TANIRA ALVES NOVAES DE OLIVEIRA[1]
(orientadora)
RESUMO: O presente artigo tem como temática os crimes virtuais, uma vez que, durante a pandemia, houve um aumento considerável nos crimes cibernéticos, conforme levantamentos que serão demonstrados, em resposta a isso, houve a aprovação da lei n° 14.155/2021. Nesse sentido, é necessário compreender as evoluções legislativas, justificando a aprovação da mencionada lei, que apresenta respostas mais graves a crimes cometidos no âmbito virtual, tais como: invasão de dispositivo informático; furto eletrônico; estelionato eletrônico e atribui nova competência para o estelionato. Embora a mencionada lei traga novas penalidades ao crime cibernético, é necessário o investimento na área da tecnologia, visto que a investigação dos infratores é difícil, principalmente aqueles que cometem crimes no exterior, o que gera burocracias ao poder judiciário, dificultando a penalização do indivíduo mal-intencionado. Esse trabalho utiliza-se da abordagem exploratória a partir de uma análise dedutiva para seu desenvolvimento, uma vez que procura, em materiais de apoio, um aprofundamento no tema estudado, proporcionando uma certa familiaridade ao tema.
Palavras–Chave: Crimes cibernéticos. Legislação. Internet. Direito penal.
ABSTRACT: The present article has as its theme the virtual crimes, since, during the pandemic, there was a considerable increase in cybercrimes, according to surveys that will be shown, in response to this, there was the approval of law no. 14.155/2021. In this sense, it is necessary to understand the legislative evolutions, justifying the approval of the mentioned law, which presents graver answers to crimes committed in the virtual environment, such as: computer device invasion; electronic theft; electronic fraud and attributes a new competence to fraud. Although the aforementioned law brings new penalties for cybercrime, investment in technology is necessary, since investigating offenders is difficult, especially those who commit crimes abroad, which creates bureaucracy for the judiciary, making it difficult to penalize the criminal. This work uses an exploratory approach from a deductive analysis for its development, since it searches, in support materials, for a deepening in the studied theme, providing a certain familiarity to the topic.
Keywords: Cyber crimes. Legislation. Internet. Criminal law.
1 INTRODUÇÃO
O avanço tecnológico trouxe consigo uma variedade de ferramentas e possibilidades, um exemplo é a própria internet, que veio acompanhada com uma quantidade imensurável de recursos, possibilitando comunicação imediata, melhoria nas relações de consumo, entre outras melhorias.
Todavia, há também aqueles indivíduos mal-intencionados, os cibercriminosos, que tentam levar vantagens ilegais ao custo alheio. Dados levantados pelo FortiGuard Labs apontam que o Brasil é o segundo país que mais sofre ataques cibernéticos na América Latina, sendo que em 2021, teve um número incrível de 88,5 bilhões de tentativas de ataques cibernéticos, um aumento de quase 1000% se comparado ao ano anterior.
Tais crimes geraram um prejuízo devastador em todo o mundo, conforme consta no relatório elaborado pela Axur, o prejuízo com crimes virtuais em 2021 chegou a 6 trilhões de dólares, equivalendo a cerca de 3 vezes mais o PIB do Brasil em 2020, ainda, conforme a Cybersecurity Ventures, os danos de cibercrime podem chegar a 10,5 trilhões de dólares em 2025.
Desse modo, o presente artigo visa a análise da Lei n° 14.155/2021, apresentando as mudanças por ela oferecidas, simultaneamente, demonstrando a necessidade da lei em decorrência do aumento de crimes no âmbito virtual, principalmente aqueles resultantes da pandemia, tendo em vista a necessidade da adaptação das normas para que elas ofereçam penas mais graves ao menos como uma medida para desencorajar tais delitos.
