Resumo: O presente trabalho pretende analisar o instituto da tutela provisória previsto no Código de Processo Civil Brasileiro (CPC), e algumas das implicações decorrentes da concessão da referida tutela em lides tributárias. A tutela provisória tem fundamento constitucional e decorre dos princípios do acesso à justiça, da efetividade da tutela jurisdicional e do devido processo legal. Neste sentido, enquanto tutela, trata-se de instituto diferenciado por estar diretamente relacionado a efetividade do processo. No caso específico do contencioso tributário, o autor do pedido de tutela de urgência deverá demonstrar a urgência do seu pleito, geralmente caracterizada pela iminência de sua inscrição na dívida ativa e Execução Fiscal, bem com todos os danos e prejuízos a serem suportados pelo contribuinte decorrentes de cobrança de crédito tributário indevido. Já para a tutela de evidência o contribuinte deverá demonstrar a ocorrência de uma das situações previstas no inciso 311 do CPC. Dito isto, serão feitas ao longo do trabalho reflexões sobre o pedido de tutela de urgência (e suas espécies) e de evidência em processos tributários.
Palavras-chave: Tutela Jurisdicional. Tutela Provisória. Processo Tributário. Código de Processo Civil.
Abstract: This paper aims to analyzes the institute of preliminary injuction provided for in the Brazilian Civil Procedure Code (CPC), and some of the implications arising from the granting of such guardianships in tax disputes. The preliminary injuction has a constitutional foundation that stems from the principles of access to justice, the effectiveness of judicial protection and due process of law. In this sense, as a provisional, it is a differentiated institute considering that it is directly related to the effectiveness of the process. In the specific case of tax disputes, the taxpayer of the preliminary injuction must demonstrate the urgency of his claim, generally characterized by the imminence of his registration in the active debt and Tax Enforcement, as well as all damages and losses to be borne by the taxpayer. For the protection of evidence, the author must demonstrate the occurrence of a situation provided for in article 311 of the CPC. That said, reflections will be made throughout the work on the request for preliminary injuction (and its types) and on evidence in tax proceedings.
Keywords: Judicial Protection. Preliminary Injuction. Tax Law Procedure. Civil Procedure Code.
1. INTRODUÇÃO
O processo judicial tributário não se resume a Ação de Execução Fiscal uma vez que existem outras ações, de iniciativa do fisco (ações exacionais) e também de iniciativa do contribuinte (ações antiexacionais).
É cediço o entendimento de que “um dos elementos essenciais do processo é a sua duração. Assim, quando a duração do processo se estende, começa a existir o perigo efetivo de que o pronunciamento final chegue tarde demais e já não seja mais efetivo para a parte que o requereu. É justamente neste ponto que deve ser garantida a utilidade da decisão final por meio de medidas antecipatórias e cautelares.”[1]
A tutela provisória tem fundamento constitucional que decorre dos princípios do acesso à justiça, da efetividade da tutela jurisdicional e do devido processo legal. A tutela jurisdicional deve ser a mais célere e efetiva possível, sem deixar de garantir o contraditório e a ampla defesa.[2]
Tem, então, o condão de reestabelecer o equilíbrio entre as partes, como nos ensina Nelson Luiz pinto:
A antecipação de tutela apresenta-se, neste aspecto, não apenas como um meio para assegurar o resultado efetivo e satisfatório da prestação jurisdicional, mas também como forma de assegurar o equilíbrio, a igualdade processual, a identidade de armas e de poderes, visando a propiciar um verdadeiro contraditório, sem que uma das partes se veja impossibilitada de litigar, assegurando o resultado do processo em razão da desproporcionalidade de condições e de poderes entre os litigantes, em decorrência. principalmente, de pressões econômicas e de ameaças, verdadeira coação do litigante "mais forte" sobre o "mais fraco"[3]
Consta na exposição de motivos do Código de Processo Civil Brasileiro de 2015 (CPC), que “sendo ineficiente o sistema processual, todo o ordenamento jurídico passa a carecer de real efetividade”.
O CPC alterou a sistemática das tutelas provisórias – estas são espécie de tutela jurisdicional (que possui aptidão para satisfazer, assegurar a pretensão do autor de maneira liminar) e são baseadas em cognição sumária.
