RESUMO: A prisão preventiva acontece no momento que o indivíduo é privado de sua liberdade no instante da decretação desta, como discrimina o art. 312 do Código do Processo Penal Brasileiro. Precisa existir prova de que houve um crime, com materialidade ou ainda que possa apontar a existência de indícios pertencentes à autoria. Este artigo tem como principal objetivo analisar o excesso de prazo no cumprimento de uma prisão cautelar de natureza preventiva que viola a dignidade humana do preso e buscar um prazo razoável para duração da prisão a fim de diminuir os danos causados ao acusado, passando ter uma medida motivada, fundamentada e em conformidade com os direitos basilares. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica realizada através de pesquisa de banco de dados no qual foram analisadas teses, revistas, leis e artigos publicados, bem como súmulas que estejam voltadas para os objetivos da pesquisa. Como resultados, a prisão preventiva quanto ao seu prazo, possui embasamento da Constituição Federal e por isso deve ser respeitado todos os direitos fundamentais relacionados que possam colocar o preso, ainda não condenado, em situações degradantes.
Palavras-Chave: Prisão preventiva. Direitos Fundamentais. Prazo. Código de Processo Penal.
Abstract: The remand in custody happens when the individual is deprived of his freedom, at the time of its decree, as discriminates art. 312 of the Brazilian Code of Criminal Procedure. There must be proof that there was a crime, with materiality or even that can point to the existence of evidence pertaining to the authorship. The main objective of this article is to analyze the excessive time limit in the fulfillment of a preventive imprisonment that violates the human dignity of the prisoner and to seek a reasonable term for the duration of the imprisonment in order to reduce the damage caused to the accused, by having a motivated, reasoned measure and in accordance with the basic rights. This is a bibliographical research carried out through database research in which were analyzed theses, journals, laws and articles published, as well as summaries that are focused on the research objectives. As a result, the remand in custody, regarding its term, is based on the Federal Constitution and therefore all related fundamental rights that can put the prisoner, who has not yet been convicted, in degrading situations must be respected.
Keywords: Preventive detention. Fundamental rights. Time limit. Code of Criminal Procedure.
Sumário: 1. Introdução; 2. Princípio da dignidade da pessoa humana frente aos preceitos da prisão preventiva. 2.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. 3 Prisão Preventiva; 3.1 Decretação da Prisão Preventiva; 3.2 Jurisdicionalidade e Motivação; 3.3 Da Provisoriedade; 4 Duração Razoável do Processo; 4.1 Falta de prazo e o princípio da dignidade humana; 4.2 Prazo Adequado; 5. Conclusão; 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
A prisão preventiva é considerada como uma medida cautelar que permite com que o indivíduo seja desprovido de sua liberdade por um prazo. No entanto, precisa ser respeitado alguns critérios estabelecidos pelo art. 312 do Código do Processo Penal e suas respectivas hipóteses para que seja decretada, quais sejam voltadas para a garantia da ordem pública; ordem econômica; pela conveniência da instrução criminal; para assegurar a aplicação da lei penal; advindo provas de que existiu de fato um crime com indícios suficientes para comprovação da autoria, bem como resultante também de descumprimentos das obrigações que são impostas.
Ocorre que quando decretada a prisão preventiva, o imputado fica privado de sua liberdade por um determinado tempo, este tempo precisa estar em concordância para que não haja violação dos direitos fundamentais, impedindo com isso que o preso passe por situações degradantes e no final do processo seja considerado inocente. Destaca-se o artigo 5º, LXXVIII da Constituição Federal de 1988, mais precisamente na Emenda Constitucional nº 45, a seguridade de que exista uma duração razoável do processo.
Em contrapartida, para o que é descrito na Constituição Federal, observa-se sistemas prisionais lotados com presos que são, uma boa parte, advindos da prisão preventiva, e que pela falta de prazo estabelecida acabam permanecendo mais tempo reclusos. Mediante a isto, indaga-se: o excesso de prazo no cumprimento de uma prisão cautelar de natureza preventiva viola a dignidade humana do preso?
Assim, entende-se que o prazo precisa estar de acordo com os direitos fundamentais e que precisa existir uma prevalência dos princípios constitucionais da dignidade humana e a duração razoável do processo. Em vista disso, quando a prisão preventiva for decretada precisa ser levada em consideração prazo para cada ato.
Este artigo tem como principal objetivo analisar o excesso de prazo no cumprimento de uma prisão cautelar de natureza preventiva que viola a dignidade humana do preso e buscar um prazo razoável para duração da prisão a fim de diminuir os danos causados ao acusado, passando ter uma medida motivada, fundamentada e em conformidade com os direitos basilares. Como objetivos específicos, estudar a regulamentação da prisão preventiva; demonstrar como a ausência de um prazo legal de prisão preventiva compromete a duração razoável do processo e verificar os métodos controversos pelo uso indiscriminado da prisão preventiva.
Trata-se de uma pesquisa bibliográfica realizada a partir das pesquisas nas principais bases de dados tais como Scielo e Google Acadêmico, bem como consulta em livros, revistas jurídicas e leis. Para isso foram necessários dois critérios, denominados de critérios de inclusão e exclusão. Para o critério de inclusão, foram consultados estudos, teses e livros que estão de acordo com os objetivos da pesquisa e que respondem à pergunta norteadora. Como critério de exclusão, foram descartados os artigos, estudos, teses e livros que não correspondem ao objetivo da pesquisa.
2. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA FRENTE AOS PRECEITOS DA PRISÃO PREVENTIVA
As abordagens voltadas para a dignidade humana durante a prisão preventiva é cada vez mais pautada na política do Brasil.
A sociedade cisma que a vinculação entre este princípio e a prisão preventiva, provém das circunstâncias nocivas que o ser humano é obrigado quando está preso, porém, desdenha que a chance de decretar a segregação cautelar como uma maneira de execução precipitação de pena, confronta também a dignidade da pessoa humana.
Assim, é visível que este princípio domina uma grande hierarquia frente às demais normas jurídicas, como também tem consigo certa expressividade persuasiva, medida de proteção e uma correlação com o Código de Processo Penal, especialmente no que concerne este instrumento, posto que a dignidade humana intervenha em todos os direitos fundamentais e ajuda na efetividade dos princípios e normas em matéria penal.
2.1. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
A Dignidade da Pessoa Humana é o princípio basilar que envolve todo o ordenamento jurídico. Com isso, pode-se afirmar que todos os outros princípios são derivados desse que se apresenta como o principal. Além disso, o Direito da Pessoa Humana se apresenta como um princípio que requer a existência de direitos intrínsecos ao ser humano, isto é, somente pelo fato de existir, o indivíduo já possui direitos. Em vista disso, esses direitos não podem ser deixados em segundo plano ou esquecidos, assim não podem ser descumpridos, principalmente os que envolvem o direito penal, visto que estes estão relacionados com a legitimidade do Estado para salvaguardá-los. Como descreve Gomes (2016, p.840) in verbis:
Acham-se ancorados no princípio-síntese do Estado Constitucional e Democrático de Direito, que é o da dignidade humana. A força imperativa do princípio da dignidade humana (CF, art. 1º, III), se apresentando como incontestável. Nenhuma ordem jurídica pode contrariá-lo. A dignidade humana, sem sombra de dúvida, é a base ou o alicerce de todos os demais princípios constitucionais penais. Qualquer violação a outro princípio afeta igualmente o da dignidade da pessoa humana. O homem (o ser humano) não é coisa, não é só cidadão, é antes de tudo, pessoa (dotada de direitos, sobretudo perante o poder punitivo do Estado).
Por outro lado, como descreve Sarlet (2001, p.60) pode ser considerado como o princípio da Dignidade Humana a qualidade que está presente em cada indivíduo, que o torna merecedor de respeito e ter os seus direitos atendidos, sendo considerado todos por parte do Estado, assegurando que este possa ter os seus direitos fundamentais garantidos. Este, por outro lado, garante que a pessoa seja atendida a favor de suas necessidades e contra todo e qualquer ato degradante e desumano que possa limitar as suas condições de vida, expondo-a em condições existenciais insuficientes para uma considerável vida saudável.
Diante disso, entre todos os outros princípios constitucionais, o que está voltado para a Dignidade da Pessoa Humana é o que está mais presente na Constituição e, consequentemente, dentro do ordenamento jurídico brasileiro. Desse ponto de vista, se uma determinada norma vai contra a dignidade da pessoa humana ela também passa a ser considerada como inconstitucional, devendo ser revogada ou retirada da legislação vigente. Esse entendimento também é o mesmo defendido pela doutrinadora Piovesan que ressalta sobre a importância do princípio da Dignidade da Pessoa Humana à frente da legislação, da seguinte forma:
A dignidade da pessoa humana (...) está erigida como princípio matriz da Constituição, imprimindo-lhe unidade de sentido, condicionado a interpretação das suas normas e revelando-se ao lado dos Direitos e Garantias Fundamentais, como cânone constitucional que incorpora “as exigências de justiça e dos valores éticos, conferindo suporte axiológico a todo o sistema jurídico brasileiro” (PIOVESAN, 2000, p.54).
Pode-se afirmar que toda e qualquer norma precisa ser interpretada de maneira que possa encontrar nela o princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Visto que ao encontrar este, pode-se constatar que há de fato um sentido na ordem jurídica. Dessa maneira, passou-se a ser consagrado como um princípio que direciona o Direito Internacional e Interno (PIOVESAN, 2004, p.92).
Esse princípio por sua vez é citado pela própria Constituição, no qual resultou na constitucionalização de diversos ramos do direito. Dessa forma, para que uma determinada lei fosse aprovada, esta precisava estar em concordância com os textos na nova Constituição Federal de 1988, e caso não estivesse com concordância, seria declarada a sua inconstitucionalidade. Dessa forma, o Processo Penal não possui características distintas de maneira que atualmente toda a lei penal precisa ser interpretada à luz Constitucional.
Com base nisso, pode-se afirmar que o prazo longo ou a falta de um prazo estabelecido durante a prisão preventiva é caracterizado como uma forma de violação do princípio da dignidade da pessoa humana, visto que está caracterizado dentro do art. 5º, XLIX e também citado dentro da Constituição Federal (MARCELINO, 2018, p.8).