2 A INTERNET E EVOLUÇÕES FACE AO CRIME CIBERNÉTICO
O crescente aumento da internet a tornou uma das áreas mais utilizadas, tornando-a praticamente de essencial uso diário, como a internet é uma das maiores revoluções históricas da humanidade, faz-se necessário a regulamentação para melhorias de relações sociais e inclusão social. Visto isso, a internet é um meio que conecta pessoas, celulares e computadores, facilitando a comunicação entre indivíduos.
Embora a internet seja uma evolução positiva na sociedade, ela traz consigo alguns problemas, que devido a sua velocidade de troca de informações e comunicações facilitou o acontecimento dos crimes cibernéticos.
Conforme o Professor Pinheiro (2000, p. 20):
Com a popularização da Internet em todo o mundo, milhares de pessoas começaram a se utilizar deste meio. Contemporaneamente se percebe que nem todos a utilizam de maneira sensata e, acreditando que a Internet é um espaço livre, acabam por exceder em suas condutas e criando novas modalidades de delito: os crimes virtuais.
Portanto, ao se analisar, as maiores discussões acerca da internet é sobre a regulamentação da mesma, pois com a popularização e em meio a uma quantia gigantesca de usuários, maior a necessidade de se estabelecer um código de conduta, tendo como analogia o automóvel, que se exige não só a habilitação mas também a obediência a um conjunto de normas obrigatórias, qual variam de multas até a perda da carteira de habilitação (PINHEIRO, 2014).
Nas palavras de Barbosa (2014):
(...) a conceituação do delito informático não é simples, pois envolve aspectos não apenas jurídicos, mas também de conceitos relacionados à área cibernética. De forma simples, pode-se afirmar que crimes informáticos são aqueles praticados mediante a obtenção indevida de dados – informações – que foram ou estão sendo processados por um terceiro.
Neste caso, para se classificar delito informático há de se observar como os dados expostos foram obtidos, em suma, invasão dos dados, sendo que Kerr (2011, p. 23) classifica delito informático “toda a ação típica, antijurídica e culpável, praticada contra ou através da transmissão, processamento e armazenamento automático de dados”.
Ainda, quanto a classificação dos delitos informáticos, Kerr (2011) separa em dois grupos, sendo eles, a violação dos sistemas de informática; a violação de outros bens jurídicos ou valores sociais, utilizando-se da informática como meio de cometer o ilícito.
Viana (2001, p. 35-51) elenca os crimes virtuais, classificando-os como: delitos informáticos impróprios; delitos informáticos próprios; delitos informáticos mistos e; delito informático mediato ou indireto:
Delitos Informáticos Impróprios são aqueles nos quais o computador é usado como instrumento para a execução do crime, mas não há ofensa ao bem jurídico inviolabilidade da informação automatizada (dados).
(...)
Delitos Informáticos Próprios são aqueles que o bem jurídico protegido pela norma penal é a inviolabilidade das informações automatizadas (dados).
(...)
Delitos Informáticos Mistos são crimes complexos em que, além da proteção da inviolabilidade dos dados, a norma visa a tutelar bem jurídico de natureza diversa.
(...)
Delito Informático Mediato ou Indireto é o delito-fim não informático que herdou esta característica do delito-meio informático realizado para possibilitar a sua consumação.
Quanto a violação de privacidade, a legislação brasileira teve um avanço positivo, sancionando a Lei n° 12.737/12, mais conhecida como “Lei Carolina Dieckmann”, tendo como estopim para a aprovação da lei o vazamento de fotos íntimas da atriz Carolina Dieckmann, que após mais de 10 anos de discussão, trouxe consigo quatro novos artigos. Sendo os mais relevantes a adequação do artigo 154 do Código Penal para tratar do crime de invasão digital, acrescentando consigo o artigo 154-A e 154-B e modificando os artigos 266 e 298 do Código Penal.
Posteriormente, no ano de 2014 foi sancionada a lei n° 12.965/14, conhecida como “Marco Civil da Internet”, criada para suprir as lacunas no sistema jurídico em relação aos crimes cometidos no âmbito virtual. Nas palavras de Oliveira (2017) “Os princípios que norteiam essa lei são liberdade, neutralidade e privacidade, e além disso estabelece garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil.”.
