ODI ALEXANDER ROCHA DA SILVA[1]
(coautor)
RESUMO: O presente estudo tem por objetivo analisar as principais leis presentes no Código Penal e na Constituição Brasileira, que são aplicadas ao crime de tráfico internacional de mulheres. A seguinte pesquisa se baseia no método qualitativo apoiado na pesquisa bibliográfica. O tráfico internacional de pessoas é uma espécie de crime em que a vítima é levada para outro país com intuito de exploração diversa, principalmente sexual. Este crime está descrito na Constituição Brasileira e no Código Penal, pelas Leis 13.344 e 12.015. É um tipo de crime organizado, com grande rentabilidade, apontado como um dos fatores que dificulta o combate e redução do crime. O perfil das vítimas atraídas pelas quadrilhas costuma ser parecido: jovens, morenas ou negras, bonitas, de família pobre, buscando emprego e solteiras. Após pesquisas, os resultados obtidos foram que a aplicabilidade das leis brasileiras não tem sido eficiente no combate ao tráfico de mulheres, pois os números de vítimas a cada ano mostram-se ao contrário, além da falta de diálogo entre os países, pouca investigação e investimento em políticas públicas que contribuam de forma significativa e direta para reduzir o crime.
Palavras-Chave: Tráfico de mulheres. Exploração Sexual. Crime. Leis.
ABSTRACT: The present study aims to analyze the main laws present in the Código Penal and Constituição Brasileira, that are applied to the crime of international trafficking in women. The following research is based on the qualitative method supported by bibliographic research. International human trafficking is a kind of crime in which the victim is taken to another country with the aim of different exploitation, mainly sexual. This crime is described in the Constituição Brasileira and in the Código Penal, by Laws 13.344 and 12.015. It's a kind of organized crime, with great profitability, identified as one of the factors that hinders the fight and reduction of crime. The profile of victims attracted to gangs is usually similar: young, brunette, or black, pretty, from a poor family, looking for a job and single. After research, the results obtained were that the applicability of Brazilian laws has not been efficient in combating trafficking in women, because the numbers of victims each year show up to the contrary, in addition to the lack of dialogue between the countries, little research and investment in public policies that significantly and directly contribute to reducing crime.
Keywords: Traffic of women. Sexual Exploitation. Crime. Laws.
1 INTRODUÇÃO
O objetivo deste estudo se concentra em analisar as principais leis presentes no Código Penal e Constituição Brasileira, que são aplicadas ao crime de tráfico internacional de mulheres. A seguinte pesquisa se baseia no método qualitativo apoiado na pesquisa bibliográfica.
O tráfico internacional de pessoas é um crime que perdura há anos na sociedade. Sabe-se que esse problema ainda é pouco discutido, principalmente o tráfico de mulheres para fins de exploração sexual, por ser um assunto ligado à prostituição (Vensom; Pedro, 2013). Nessa perspectiva, este tipo de crime está entre um dos mais rentáveis do mundo para os criminosos que abusam da inocência dessas mulheres, mas que mediante a justiça brasileira não recebe tanta atenção e investimento para julgar e prender os criminosos (BORGES, 2013).
O Código Penal Brasileiro apresenta os crimes de exploração sexual descritos nos artigos 228, 229, 230, 231 e 231-A, em que citam quanto ao tempo de recrutamento, especificando-o como crime de exploração sexual da seguinte forma: “Manter, por conta própria ou de terceiros, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente [...]”. Embora haja sua descrição no Código Penal, ainda é visto que essa lei tem pouca aplicabilidade, e um dos motivos é a dificuldade em chegar até os criminosos.
Bittencourt (2019) salienta que uma das formas de combate é o investimento em políticas públicas, campanhas em vários veículos de informação, com a finalidade de informar as possíveis vítimas acerca de acontecimentos no país de origem, servindo como alerta e estratégia de reduzir o aumento do tráfico de mulheres para a exploração sexual. Além do alinhamento das esferas competentes em trabalharem em conjunto de acordo as medidas aplicáveis.
Após pesquisar a respeito do tráfico internacional de mulheres para fins de exploração sexual, levantou-se a seguinte problemática: A aplicação das leis brasileiras tem colaborado de maneira efetiva para a redução de tráfico internacional de mulheres?
A justificativa pela escolha desse tema se deu após notarmos que dentro do crime de tráfico internacional de mulheres estão elencados vários crimes, que podem ser julgados de acordo com o Código Penal e demais leis brasileiras. Ao revisar acerca do assunto, percebe-se que a aplicação das leis para esse tipo de crime não tem uma efetividade tão satisfatória. E uma das causas é a falta de investigações ou investimentos na área para descobrir mais quadrilhas que ainda fazem esse tipo de crime.
O presente estudo está dividido em Introdução – uma breve descrição sobre o que é o crime de tráfico de pessoas/ mulheres e exploração sexual. O Capítulo 2 - tem por finalidade discutir e explanar em que se caracteriza o crime de exploração sexual. O Capítulo 3 – propõe descrever o perfil da vítima e qual a relação da vulnerabilidade social dentro do crime de tráfico de mulheres. E por último, o Capítulo 4 – se emprega em analisar as principais leis (12.015, de 7 de agosto de 2009 e 13.344, de 6 de outubro de 2016).