3. PRISÃO PREVENTIVA
O impacto social que a prisão preventiva traz envolve cerca de milhares de pessoas que estão encarceradas em todo o país. No decorrer dos anos, o Brasil passou a adotar um perfil encarcerador, sendo que esse posicionamento que advém do Estado é resultante de uma pressão cada vez maior por parte da sociedade no tocante da insegurança e no medo decorrente da insegurança que assola as cidades. Parte dessa pressão também vem da imprensa que colabora com o aumento do temor de todas as pessoas. Além disso, a mídia atua em partes reafirmando a necessidade de que precise existir cada vez mais prisões e o aumento das penas, quando isso é cobrado, os direitos fundamentais acabam ficando em segundo plano, igualando todos os tipos de réus até mesmo os que são em caráter provisório. No entanto, mesmo existindo a Lei 12. 403/2011 (BRASIL, 2011), no qual descreve que existem disponíveis outras medidas cautelares que se apresentam como uma alternativa para prisão, se apresentando, dependendo do caso, como suficiente para a finalidade do desenvolvimento do processo e o seu resultado, como discrimina Mendonça (2011, p.24):
Quando o legislador estabeleceu as medidas cautelares no processo penal, o fez para a proteção de bens jurídicos relevantes, seja para o processo (intraprocessuais) ou da sociedade (extra ou metaprocessuais). É expressão da própria coerção estatal, entendida segundo Julio B. Maier, como o uso de seu poder, conforme a lei, para restringir certas liberdades ou faculdades das pessoas, com objetivo de alcançar um fim determinado. As medidas cautelares se encontram dentro desse marco de exercício da coerção estatal.
Diante a isto, entende-se que há uma necessidade de que a prisão deve ser realizada como uma medida extrema, visto que esse é o maior motivo dos sistemas prisionais estarem cada vez mais lotados. Com a alta lotação estão as condições precárias que assolam os encarcerados, em que compartilham condições mínimas de higiene, saúde e outras condições voltadas para a sobrevivência de uma pessoa que está sob prisão preventiva. Essas condições não conseguem permitir com que a prisão cumpra com a sua função social de recuperação e nem permite com que pessoas que estão aguardando prazo da prisão preventiva fiquem em segurança. Além disso, a quantidade de presos permite com que cada vez mais aumente a quantidade de facções, pois cada indivíduo integrado em um sistema inseguro, como as prisões atuais, se torna obrigado a se aliançar aos grupos criminosos para conseguirem proteção, passando a fazer parte de uma realidade que não pertencia à situação real daquele preso, visto que o indivíduo nem sequer foi condenado ainda (BOTTINI, 2008, p.454).
Além disso, a Lei 12.403/2011, mais precisamente dentro do seu parágrafo 6º do artigo 282, descreve nitidamente que a prisão preventiva deve ser usada como um último recurso, dentro de um sistema processual penal. Contudo, observa-se um certo paradoxo quanto a prática e ao uso da prisão preventiva, pois passou a ser utilizada para diversos casos, ocasionando a superlotação de presos que estão ainda aguardando condenação, superlotando a quantidade de pessoas encarceradas no Brasil (BOTTINI, 2008, p.455).
3.1. Decretação da Prisão Preventiva
Pode-se afirmar que a prisão preventiva acontece no momento que o indivíduo é privado de sua liberdade, sendo que esta medida precisa ser decretada por um juiz, em concordância com o Ministério Público, bem como por representação de uma autoridade policial, acontecendo ainda através de um inquérito, bem como por uma instrução criminal, mediante pressupostos que são descritos com base na lei. Diante a isto, Lima (2014, p. 52), descreve essa visão in verbis:
Cuida-se de espécie de prisão cautelar decretada pela autoridade judiciária compromete, mediante representação da autoridade policial, ou requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, em qualquer fase das investigações ou do processo criminal (nesta hipótese, também pode ser decretada de ofício pelo magistrado), sempre que estiverem preenchidos requisitos legais (CPP, art. 313) e ocorre os motivos autorizados listados no art. 312 do CPP, e desde que se revelem inadequadas ou insuficiente as medidas cautelares diversas da prisão (CPP, art. 319).
Ainda referente ao art. 316 do CPP, pode-se citar o parágrafo único que foi introduzido pela respectiva Lei n. 13.964/2019, no qual estabeleceu a necessidade de revisão, de ofício, pelo próprio órgão emissor da decretação da prisão preventiva e sua respectiva manutenção que deve acontecer a cada 90 (noventa dias), que deve acontecer a partir de uma decisão fundamentada, sob pena de ilegalidade da restrição do status libertatis. Isto é, não revisão desse ofício pode ser considerado como algo ilegal, pois trata de um dever e não de algo facultativo (IANNI, 2021, p.34)
Dessa mesma forma, afirma-se também que a prisão preventiva traz consigo características voltadas para a cautelaridade na tutela da persecução penal, onde busca-se impedir que possíveis condutas possam comprometer o andamento do processo ou ainda, impedir ou alterar o rumo da investigação. Além disso, se torna extremamente importante que sejam analisados também os requisitos para a prisão preventiva, visto que estes estão adentrados e citados pelo Código de Processo Penal, realizando-se um estudo voltado aos motivos que foram autorizadores à prisão, percebendo-se as regras que estão citadas para que possa ser realizada essa prisão. A Constituição Federal também precisa ser base para esse que a prisão possa ser feita (PACELLI, 2020, p. 683).