Era comum imaginar que a internet era denominada como “terra sem lei”, principalmente devido o anonimato, dessarte veio então a dedução de que o direito penal tradicional não era eficiente ao combate à criminalidade virtual, por conseguinte, as leis anteriormente mencionadas são uma evolução na punição de cibercrimes, adicionando novos tipos penais, cobrindo as lacunas que os cibercriminosos aproveitavam.
2.1 Dificuldades na aplicação de leis no âmbito virtual
Por mais que o ordenamento jurídico brasileiro esteja se adaptando a regulamentação no âmbito virtual, ainda há uma séria dificuldade na aplicação das leis no ciberespaço, visto que o espaço virtual não se limita apenas ao Brasil, mas sim em todo o globo, da mesma forma o avanço da tecnologia permite que os criminosos hajam de forma silenciosa e anônima.
Dessa forma, a regulamentação na rede mundial de computadores se torna difícil, justamente pelo fato de que alguém pode estar invadido um indivíduo do outro lado do planeta, dificultando na hora de processar os criminosos judicialmente, o que se agrava devido à falta de pessoal qualificado para investigações desse tipo.
No mesmo sentido existem os crimes que não possuem o devido enquadramento legal, o que por muitas vezes deixa o infrator sem a devida punição pelo crime, gerando a famosa sensação de que a internet é uma “terra sem lei”, aproveitando essa deixa, o legislador visa enquadrar algumas práticas antijurídicas à nova lei de crimes virtuais.
3 LEI 14.155/2021
O surgimento da pandemia tornou as pessoas mais ativas na internet, com muitos se adaptando ao meio digital. Por efeito da Covid-19, o isolamento social era a medida determinada, tornando a internet o principal meio de comunicação, ocorrendo assim a virtualização. Um exemplo disso é a educação a distância, estudantes que antes frequentavam as aulas presencialmente começaram a enfrentar as “aulas remotas”, do mesmo modo, muitos trabalhadores começaram a trabalhar em “home office”, aumentando drasticamente o tempo em que ficam no espaço virtual.
Diante o aumento dos usuários no ciberespaço, houve também o aumento significativo de crimes virtuais, conforme o relatório da Fortinet, o Brasil sofreu mais de 88,5 bilhões de tentativas de ataques cibernéticos em 2021, que comparado ao ano anterior, houve um aumento de mais de 950%.
Portanto, mediante o aumento de fraudes virtuais, o legislador brasileiro precisou fazer algo para dar uma freada nos crimes cometidos, a Lei n° 14.155/21 visa reprimir os crimes de maneira mais eficaz, sendo que tais condutais são recorrentes atualmente, portanto a mencionada lei traz uma série de normas que proporcionam sanções mais graves a condutas delituosas praticadas no âmbito virtual (LAI e MOURÃO, 2021).
Andreucci (2021) dispõe da mesma maneira:
A inovação legislativa veio em boa hora, já que o número de fraudes virtuais aumentou assustadoramente no Brasil, tendo o distanciamento social e a maior utilização de meios digitais para a realização de atividades pessoais e profissionais contribuído sobremaneira para o incremento desse resultado.
Por conseguinte, para proteger princípios basilares, como a privacidade e honra, e devido ao constante aumento de crimes virtuais, a mencionada lei se mostrou necessária, com penas mais rigorosas para ajudar na punição de crimes cibernéticos que a seguir se descrevem.
3.1 Invasão de dispositivo informático
É plausível deduzir que qualquer dispositivo que tenha a capacidade de armazenar e processar automaticamente informações/programas está incluso no conceito de dispositivo eletrônico, tais como: notebook, computador, tablet, smartphone, etc. Ainda, não é necessário que o dispositivo esteja conectado na internet (CUNHA, 2021).
