado, o agente, em razão do cargo que ocupava, apropriou-se, em proveito próprio, de colete balístico que se destinava a guarnecer a equipe de funcionários da Delegacia local.
Em suma, em sede recursal, a defesa do agente postulou o reconhecimento da atipicidade em razão da incidência do princípio da insignificância. Em seu voto, o Ministro relator Rogério Schietti afirmou ser pacífica a jurisprudência no sentido de não ser possível a aplicação do princípio aos delitos contra a Administração Pública. A Sexta Turma, nesse passo, por unanimidade, seguiu o voto do Ministro Relator e negou provimento ao agravo regimental interposto pela defesa do denunciado.
Interessante, ainda, o caso tratado pelo Agravo em Recurso Especial nº 1.339.337, oriundo do estado de São Paulo e julgado 19 de março de 2019.[42] Segundo consta do referido caso, o acusado, na condição de vereador, recebeu do Governo do Estado de São Paulo, alguns uniformes para doação às equipes de futebol sediadas na cidade onde exercia sua legislatura.
Contudo, com o fim de promoção pessoal à custa do erário, o então vereador suprimiu os brasões símbolos do Estado de São Paulo estampados nos uniformes, mediante a sobreposição de seu nome e logo, apropriando-se dos referidos bens como se dono fosse. Em seguida, agindo como dono dos aludidos uniformes, o acusado as doou a equipes de futebol. Nesse sentido, foi condenado à pratica da conduta prevista no artigo 312 do Código Penal. Em sede de recurso interposto pelo acusado, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, acompanhou o voto da Ministra Relatora.
Em seu voto, afastado o princípio da insignificância, a Ministra ainda destacou a circunstância de o delito ter sido praticado pelo vereador visando à sua promoção pessoal, o que denota maior reprovabilidade da conduta e inviabiliza a incidência o aludido princípio.
Ainda que não se refira a um crime específico contra a Administração Pública, é importante trazer à baila o julgamento proferido pela Corte Cidadã no Agravo Regimental no habeas corpus nº 548.869, originário do Rio Grande do Sul, que afastou o princípio da insignificância na hipótese de crime de estelionato cometido em detrimento de entidade de direito público (artigo 171, §3º, do Código Penal).
O caso versava sobre médico que teria registrado seu ponto em Hospital Universitário da FURG, e, em seguida, se retirado do local, descumprindo sua carga horária. Recebida a denúncia, o agente impetrou habeas corpus, rejeitado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, a Corte, em decisão, argumentou que não tem admitido a incidência do princípio da insignificância, inspirado na fragmentariedade do Direito Penal, no caso do prejuízo aos cofres públicos, por identificar maior reprovabilidade da conduta delitiva.
Afirmou, nesse sentido, ser incabível o pedido de trancamento da ação penal sob o fundamento de inexistência de prejuízo expressivo para a vítima, porquanto, em se tratando de hospital universitário, os pagamentos aos médicos são provenientes de verbas federais.[43]
Não obstante todos os julgados aqui descritos, é importante destacar que a Corte Cidadã, em entendimento pacífico, realizou algumas exceções à inaplicação do princípio nos crimes contra a Administração Pública.
A jurisprudência do STJ, nesse sentido, é pacífica em admitir a aplicação do princípio da insignificância ao crime de descaminho, previsto no artigo 334 do Código Penal.
Nesse sentido foi decidido o Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.346.879, originário do estado de Santa Catarina, de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze.[44] Em seu voto, o Relator afirmou que o princípio da insignificância nos crimes de descaminho tem colorido próprio, diante das disposições trazidas na Lei nº 10.522/2002.
O delito de descaminho, contido no artigo 334 do Código Penal, consiste em iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria. O crime de descaminho é considerado pela doutrina e jurisprudência como um crime contra a ordem tributária, embora topograficamente localizado no título do Código Penal que versa sobre crimes contra a Administração Pública.
O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que deve ser reconhecido o princípio da insignificância sempre que o valor do tributo devido e acessórios, não pago pelo agente, totalizar montante inferior ao mínimo necessário para ajuizamento de execução fiscal. Inicialmente, entendia-se que o valor do tributo elidido a ser considerado para fins de aplicação do princípio da insignificância seria aquele de R$ 10.000,00 (dez mil reais), previsto no artigo 20 da Lei nº 10.522/02. Esse parâmetro foi definido no julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia 1.112.748/TO, pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça.[45]
O julgamento do Recurso Especial nº 1.709.029[46], por sua vez, alterou o parâmetro acima fixado.
Com o advento das Portarias nº 75 e 130 do Ministério da Fazenda, houve elevação do teto para o arquivamento de execução fiscal para R$ 20.000,00. Explique-se: a Portaria nº 75 determina, em seu art. 1º, inciso II, que, até o valor de 20 mil reais, os débitos inscritos como Dívida Ativa da União não serão executados. Diante dessa alteração, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, por conseguinte, também elevou o parâmetro para fins de aplicação do princípio, determinando que ele incidirá ao crime de descaminho quando o montante do tributo não recolhido for inferior ao limite de 20.000,00.
Ocorreu, nesse sentido, um distanciamento entre a jurisprudência do Superior Tribunal e Justiça e do Supremo Tribunal Federal, que aderiu ao novo parâmetro fixado por ato normativo infralegal.[47]
Assim, em consideração ao princípio da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do citado recurso, procedeu à revisão da tese fixada no Recurso Representativo da Controvérsia, a fim de adequá-la ao entendimento pela Suprema Corte.
A tese, nesse sentido, passu a ter a seguinte redação: “incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias n. 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda”.