2 CARACTERIZAÇÃO DO CRIME DE EXPLORAÇÃO SEXUAL
Silva e Mattos (2019) destacam para documentos e Convenções que foram fundamentais para a abordagem do assunto, tais como o Protocolo Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas -Protocolo de Palermo, criado no ano 2000. Este documento trouxe em suas páginas, medidas dos níveis sociais, educativos e culturais que coibissem o crime do tráfico de pessoas no geral. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgada em 1948, pela ONU (Organização das Nações Unidas) foi outro modelo de documento importante, que expressava quanto aos direitos e liberdade das pessoas, inclusive daquelas vítimas de tráfico.
Vensom e Pedro (2013, p. 75) descrevem esse crime como: “exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, os trabalhos ou serviços forçados, escravaturas ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos”. Em suma, se designa a tudo aquilo em que remete o sujeito a um trabalho forçado, em condições precárias e sem remuneração por isto.
Nas palavras de Rocha (2020) o uso da internet tem sido um meio facilitador para que os criminosos procurem por suas vítimas. Em muitos desses casos, a busca é realizada por perfis similares, a partir do velho discurso de ascensão e qualidade de vida. Tal atitude é vista como algo que se torna atraente perante o entendimento das vítimas, e em pouco tempo as levam para uma série de armadilhas, em que poucas conseguem se livrar.
O crime de exploração sexual é um assunto importante para se debater, principalmente na área do Direito. Todavia, a sua caracterização é mal compreendida ou confundida com outros tipos de crime que se assemelham a este. Nesse ínterim, muitas das vezes o termo de tráfico de pessoas é usado para se referir somente a exploração sexual. Mas, sabe-se que se trata de dois tipos de crimes que estão dentro do Código Penal e da Constituição Federal Brasileira, em que a exploração é abordada como uma das finalidades do tráfico de pessoas (SANCHES; BRITO, 2019).
Primeiro existe a classificação do crime de tráfico de pessoas, o qual não faz menção apenas às mulheres, como também homens, crianças, idosos etc. Considerando o tráfico de pessoas para diversos fins, observa-se que a Lei 13.344, no Art. 149, do Código Penal, do ano de 2016, discorre que:
Agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com a finalidade de:
I - remover-lhe órgãos, tecidos ou partes do corpo;
II - submetê-la a trabalho em condições análogas à de escravo;
III - submetê-la a qualquer tipo de servidão;
IV - adoção ilegal; ou
V - exploração sexual.
Nos itens acima, nota-se quanto a descrição do tráfico de pessoas, e o subitem V trata a respeito da exploração sexual. Logo, o crime de exploração sexual apresenta-se como ponto primordial para análise, pois é caracterizado, também, nos artigos 228, 229, 230 e 231.
Assim, é válido proporcionar essa discussão, contrapondo o que diz os artigos que ferem o Código Penal no que tange ao crime de exploração sexual. A Lei Nº 12.015, de 7 de agosto de 2009, no Capítulo V, o qual traz em sua composição em relação aos crimes de Lenocínio e do tráfico de pessoa para fim de prostituição ou outra forma de exploração sexual:
Art. 228: Induzir ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitá-la, impedir ou dificultar que alguém a abandone: [...]
Art. 229: Manter, por conta própria ou de terceiro, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente: [...]
Art. 230 Tirar proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça:
Art. 231: Promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha a exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou a saída de alguém que vá exercê-la no estrangeiro.
Art. 231 A: Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual: [...]
O Código Penal descreve acerca dos crimes que são ligados à exploração sexual, e a partir dos verbos “promover” e “facilitar”, compreende-se que os criminosos que trabalham de forma direta ou indireta, estão infringindo os Artigos 228, 229, 230 e 231. O crime de tráfico de mulheres, em território nacional ou internacional tem o mesmo objetivo: exploração sexual.
Através do diálogo sobre o que o Código Penal e a Constituição apresentam para a caracterização do crime de exploração sexual, parte-se do princípio de inclusão do que é o tráfico de pessoas, tráfico internacional de mulheres, crime transnacional ou lenocínio. Com a finalidade de explicar que todos esses termos citam a prática da exploração sexual, mas existem outros envolvidos também, como: o trabalho semelhante a escravidão, o cárcere privado, a remoção de órgãos etc. (SANCHES; BRITO, 2019).
Enquanto alguns autores expõem que o crime de tráfico internacional é o ato de explorar o corpo de alguém para a prostituição ou distintas maneiras de exploração do sexo - é perceptível o quanto na maioria das literaturas as palavras “exploração sexual” são usadas para caracterizar esse tipo de tráfico (BORGES, 2013).
Sanches e Brito (2019) destacam que esse modelo de crime sempre esteve presente na sociedade, embora tenham criado leis, penalidades para os criminosos, as formas de agir, de chegar às vítimas, o perfil escolhido e a questão de levar para outros países continuam sendo semelhantes às do passado.
Ladeia e Vieira (2018) trazem uma abordagem utilizando o termo tráfico de mulheres:
O Tráfico de mulheres é um crime invisível, silencioso, oculto sob o véu de um submundo que inclui tráfico de drogas, de órgãos e pele, de armas e de pessoas para diversos fins, o trabalho ou serviços forçados, a servidão, a escravidão, a remoção de órgãos ou o casamento servil, e a exploração sexual, onde a vítima em sua maioria, é a mulher (LADEIA; VIEIRA, 2018, p. 3).