Com base nisso, pode-se realizar um estudo mais aprofundado e comparativo com outros tipos de prisão cautelares, visto que essa tipologia é realizada em caráter essencial, dentro dos requisitos citados conforme o art. 282, §6º do Código Processo Penal. Dentro desse contexto, Pacelli (2020, p. 683) traz à luz que a:
Referida modalidade de prisão, por trazer como consequência a privação da liberdade antes do trânsito em julgado, somente se justifica enquanto e na medida em que puder realizar a proteção da persecução penal, em todo o seu inter procedimental, e mais, quando se mostrar a única maneira de satisfazer tal necessidade.
Dessa forma, pode-se afirmar que é uma prisão diferenciada das outras modalidades, pois ao contrário das outras modalidades, esta acontece durante a fase pré-processual e processual, desde que seja decretada em um momento anterior do trânsito em julgado. Além disso, ressalta-se que a prisão de natureza cautelar que apresenta uma forma mais ampla, se apresentando como um instrumento eficiente para o encarceramento durante toda a persecução penal, pois pode acontecer durante o inquérito policial e a fase processual. Assim, mediante uma ordem escrita por uma autoridade competente judicial com fundamento voltado para o art. 5º, inciso LXI da CF, desde que seja apresentada a necessidade de cárcere, pois por ser uma prisão preventiva precisa ser sustentada com lastro probatório mínimo para indicar a ocorrência da infração, visto que precisa existir motivos legais para que essa prisão de fato possa ser feita (TÁVORA; ALENCAR, 2015, p.861).
3.2. Jurisdicionalidade e Motivação
No momento da decretação da prisão preventiva, como discrimina o art. 312 do Código do Processo Penal Brasileiro, precisa existir prova de que houve um crime, com materialidade ou ainda que possa apontar a existência de indícios pertencentes à autoria. O art. 312 do CPP descreve que outras razões como voltadas para ordem pública, ordem econômica, instrução criminal e a proteção direcionada para a aplicação da lei penal também são motivos para serem decretada a prisão preventiva. No entanto, o que tange a ordem pública ainda é passível de críticas de uma boa parcela dos doutrinadores penalistas brasileiros, sendo considerado um motivo vago, que podem inclusive permitir interpretações inadequadas (LOPES JR, 2017, p. 635).
Com relação aos fundamentos que permeiam a prisão preventiva, pode-se citar o que está previsto no art. 312 do Código de Processo Penal, nestes termos:
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.
Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, §4º) (BRASIL, 2011).
Esse tipo de prisão possui as hipóteses mais criticadas por ser uma das mais aplicadas no Brasil. Visto que, no país a quantidade de pessoas presas estão em torno de 600 mil, desse montante cerca de 40% são presos decorrentes de medidas cautelares, bem como os presos em flagrantes, que possuem um caráter provisório e temporário. Alguns estudos realizados recentemente apontaram um certo exagero na prática desse tipo de prisão, tanto como principal incremento a taxa de presos preventivos, no qual acabam ferindo de morte o princípio da ultima ratio. Atualmente, o seu uso está voltado para punição gerando incapacitação no preso, se apresentando como uma medida provisória de “último recurso” sendo usado como uma forma de recurso para que a autoridade possa ter uma resposta rápida sobre um determinado crime (SANGUINÉ, 2014, p. 186).
Além disso, no art. 311 discrimina-se que a prisão pode ser decretada a qualquer momento do inquérito policial ou até mesmo da instrução criminal, no qual é decretada pelo juiz com base no requerimento emitido pelo Ministério Público, podendo também ser realizado por parte de uma representação da autoridade policial (BRASIL, 1941).
Outro artigo relevante dentro dessa vertente é o art. 315, que traz à luz os seguintes termos:
Art. 315. A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada e fundamentada (Lei n.13.964 de 2019).
§1º Na motivação da decretação da prisão preventiva ou de qualquer outra cautelar, o juiz deverá indicar concretamente a existência de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada.
§2º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: (incluído pela Lei n. 13.964, de 2019).
I – limitar-se à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;
II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;
III – Invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;
IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V – limitar-se a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;
VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou superação do entendimento.
Dessa maneira, a decisão voltada para decretar ou substituir a prisão preventiva precisará ser sempre motivada. No entanto, precisa ter provas para imputar ao indivíduo aquela prisão, pois prender somente com o argumento de manter a ordem pública seria o mesmo que condenar alguém sem ao menos saber se a pessoa é culpada ou não daquele crime.
3.3. Da Provisoriedade
Pode-se compreender que o percentual retratado acima descreve pessoas que estão presas de forma provisória tendo como principal causa manter a ordem pública ou assegurar que alguma lei penal possa ser aplicada. Por isso que Maurício Sant’Anna dos Reis descreve in verbis:
Se do ponto de vista social, a ideia de opinião pública se adéqua a de imposição da opinião de quem detém o poder sobre quem não o detém, diferente não é no processo. Fundamentar uma prisão preventiva com base na ordem pública, pelo clamo público causado pelo fato supostamente criminoso, ante a robusta manifestação dos meios de comunicação sobre o dito crime, não se afasta da lógica trazida por Pierre Boudieu. Com efeito, a prisão que se baseia na opinião pública, por cento em nada se baseia, tendo em vista que a opinião pública, não pertence ao público, senão ao próprio juiz, ou quando muito, a um meio de comunicação. Desse modo a decisão é sui referencial, é cíclica, está despida da devida fundamentação exigida a todas as decisões, pelo que é ilegal. Mas acima de tudo não é sequer uma decisão judicial, senão um ato escancarado de submissão ao poder, ao arbítrio, em suma, manifestamente ilegal (REIS, 2016, p.89).