A jurisprudência, em suma, possui o entendimento de que não há sentido permitir que alguém seja criminalmente processado pela falta de recolhimento de tributo que sequer será cobrado no âmbito administrativo. Assim, considerando ser o direito penal a ultima ratio, se o fato sequer é capaz de movimentar a máquina administrativa, com maior razão também não deve ensejar a atuação do jus puniendi estatal.
Ressalte-se que, segundo o entendimento do STJ, a aplicação do princípio da insignificância não incide, no crime de descaminho, nas hipóteses em que há habitualidade delitiva, configurada tanto pela multiplicidade de procedimentos administrativos quanto por ações penais ou inquéritos policiais em curso.
De acordo com a referida Corte, a reiteração delitiva denota maior reprovabilidade da conduta do agente, devendo, portanto, ser sopesada para fins de aplicação do princípio da insignificância.[48] Dentre as decisões que aplicaram o entendimento, merecem transcrição as seguintes ementas:
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. HABITUALIDADE DELITIVA. INAPLICABILIDADE. PRECEDENTES. 1. "A habitualidade na prática do crime do art. 334 do CP denota o elevado grau de reprovabilidade da conduta, obstando a aplicação do princípio da insignificância" (AgInt no REsp n. 1.491.327/SC, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 19/5/2016, DJe 1°/6/2016). 2. Apesar de não configurar reincidência, a existência de outras ações penais, inquéritos policiais em curso ou procedimentos administrativos fiscais é suficiente para caracterizar a habitualidade delitiva e, consequentemente, afastar a incidência do princípio da insignificância. Precedentes. 3. Agravo regimental desprovido.[49]
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DESCAMINHO. HABITUALIDADE DELITIVA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO INCIDÊNCIA. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Esta Corte entende ser incabível a aplicação do princípio da insignificância quando constatada a habitualidade delitiva nos crimes de descaminho, configurada tanto pela multiplicidade de procedimentos administrativos quanto por ações penais ou inquéritos policiais em curso. 2. Agravo regimental desprovido.[50]
Além da excepcional aplicação da insignificância aos crimes de descaminho, é importante destacar, por fim, recentes julgados em que o Superior Tribunal de Justiça flexibilizou o entendimento contido na Súmula 599 e aplicou o princípio a crimes contra Administração Pública.
Tais decisões, embora não constituam o entendimento dominante da Corte, merecem ser destacadas, pois levam à conclusão de que, embora dominante, o entendimento constante do enunciado sumular não é totalmente pacífico.
Por fim, merece destaque a decisão prolatada no bojo do Recurso em Habeas Corpus nº 85.272, originário do Rio Grande do Sul, com julgamento ocorrido em 14 de agosto de 2018.[51] Embora não envolva propriamente um delito situado no Título XI, referente aos crimes contra a Administração Pública, o caso versava sobre a prática do crime de dano qualificado contra patrimônio da União (art. 183, parágrafo único, inciso III, do Código Penal), razão pela qual a discussão envolve a aplicação da insignificância à administração.
Segundo relatado no recurso, um idoso de 83 anos, na condução de veículo automotor, destruiu e inutilizou um cone de sinalização pertencente à Polícia Rodoviária, causando, assim, danos ao patrimônio público estadual. Interposto habeas corpus, requerendo o trancamento da ação em razão da incidência do princípio da insignificância, o tribunal de origem o denegou.
Em sua decisão, foi afirmado que, ainda que se considere que a atuação do agente tenha sido de pouca repercussão ao patrimônio do Estado, é preciso considerar o seu contexto e repercussão, a revelarem intensa lesividade. Aduziu o relator que a transposição de bloqueio organizado pela polícia rodoviária e a decorrente avariação de cone de sinalização apresentam alto grau de reprovação gerando sentimento de insegurança aos demais cidadãos, o que reclama imediata providência das autoridades.
Em sede de recurso em habeas corpus, o Superior Tribunal de Justiça concluiu pela aplicabilidade do princípio no caso em análise.
O Ministro Relator Nefi Cordeiro, em seu voto, destacou que a subsidiariedade do direito penal não permite tornar o processo criminal instrumento de repressão moral, de condutas típicas que não produzam efetivo dano. Afirmou, assim, que a falta de interesse estatal pelo reflexo social da conduta, por irrelevante dano à esfera de direitos da vítima, torna inaceitável a intervenção estatal-criminal.
Nesse sentido, trouxe à baila a necessidade de concomitância dos quatro vetores estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal: a) a mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada.
Concluiu, assim, que, a despeito do teor do enunciado sumular nº 599, no sentido de que o princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a administração pública, as peculiaridades do caso concreto – réu primário, com 83 anos à época dos fatos, avaria de um cone avaliado em menos de R$ 20,00, ou seja, menos de 3% do salário mínimo vigente à época dos fatos – justificam a mitigação da referida súmula, considerando que inexiste interesse social na onerosa intervenção estatal diante da inexpressiva lesão jurídica provocada.
Dessa forma, o Ministro Relator, em mitigação excepcional da Súmula 599 do STJ, entendeu pela incidência do princípio da insignificância no caso concreto, dando provimento, em decisão unânime, ao recurso para determinar o trancamento da ação penal.
Diante da análise dos julgamentos realizados pelo Superior Tribunal de Justiça, verifica-se que o entendimento majoritário da referida Corte é pela inaplicação do princípio da insignificância nos termos da Súmula 599, existindo, não obstante, excepcionais julgados que entendem pela sua incidência, tomando-se como exemplo o recurso acima analisado. Merece destaque ainda a ressalva realizada, em posicionamento pacífico da Corte Cidadã, que entende pela incidência do princípio no delito de descaminho.