Luiz Guilherme Marinoni afirma que “a tutela deve expressar a necessidade do direito material e, em outros termos, reflete o bem da vida buscado pelo jurisdicionado.”[4]
Conforme preceitua o CPC, a tutela provisória pode ser entendida como “o conjunto de técnicas que permite ao magistrado, na presença de determinados pressupostos, que gravitam em torno da presença da “urgência” ou da “evidência”, prestar tutela jurisdicional, antecedente ou incidentalmente, com base em decisão instável (por isso, provisória) apta a assegurar e/ou satisfazer, desde logo, a pretensão do autor, até mesmo de maneira liminar, isto é, sem prévia oitiva do réu.”[5]
Neste sentido, as tutelas provisórias – enquanto tutela diferenciadas por estarem relacionadas a efetividade do processo, contemplam tanto a “existência de procedimentos específicos voltados a atender as peculiaridades de dada relação jurídica material, quanto a regulamentação de tutelas sumárias típicas, precedidas de cognição exauriente e destinadas a evitar que o tempo possa comprometer o resultado do processo.”[6]
A tutela provisória, enquanto modalidade de tutela diferenciada, essencialmente marcada pelo fator tempo[7], é concedida com base em cognição sumária, ou seja, sujeitas a posterior confirmação ou retificação do Magistrado, não estando, pois, sujeitas aos efeitos do instituto da coisa julgada material.
Em relação a tutela provisória, o legislador de 2015 resguardou duas diferentes situações. A primeira em relação a situações de urgência (quando houver perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo) e em relação a constatação do direito alegado de plano.
António Santos Abrantes Geraldes traz a seguinte lição:
"Entre uma decisão, porventura mais segura, mas tardia e uma outra, mais célere e eficaz, apesar de fundada num critério de julgamento menos rigoroso e, por isso, potenciador de maiores riscos de insegurança, o legislador não hesitou em dar prevalência à celeridade, em situações em que os prejuízos emergentes da demora do processo definitivo superem os que resultem da concessão da medida cautelar"[8]
Ainda segundo Jose Roberto dos Santos Bedaque “Em substituição ao longo processo de cognição plena. com todas as garantias a ele inerentes, surge a ideia de uma tutela mais rápida. com cognição limitada. que possibilite à parte obter antecipadamente o resultado da atuação jurisdicional. Afirma-se, mesmo, que o futuro do processo civil será dominado pelos provimentos urgentes e provisórios”[9]
Assim, a tutela provisória pode ser de urgência ou de evidência. A primeira poderá ser concedida de forma cautelar ou antecipada, podendo ocorrer de forma antecedente ou incidental e tendo a urgência como pressuposto para seu deferimento sendo que ambas possuem como fundamento o perigo da demora do provimento jurisdicional. A segunda é cabível nas hipóteses previstas no art. 311 do CPC.
A tutela cautelar terá como objetivo assegurar o direito do autor, enquanto que a tutela antecipada objetiva justamente a antecipação do direito pleiteado. Nesta linha, é o entendimento de Cassio Scarpinella Bueno:
Assim, para evitar as discussões, riquíssimas e abundantes no CPC de 1973, mas que, em termos de prática de processo, isto é, de realização e proteção efetiva de direitos são de questionável utilidade e, com isto, celebrar o que é novo, indo além da mera nomenclatura, a tutela provisória cautelar merece ser compreendida como as técnicas que buscam assegurar o resultado útil do processo. A tutela provisória antecipada, por sua vez, são as técnicas que permitem satisfazer, desde logo, a pretensão do autor.[10]
No processo tributário, o autor do pedido de tutela de urgência deverá demonstrar a urgência do seu pleito, geralmente caracterizada pela iminência de sua inscrição na dívida ativa e Execução Fiscal, bem com todos os danos e prejuízos a serem suportados pelo contribuinte.