A nova lei vem com alterações ao artigo 154-A do Código Penal, excluindo a necessidade de a invasão ser fruto de “violação indevida de mecanismo de segurança”, nas palavras da doutrinadora Pinheiro (2010, p. 46):
Podemos conceituar os crimes virtuais como sendo as condutas de acesso não autorizado a sistemas informáticos, ações destrutivas nesses sistemas, a interceptação de comunicações, modificações de dados, infrações os direitos de autor, incitação ao ódio e descriminação, chacota religiosa, transmissão de pornografia infantil, terrorismo, entre diversas outras formas existentes.
Dessa forma, caso o dispositivo, alvo da invasão, for acessado de forma que não necessite da quebra de segurança, estará amparado pela lei, um exemplo seria o usuário deixa seu dispositivo ligado e, enquanto está ausente alguém aproveita a sua ausência e invade as informações sem a devida autorização do usuário estaria cometendo o ilícito descrito no artigo em estudo, vale ressaltar que a consumação sucede com a efetiva invasão do dispositivo, mesmo se o invasor não obter, adulterar ou destruir os dados da máquina.
Portanto, mesmo não havendo estratégias de invasão bem como os crackers, que Prado, Carvalho e Carvalho (2014, p. 863) define cracker como o indivíduo que invade sistema de computador de outra pessoa, superando senhas ou licenças em programas de computadores, ou mesmo de outras formas, a conduta se mantém tipificada, visto que o invasor alcançou seu objetivo, o que antes era de certa forma ineficaz caso o invasor não empregava técnica especial para concretizar a invasão, além de que, para o crime se consumar era necessário a invasão ser “virtual”, de certa forma trazia uma ineficácia a aplicação da norma, visto que a norma tem como intuito a preservação da vida privada e intimidade.
Do mesmo modo, houve uma majoração na pena prevista no caput, que antes era de 3 meses a 1 ano de detenção, passando a ser de 1 a 4 anos de reclusão, deixando de ser crime de menor potencial ofensivo (artigo 61 da Lei n° 9.099/95) passando a ser crime de médio potencial ofensivo, ainda que admita outros benefícios, como a suspensão condicional do processo, previsto no artigo 89 da mesma lei e, acordo de não persecução penal, artigo 28-A do CPP. Visto que a pena para o crime supramencionado foi agravada, permitindo agora a reclusão, é possível o cumprimento da sanção em regime inicialmente fechado em caso de reincidência, qualificadora ou se contar com causa de aumento da pena.
3.2 Furto qualificado pela fraude eletrônica
Inicialmente é necessário entender a fraude, e nas palavras de Gonçalves (2011, p. 337) “Fraude é qualquer artifício, engodo, ardil ou artimanha utilizados pelo agente durante o contexto fático do delito a fim de viabilizar a subtração.”, portanto há de se imaginar que existem inúmeras formas de fraudar algo, no caso o sujeito ativo consegue enganar o sujeito passivo para cometer o ilícito contra ele, sem praticar nenhuma agressão ou ameaça, por conseguinte entende-se que o furto mediante fraude se dá no momento em que o criminoso se aproveita da falta de vigilância da vítima para subtrair bens ou valores para si, sem a percepção da vítima.
Com o aumento de usuários conectados, simultaneamente com a gama de recursos e serviços eletrônicos oferecidos em todos os segmentos, foi-se criando um ambiente vulnerável em que milhares de pessoas se tornaram alvos fáceis e recorrentes de criminosos capazes na exploração dessas circunstâncias. Houve ainda um aumento considerável dos casos de fraude eletrônica, principalmente devido à pandemia, já que obrigava as pessoas a se isolar, passando a utilizar de forma mais regular os serviços eletrônicos (CUNHA, 2021).
Diante disso, houve a necessidade do legislador criar uma qualificadora ao crime de furto mediante fraude, o qual foi concebida pela Lei n° 14.155/21, previsto no artigo 155, §4°-B do Código Penal, com a seguinte redação:
Art. 155. (...)