Conforme aponta os autores no excerto em questão, além da exploração sexual, outros atos ilícitos são tidos como objetivos das quadrilhas, e a procura por mulheres julgadas como ‘presas fáceis’ funciona como alvo certeiro dos criminosos. Apesar de que a escravidão e a prostituição sejam descritas dentro da exploração sexual e do tráfico de pessoas/ mulheres, é necessário pontuar que existem diferenças quando se quer falar o que é um crime ou outro.
Rocha (2020) ressalta quanto a escravidão como ponto de partida para compreender melhor o crime de tráfico de mulheres. Uma breve retrospectiva voltada para a história do tráfico de pessoas de modo geral, especificamente o de mulheres, caracterizando o crime de exploração sexual e prostituição, a autora aponta para o Protocolo de Palermo, aprovado em 2000, como um dos principais decretos em defesa a vítima do crime organizado e tráfico de pessoas, mais precisamente o de mulheres e crianças, que são em grande número.
Segundo Silva e Guimarães (2018, p. 106) esse tipo de crime não fere apenas o Código Penal, como, notoriamente, os Direitos Humanos e a dignidade dessas pessoas que passam por tais situações. Em suma, os autores especificam o como “[...] um crime com múltiplos propósitos, mas que culmina numa característica primordial, qual seja, a subjugação de um ser humano imposta por outro, constituindo grave violação dos direitos fundamentais destas pessoas.” Violação esta que traz muitas consequências negativas para a vítima, os direitos dela como ser humano, para a sociedade, e, por sua vez, a quem trabalha de forma direta combatendo o crime de tráfico de mulheres, exploração sexual, cárcere privado e demais situações que concomitam nessa esfera.
2.1 Prostituição x Exploração Sexual
Os termos Prostituição e Exploração Sexual são citados com certa frequência ao atribuir o tema tráfico de mulheres, pois são práticas bastante comuns que fomentam o crime organizado. É importante frisar que muitas pessoas não conhecem a diferença entre as duas. A Prostituição é uma ação um tanto quanto antiga na sociedade, e no Brasil não é qualificada como um crime, mas quando se “tira proveito”, “vantagem” disso, associa-se a um delito. Concerne-se na troca de favores, em que a pessoa vende o prazer carnal e o cliente, mediante pagamento, faz um acordo e se relacionam sexualmente (BARROSO, 2020).
A Exploração Sexual, como pode ser esclarecida neste capítulo, denota a uma espécie de situação mais grave, em que alguém usa de outro sujeito para conseguir lucrar. Serpa e Felipe (2019, p. 9) denominam que “a exploração sexual se caracteriza por uma prática sexual obrigada por alguém, a outro, a exercê-la ou de impedi-la de abandoná-la caso deseje [...]”. Ao comparar a Prostituição (forma livre) e a Exploração Sexual, há uma pequena distância no significado de se vender por dinheiro diante da obrigação e vantagem que alguém impõe em uma pessoa em ser submetida a atos sexuais com outras pessoas.
As finalidades também mudam nos dois casos, mas o dinheiro é muito visado. E os motivos no tráfico de mulheres para a Exploração Sexual aparentam ser os melhores, conforme é citado abaixo:
O tráfico para fins de exploração sexual está ligado com a desigualdade social do mundo capitalista e a glamorização da vida europeia; Fortes motivações que fazem milhares de pessoas caírem nos radares das máfias é a questão do desemprego e baixa qualificação, que faz com que não sobre muitas alternativas e se tornem pessoas vulneráveis e marginalizadas (ROCHA, 2020, p. 18).
Nesse tipo de crime é comum também, a vítima relatar que foi “convidada” para trabalhar no exterior, mas em muitas das vezes desconheciam a parte de serem exploradas, e as quadrilhas são cuidadosas ao escolherem mulheres com perfis parecidos: “jovens, desempregadas e com pouca ou nenhuma qualificação”.
Da exploração para a prostituição, lida-se com fatores diretos: quem agencia (aliciadores, rufião, chefe), e quem trabalha por conta própria.
No Brasil, se prostituir não é crime, e isto a maioria da população sabe, o que elas não sabem é que tirar proveito desta prática é crime, e dependendo como ocorre deixa de ser o delito de rufianismo e passa a ser o tão temido tráfico de pessoas (SANCHES; BRITO, 2019, p. 169).
Ou seja, a prostituição não é criminalizada aqui no Brasil, mas de forma sorrateira, pode passar ao tráfico de pessoas, e o que, no outro segmento, a mulher fazia por conta, no horário e dia que ela quisesse, já não será mais assim, e nesse instante entra a exploração sexual, os lucros também passarão a ser divididos e de forma desigual.
Os problemas vão além no tráfico de mulheres, conforme apontam os autores no trecho a seguir:
Considerando que a prostituição e o mal que a acompanha, isto é, o tráfico de pessoas para fins de prostituição, são incompatíveis com a dignidade e o valor de pessoa humana e põem em perigo o bem-estar do indivíduo, da família e da comunidade (LADEIA; VIEIRA, 2018, p. 6).