2.2. O princípio da insignificância na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal
Para o Supremo Tribunal Federal, a prática de crime contra a Administração Pública, por si só, não impede a aplicação do princípio da insignificância. Para compreender a fundo este posicionamento e as fundamentações utilizadas, serão analisadas as decisões proferidas pela Suprema Corte envolvendo crimes contra a Administração Pública, verificando-se, assim, em que medida se dá a divergência com os julgados prolatados no âmbito do Superior Tribunal de Justiça.
O habeas corpus nº 107.370[52], originário do estado de São Paulo, versa sobre a prática de peculato, consistente na subtração de objetos da Administração Pública avaliados em 130,00 (cento e trinta reais). Com efeito, o agente, funcionário da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, subtraiu duas luminárias de alumínio e fios de cobre que estavam em desuso.
O juízo de origem condenou-o à pena de 2 anos de reclusão, em regime aberto, e ao pagamento de multa, substituídos por pena restritiva de direitos. Interposta apelação no Tribunal de Justiça pela defesa, foi negado provimento ao recurso. Assim, a defesa impetrou habeas no STJ, alegando a incidência do princípio da insignificância, ocasião em que o Tribunal o afastou e denegou a ordem.
No writ ora analisado, o Ministro Gilmar Mendes, relator do caso, consignou que o princípio da insignificância solidificou-se como importante instrumento de aprimoramento do Direito Penal, sendo paulatinamente reconhecido pela jurisprudência dos Tribunais Superiores, notadamente a do Supremo Tribunal Federal.
Reconhece, nesse sentido, a plausibilidade da tese sustentada pelo impetrante. Afirmou, assim, que não é razoável que o direito penal e todo o aparelho do Estado-Polícia e Estado-Juiz movimentem-se no sentido de atribuir relevância típica a subtração de objetos da Administração Pública, avaliados em R$ 130,00 (cento e trinta reais), e quando as condições que circundam o delito dão conta da sua singeleza, miudeza e não habitualidade. E, em voto merecedor de sua integral transcrição, continua:
Isso porque, ante o caráter eminentemente subsidiário que o Direito Penal assume, impõe-se a sua intervenção mínima, somente devendo atuar para a proteção dos bens jurídicos de maior relevância e transcendência para a vida social. Em outras palavras, não cabe ao direito penal — como instrumento de controle mais rígido e duro que é — ocupar-se de condutas insignificantes, que ofendam com o mínimo grau de lesividade o bem jurídico tutelado.
Assim, só cabe ao Direito Penal intervir quando outros ramos do direito se demonstrarem ineficazes para prevenir práticas delituosas (princípio da intervenção mínima ou ultima ratio), limitando-se a punir somente as condutas mais graves dirigidas contra os bens jurídicos mais essenciais à sociedade (princípio da fragmentariedade).
O eminente Ministro também realiza uma breve análise acerca da incidência, no caso concreto, dos vetores determinados pelo STF, já mencionados ao longo do presente trabalho. Conclui, portanto, que o prejuízo material foi insignificante e que a conduta não causou lesividade à ordem social, havendo que incidir, por conseguinte, o princípio da bagatela. Assim, a Corte Suprema, por maioria, deferiu a ordem para reconhecer a aplicação do princípio da insignificância e absolver o paciente.
No habeas corpus nº 112.388[53], originário de São Paulo, o Supremo também concluiu pela incidência do princípio da insignificância.
A hipótese tratada no recurso versava sobre a prática pelo delito de peculato-furto, previsto no artigo 312 do Código Penal. No caso, um carcereiro teria se apropriado de farol de milha que guarnecia motocicleta apreendida, bem estimado em treze reais.
Em sede de primeiro grau, o agente foi condenado à pena de 2 (dois) anos de reclusão, em regime aberto, pela prática do delito mencionado, com substituição por pena restritiva de direitos. A sentença, ainda, o condenou à perda do cargo público. Interposta apelação, o Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso da defesa e manteve a condenação.
Buscando a aplicação do princípio da insignificância, a defesa manejou habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça, que denegou a ordem, com a seguinte ementa:
HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PECULATOFURTO. AUSÊNCIA DE DEFESA PRELIMINAR. NULIDADE RELATIVA. PRECLUSÃO. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. DENÚNCIA INSTRUÍDA COM O INQUÉRITO POLICIAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. A nulidade pela ausência de abertura de prazo para oferecimento da defesa preliminar prevista no art. 514 do Código de Processo Penal tem natureza relativa, devendo ser arguida tempestivamente e com demonstração do prejuízo, sob pena de preclusão. 2. Se a denúncia se fez acompanhar do inquérito policial, também fica afastada a existência de nulidade pela falta de defesa prévia, conforme a dicção da Súmula nº 330 do Superior Tribunal de Justiça. 3. No caso concreto, a Defesa silenciou acerca do tema durante todo o iter processual, vindo a alegar a mácula tão somente por ocasião da impetração do presente habeas corpus, dirigido contra o acórdão - já transitado em julgado - proferido na apelação. 4. Segundo o entendimento das Turmas que compõem a Terceira Seção desta Corte Superior de Justiça, é inaplicável o princípio da insignificância aos crimes contra a Administração Pública, pois, nesses casos, a norma penal busca resguardar não somente o aspecto patrimonial, mas a moral administrativa, o que torna inviável a afirmação do desinteresse estatal à sua repressão. 5. Ordem denegada. Pedido de reconsideração da liminar julgado prejudicado[54]
No julgamento do recurso, a Segunda Turma do Supremo, por maioria, reconheceu a aplicação do princípio da insignificância ao caso, concedendo a ordem, em razão do valor insignificante da res, periculosidade não considerável do agente, bem como das circunstâncias do caso, conforme se verifica da respectiva ementa:
AÇÃO PENAL. Delito de peculato-furto. Apropriação, por carcereiro, de farol de milha que guarnecia motocicleta apreendida. Coisa estimada em treze reais. Res furtiva de valor insignificante. Periculosidade não considerável do agente. Circunstâncias relevantes. Crime de bagatela. Caracterização. Dano à probidade da administração. Irrelevância no caso. Aplicação do princípio da insignificância. Atipicidade reconhecida. Absolvição decretada. HC concedido para esse fim. Voto vencido. Verificada a objetiva insignificância jurídica do ato tido por delituoso, à luz das suas circunstâncias, deve o réu, em recurso ou habeas corpus, ser absolvido por atipicidade do comportamento.[55]
Outro julgado merecedor de análise é o Habeas Corpus nº 104.286, oriundo do estado de São Paulo, também de relatoria do Ministro Gilmar Mendes.[56] No caso, o paciente foi condenado por infração ao disposto no artigo 1º, II, do Decreto Lei nº 201/1967, por utilizar máquinas e caminhões de propriedade da prefeitura daquele município, na sua propriedade particular, para efetuar serviços de terraplanagem no terreno de sua residência. No caso, o valor devido pelo ex-prefeito ao Município seria de, aproximadamente, R$ 40,00.
A Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São, por unanimidade, condenou o paciente à pena de 2 anos de detenção, em regime inicial aberto, substituída por pena restritiva de direito. Impetrado habeas corpus sob a alegação de insignificância da conduta, o STJ, por unanimidade, denegou a ordem.
No STF, o Ministro Relator entendeu pela incidência do aludido princípio. Em seu voto, o Ministro afirma que, para levando-se em conta que o princípio da insignificância atua como verdadeira causa de exclusão da própria tipicidade, equivocado é afastar-lhe a incidência tão somente pelo fato de o paciente ter praticado o crime na condição de prefeito da municipalidade.
Alegou, nesse sentido, que reputa mais coerente a linha de entendimento segundo a qual, para a incidência do princípio da bagatela, devem ser sopesadas somente as circunstâncias objetivas em que se deu a prática delituosa, o fato em si, e não atributos inerentes ao agente, sob pena de, ao proceder a uma análise subjetiva, dar-se prioridade ao contestado e ultrapassado direito penal do autor em detrimento do direito penal do fato.
Discordou, expressamente, do fundamento utilizado pelo STJ, ao afastar a incidência da insignificância tão só pelo fato de o paciente exercer o cargo de prefeito no momento da infração, aduzindo que, ao assim agir, deu-se prioridade ao “agente-do-fato” e não ao “fato-do-agente”. Criticou ainda que não se pretendeu, em momento algum, auferir a reprovabilidade, a censurabilidade do comportamento criminoso, afastando-se o princípio sem sequer examinar se a conduta possuía ou não a condição de provocar lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico.
Concluiu não conseguir vislumbrar a tipicidade material, vez que as condições que circundam o delito dão conta de sua singeleza, miudeza e não habitualidade, não havendo qualquer lesividade efetiva e concreto ao bem tutelado, sendo atípica a conduta imputada. A Segunda Turma, por conseguinte, em decisão unânime, deferiu a ordem para cassar a decisão emanada do Superior Tribunal de Justiça.
Nos casos acima mencionados, depreende-se que o STF se utilizou dos já mencionados quatro vetores para concluir pela aplicação do princípio no caso concreto. Para compreender integralmente como se dá, diante da realidade fática, a incidência dos vetores estabelecidos pela Corte Suprema, faz-se necessário, ainda, a análise de decisão do Supremo afastando o princípio da insignificância nos crimes contra a Administração Pública.
No julgamento do habeas corpus nº 134.561[57], originário do estado de Goiás, o Supremo Tribunal Federal entendeu pela impossibilidade de aplicação do princípio da insignificância. Com efeito, a hipótese versava sobre a prática dos crimes de corrupção ativa e resistência, previstos, respectivamente, nos artigos 333 e 329 do Código Penal. No caso, o acusado teria oferecido a quantia de R$ 35,00 a policiais rodoviários federais, a fim de que se abstivessem de o autuar por condução de veículo sob efeito de bebida alcoólica e sem habilitação.
Em seu pedido, a parte impetrante sustentou a aplicabilidade do princípio da insignificância, tendo em vista que o delito não teria sido cometido com ameaça ou violência, o valor da vantagem oferecida foi de pequena monta (R$ 35,00) e a espécie em dinheiro não foi aceita pelos policiais, não havendo, segundo a defesa, que se falar em qualquer prejuízo, seja de ordem financeira ou moral.
Em seu voto, o eminente Ministro Relator Luís Roberto Barroso entendeu não estarem preenchidos os requisitos necessários ao reconhecimento da atipicidade material da conduta. Lembrou, inicialmente, que a correta aplicação do princípio da insignificância exige a presença simultânea dos quatro requisitos já mencionados. Afirmou que, ao contrário do que sustenta a defesa, os fatos denunciados são típicos, pois dotados de relevância penal.
Nesse contexto, a conduta do paciente lesou a Administração Pública, que foi atingida de forma expressiva, podendo-se falar, portanto, em significativa periculosidade social da ação, a rechaçar o princípio da insignificância. Reportando-se ao parecer proferido pelo Ministério Público Federal, salientou que a Administração Pública deve zelar não só por interesses patrimoniais, mas, com igual ou superior importância, por interesses morais, frontalmente atingidos pela conduta do paciente. E, nesse cenário, continua o voto, transcrevendo interessante trecho do parecer ministerial:
15. Assim sendo, não há o que reparar no acórdão do Tribunal Regional Federal, pois, independentemente do valor da vantagem indevidamente oferecida a funcionário público para que pratique ou deixe de praticar ato de ofício, a lesão à moral administrativa – bem de insuscetível de valoração econômica – confere acentuado grau de reprovabilidade à conduta.