No entanto, um ponto que se apresenta como controverso é o fato de a prisão preventiva não ter um prazo que possa ser preestabelecido, para que o preso possa ter conhecimento do prazo que ele vai ficar detido. Nesse ponto de vista, esse detalhe pode apresentar arbitrariedade por parte dos magistrados que acabam facilitando com que ocorra uma violação dos princípios fundamentais constitucionais, como no caso o da Dignidade da Pessoa Humana.
4. DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO
A relação entre o tempo e o direito é considerada intrínseca, visto que o transcorrer do tempo gera efeitos significativos dentro dos processos que o direito traz consigo, uma vez que os efeitos do tempo podem se apresentar como materiais ou processuais. Mais precisamente dentro do direito penal, o tempo possui total relevância, sendo o principal alicerce para que ocorram as medidas punitivas, pois dependendo das penas existem uma quantidade de tempo estabelecida ao condenado, que podem variar de privação da liberdade, privação em caráter temporário do direito ou ainda uma privação do tempo que pode ser convertida em trabalho, como no caso das que podem ser pecuniárias. Além disso, o quantum de tempo em que o indivíduo foi condenado pode ainda imputar a este algum direito como o benefício voltado a suspensão condicional da pena ou ainda o livramento condicional (PASTOR, 2009, p.81).
Outra evidência de que o tempo é de fato relevante para a seara jurídica está presente na prescrição da pretensão punitiva estatal, devido ao tempo que o Estado deixou de punir, fazendo com que recaia sobre este o direito de punir devido o decurso do tempo, em razão exclusiva de sua própria inércia (BITENCOURT, 2012, p. 867).
Em vista disso, o tempo do processo, o que faz o tempo de prisão preventiva se tornar longo, não se apresenta como qualquer tempo e precisa ser visto com equilíbrio entre a celeridade processual em concordância com os direitos que são inerentes ao processo legal. Além disso, estes não podem ferir os princípios constitucionais que cobrem garantias e direitos, por isso não pode ser arrastado por um longo tempo (LOPES JÚNIOR, 2010, p. 144).
4.1. Falta de Prazo e o Princípio da Dignidade Humana
O conjunto de garantias fundamentais para a qualidade de vida humana precisam ser respeitados, devendo ser assegurado e imputado ao processo penal, visto que o tempo precisa ser estabelecido para que possa garantir a ampla defesa e o contraditório, sem que haja prejuízos perante a recorribilidade das decisões judiciais. Simultaneamente, os processos não precisam ser prolongados, com vistas a garantir que os direitos fundamentais possam ser assegurados. Observa-se esses casos quando o imputado responde ao processo preso, no qual priva-se deste a sua liberdade sem ainda ser condenado, apresentando-se totalmente vulnerável aos ventos da persecução penal (PASTOR, 2009, p.90).
Diante a isto, cabe ressaltar que o sistema processual funciona através do estabelecimento de prazo, visto que os atos dentro do processo deverão ser realizados diante de prazos estabelecidos. Com isso, pode-se afirmar que o prazo dentro do processo penal:
[...] é uma distância temporal entre dois marcos: um assinala o seu início (dies a quo) e o outro representa o seu encerramento (dies ad quem). Em princípio, todo ato deve ser efetuado dentro do prazo fixado pela lei. Quando faltar tal previsão, ele será realizado de acordo com o prazo assentado por norma genérica (SCARANCE FERNANDES, 2012, p. 123).
Perante a isso, a dignidade do imputado precisa ser respeitada mediante o estabelecimento de um prazo, como uma forma de apresentar um equilíbrio entre o poder de acusar do Estado e o imputado de se defender, conforme o princípio da ampla defesa e contraditório. Em vista disso, a justiça deve realizar todo o seu processo e resolver os casos que chegam até o seu conhecimento em um prazo razoável e considerado adequado (BADARÓ; LOPES JÚNIOR, 2011, p.14).
Com isso, já foram constatados casos em que os acusados foram presos de forma provisória, mesmo que antes da sentença condenatória sem trânsito julgado, em prazos superiores a 5 (cinco) anos, chegando inclusive a ficarem presos por dez anos, sem serem considerados de fato culpados ou condenados. Mediante a isto, pode-se afirmar que uma restrição de liberdade com prazo superior a noventa dias, sem motivação idônea para que o imputado permaneça tanto tempo privado de sua liberdade sem provas o suficiente para mantê-lo de tal maneira, torna-se considerada como desarrazoada, desta feita considerada ilegal (SANGUINÉ, 2014, p.509).
Com isso, torna-se translúcido o grau de violação que permeia a Dignidade da Pessoa Humana, visto que é um direito que é salvaguardado pelo ordenamento jurídico. Com isso, a maior indagação que permeia essa problemática é: como pode-se reparar os danos e prejuízos que são resultantes do tempo que o imputado passou longe de sua família, visto que teve sua liberdade suspensa por cinco ou dez anos para depois ser considerado inocente? Ora, sendo punido, estando isolado por algo que não cometeu? Diante a isto, uma possível reparação ou indenização não traz para esse indivíduo o tempo que passou preso injustamente, bem como não devolve os seus direitos que foram violados dentro do seu convívio familiar e social.