Como discorrem os autores no excerto supracitado, não somente a vítima passa a correr perigo ao ser explorada e chantageada. Quando essas mulheres se recusam a fazerem o que os seus chefes mandam, eles passam a usar por meio de chantagens que irão matar a família da vítima. Por ligações começam a ameaçar mãe, pai, irmãos, filhos – uma maneira de continuar tendo o controle sobre a vítima. Em casos mais graves, os integrantes da quadrilha que trabalham no Brasil passam a andar próximo a casa das famílias delas, deixando até a comunidade preocupada.
Ladeia e Vieira (2018, p. 8) mencionam “[...] o conceito de prostituição forçada como uma violência, entendendo-se que a livremente exercida não representa um ato violento aos direitos humanos”. Em outro sentido e implicitamente, a exploração sexual também representa a prostituição, mas culmina em ato violento, criminal e forçado. Já quando a prostituição que não se insere dentro das práticas ilegais, e a pessoa exerce de forma livre e independente, não é vista como problema para a própria pessoa ou para os órgãos de proteção à vítima do crime de tráfico, com intuito da exploração sexual.
Borges (2013) critica a forma da legislação no Brasil lidar com o crime de exploração sexual:
Trata-se de um sistema paternalista, moralista e puritano, que adota como classificação absoluta da prostituição como forma de exploração sexual, abrangendo a prostituição exercida como atividade laboral voluntária e, efetivamente, realizando uma inversão ideológica a pretexto de proteção de grupos vulneráveis de pessoas que se dedicam à prostituição em determinadas regiões do país, ou pretendam realizá-la no exterior (BORGES, 2013, p. 33).
É fato que a legislação no Brasil não é coerente ao especificar quando e em que se encaixa o crime de exploração sexual, a prostituição livre em si não é proibida, mas a julgam como crime. Entretanto, no exterior, as leis são diferentes. Se a pessoa é pega se prostituindo, dependendo do país, o código de leis daquele lugar é infringido.
Na visão de Ribeiro (2015) os artigos do Código Penal não são muito claros ao que citam os crimes praticados no âmbito do tráfico, aludindo mais à prostituição. O autor ainda evidencia o fato de que os artigos não destacam quanto ao ato de consentimento da vítima, para a partir disso ser julgado se é um crime ou não. Uma outra observação é que não há distinção entre a prostituição de forma livre ou obrigada. Para a lei brasileira ambos os jeitos são postos como crime. Embora o Brasil seja um país em que a prostituição não é banida.
Em outro viés, o dinheiro evidencia-se como uma premissa forte para mascarar esse crime diante da sociedade. Entretanto, se uma pessoa se desloca para outro país ou estado (tráfico interno) com propósito de se prostituir, com ajuda de alguém, nesse caso, a lei brasileira já pode julgar como tráfico de pessoa, mesmo que tenha tido a concordância da pessoa (RIBEIRO, 2015).
2.2 O tráfico de mulheres como mercado lucrativo
Nesse aparato o tráfico de mulheres envolve uma alta lucratividade, no qual os criminosos ganham em cima das mulheres que são levadas para serem usadas em outros países.
De acordo com Borges (2013)
O tráfico de pessoas para exploração sexual é considerado a atividade comercial ilícita que ocupa o terceiro lugar entre as mais rentáveis, no mundo, sendo superado apenas pelo tráfico de armas e o de drogas, e movimentando cerca de 12 bilhões de euros, por ano, envolvendo cerca de 2,5 milhões de pessoas, originárias de 127 países, que são traficadas para mais de cem países, para exploração sexual ou laboral (BORGES, 2013, p. 18).
Através dessas informações, acredita-se que esse tipo de atividade é difícil de combater, justamente por ser algo ilegal, e por gerar grande rentabilidade, fator esse que de maneira discrepante “compra” até mesmo o silêncio de pessoas que trabalham para tentar combater a máfia do tráfico internacional.
Os números no lucro não são calculados de maneira exata, pois eles alteram conforme os anos, e, quanto mais pessoas são aliciadas, mais dinheiro entra na conta dos criminosos (Vensom e Pedro, 2013). Segundo dados da UNODC (United Nations Office on Drugs and Crime), que é uma organização a qual tem por objetivo a luta contra os crimes de drogas e tráfico de pessoas, ressalta-se a seguinte observação:
Como se trata de um crime, ou seja, atividade ilícita, não há como saber com exatidão sobre o faturamento das máfias e bordéis pelo mundo, o que se tem são projeções e cálculos aproximados. O relatório da UNODC apontou que este mercado ilegal fatura aproximadamente U$32 bilhões por ano, o mesmo número é repetido no relatório feito pela Global Financial Integrity (GFI) [...]
(ROCHA, 2020, p. 15).
Os números apesar de não serem exatos, é perceptível que gira em torno dos bilhões; de fato, aqueles que participam dessa rede costumam ser pessoas influentes na sociedade, grandes nomes, empresários, bilionários, e os valores cobrados pelos traficantes são caros.
Silva e Guimarães (2018) trazem alguns dados quanto ao mercado de exploração, discorrendo que:
[...] cerca de 60% das pessoas traficadas atualmente são mulheres, uma vez que os traficantes tiram proveito de suas frágeis situações econômica e social, prometendo-lhes altos ganhos para sustentarem a si mesmas e suas famílias. Nesse cenário, o tráfico de mulheres para fins de exploração sexual, torna-se uma fonte de grandes rendimentos para o crime organizado, que opera, principalmente, através de agências de emprego e turismo, abordando suas vítimas por meio de anúncios de jornais e internet, requisitando empregadas, dançarinas, garçonetes, entre outras (SILVA; GUIMARÃES, 2018, p.107).