16. Tanto é assim que, tratando-se a corrupção ativa de delito formal, é irrelevante que o funcionário público aceite a vantagem indevida ofertada pelo corruptor para a consumação do crime e, consequentemente, é irrelevante o valor da vantagem oferecida. Vale dizer que a própria conduta de oferecer a vantagem indevida ao funcionário público para que pratique ou deixe de praticar ato de ofício já configura o crime de corrupção ativa, não importando o valor da vantagem oferecida ou se esta é aceita pelo funcionário. 17. Nesse contexto, portanto, a conduta do paciente não pode ser considerada penalmente irrelevante, tratando-se de comportamento altamente reprovável, que deve ser combatido pelo direito penal.
Assim, ante a ofensividade da conduta, periculosidade da ação e o alto grau de reprovabilidade do comportamento, concluiu não se cogitar em descaracterização da tipicidade penal.
Ressalte-se, como já anteriormente mencionado, que o Supremo Tribunal Federal, quanto ao crime de descaminho, possui entendimento alinhado com o adotado pelo Superior Tribunal de Justiça.
Nesse sentido, o posicionamento pacífico da Corte Constitucional é de que, em tais delitos, o valor da tributação elidida, para fins de aplicação do princípio da insignificância, é de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), montante previsto no art. 20 da Lei nº 10.522/2002 e atualizado pelas Portarias nº 75 e 130/2012 do Ministério da Fazenda. A seguir, vejamos ementa do julgamento do habeas corpus nº 155.347, oriundo do estado do Paraná, que entendeu pelo trancamento da ação penal em razão da incidência da insignificância ao delito de descaminho:
Habeas corpus. Penal. Crime de descaminho (CP, art. 334). Trancamento da ação penal. Pretensão à aplicação do princípio da insignificância. Incidência. Valor inferior ao estipulado pelo art. 20 da Lei nº 10.522/02, atualizado pelas Portarias nº 75 e nº 130/2012 do Ministério da Fazenda. Preenchimento dos requisitos necessários. Ordem concedida.
1. No crime de descaminho, o Supremo Tribunal Federal tem considerado, para a avaliação da insignificância, o patamar de R$ 20.000,00, previsto no art. 20 da Lei nº 10.522/2002 e atualizado pelas Portarias nº 75 e nº 130/2012 do Ministério da Fazenda. Precedentes.
2. Na espécie, como a soma dos tributos que deixaram de ser recolhidos perfaz a quantia de R$ 19.750,41 e o paciente, segundo os autos, não responde a outros procedimentos administrativos fiscais ou processos criminais, é de se afastar a tipicidade material do delito de descaminho com base no princípio da insignificância.
3. Ordem concedida para se restabelecer o acórdão de segundo grau, no qual se manteve a sentença absolutória proferida com base no art. 397, inciso III, do Código de Processo Penal.[58]
Ressalte-se que, assim como entende o STJ, o Supremo Tribunal Federal entende que a habitualidade na prática do crime previsto no artigo 334 do Código Penal denota elevado grau de reprovabilidade da conduta, obstando, por conseguinte, a aplicação do princípio da insignificância. Nesse sentido:
PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE CONTRABANDO OU DESCAMINHO. DOSIMETRIA. REVISÃO. TEMA NÃO EXAMINADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. NÃO CONHECIMENTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. REITERAÇÃO DELITIVA. ORDEM DENEGADA. I – Verifica-se do acórdão impugnado que o pedido de revisão da dosimetria da pena não foi analisado pela Corte Superior. Desse modo, o exame da matéria por este Tribunal implicaria indevida supressão de instância e extravasamento dos limites de competência do STF, descritos no art. 102 da Constituição Federal. II – Nos termos da jurisprudência deste Tribunal, o princípio da insignificância deve ser aplicado ao delito de descaminho quando o valor sonegado for inferior ao estabelecido no art. 20 da Lei 10.522/2002, com as atualizações feitas pelas Portarias 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda. Contudo, os fatos narrados demonstram a necessidade da tutela penal em função da maior reprovabilidade da conduta do agente. III – No caso sob exame, o paciente detinha a posse de cigarros de origem estrangeira – sem a documentação legal necessária – e de cigarros nacionais do tipo exportação, cuja repatriação é proibida. Como se sabe, essa é uma típica mercadoria trazida do exterior, sistematicamente, em pequenas quantidades, para abastecer um intenso comércio clandestino, extremamente nocivo para o País, seja do ponto de vista tributário, seja do ponto de vista da saúde pública. IV – Os autos dão conta da reiteração delitiva, o que impede a aplicação do princípio da insignificância em favor do paciente, em razão do alto grau de reprovabilidade do seu comportamento. V – Habeas corpus conhecido em parte e, nessa extensão, denegada a ordem.[59]
Não obstante a possibilidade de aplicação do princípio, é firme a jurisprudência da Corte Superior no sentido de que todas as circunstâncias que permeiam o delito devem ser ponderadas para fins de aplicação da insignificância, o que também recomenda a incursão no conjunto fático, sobre o qual se reconhece a soberania das instâncias ordinárias. Assim:
A aplicação do princípio da insignificância deve ser precedida de criteriosa análise de cada caso, a fim de evitar que sua adoção indiscriminada constitua verdadeiro incentivo à prática de pequenos delitos patrimoniais. (...) O valor da res furtiva não pode ser o único parâmetro a ser avaliado, devendo ser analisadas as circunstâncias do fato para decidir-se sobre seu efetivo enquadramento na hipótese de crime de bagatela, bem assim o reflexo da conduta no âmbito da sociedade.[60]
Além disso, do ponto de vista crítico, se faz interessante a análise da seletividade da aplicação do princípio da insignificância no sistema penal brasileiro, abordada em voto proferido pelo brilhante Ministro Luís Roberto Barroso e que merece a reflexão:
Em matéria de insignificância, como tudo o que envolve o sistema penal brasileiro, a seletividade também está presente. Nesse sentido, qualquer observador da atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal pode confirmar que o furto de um par de chinelos, de dois frascos de sabonete íntimo ou de alguns bombons, todos avaliados em menos de R$ 50,00 (cinquenta reais), justifica a prisão do acusado, em regime inicial no mínimo semiaberto, caso se trate de reincidente. No entanto, se uma pessoa comete descaminho por duas vezes, sonegando R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em tributos na primeira oportunidade e R$ 10.000,00 (dez mil reais) na segunda, o sistema penal não é acionado, por não ter sido excedido o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Em conclusão deste tópico, é fora de dúvida que o sistema punitivo no Brasil não realiza adequadamente qualquer das funções próprias da pena criminal: não previne, não ressocializa, nem prevê retribuição na medida certa. A despeito disso, toda sociedade democrática precisa de uma dose inevitável e proporcional de repressão penal e punição, como pressuposto da vida civilizada e da proteção dos direitos humanos de todos. É imperativo, portanto, encontrar um ponto de equilíbrio. De fato, sem descurar dos deveres de proteção que o Estado tem para com a sociedade, as instituições e as pessoas, juízes e tribunais devem prestigiar os entendimentos razoáveis que não sobrecarreguem ainda mais o sistema, nem tampouco imponham aos apenados situações mais gravosas do que as que decorrem da lei e das condenações que sofreram. A Justiça, aqui, envolve a ponderação entre os deveres de proteção da sociedade e o respeito aos direitos fundamentais dos condenados, temperada com uma dose de pragmatismo e de senso de realidade.[61]
Nos termos das reflexões trazidas pelo Barroso, a alarmante situação carcerária no Brasil e o alto índice de reincidência dos egressos do sistema prisional são problemas altamente complexos e graves, que não podem ser integralmente resolvidos pelo Judiciário. Assim, a reconfiguração jurisprudencial da insignificância constitui mecanismo realidade e pragmático de lidar com a realidade presente, até que ela possa ser modificada.
Diante de todo o exposto, sobretudo da divergência existente entre as decisões proferidas pelo STF e STJ, revela-se a necessidade de uniformização da jurisprudência, de modo que os Tribunais Superiores sejam harmônicos na aplicação dos vetores estabelecidos pela Corte Constitucional, bem como de outros critérios objetivos que confiram a casos similares tratamento isonômico. Há, assim, a “necessidade de revisitação do princípio da insignificância, não para limitar a sua incidência, mas para assentar suas bases materiais e permitir o desenvolvimento de critérios de aplicação mais uniformes, mais racionais, que permitam um tratamento isonômico a crimes similares, praticados de maneira semelhante”.[62]
Da análise da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, verifica-se que há grande divergência entre seus posicionamentos acerca da aplicação do princípio da insignificância nos crimes contra a Administração Pública.
Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento pacífico, sedimentado no enunciado 599, segundo o qual o princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a Administração Pública. De acordo com a referida Corte, a norma penal objetiva tutelar, para além do aspecto patrimonial, ou seja, o valor em si do bem subtraído, a moral administrativa, insuscetível de valoração econômica.
Assim, a par de julgados excepcionas que aplicam o princípio nos delitos contra a Administração Pública, a jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça é resistente em reconhecer a sua incidência aos referidos crimes, em razão do bem jurídico tutelado.
O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, possui posicionamento diametralmente oposto daquele firmado pela Corte Cidadã, compreendendo que o princípio da insignificância é plenamente aplicável aos crimes contra a Administração Pública. Nesse sentido, o Tribunal Constitucional se vale da análise de quatro vetores, fixados no âmbito da própria Corte, para fins de verificar a incidência do princípio da insignificância no caso concreta: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.
De acordo com a Suprema Corte brasileira, não é razoável que o direito penal e todo o aparelho do Estado-Polícia e Estado-Juiz movimentem-se no sentido de atribuir relevância típica a condutas que causam mínima lesão aos bens jurídicos protegidos no Título XI do Código Penal. Privilegia, portanto, o entendimento segundo o qual o Direito Penal é a ultima ratio, dando-se prevalência aos princípios da fragmentariedade e subsidiariedade no caso concreto, ainda que se trate de delitos praticados em detrimento da Administração Pública.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, em verdade, possuem em comum tão somente o consolidado entendimento de que pode ser o princípio reconhecido nos delitos de descaminho, sempre que o valor do tributo devido e acessórios, não pago pelo agente, totalizar montante inferior ao mínimo necessário para ajuizamento de execução fiscal.
A falta de harmonia entre os julgados do STF e STJ vão de encontro à tendência, existente no ordenamento jurídico brasileiro, de zelar cada vez mais pela coerência e estabilidade na jurisprudência. Não há dúvidas de que os Tribunais Superiores precisam de critérios mais sólidos e o estabelecimento de entendimento harmônico e alinhado para aplicação do princípio da insignificância, sob pena de cometer injustiças e não formar uma jurisprudência estável e coerente entre si, a ser observada por todos os graus de jurisdição.
Faz-se imprescindível, dessa forma, que a jurisprudência dos Tribunais Superiores se alinhe quanto à aplicabilidade do princípio da insignificância nos casos a eles submetidos, mantendo a integridade e linearidade em suas decisões e garantindo, por conseguinte, a segurança jurídica aos seus jurisdicionados, essencial para a garantia do Estado Democrático de Direito.
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[1] BITENCOURT, Cézar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral (Arts. 1º a 120). Vol. 1. 26. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. p. 140.
[2] GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. 11. ed. Niterói, RJ: Impetus, 2017. p. 62.