A concessão da tutela provisória de urgência será justificada pela existência de:
“a) dano concreto: aquele certo e não hipotético; b) dano atual: o iminente ou que já está ocorrendo; c) dano grave: de grande ou média intensidade e que tenha aptidão para perturbar ou impedir a fruição do direito; d) dano irreparável ou de difícil reparação: as consequências são impossíveis ou de extrema dificuldade para serem reparadas.”[11]
Assiste razão a afirmação de Marcos Destefenni ao dizer que “o direito de acesso à jurisdição estatal também significa direito à obtenção de uma tutela jurisdicional efetiva, prestada em prazo razoável, quer dizer, sem dilações indevidas.”[12]
2. TUTELA PROVISÓRIA ANTECIPADA NO PROCESSO TRIBUTÁRIO
O CPC divide a tutela de urgência em tutela de urgência antecipada e tutela de urgência cautelar, que podem ser pleiteadas de forma antecedente ou incidental nos termos do art. 294, parágrafo único, do CPC.
Claudio Carneiro esclarece que “a tutela antecipatória visa satisfazer uma situação que não pode esperar até o pronunciamento final, sob pena de tornar ineficaz a tutela definitiva.”[13] O objetivo é, portanto, proteger o direito que está em perigo frente a demora da prestação jurisdicional, antecipando parcial ou totalmente o direito pleiteado.
O principal fundamento da antecipação de tutela é o fator tempo. Na hipótese de a tutela antecipada ser requerida em caráter antecedente, a petição inicial deverá ser aditada no prazo previsto no CPC sendo que o não aditamento da petição implica a extinção do processo sem julgamento de mérito.
O CPC simplificou os procedimentos para a concessão de tutela antecipada. O art. 303 do CPC preceitua que ao ajuizar ação de rito comum, poderá o autor verificar que sua demanda é urgente a partir da existência de perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo:
Art. 303. Nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, a petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo.
§ 1º Concedida a tutela antecipada a que se refere o caput deste artigo:
I - o autor deverá aditar a petição inicial, com a complementação de sua argumentação, a juntada de novos documentos e a confirmação do pedido de tutela final, em 15 (quinze) dias ou em outro prazo maior que o juiz fixar;
II - o réu será citado e intimado para a audiência de conciliação ou de mediação na forma do art. 334 ;
III - não havendo autocomposição, o prazo para contestação será contado na forma do art. 335 .
[...]
Em relação ao CPC de 1973, a diferença é que na tutela antecipada antecedente há a possibilidade de estabilização da decisão que a defere, que se dará quando a decisão que a deferiu não for atacada por recurso do réu, nos termos do art. 304 do CPC:
A tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303 , torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso.
Aqui não haverá coisa julgada, sendo que os efeitos da decisão estabilizada poderão ser afastados através de ação que pleitear a revisão, reforma ou invalidação da tutela antecipada estabilizada, que deverá ser proposta no prazo de 2 (dois) anos por quaisquer das partes interessadas.
Em lides tributárias que buscam em última análise a extinção da relação tributária, a estabilização não se verifica uma vez que a tutela antecipada somente suspenderá a exigibilidade do crédito tributários, nos termos do art. 151 do Código Tributário Nacional (CTN, sendo certo que a extinção do crédito tributário somente se verifica nas hipóteses previstas no art. 156 do CTN.
Existem ainda outras situações em que a estabilização da tutela antecipada é de difícil verificação tendo em vista que é pouco comum que a procuradoria deixe de recorrer de decisões que lhe forem contrárias.
O exemplo supramencionado é comumente aplicável a alíquota da Cofins incidente sobre insumos utilizados na área da saúde, isto porque de acordo com o § 3º do art. 2º da Lei n. 10.833, de 2003, com redação dada pela Lei n. 11.196, de 2005, o Poder Executivo poderá reduzir a zero a alíquota da COFINS sobre a receita de alguns insumos utilizados na área da saúde.[14]
Assim, o Poder Executivo está autorizado a reestabelecer, via decreto, o percentual que foi reduzido, o que é diferente de majorar o percentual da alíquota. Frente a possível violação ao § 3º do art. 2º da Lei n. 10.833, de 2003, poderá o contribuinte ingressar com o pedido de tutela antecipada na forma do art. 303 do CPC, pleiteando a inexigibilidade do pagamento da Cofins com a alíquota majorada.[15]
Neste caso, em relação aos requisitos da tutela antecipada, nos termos do art. 303 do CPC, a urgência resta demonstrada perante a iminência do lançamento do tributo com a alíquota majorada. A demonstração do perigo de dano e risco ao resultado útil do processo reside no fato de que somente com a concessão da tutela antecipada o contribuinte não será prejudicado com a majoração indevida da COFINS.