Os criminosos quando procuram por suas vítimas, na maioria dos casos, buscam sempre os perfis parecidos, com o discurso de melhoria e qualidade de vida, as atraem para uma rede de problemas infinitos, em que poucas conseguem se livrar.
Contribuindo nessa discussão, Sanches e Brito (2019) salientam que a forma como o crime é executado, o modelo e todo os trâmites que os aliciadores usam para que seja concluído é o que o torna tão rentável. Os métodos e a boa lábia (conversa que seduz) vendem a elas um sonho utópico, fazendo-as acreditarem que mudarão de vida. De fato, pode-se afirmar, que elas são atraídas a uma rede de problemas e melhoram sim as vidas, não as suas, mas as dos chefões.
3 O PERFIL DA VÍTIMA E A VULNERABILIDADE SOCIAL
O tema tráfico internacional de mulheres destaca o perfil considerado ideal para as quadrilhas. Pensa-se a partir dos pressupostos de que as vítimas sempre são as mesmas, ou seja, de mesmo perfil social. Na mídia, por exemplo, quando novelas e filmes tentam repassar o alerta para os devidos cuidados que as mulheres precisam ter quando se querem obter sucesso na vida, ter um emprego, que versa benefícios, o perfil das representantes nesses canais costumam ser: jovens, bonitas, de família pobre, buscando emprego (VENSOM; PEDRO, 2013).
Nas considerações de Rocha (2020) antes das vítimas serem “vítimas” do tráfico de mulheres, são vítimas da sociedade do país de suas nacionalidades. Mediante a falta de oportunidade, essas mulheres são excluídas do meio social, não tem emprego, baixa escolaridade e sem perspectiva de um futuro melhor.
Borges (2013) aponta que:
A vulnerabilidade social da vítima traficada, para fins de exploração sexual e, especificamente, para prostituição forçada, pode apresentar diversos traços comuns com a vulnerabilidade social pela qual passa a pessoa que faz da prostituição um trabalho para a sua subsistência e a de sua família, mas quando é submetida a condições extremas e degradantes para o exercício de sua profissão, a tutela penal de seus direitos desborda da exploração sexual, em si mesma, para abarcar as condições análogas à de trabalho escravo (BORGES, 2013, p. 15).
Quando a vítima sai da situação de usar a prostituição como um trabalho, para fazer tal exercício de modo forçado, e em muitos dos casos isso ocorre por conta da vulnerabilidade social: falta de dinheiro e de visão de melhoria de vida por outros meios. Assim, as condições de vida, desumanas e que ferem a dignidade da vítima, são parecidas e semelhantes às de trabalho escravo – presas, com uma dívida enorme com seus chefes, sem hora de começar e terminar o serviço, sem horário para se alimentarem, sem contato com familiares e amigos, e por ora os documentos apreendidos pela quadrilha.
Silva e Guimarães (2018) acrescentam que, além do perfil já caracterizado nas pesquisas sobre vítimas do tráfico internacional, tem a questão do sonho de viver/ morar na Europa. Trata-se de um artificio utilizado no processo de persuadi-las a largarem o seu país, família e irem “tentar a vida lá fora”, expressão essa que cai perfeitamente nos ouvidos delas, mas que não passa de uma idealização.
Em muitos dos relatos, a vulnerabilidade é apontada como o escopo do perfil das vítimas. Em conjunto ao perfil já abordado nos parágrafos anteriores, tem-se a raça de mulheres que mais são coagidas para o tráfico, como menciona o excerto abaixo:
O alvo preferido do tráfico de pessoas para exploração sexual são mulheres jovens, de baixa escolaridade, que começaram a trabalhar muito cedo e migraram por falta de opção, elas se encaixam em um perfil de vulnerabilidade, muitas dessas mulheres são negras ou morenas, solteiras, com filhos, sofreram abuso sexual na infância, prostituíram-se, e algumas acabaram se tornando viciadas em drogas (SANCHES; BRITO, 2019, p. 171-172. Grifos nossos).
Poucas literaturas citam quanto à violência sexual que essas mulheres já sofreram na vida como parte do perfil traçado, não que seja uma novidade, porém entende-se que essa informação pode dar margem para que a sociedade tenha uma visão errônea das mulheres que ‘entram’ nessa rede de esquemas criminosos. A mulher negra em um país com o histórico de passado escravagista acaba passando novamente para os dados que perpetuam a objetificação sexual vista do panorama lá fora.
Ladeia e Vieira (2018) também compartilham da posição do perfil exposto com o dos demais autores
Estas mulheres, são em geral, pobres, vivem em uma realidade desanimadora, baixa escolaridade, algumas já possuem filhos e por serem ainda jovens, nutrem os sonhos e desejos típicos da faixa etária; essa soma de elementos é fatal para que sejam atraídas por aliciadores de tráficos de mulheres que as submetem à exploração sexual em regime de escravidão (LADEIA; VIEIRA, 2018, p. 3. Grifos nossos).
A idade contribui em diversos aspectos no momento que os criminosos fazem suas buscas. Logo, as mais novas estão entre aquelas preferidas e desejadas para o perfil. A vontade em realizar sonhos e crescer na vida as levam para um mundo totalmente oposto do que imaginavam.