[3] Ibidem, p. 67
[4] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Geral. vol. 1. 19. ed. Niterói, RJ: Impetus, 2017. p. 289.
[5] NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Penal: Parte Geral. Arts. 1º a 120 do Código Penal. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019. p. 521.
[6] Ibidem.
[7] Ibidem, p. 525.
[8] GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. 11. ed. Niterói, RJ: Impetus, 2017. p. 67.
[9] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 107.370 – São Paulo. Ministro Relator Gilmar Mendes. Segunda Turma. Julgamento em: 26 de abril de 2011. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=1256111. Acesso em: 15 de janeiro de 2021.
[10] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Geral. vol. 1. 19. ed. Niterói, RJ: Impetus, 2017. p. 147.
[11] ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI; José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. Imprenta: São Paulo, Revista dos Tribunais. p. 394/395.
[12] JESUS, Damásio de. Direito Penal: Parte Geral. Vol. 1. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. pp. 52-53.
[13] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus 104.787 – Rio de Janeiro. Relator Ministro Ayres Britto. Segunda Turma. Julgamento em: 26 de outubro de 2010. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/19736631/habeas-corpus-hc-104787-rj. Acesso em: 05 de fevereiro de 2021.
[14] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral (Arts. 1º a 120). Vol. 1. 26. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. p. 141. pp. 52-53.
[15] ROXIN, Claus. Política Criminal e sistema jurídico-penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 53.
[16] MAÑAS, Carlos Vico. O princípio da insignificância como excludente da tipicidade no direito penal. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 1994. pp. 69-70.
[17] BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. 12. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2011. pp. 82-94.
[18] MASSON, Cleber. Direito Penal esquematizado: Parte Geral. 4. ed. vol. 1. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2011. p. 90.
[19] Ibidem.
[20] Ibidem, p. 91.
[21] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Voto do Ministro Gilmar Mendes no Agravo Regimental Habeas Corpus 181.389 – São Paulo. Segunda Turma. Relator: Ministro Gilmar Mendes. Julgamento em 14 de abril de 2020. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=752736209. Acesso em: 03 de fevereiro de 2021.
[22] BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 329.
[23] GOMES, Luiz Flávio. Princípio da insignificância e outras excludentes de tipicidade. 3. ed., rev., atual. e ampl., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. pp. 27 e 93.
[24] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus 123.108 – Minas Gerais. Relator Ministro Luís Roberto Barroso. Julgamento em: 03 de agosto de 2015. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/HC_123108_MLRB.pdf. Acesso em: 10 de fevereiro de 2021.
[25] BOTTINI, Pierpaolo Cruz. A confusa exegese do princípio da insignificância. In: Temas relevantes de direito penal e processual penal. Coord.: Luiz Rascovski. 2012. p. 245.
[26] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 111.017 – Rio Grande do Sul. Relator: Ministro Ayres Britto. Julgamento em 07 de fevereiro de 2012. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=2218342. Acesso em: 04 de fevereiro de 2021.
[27] Ibidem.
[28] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 111.017 – Rio Grande do Sul. Relator: Ministro Ayres Britto. Julgamento em 07 de fevereiro de 2012. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=2218342. Acesso em: 04 de fevereiro de 2021.
[29] Ibidem.
[30] GOMES, Luiz Flávio. Princípio da insignificância e outras excludentes de tipicidade. 3. ed., rev., atual. e ampl., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 78.
[31] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 123.108 – Minas Gerais. Relator Ministro Luís Roberto Barroso. Julgamento em: 03 de agosto de 2015. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/HC_123108_MLRB.pdf. Acesso em: 20 de fevereiro de 2021.
[32] BARROSO, Luis Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. pp. 331-333.
[33] Ibidem.
[34] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 572.572 – Paraná. Quinta Turma. Ministro Relator: Jorge Mussi. Julgamento em: 08 de março de 2016. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201402127730&dt_publicacao=16/03/2016. Acesso em: 20 de janeiro de 2021.
[35] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº 310.458 – São Paulo. Quinta Turma. Relator: Ministro Ribeiro Dantas. Julgamento: 06 de outubro de 2016. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201403162038&dt_publicacao=26/10/2016. Acesso em: 24 de fevereiro de 2021.
[36] Ibidem.
[37] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 648.194 – São Paulo. Sexta Turma. Relator: Ministro Sebastião Reis Júnior. Julgamento: 03 de março de 2016. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201500195740&dt_publicacao=14/03/2016. Acesso em: 20 de janeiro de 2021.
[38] Ibidem.
[39] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.382.289 – Paraná. Quinta Turma. Ministro Relator: Jorge Mussi. Julgamento: 05 de junho de 2014. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201301319252&dt_publicacao=11/06/2014. Acesso em: 22 de janeiro de 2021.
[40] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso em Habeas Corpus nº 51.356 – Santa Catarina. Quinta Turma. Relator Ministro Felix Fischer. Julgamento em: 03 de fevereiro de 2015. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201402244673&dt_publicacao=18/02/2015. Acesso em: 19 de janeiro de 2021.
[41] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Habeas Corpus nº 540.196 – Acre. Sexta Turma. Relator: Ministro Rogério Schietti Cruz. Julgamento em: 02 de junho de 2020. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201903118027&dt_publicacao=10/06/2020. Acesso em: 19 de janeiro de 2021.
[42] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo em Recurso Especial nº 1.339.337 – São Paulo. Relatora Ministra Laurita Vaz. Julgamento em: 1º de fevereiro de 2019. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=MON&sequencial=91452147&tipo_documento=documento&num_registro=201801990860&data=20190211&formato=PDF. Acesso em: 20 de janeiro de 2021.