3. TUTELA PROVISÓRIA CAUTELAR NO PROCESSO TRIBUTÁRIO
A tutela cautelar antecedente tem sua disciplina previstas nos arts. 305 a 310 do CPC e tem como fundamento a preservação de direito objeto de discussão, tendo como objetivo evitar danos e principalmente garantir o resultado útil do processo.
Nas palavras de Claudio Carneiro a “tutela provisória de urgência de natureza cautelar presta-se para acautelar o estado de pessoa ou coisa, assegurando o resultado útil do processo.”[16]
Tendo em vista que a distinção entre a tutela antecipada e tutela cautelar é uma zona cinzenta, o legislador do CPC previu a aplicação do princípio da fungibilidade das formas, de modo que o juiz poderá receber como tutela cautelar o requerimento de tutela antecipada, e vice-versa, nos termos do parágrafo único do art. 305 do CPC.
Nos termos do art. 305 do CPC “a petição inicial da ação que visa à prestação de tutela cautelar em caráter antecedente indicará a lide e seu fundamento, a exposição sumária do direito que se objetiva assegurar e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.”
Caberá ao requerente o aditamento da inicial no prazo de 30 dias da efetivação da tutela cautelar deferida sendo que o não aditamento da petição implica a perda da eficácia da cautela anteriormente concedida.
Exemplo típico de tutela cautelar em processo tributário é a hipótese de pleito do contribuinte que objetiva a anulação de auto de infração que cobra tributo de maneira indevida tendo em vista sua inexigibilidade nas hipóteses de imunidade. Nestes casos a autoridade fiscal não tem legitimidade para constituir o crédito tributário por meio do lançamento de ofício via auto de infração, e consequentemente tornar o crédito tributário exigível pelo fisco.
Ao ser autuado, poderá o contribuinte apresentar impugnação pela via administrativa ou poderá ainda optar por levar tal demanda para apreciação pelo poder judiciário. Em matéria tributária, a motivação do pedido de tutela cautelar é, na maioria das vezes, justamente a ameaça de inscrição em dívida ativa de crédito tributário indevido.
De forma recorrente, em lides tributárias, a diferença em relação a tutela antecipada é que nesta o contribuinte pretende a suspensão da exigibilidade do crédito tributário ainda não lançado, pretendendo então a antecipação do reconhecimento do seu direito de não pagamento de exação indevida.
Diz-se que “a tutela cautelar se tornou meramente instrumental, já que não possui fim em si mesma, isto é, está atrelada a um processo principal e, por isso, não visa satisfazer concretamente a pretensão do autor, mas sim assegurar o resultado útil e eficaz do provimento jurisdicional definitivo.”[17]
Em lides tributárias, o objetivo da tutela cautelar é proteger o direito principal de alegar a nulidade do lançamento tributário. Nos ensinamentos de Luiz Guilherme Marioni:
A tutela cautelar é direito da parte, correlacionado com o próprio direito à tutela do direito. Em razão deste direito, a jurisdição tem o dever de dar tutela cautelar à parte que tem o seu direito à tutela do direito submetido a perigo de dano.
O titular do direito ao ressarcimento, que vê o infrator se desfazer dos seus bens para futuramente não poder ser alcançado pela execução, tem ameaçado o seu direito à tutela ressarcitória e, por isso, tem direito à tutela de segurança (cautelar) da tutela ressarcitória.
Ora, da mesma forma que tem dever de prestar tutela ressarcitória, a jurisdição tem dever de conceder tutela que seja capaz de garantir a efetividade da tutela ressarcitória.