Para Rocha (2020, p. 25) “[...] jovens de 10 a 19 anos consistem em uma porcentagem de 20% das pessoas traficadas, por razões óbvias [...]”. As mulheres jovens são as mais atraídas, pois, teoricamente, são mais fáceis para serem persuadidas. Diferente de uma mulher na fase dos 30 anos, que já possui certa experiência de vida, sendo, por essa razão, mais difícil de ser enganada. Importante discutir que a idade de 10 aos 12 anos incompletos trata-se de vítimas infantis, e dos 13 aos 18 anos incompletos vítimas menores de idade. Em suma, além do crime de tráfico de mulheres, envolve outros crimes, como: a prática de aliciamento de crianças, corrupção de menores, estupro de vulnerável, entre outros.
Os meios usados pelas quadrilhas para encontrá-las chegam a ser um tanto que velhos, em se falando de estratégias, como as expostas no seguinte item:
São inúmeras maneiras de aliciá-las, podendo o primeiro contato ser físico ou através das redes sociais. Agências de viagens, de modelos, de empregos são lugares que os traficantes se sentem mais próximo de suas vítimas e preparados para começar o processo de aliciamento. Percebe-se que os criminosos sabem exatamente onde encontrar pessoas que são mais suscetíveis a se iludirem com seus argumentos e a vidas fantasiosas (ROCHA, 2020, p. 25. Grifos nossos).
Por conseguinte, com o desenvolvimento das redes sociais, há uma maior facilidade de falsas agências de modelos e viagens divulgarem seus “trabalhos” através de slogans e mensagens chamativas nesses veículos midiáticos, ocasionando uma sensação fictícia de segurança e veracidade, se tornando alheias às vítimas. E, as vítimas por não buscarem informações de alguém que as ajude a verificar se o anúncio é verdadeiro ou não, se são de confiança, aceitam e caem no golpe, por pensarem que é uma oportunidade única na vida delas.
4 APLICAÇÃO DAS PRINCIPAIS LEIS BRASILEIRAS PARA O CRIME DE TRÁFICO DE MULHERES
Conforme pôde ser discutido nos tópicos dois e três, o crime de tráfico internacional de mulheres abrange uma categoria criminosa, a qual existe a dificuldade em ser operacionalizado e sentenciado. Nessa perspectiva, o seguinte tópico propõe-se a analisar em relação as principais leis presentes na Constituição e no Código Penal Brasileiro.
Uma das principais leis que abordam o tráfico de mulheres se refere a Lei 12.015, de 7 de agosto de 2009. Esta lei versa quanto aos crimes contra a dignidade e liberdade sexual. No capítulo V, a partir dos Artigos 228, trata do “Do Lenocínio e do tráfico de pessoas para fim de prostituição ou outra forma de exploração sexual”. Por conseguinte, tem a lei 13.344, de 6 de outubro de 2016, que explana a respeito da prevenção e repressão ao tráfico interno e internacional de pessoas.
O Código Penal Brasileiro relata em seu texto, o Capítulo VI, o qual descreve em relação aos “Crimes contra a liberdade individual”, os Artigos 149 e 149-A, ambos abarcam quanto a “Redução a condição análoga à de escravo”, e o “Tráfico de pessoas”. Julga-se que o tráfico de mulheres envolve quatro crimes principais: o de dignidade e liberdade sexual da vítima, prevenção do crime, liberdade individual e trabalho semelhante a escravidão, além de outros que são considerados menores (MASSON, 2014).
O Artigo 228 ao 231-A, da Lei 12.015, do Código Penal brasileiro apresenta quanto a descrição do crime e a pena:
Art. 228
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
§ 1o Se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos.
Art. 230
§ 1º Se a vítima é menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos ou se o crime é cometido por ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou por quem assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
§ 2o Se o crime é cometido mediante violência, grave ameaça, fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, sem prejuízo da pena correspondente à violência.” (NR)
Art. 231
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos.
§ 1o Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar ou comprar a pessoa traficada, assim como, tendo conhecimento dessa condição, transportá-la, transferi-la ou alojá-la.
§ 2o A pena é aumentada da metade se:
I - a vítima é menor de 18 (dezoito) anos;
II - a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato;
III - se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; ou
IV - há emprego de violência, grave ameaça ou fraude.
§ 3o Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.” (NR)
Art. 231-A
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.
§ 1o Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar, vender ou comprar a pessoa traficada, assim como, tendo conhecimento dessa condição, transportá-la, transferi-la ou alojá-la.
§ 2o A pena é aumentada da metade se:
I - a vítima é menor de 18 (dezoito) anos;
II - a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato;
III - se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; ou
IV - há emprego de violência, grave ameaça ou fraude.
§ 3o Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.” (NR)
Os Artigos supracitados apresentam as condições para que os crimes sejam julgados. Seja por motivos de participação direta ou indireta (algum parentesco com a vítima, ou se trata de tráfico interno ou internacional, se tem mais de 18 anos ou não, se envolve fins lucrativos, a vítima tem alguma enfermidade, sofreu ameaça etc.). No que se refere a pena pelos atos, abrange dos 2 para 8 anos. Quando estas se aplicam, podem aumentar para o dobro, conforme está na lei, contando ainda com a multa, que varia bastante de acordo os crimes. Nota-se que o que está descrito no papel, nem sempre acontece na prática, pois para que sejam julgados os subitens, o trabalho da polícia é dificultado ao prender os envolvidos e reunir provas.