[43] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Habeas Corpus nº 548.869 – Rio Grande do Sul. Quinta Turma. Relator: Ministro Joel Ilan Paciornik. Julgamento em: 12 de maio de 2020. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201903581621&dt_publicacao=25/05/2020. Acesso em: 27 de fevereiro de 2021.
[44] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.346.879 – Santa Catarina. Quinta Turma. Relator: Ministro Marco Aurélio Bellizze. Julgamento em: 26 de novembro de 2013. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201202086465&dt_publicacao=04/12/2013. Acesso em: 18 de janeiro de 2021.
[45] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.112.748. Terceira Seção. Relator: Ministro Félix Fischer. Julgamento em: 09 de setembro de 2009. Disponível em: https://juridica.mppr.mp.br/arquivos/File/AreaCriminal/STJ/REsp1112748.pdf. Acesso em: 14 de fevereiro de 2021.
[46] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.709.029 – Minas Gerais. Relator Ministro Sebastião Reis Júnior. Terceira Seção. Julgamento em: 28 de fevereiro de 2018. Disponível em: https://www.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/ITA?seq=1677614&tipo=0&nreg=201702518799&SeqCgrmaSessao=&CodOrgaoJgdr=&dt=20180404&formato=PDF&salvar=false. Acesso em: 22 de janeiro de 2021.
[47] Nesse sentido: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 136.843. – Minas Gerais. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Segunda Turma. Julgamento em 08 de agosto de 2017; Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 127.173 – Paraná. Relator p/ acórdão: Ministro Luís Roberto Barroso. Primeira Turma. Julgamento em 21 de março de 2017; Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 136.958 – Rio Grande do Sul. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Segunda Turma. Julgamento em 04 de abril de 2017; Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 136.984 – São Paulo. Relatora Ministra Rosa Weber. Primeira Turma. Julgamento em 18 de outubro de 2016.
[48] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.437.999 – Santa Catarina. Quinta Turma. Relator: Ministro Marco Aurélio Bellizze. Julgamento em: 22 de maio de 2014. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201400445483&dt_publicacao=02/06/2014. Acesso em: 25 de janeiro de 2021.
[49] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.710.745 – Paraná. Sexta Turma. Relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro. Julgamento em: 20 de março de 2018. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201703010494&dt_publicacao=05/04/2018. Acesso em: 15 de fevereiro de 2021.
[50] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.680.329 – Rio Grande do Sul. Quinta Turma. Relator: Ministro Joel Ilan Paciornik. Julgamento em: julgado em 03 de outubro de 2017. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201701537234&dt_publicacao=16/10/2017. Acesso em: 13 de fevereiro de 2021.
[51] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso em Habeas Corpus nº 85.272 – Rio Grande do Sul. Relator: Ministro Nefi Cordeiro. Sexta Turma. Julgamento em: 14 de agosto de 2018. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1738476&num_registro=201701316304&data=20180823&formato=PDF. Acesso em: 22 de janeiro de 2021.
[52] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 107.370 – São Paulo. Segunda Turma. Relator: Ministro Gilmar Mendes. Julgamento em: 26 de abril de 2011. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=1256111. Acesso em: 15 de janeiro de 2021.
[53] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 112.388 – São Paulo. Relator: Ministro Ricardo Lewandowski. Redator do acórdão: Ministro Cezar Peluso. Julgamento em: 21 de agosto de 2012. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=2751590. Acesso em: 24 de janeiro de 2021.
[54] Ibidem.
[55] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 112.388 – São Paulo. Relator: Ministro Ricardo Lewandowski. Redator do acórdão: Ministro Cezar Peluso. Julgamento em: 21 de agosto de 2012. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=2751590. Acesso em: 24 de janeiro de 2021.
[56] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 104.286 – São Paulo. Segunda Turma. Relator: Ministro Gilmar Mendes. Julgamento em 03 de maio de 2011. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=623194. Acesso em 25 de janeiro de 2021.
[57] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 134.561 – Goiás. Relator: Ministro Luís Roberto Barroso. Julgamento em: 09 de março de 2017. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=311373126&ext=.pdf. Acesso em: 23 de janeiro de 2021.
[58] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 155.347 – Paraná. Segunda Turma. Relator Ministro Dias Toffoli. Julgamento em: 17 de abril de 2018. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=14763951. Acesso em: 23 de janeiro de 2021.
[59] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 121.892 – São Paulo. Segunda Turma. Ministro Relator Ricardo Lewandowski. Julgamento em: 10 de fevereiro de 2015. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=8164393. Acesso em: 20 de janeiro de 2021.
[60] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 114.174 – Rio Grande do Sul. Primeira Turma. Relator Ministro Luiz Fux, Julgamento: 05 de novembro de 2013. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/24655215/habeas-corpus-hc-114174-rs-stf/inteiro-teor-112141142. Acesso em: 22 de janeiro de 2021.
[61] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 123.108 – Minas Gerais. Relator Ministro Luís Roberto Barroso. Julgamento em: 03 de agosto de 2015. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/HC_123108_MLRB.pdf. Acesso em: 20 de fevereiro de 2021.
[62] BOTTINI, Pierpaolo Cruz. A confusa exegese do princípio da insignificância. In: Temas relevantes de direito penal e processual penal. Coord.: Luiz Rascovski. 2012. p. 251.
Advogada. Graduação na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Pós Graduação em Direito Penal pelo Instituto Damásio de Jesus.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERREIRA, Luisa Lemos. O princípio da insignificância em crimes contra a Administração Pública na jurisprudência dos tribunais superiores Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 jul 2022, 04:17. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/58860/o-princpio-da-insignificncia-em-crimes-contra-a-administrao-pblica-na-jurisprudncia-dos-tribunais-superiores. Acesso em: 22 nov 2024.
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