Em outros termos, a jurisdição tem o dever de tutelar o direito provável – ameaçado por dano – à tutela do direito (p. ex., tutela ressarcitória). [18]
Em última análise, o que o autor pretende é que seja concedida tutela cautelar que impeça a Fazenda Pública de prosseguir nos atos legais para a consumação do pagamento do crédito tributário. [19]
No caso específico daqueles que desenvolvem atividade empresária, o perigo de dano é evidente frente aos efeitos da inscrição em dívida ativa, bem como a negativação do nome do contribuinte frente aos órgãos de proteção de crédito e em cadastros tributários (Cadin), óbice a emissão de CDA, impossibilidade de celebrar contratos com o poder público, entre outros. O requisito da urgência aqui se materializa pelo risco de dano irreparável ou de difícil reparação uma vez que as constrições decorrentes da cobrança de créditos tributários indevidos prejudicam e em alguns casos, inclusive, inviabilizam a realização de atividade empresarial, gerando reflexos em toda a sociedade, com redução da quantidade de empregos, da geração de renda e inclusive da própria arrecadação.
Em relação ao resultado útil do processo, nos termos do art. 310 do CPC, o indeferimento da tutela não obsta que o autor siga com o pedido principal, excetuadas as hipóteses de indeferimento da tutela pelo reconhecimento de decadência ou de prescrição.
4. TUTELA PROVISÓRIA DE EVIDÊNCIA NO PROCESSO TRIBUTÁRIO
A tutela provisória de evidência, enquanto provimento de natureza provisória, visa o atendimento imediato do pedido do Autor frente a notória presença do seu direito.
Hugo de Brito Machado Segundo didaticamente esclarece que “presente, de forma muito intensa, a fumaça do bom direito, o juízo defere a tutela provisória, mesmo que não haja forte perigo da demora. É o que subjaz, a propósito, à figura das tutelas provisórias de evidência.” [20]
A tutela de evidência tem previsão descrita no art. 311 do CPC, que determina seu cabimento nas seguintes hipóteses:
Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:
I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;
II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;
III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa;
IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.
Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.
A tutela de evidência visa afastar de maneira provisória situação incompatível com as normas de direito material. Neste sentido, Humberto Theodoro Junior afirma que:
“A tutela de evidência não se funda no fato da situação geradora do perigo de dano, mas no fato de a pretensão de tutela imediata se apoiar em comprovação suficiente do direito material da parte. justifica-se pela possibilidade de aferir a liquidez e certeza do direito material, ainda que sem o caráter de definitividade, já que o debate e a instrução processuais ainda não se completaram.[ ... ]
Mesmo abstraindo o risco de dano material imediato, a tutela de evidência parte do princípio de que a duração do processo não deve redundar em maior prejuízo para quem já demonstrou, satisfatoriamente, melhor direito dentro do conflito material a ser no final composto por provimento definitivo .”[21]
Assim, na tutela de evidência a urgência não é o requisito fundamental para a concessão e sim a plausibilidade das alegações ou provas apresentadas pelo autor.
A previsão contida no inciso I é recorrente em lides tributárias em que o contribuinte alega abuso do direito de defesa pela Fazenda, que, embora presente, pode não ficar patente para o magistrado, cabendo ao autor requerer a tutela de evidência.[22]
O inciso II também é recorrente em processos tributários quando não resta alternativa ao contribuinte senão ingressar com pedido judicial pleiteando a suspensão da exigibilidade de tributo no qual os tribunais superiores firmaram tese pela sua não incidência.
A previsão do inciso IV encontra exemplo na seara tributária quando, em sede de ação anulatória, a Fazenda se vê incapaz de rebater alegação de nulidade do lançamento do crédito tributário.
Sobre o tema, Eduardo Arruda Alvim tece as seguintes considerações:
“A tutela provisória da evidência caracteriza-se, dessa forma, como um mecanismo de redistribuição do ônus do tempo processual. Caracterizada a probabilidade do direito e presente alguma das hipóteses dos incisos do art. 311 do CPC/2015, o peso do tempo do processo será transferido do autor (que antes deveria aguardar todo o trâmite processual, até final decisão de mérito) para o réu (que se verá privado do bem da vida provisória e antecipadamente). São situações de direto material em que evidentemente não faria sentido privar o autor da tutela imediata.”[23]
5. EXIGÊNCIA DE CAUÇÃO PARA CONCESSÃO DA TUTELA
O §1º do art. 300 do CPC, autoriza a exigência pelo juiz de "caução real ou fidejussória idônea" para a concessão de tutela provisória fundamentada na urgência:
§ 1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
Referido dispositivo assegura o correlato direito de o contribuinte antecipar-se e oferecer caução, de modo a resguardar-se em relação as constrições decorrentes da inadimplência.