Diante a isto, se torna extremamente importante e legal, que seja determinado um prazo para que esse imputado seja detido para que este ato não possa violar os seus direitos fundamentais e humanos, sem violar também os princípios e diretrizes constitucionais que são respeitadas interiormente do ordenamento jurídico (SARLET, 2004, p.62).
4.2. Prazo Adequado
No Brasil, historicamente, pode-se citar que com o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004, conhecida popularmente como Reforma do Judiciário, o direito a um prazo adequado para o processo foi expressamente incluído na Constituição Federal de 1988, sendo discriminado através do inciso LXXVIII, mais precisamente no rol das garantias fundamentais citadas no artigo 5º. Como discrimina em seu texto, “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (SANTOS, 2008, p.139-140).
Para Lopes Júnior (2010, p.102-103) o prazo razoável se apresenta um direito fundamental, bem como outras garantias fundamentais presentes no art.5º da Constituição Federal, sendo comparada com a vedação da tortura ou ainda possuindo o mesmo valor que o tratamento desumano ou degradante, trazido à baila pelo inciso III, bem como é citado no inciso LV, no tocante do princípio da ampla defesa e contraditório.
Indo além, Tucci (2009, p.66) ressalta que há a necessidade da adoção de um método que seja mais sistemático e teleológico de interpretação do sistema processual constitucional, visto que a duração razoável é citada desde a Convenção Americana sobre os Direitos Humanos, in verbis:
[...] a determinante da fixação de prazo razoável de duração do processo penal está contida no § 2º do art. 5º, cuja parte final determina a consideração de garantias decorrentes “dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”, isto é, in casu, o estabelecido na Convenção americana sobre direitos humanos (sic), assinada em San José, Costa Rica, no dia 22.11.1969, e que no art. 8º, 1 estatui, in expressis verbis, que toda pessoa “[...] tem direito de ser ouvida como as devidas garantias e dentro de um prazo razoável [...] na defesa de qualquer acusação penal contra ela formulada...”.
Assim, compreende-se que mesmo sendo algo previsto em Tratado Internacional voltado para os direitos humanos no ano de 1992, pode-se afirmar que passou a ser citado dentro do ordenamento apenas a partir do ano de 2004. Com base nisso, uma discussão dentre os doutrinadores surgiu por parte da natureza jurídica dessa garantia, na dúvida de saber se trata de uma garantia constitucional, legal ou se sui generis de norma (BADARÓ; LOPES JÚNIOR, 2008, p.33-34).
Em contrapartida, afirma-se que o grau de desenvolvimento democrático de um determinado país pode ser mensurado com o nível de proteção que se oferece ao cidadão através das garantias em que estão relacionadas com os processos penais. Assim, observa-se que nas sociedades mais autoritárias, essas garantias são limitadas ou ainda restritas se comparadas com as que são fundadas na liberdade do indivíduo (BACIGALUPO, 2005, p.24).
Sobre as respectivas garantias, principalmente voltada para o prazo razoável, Badaró (2011, p. 207-208) descreve o seu respectivo significado:
Em suma, o modelo constitucional do devido processo legal no sistema brasileiro é de um processo que se desenvolva perante o juiz natural, em contraditório, assegurada a ampla defesa, com atos públicos e decisões motivadas, em que ao acusado seja assegurada a presunção de inocência, devendo o processo se desenvolver em um prazo razoável. Sem isso, não haverá due process ou um processo équo.
Com base nisso, o processo penal que faz parte de um Estado democrático de Direito, no qual suas ações precisam estar pautadas pelas garantias fundamentais que são citadas na Constituição, como uma forma de evitar abusos por parte do Estado no exercício de seu jus puniendi, bem como, na prática do seu poder durante a persecução penal. As garantias são seguranças que por sua vez são concernentes ao due processo of law, de maneira que possa de fato existir um certo equilíbrio entre punir um indivíduo e garantir os seus direitos fundamentais (BONATO, 2003, p.108).
Ocorre que, se na Constituição Federal mais precisamente no seu respectivo art. 5º e inciso LIV, destaca-se que ninguém poderá ser privado de sua liberdade sem que exista um processo legal. Mediante a isso, não tem como considerar um julgamento que não está embasado nos termos constitucionais, da mesma forma que um processo não deve ser visto como algo paralelo, mas que precisa ser interpretado e analisado em concordância com a própria Constituição Federal, pois esta se apresenta como principal base (TUCCI, 2009, p.108).
Por isso, Nucci (2016, p.89) afirma que precisa ser levado em consideração para a decretação da prisão preventiva o princípio do devido processo legal, ipsis verbis:
O princípio do devido processo legal é, sem dúvida, o aglutinador dos inúmeros princípios processuais penais (art.5º, LIV, CF). Constitui o horizonte a ser seguido pelo Estado Democrático de Direito, fazendo valer os direitos e garantias humanas fundamentais. Se esses forem assegurados, a persecução penal se faz sem qualquer tipo de violência ou constrangimento ilegal, representando o necessário papel dos agentes estatais na descoberta, apuração e punição do criminoso.
Assim, entende-se que este é considerado como caráter processual da garantia do devido processo legal, justamente a junção de princípios e garantias que estão citadas na Constituição Federal, que asseguram o indivíduo de que seus direitos fundamentais serão garantidos. Em contrapartida com o Brasil, nos Estados Unidos da América, durante os anos foram sendo desenvolvidas teorias que permeiam o processo, chamada de processo legal substantivo, onde se afirma que as leis precisam estar em concordância com um processo legislativo, com fundamentos voltados para os direitos fundamentais básicos, caso contrário são consideradas injustas ou inconstitucionais (SCARANCE FERNANDES, 2012, p.57).