§ 4º-B. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se o furto mediante fraude é cometido por meio de dispositivo eletrônico ou informático, conectado ou não à rede de computadores, com ou sem a violação de mecanismo de segurança ou a utilização de programa malicioso, ou por qualquer outro meio fraudulento análogo.
O presente parágrafo se dá principalmente devido ao aumento de fraudes virtuais na época da pandemia, havendo o crescimento de pessoas on-line na prática de ocupações profissionais e pessoais, favorecendo a ampliação dos delitos on-line (ANDREUCCI, 2021).
Ao analisar a qualificadora, percebe-se que o legislador quis a abranger da maior forma possível, visto que pouco importa a maneira que o agente comete a fraude, pois independente da forma, se for meio fraudulento que envolva dispositivo eletrônico ou informático, o criminoso pratica o ato previsto na qualificadora (CUNHA, 2021).
A referida lei traz também as causas de aumento da pena, sendo elas:
Art. 155. (...)
§ 4º-C. A pena prevista no § 4º-B deste artigo, considerada a relevância do resultado gravoso:
I – aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado mediante a utilização de servidor mantido fora do território nacional;
II – aumenta-se de 1/3 (um terço) ao dobro, se o crime é praticado contra idoso ou vulnerável.
Segundo o parecer do relator Cunha (2020), em relação ao projeto de lei n° 4554, a elevação da pena, quando é praticado em desfavor ao idoso se justifica diante do contexto específico, quando o crime é praticado contra o vulnerável, se dá principalmente devido à repercussão social e familiar que causa, extraindo a orientação do termo vulnerável o previsto no caput e parágrafo primeiro do artigo 217-A do Código Penal, ou seja, os menores de 14 anos e aqueles que por enfermidade ou deficiência mental, não tem pleno discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.
Destaca-se que o aumento de pena ante o idoso ocorre justamente por ser alvo fácil para os cibercriminosos, o conceito pode-se estender aos vulneráveis. Da mesma forma, quando o crime é praticado por servidores além do território nacional, são geralmente mais graves, justificando o aumento potencial da pena, entretanto, para tal, é necessário a relevância do resultado gravoso, considerando os prejuízos que o ato causa a vítima (BRASIL, 2020).
Vale lembrar que para elevar a pena utilizando-se das majorantes, é necessário o conhecimento do autor sobre as circunstâncias da vítima.
3.3 Estelionato eletrônico
Concomitantemente, a Lei n° 14.155/21 inseriu nova modalidade de estelionato, caso a fraude seja cometida com o emprego de informações concebidas pela vítima ou por terceiro induzido a erro através de redes sociais, contatos telefônicos ou envio de correio eletrônico, ou outro meio fraudulento análogo, elevando as penas, se comparado ao estelionato previsto no caput do artigo 171 (BRASIL, 2014).
Ainda, de acordo com Gonçalves (2011, p. 338), a fraude pode se dar de modo aperfeiçoado (estelionato), podendo o cibercriminoso criar um site falso a fim de enganar a vítima, imitando o banco da mesma, fazendo-a pensar ser o site do banco verdadeiro, da qual digitam o número da conta-corrente e senha, que em seguida os criminosos poderão sacar o dinheiro da conta sem a devida autorização.
Ademais, Andreucci (2021) define o estelionatário como aquele que, pratica a conduta típica para obter a vantagem ilícita, isto é, aquele que consegue obter o proveito do crime, em prejuízo alheio, que atinge o patrimônio da vítima, induzindo ou mantendo a vítima em erro, utilizando-se de artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento.
Deste modo, preceitua a lei n° 14.155/21 acerca do estelionato mediante fraude:
Art. 171. (...)
Fraude eletrônica
§ 2º-A. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se a fraude é cometida com a utilização de informações fornecidas pela vítima ou por terceiro induzido a erro por meio de redes sociais, contatos telefônicos ou envio de correio eletrônico fraudulento, ou por qualquer outro meio fraudulento análogo.