Nesta hipótese e tratando-se de lide tributária, o contribuinte não pleitearia a suspensão da exigibilidade do crédito tributário mediante a apresentação de caução, na contramão da jurisprudência sedimentada no Superior Tribunal de Justiça.
O pleito do contribuinte objetivaria a concessão da tutela de urgência, tendo em vista a presença dos requisitos processuais da urgência e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, mediante a apresentação de caução como contracautela de eventuais danos, e consequente suspensão da exigibilidade do crédito tributário, nos termos do art. 151. Inciso V do CTN.
Dessa forma, tendo em vista a possibilidade de apresentação de caução como contracautela com o objetivo de garantir eventuais danos à Fazenda e, restando demonstrado a probabilidade do direito e o perigo da demora no caso concreto, o contribuinte poderá requerer a concessão de tutela de urgência, esta que poderá ser revogada sem causar nenhum prejuízo a Fazenda.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O CPC de 2015 buscou operacionalizar a efetividade na prestação da tutela jurisdicional.
A tutela provisória é concedida com base em cognição sumária, ou seja, pende sobre ela posterior confirmação ou retificação do Magistrado, não estando, pois, sujeita aos efeitos do instituto da coisa julgada material.
Nos termos do art. 294 do CPC, as tutelas provisórias podem se fundamentar em evidência ou urgência, sendo que estas podem ter natureza cautelar ou antecipada, podendo ser requerida em caráter antecedente ou incidental.
A tutela provisória de evidência, enquanto provimento de natureza provisória, visa o atendimento imediato do pedido do Autor frente a notória presença do seu direito.
No processo tributário, o autor do pedido de tutela de urgência deverá demonstrar a urgência do seu pleito, geralmente caracterizada pela iminência de sua inscrição na dívida ativa e Execução Fiscal, bem com todos os danos e prejuízos a serem suportados pelo contribuinte.
Estando presentes os requisitos que autorizam o deferimento da tutela de urgência, quais sejam, o perigo de dano e risco ao resultado útil do processo, é incorreto condicionar tal deferimento à realização de caução.
Referida situação ocasionaria uma dupla inconstitucionalidade, primeiro ao restringir o acesso aos tribunais e em segundo ao violar o princípio da igualdade, discriminando-se em relação a contribuintes com menores recursos.
Em lides tributárias, a estabilização da tutela antecipada é de difícil verificação tendo em vista que é pouco comum que a procuradoria deixe de recorrer de decisões que lhe forem contrárias.
Em relação a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, a tutela e a caução estão previstas em incisos distintos do art. 151 do CTN, e condicionar a concessão de liminares ao depósito implica, logicamente, tornar inexistente referidos provimentos judiciais.
O §1º do art. 300 do CPC assegura o correlato direito de o contribuinte antecipar-se e oferecer caução, de modo a resguardar-se em relação as constrições decorrentes da inadimplência.
Tendo em vista a possibilidade de apresentação de caução como contracautela que tem com o objetivo garantir eventuais danos à Fazenda e, restando demonstrado a probabilidade do direito e o perigo da demora no caso concreto, o contribuinte poderá requerer a concessão de tutela de urgência.
Caberá ao contribuinte analisar o que é mais viável frente ao caso concreto: (i) a distribuição de ação de rito ordinário com pedido de tutela provisória ou (ii) a impetração de mandado de segurança no qual poderá ser deferida medida liminar.
A escolha do contribuinte dependerá de uma série de variáveis das quais destacam-se: o decurso de prazo superior a 120 dias da data da prolação do ato impugnado e a necessidade de dilação probatória, o que excluiria a opção pelo mandado de segurança.
REFERÊNCIAS
- BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização). 4. Ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2006.
- BRASIL. Constituição Federal. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
- BRASIL. Código Tributário Nacional. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm
- BRASIL. Código de Processo Civil. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm
- BUENO, Cassio Scarpinella, Manual de direito processual civil - volume único. 8 ed. São Paulo: Editora SaraivaJur, 2022.
- GENARO, Leandro Lopes. Tutela Provisória em matéria Tributária. Tese de mestrado junto à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 2017.