Na lei 13.344, nos Artigos 1º ao 17º expõem a respeito das diversas formas de enfrentamento do crime, em que o Capítulo I pontua “Dos princípios e das diretrizes”, o Capítulo II remete a “Prevenção ao tráfico de pessoas”; O Capítulo III – “Da repressão ao tráfico de pessoas”; Capítulo IV “Da proteção e assistência às vítimas”; Capítulo V - “Das disposições processuais”; Capítulo VI – “Das campanhas relacionadas ao enfrentamento ao tráfico de pessoas”; Capítulo VII – “Disposições Finais”.
Aqui nos deteremos a analisar os Artigos 4º, 5º e 6º, conforme descrito na redação:
Art. 4º A prevenção ao tráfico de pessoas dar-se-á por meio:
I - da implementação de medidas intersetoriais e integradas nas áreas de saúde, educação, trabalho, segurança pública, justiça, turismo, assistência social, desenvolvimento rural, esportes, comunicação, cultura e direitos humanos;
II - de campanhas socioeducativas e de conscientização, considerando as diferentes realidades e linguagens;
III - de incentivo à mobilização e à participação da sociedade civil; e
IV - de incentivo a projetos de prevenção ao tráfico de pessoas.
Art. 5º A repressão ao tráfico de pessoas dar-se-á por meio:
I - da cooperação entre órgãos do sistema de justiça e segurança, nacionais e estrangeiros;
II - da integração de políticas e ações de repressão aos crimes correlatos e da responsabilização dos seus autores;
III - da formação de equipes conjuntas de investigação.
Art. 6º A proteção e o atendimento à vítima direta ou indireta do tráfico de pessoas compreendem:
I - assistência jurídica, social, de trabalho e emprego e de saúde;
II - acolhimento e abrigo provisório;
III - atenção às suas necessidades específicas, especialmente em relação a questões de gênero, orientação sexual, origem étnica ou social, procedência, nacionalidade, raça, religião, faixa etária, situação migratória, atuação profissional, diversidade cultural, linguagem, laços sociais e familiares ou outro status;
IV - preservação da intimidade e da identidade;
V- prevenção à revitimização no atendimento e nos procedimentos investigatórios e judiciais;
VI - atendimento humanizado;
VII - informação sobre procedimentos administrativos e judiciais.
§ 1º A atenção às vítimas dar-se-á com a interrupção da situação de exploração ou violência, a sua reinserção social, a garantia de facilitação do acesso à educação, à cultura, à formação profissional e ao trabalho e, no caso de crianças e adolescentes, a busca de sua reinserção familiar e comunitária.
§ 2º No exterior, a assistência imediata a vítimas brasileiras estará a cargo da rede consular brasileira e será prestada independentemente de sua situação migratória, ocupação ou outro status.
§ 3º A assistência à saúde prevista no inciso I deste artigo deve compreender os aspectos de recuperação física e psicológica da vítima.
O Artigo 6º traz em seu texto, o destaque para a atenção e cuidados de proteção à vítima. Em outro viés, perante a lei, é reservada uma equipe de apoio para a vítima de tráfico (no caso as mulheres), que a ampare nos processos que se referem ao jurídico, social, saúde, trabalho e emprego, tanto em território nacional como internacional.
Para Vassoler et al. (2015, p. 2) “os traficantes procuram as mulheres vitimadas para retornarem ao tráfico ou mesmo para ameaçá-las, é fundamental a não discriminação, dado que alguns países consideram as vítimas como prostitutas [...]”. Em suma, o trabalho da polícia é em conjunto com o consulado brasileiro presente no país que a vítima está, e outros órgãos de proteção à pessoa. Porém, muitas vítimas desconhecem essas instituições, temem pedir ajuda e serem assassinadas.
Silva e Mattos (2019, p. 194) compartilham da discussão, afirmando que “[...] a proteção é elemento primordial dentro do enfrentamento ao crime de tráfico de pessoas, uma vez que, sem ela, pessoas viram objetos para simples obtenção de lucro”. Em muitos casos, as vítimas não sabem que farão parte de uma armadilha, por isso existe a necessidade de se ter mais investimento em políticas públicas, para que proteja mulheres nessas situações.
Os Artigos 4º, 5º e 6º mostram que a prevenção, a repressão e o enfrentamento ao crime de tráfico de pessoas devem ser tarefas executadas em equipe, que inclua órgãos nacionais e internacionais. Almeida (2017) reitera que por não ter diálogo direto entre os países, além de dificultar o combate, colabora mais ainda para os criminosos saírem impunes. As práticas estão previstas em lei, mas não tem um efeito tão positivo quanto deveria ter se for observar cada um dos artigos presentes no Código Penal, revelando-se um sistema com diversas falhas.
Os Artigos 149 e 149-A do Código Penal dissertam quanto aos crimes de analogia à escravidão e tráfico de pessoas, e a aplicação da pena (de 4 a 8 anos) é semelhante aos crimes descritos nas Lei 12.015 e 13.344. Mas, observa-se uma pequena diferença na seguinte parte:
IV - a vítima do tráfico de pessoas for retirada do território nacional.