§ 2º-B. A pena prevista no § 2º-A deste artigo, considerada a relevância do resultado gravoso, aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado mediante a utilização de servidor mantido fora do território nacional.
Estelionato contra idoso ou vulnerável
§ 4º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) ao dobro, se o crime é cometido contra idoso ou vulnerável, considerada a relevância do resultado gravoso.
Observa-se que mantém a lógica do furto qualificado pela fraude eletrônica quanto as majorantes previstas nos parágrafos 2°-B e 4° do mencionado artigo, considerando a relevância do resultado gravoso.
3.4 Nova competência para o caso de estelionato
Existia uma divergência grande em relação à competência do estelionato, antes do novo dispositivo, o que gerava confusões acerca da competência, nos dizeres de Cavalcante (2021) “pode acontecer de a vantagem ilícita ocorrer em um local e o prejuízo em outro. Tais situações poderão gerar algumas dúvidas relacionadas com a competência territorial para processar e julgar esse crime.”
A nova redação do dispositivo legal, situada no artigo 70 do Código de Processo Penal, estabelece que:
Art. 70. (...)
§ 4º Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção.
Diante disso, para por um fim na discussão da competência, visando obter uma eficiência melhor nos casos de estelionato, o legislador atribui a competência ao local do domicílio da vítima nos crimes cometidos mediante depósito, emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme o artigo apresentado, observa-se que a medida legislativa veio em momento oportuno, visto que a situação dos crimes cibernéticos estavam se agravando de forma descontrolada, e mediante isso o prejuízo causado, nesse caso, a lei pretende parear as penas com a gravidade do crime.
Nesse sentido, a lei n° 14.155/21 vem como uma medida para evitar que os crimes virtuais se alastrem ainda mais, dado que as previsões indicam que o prejuízo por crimes virtuais podem chegar a 10,5 trilhões de dólares em 2025 no mundo.
Dessa forma, como medida de contornar as previsões, o vigor da nova lei traz uma segurança jurídica melhor em comparação com a redação da lei anterior, no sentido que a nova lei não veio apenas para agravar as penas já previstas, mas também para preencher lacunas, que antes poderiam ser exploradas pelos criminosos.
Todavia, mesmo a lei trazendo certa comodidade, ainda é difícil aplicar a lei no ambiente virtual, visto que as conexões ampliam-se ao nível mundial, portanto, é possível uma pessoa no Brasil ser vítima de crime cibernético cometido no estrangeiro, gerando assim uma séria burocracia para encontrar o indivíduo mal-intencionado, o que por muitas vezes leva à impunidade.
Ainda há hipóteses de crimes não codificados, pois conforme a sociedade evolui, os meios tecnológicos evoluem na mesma medida, e como é sabido, não há crime sem lei anterior que o defina, portanto, não há a devida proteção do bem jurídico ofendido, o que pode acabar levando a impunidade ou pena muito branda para os ofensores.
Assim, embora o ordenamento jurídico brasileiro esteja evoluindo para proteger seus cidadãos de forma mais eficaz com a aprovação de leis específicas que regem as relações virtuais, há também que se investir em tecnologia, principalmente para prevenir situações como a impossibilidade de penalizar o infrator, por ser de difícil identificação, visto que muitas vezes os crimes cometidos não deixam rastros aparentes.
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[1] Professor Orientador. Especialista em Direito Penal pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus. Possui graduação em Direito pelo Instituto de Ensino Superior do Sul do Maranhão (2015), graduação em Pedagogia pela Universidade do Estado da Bahia (2006), graduação em andamento em matemática pela Universidade de Pernambuco. E-mail: [email protected]
graduando em Direito pela Unisulma/IESMA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Marcos Vinicius da Silva. Crimes Cibernéticos: alterações da lei n° 14.155/21 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 out 2022, 04:42. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/59646/crimes-cibernticos-alteraes-da-lei-n-14-155-21. Acesso em: 04 dez 2024.
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