- GERALDES, António Santos Abrantes. Temas da reforma do processo civil. Coimbra: Editora Almedina, 1998. p. 87.
- LEÃO, Fernanda Teles de Paula, O regime de tutelas do Código de Processo Civil e a redefinição do conteúdo normativo do artigo 170-A do Código Tributário Nacional. Tese de mestrado junto à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 2021.
- MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação de tutela. 10 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000.
- NUNES, Cleucio Santos. Curso Completo de Direito Processual Tributário. 3. Ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
- PINTO, Nelson Luiz. A antecipação de tutela como instrumento de efetividade do processo e de isonomia processual. São Paulo: RT, 2011.
- SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Processo Tributário. 10. ed., São Paulo: Atlas, 2018,
[1] LEÃO, Fernanda Teles de Paula, O regime de tutelas do Código de Processo Civil e a redefinição do conteúdo normativo do artigo 170-A do Código Tributário Nacional. Tese de mestrado junto à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 2021. p. 72.
[2] SEGUNDO, Hugo de Brito Machado, Processo Tributário. 10. ed., São Paulo: Atlas, 2018, p. 484.
[3] PINTO, Nelson Luiz. A antecipação de tutela como instrumento de efetividade do processo e de isonomia processual. São Paulo: RT, 2011. p. 618.
[4] MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação de tutela. 10 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000. p. 69.
[5] BUENO, Cassio Scarpinella, Manual de direito processual civil - volume único. 8 ed. São Paulo: Editora SaraivaJur, 2022. p. 575..
[6] BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização). 4. Ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2006. p. 25.
[7] GENARO, Leandro Lopes. Tutela Provisória em matéria Tributária. Tese de mestrado junto à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 2017.
[8] GERALDES, António Santos Abrantes. Temas da reforma do processo civil. Coimbra: Editora Almedina, 1998. p. 87.
[9] BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: Tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização). 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 119.
[10] BUENO, Cassio Scarpinella, Manual de direito processual civil - volume único. 8 ed. São Paulo: Editora SaraivaJur, 2022. p. 578.
[11] LEÃO, Fernanda Teles de Paula, O regime de tutelas do Código de Processo Civil e a redefinição do conteúdo normativo do artigo 170-A do Código Tributário Nacional. Tese de mestrado junto à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 2021. p. 77.
[12] DESTEFENNI, Marcos. Natureza constitucional da tutela de urgência. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2002. p. 294-295.
[13] CARNEIRO, Claudio. Processo tributário: administrativo e judicial. 5. ed. São Paulo: Saraiva. 2018. P. 112.
[14] NUNES, Cleucio Santos. Curso Completo de Direito Processual Tributário. 3. Ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 614
[15] Idem, Ibidem, p. 615.
[16] CARNEIRO, Claudio. Processo tributário: administrativo e judicial. 5. ed. São Paulo: Saraiva. 2018. P. 110.
[17] CARNEIRO, Claudio. Processo tributário: administrativo e judicial. 5. ed. São Paulo: Saraiva. 2018. P. 112.
[18] MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela de urgência e tutela de evidência. 1 ed ebook. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2017. p. 38.
[19] NUNES, Cleucio Santos. Curso Completo de Direito Processual Tributário. 3. Ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 624.
[20] SEGUNDO, Hugo de Brito Machado, Processo Tributário, 10. ed., São Paulo: Atlas, 2018, p. 485.
[21] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil: Teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum. 56. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2015. p. 675
[22] NUNES, Cleucio Santos. Curso Completo de Direito Processual Tributário. 3. Ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 631.
[23] ALVIM, Eduardo Arruda, Tutela Provisória. 2 ed. São Paulo: Saraiva. 2017. p. 72.
Mestranda em Direito, com ênfase em Direito Tributário (PUC-SP). Especialista em Direito Tributário. Advogada.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BITENCOURT, Yasmin Da Silva. Tutela provisória no processo tributário Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 fev 2023, 04:42. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/61095/tutela-provisria-no-processo-tributrio. Acesso em: 21 nov 2024.
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
Por: PRISCILA GOULART GARRASTAZU XAVIER
Precisa estar logado para fazer comentários.