Com base nisso, constata-se que sendo decretada a prisão preventiva, o imputado não pode permanecer preso sem prazo para ser liberto, por isso precisam ser observados os prazos que são discriminados por lei para que sejam cumpridos os respectivos atos processuais. Assim, cita-se que: conclusão do inquérito estabelece-se o prazo de 10 ou 15 dias, no caso quando a competência é da Justiça Federal; oferecimento de denúncia, prazo de 5 dias; recebimento de denúncia, prazo de 5 dias; resposta escrita do réu, prazo de 10 dias; apreciação quanto à resposta escrita, 10 dias; audiência para oitiva de testemunhas no qual se objetiva debater a sentença, prazo de 60 dias somados com 24 horas, para que possa ser dado andamento em cartório judicial (LENZA, 2016, p. 99).
Destarte, quando somados todos os prazos resulta em um total de 120 dias, visto quando for de competência da Justiça Estadual, e 125 dias quando estiver sob a competência da Justiça Federal. O que se observa é que a maioria dos magistrados entendem que não podem ser computados os prazos de forma isolada, por isso que são considerados os eventuais atrasos. No entanto, buscando-se na seara da jurisprudência, pode-se observar decisões no qual foram considerados os atos isolados, in verbis:
TJMG – HG – “HABEAS CORPUS” – ROUBO MAJORADO – CORRUPÇÃO DE MENOR – RELAXAMENTO DE PRISÃO – EXCESSO DE PRAZO – NÃO CONFIGURADO –PRISÃO PREVENTIVA – DECISÃO FUNDAMENTADA – GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. Não há que se falar em excesso de prazo para formação da culpa quando a instrução criminal não ultrapassou o prazo global de 122 dias. A prisão preventiva se sustenta diante da comprovação da materialidade e dos indícios suficientes da autoria do crime, associados ao motivo legal da garantia da ordem pública, sobretudo no que se refere ao modo concreto com que o paciente teria agido. Eventuais condições pessoais, ainda que favoráveis, não tem o condão de, por si só, garantirem a revogação da prisão preventiva, mormente diante de elementos concretos e legítimos que demonstram a essencialidade da manutenção da custódia antecipada. Relatora Maria Luíza de Marilac – Pub 17.05.16.
Dessa maneira, o prazo começa a contar após a prisão para o encerramento do respectivo inquérito policial, que por sua vez ocorre em dez dias, conforme Justiça Estadual, e 15 dias prorrogáveis se for Justiça Federal, dando andamento aos demais atos processuais, que, no entanto, fazem parte do oferecimento da denúncia e início da instrução criminal (PACELLI, 2020, p.100). Com base nisso, Avena (2017, p.684) destaca algumas súmulas que adentram no assunto relacionado à prazo:
Cabe lembrar, por derradeiro, a existência de Súmulas pertinentes ao rotulado excesso de prazo na prisão, ressaltando-se, no âmbito do STJ, a Súmula 21 (pronunciado o réu, fica superada a alegação do constrangimento ilegal da prisão por excesso de prazo na instrução), a Súmula 52 (encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento por excesso de prazo) e a Súmula 64 (não constitui constrangimento ilegal o excesso de prazo na instrução, provocado pela defesa).
Contudo, o posicionamento por parte do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça, é de que o prazo decorrente da prisão preventiva sofre influência do prazo para a conclusão da instrução criminal ficando com isso sujeito a um juízo razoável, sendo este prazo estabelecido também por parte do senso jurídico em comum, no qual não se considera que exista um excesso de prazo quando se existe justificativa para que haja essa demora no processo (AVENA, 2017, p. 122).
Entretanto, é notória a divergência com relação aos prazos, visto que em uma comparação realizada com o levantamento de dados realizados pelo Conselho Nacional de Justiça, no qual apresentou uma média de tempo em prisão provisória variando de 172 até 974 dias.
Desta feita, foram formados na jurisprudência, alguns critérios que são a base da justificativa para que houvesse um excesso de prazo, já que se baseia na extensão da instrução criminal, apontando-se como motivos, por exemplo, a quantidade de número de corréus; as provas que são produzidas por carta precatória; variadas provas periciais bem como a quantidade de diligências solicitadas para que fosse feita a defesa do acusado (NUCCI, 2016, p. 155).
Cita-se o que é observado na jurisprudência, como o caso que ocorreu perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nestes termos:
Ademais, o com seis réus, cujos defensores são distintos, havendo necessidade de expedição de cartas precatórias para oitiva de testemunhas. Tais circunstâncias demonstram a complexidade do feito e justificam seu retardamento, não sendo possível atribuir eventual demora à inércia do Poder Judiciário, sendo o caso da aplicação do princípio da razoabilidade (HC 990.10.455036-0, 16ª C, Almeida Toledo, j.14.12.2020, v.u).
Por isso, que o aceleramento desse prazo vai contar com o ponto de vista de todos os magistrados envolvidos que tiverem uma visão mais utilitarista, não partindo de uma justiça imediata, visto que a duração precisa ser razoável e sem que exista de fato excessos desnecessários, uma vez que o réu passa a ser submetido à situações consideradas degradantes e por um sentimento de angústia por tempo ilimitado, devido à pendência que deveria ter prazo para ser analisada.