§ 2o A pena é reduzida de um a dois terços se o agente for primário e não integrar organização criminosa. (Grifos nossos)
Verifica-se que a pena aumenta quando o tráfico acontece fora do país de origem da pessoa. Mas, no artigo apresentado a pena é reduzida nos casos daquele que está cometendo o ato, não tiver passagem pela polícia e nem fazer parte de qualquer espécie de sistema para prática de crime. Bittencourt (2019) relata que muitas quadrilhas agem de formas e em momentos diferentes, resultando na dificuldade em desarmar as quadrilhas e prender os criminosos. Logo, compreende-se que os criminosos costumam ter pessoas influentes em setores e áreas que a polícia não investigaria, por não haver suspeitas visíveis, como o setor público, por exemplo, muitos entram para a organização em troca de propina (VASSOLER et al., 2015).
Varela et al. (2021) afirmam que o tráfico de mulheres é uma tipificação de crime no qual o combate ainda é ineficiente. Apesar de existir várias convenções que discutam sobre o tema na esfera internacional, os países envolvidos não abordam sobre medidas que sejam eficientes. Principalmente relacionados a problemas socioeconômicos (motivo de levar as vítimas a acreditarem em falsas promessas e serem levadas para outros países). As leis brasileiras criadas não são devidamente aplicadas, caracterizando, por ora, no descontrole sobre o crime. Outro fator apontado também é a falta de preparo das instituições e agentes públicos, ou seja, não adianta (estar) no Código Penal e na Constituição, se os órgãos não recebem o preparo e assistência adequados.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O tráfico internacional de mulheres, é uma prática criminosa ilícita, que ocorre há décadas na sociedade. Se define pelo deslocamento de alguém para outro país com promessas de trabalhos e melhorias de vida. E ao chegar no destino, o passaporte e demais documentos são retidos e as vítimas são obrigadas a “trabalharem”, para obter lucro aos chefes.
O crime era descrito na Constituição, por meio da Lei 12.015 apenas como tráfico de mulheres, tendo sua alteração a partir de 2009, passando a subjugar por tráfico de pessoas, uma vez que, nesta modalidade, também são inseridos homens e crianças, embora as mulheres e crianças sejam os alvos favoritos das quadrilhas. A Lei 13.344, retrata os crimes que estão descritos para o Tráfico internacional de mulheres - dizem respeito a exploração sexual, prevenção e repressão do tráfico, proteção às vítimas etc. Além do Artigo 149, 149-A, do Código Penal, que em conjunto descrevem ao que se refere e os anos de pena para os crimes de tráfico de pessoas e analogia à escravidão.
O Protocolo de Palermo é um documento essencial, o qual foi criado para contribuir na prevenção, repressão e punir o tráfico de pessoas, por intermédio de medidas cabíveis que possam ser consideradas e adotadas para combater o crime organizado.
Conforme pode ser analisado nas literaturas, e nas principais leis, este tipo de crime torna-se difícil de ser combatido por diversos motivos: pouca divulgação na mídia para servir de alerta, medidas pouco eficientes, falta de diálogo entre os países, o despreparo de pessoas que trabalham nos órgãos responsáveis no combate, não investimento em políticas públicas, leis mais severas, quadrilhas que trabalham em conjunto com atividades que aparentam serem legais, entre outros.
Ainda mais complicado que as questões levantadas acima, é o problema socioeconômico que os países subdesenvolvidos vivem, refletindo diretamente na falta de oportunidades para as mulheres, que veem nos ‘trabalhos’ apresentados a elas como oportunidades. Nesse sentido, até mesmo os documentos e leis que descrevem formas de prevenção e repressão surtem como falhos. Embora, na Constituição e no Código Penal citem que as instituições, consulados e demais órgãos atuam em equipe, não se sabe se na prática existe a efetividade desse trabalho, ao observar que cada ano o número de vítimas de tráfico aumenta, os motivos são os mais aparentes, e a rentabilidade de mercado é o principal.
Com base no que foi examinado e discutido, é lícito afirmar que nossas considerações ao longo do texto pretendem ser, na medida do possível, uma contribuição, sobretudo na forma de alerta e objeto de estudos para as áreas interessadas no tema em questão e, principalmente do Direito Penal. Por último, sugere-se a discussão e mais notoriedade dos problemas ocasionados pelo crime de tráfico internacional, através de jornais, mídias, campanhas que as oriente, levando em consideração que as vítimas que passam por essas situações desconhecem do assunto, tem pouca informação, e precisam de proteção (antes ou depois de caírem nas armadilhas).
REFERÊNCIAS
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Bacharelanda no curso de Direito na Universidade Estadual do Tocantins (UNITINS).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Letícia Oliveira da. Tráfico internacional de mulheres para exploração sexual: um estudo sobre a aplicação das leis brasileiras Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 out 2022, 04:22. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/59634/trfico-internacional-de-mulheres-para-explorao-sexual-um-estudo-sobre-a-aplicao-das-leis-brasileiras. Acesso em: 04 dez 2024.
Por: Michel Lima Sleiman Amud
Por: Helena Vaz de Figueiredo
Por: Daniella de Pádua Walfrido Aguiar
Por: MARTINS, LEONARDO DE SOUZA.
Por: Willian Douglas de Faria
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