Então compreende-se que a celeridade do prazo está voltada para a redução do tempo em que o acusado entrará em sofrimento, partindo-se do ponto de vista que há risco de se tratar de um caso de inocência, no qual o tempo que o imputado ficará isolado pode colocá-lo em uma situação injusta (LOPES JR, 2010, p. 181).
Outro caso ímpar, ocorre quando a demora do prazo é resultante pela demora da defesa, assim o magistrado pode manter o acusado preso por um tempo maior, no entanto, mediante essa decisão é passível recurso. Contudo, se a defesa entrar com o respectivo recurso não terá a sua justificativa de excesso de prazo deferida, conforme descreve Súmula nº 21 do Superior Tribunal de Justiça. Por outro lado, o art. 428 do respectivo Código de Processo Penal descreve que o julgamento em plenário deve ter um prazo de seis meses, e se nada for providenciado durante esse período pode entrar com alegação de excesso de prazo (LENZA, 2016, p. 177).
5. CONCLUSÃO
De acordo com a pesquisa realizada, pode-se afirmar que a prisão preventiva é de fato uma medida cautelar e que por isso, precisa ser usada somente em último recurso, visto que restringe a liberdade do acusado por um prazo que deve ser estabelecido, fundamentado em provas da existência de crime bem como indícios que são considerados suficientes, no qual se relacionam as seguintes expressões periculum in mora, que é o perigo na demora, e fumus boni iuris.
Com isso, pode-se afirmar que a falta de prazo estabelecida para a prisão preventiva é uma realidade considerada grave na sociedade brasileira, pois cada vez mais as penitenciárias estão ficando lotadas por pessoas que ainda estão esperado seus prazos serem finalizados para assim serem consideradas culpadas ou inocentes, no entanto não é isso que acontece pois o prazo fica estendido por um tempo não estabelecido, fazendo com que a pessoa passe anos e anos apenas esperando esse período finalizar.
Diante a isto, pode-se concluir que o art. 312 do Código de Processo penal descreve em quais condições pode ser decretada a prisão preventiva, podendo citar a garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal, bem como a garantia da ordem econômica, além da asseguração de eventual pena a ser imposta. Destarte, a própria Constituição Federal descreve em seus textos o respeito que precisa existir para que os direitos fundamentais possam ser garantidos.
Logo, observa-se que mesmo estando incluída à Constituição através da Emenda 45 de 2004, e presente no texto original no seu art. 5º, cláusula pétrea, verifica-se que a presença de atos considerados inconstitucionais que ferem de morte os princípios estabelecidos pela Constituição Federal de 1988, visto que o ocorre uma realidade jurídica diferenciada no que era para de fato acontecer, sendo que os prazos se apresentam extrapolados, enquanto deveria ser uma duração razoável.
Assim, a ausência de um prazo legal de prisão preventiva colabora para o comprometimento da duração razoável do processo. No entanto, é algo possível, mas exige com que ocorra um consenso entre os magistrados para ocorrer a celeridade processual, que por sua vez é considerada como um grande gargalo na esfera judicial no país. Outro ponto a ser citado é que há um certo paradoxo e desencontro entre a doutrina e a jurisprudência no tocante do prazo para manter o preso encarcerado, uma vez que mesmo que possa ser defendida a tese de um “razoável prazo” ainda sim é um termo vago e que pode ser inclusive interpretado de diversas nuances, podendo inclusive ser considerado razoável o tempo que o preso estiver encarcerado mesmo que dure 10 anos.
Em contrapartida, existem Tribunais que possuem uma visão fixada do que seria o “prazo razoável” estabelecendo uma média de 125 dias, como no caso do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, que afirmou que esse prazo supracitado é suficiente para que possa cumprir todos os atos processuais.
Ainda sim, mesmo sendo uma medida cautelar, a prisão preventiva pode ser substituída por outras medidas, visto que a prisão preventiva deve ser aplicada somente em último caso. Entende-se que as outras medidas, dependendo da acusação, podem se apresentar como alternativas à prisão preventiva, como por exemplo: comparecimento periódico em juízo; proibição de acesso a um determinado lugar ou ainda de frequentar determinados lugares; proibição de manter contato com uma determinada pessoa ou pessoas; proibição de se ausentar da respectiva Comarca; recolhimento domiciliar durante a noite e nos dias de folga; suspensão de atividades públicas ou de outras atividades econômicas; internação provisória e por fim, a monitoração realizada com a tornozeleira eletrônica.
Visto que é um assunto atual devido ao recente cenário dos sistemas prisionais do país, lotados e, devido a superlotação, os presos ficam submetidos a situações degradantes. No entanto, sugere-se para estudos futuros a importância da aplicação das outras medidas cautelares, se possível, para a redução da quantidade de presos por prisão preventiva.
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Graduanda do Curso de Direito pela Fametro – Faculdade Metropolitana de Manaus
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CARVALHO, Gabriele Gomes. A falta de prazo no cumprimento da prisão preventiva e a violação da dignidade da pessoa humana Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 out 2022, 04:25. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/59629/a-falta-de-prazo-no-cumprimento-da-priso-preventiva-e-a-violao-da-dignidade-da-pessoa-humana. Acesso em: 04 dez 2024.
Por: RODRIGO PRESTES POLETTO
Por: LEONARDO RODRIGUES ARRUDA COELHO
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
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