FERNANDO PALMA PIMENTA FURLAN[1].
(orientador)
RESUMO: O artigo apresenta uma reflexão psicojurídica sobre a relação e a grande influência do abandono afetivo parental sobre crianças, adolescentes e jovens que se encontram na vida do crime, com o objetivo de discutir seus fatores, abordando tanto o conceito de abandono afetivo como o conceito da delinquência juvenil, aos quais os adolescentes autores de ato infracional estão expostos. São apresentados questionamentos e estudos científicos e sociais sobre a origem e o desenvolvimento da criminalidade precoce, motivos para os quais tantos jovens almejam e tem como referência e meta a vida no crime. A metodologia abordada no presente artigo é a pesquisa bibliográfica, ou seja, através de materiais já existentes, principalmente de livros e artigos científicos. Neste trabalho é explorado o comportamento do menor afetado pelo abandono afetivo parental para com a sociedade, seu modo de agir e estudar a razão por trás de seus atos infracionais. Portanto, o objetivo é apresentar as consequências psicológicas, jurídicas e sociais que o abandono afetivo é capaz de fazer com uma criança, adolescente ou jovem em desenvolvimento.
Palavras-chave: Criminalidade. Fatores. Crianças. Jovens. Adolescentes.
JUVENILE DELINQUENCY AS A CONSEQUENCE OF AFFECTIVE ABANDONMENT
ABSTRACT: The article presents a psycho-legal reflection on the relationship and the great influence of parental affective abandonment on children, adolescents and young people who find themselves in the life of crime, with the aim of discussing its factors, addressing both the concept of affective abandonment and the concept of juvenile delinquency, to which adolescents who commit infractions are exposed. Questions and scientific and social studies are presented on the origin and development of early crime, reasons for which so many young people aspire and have a life in crime as a reference and goal. The methodology used in this article is bibliographical research, that is, through existing materials, mainly books and scientific articles. This work explores the behavior of minors affected by parental affective abandonment towards society, their way of acting and studying the reason behind their infractions. Therefore, the objective is to present the psychological, legal and social consequences that affective abandonment is capable of causing to a child, adolescent or young person in development.
Keywords: Criminality. Factors. Children. Young people. Teenagers.
1. INTRODUÇÃO
A família é sinônimo de segurança, acolhimento e direcionamento, é retratada como a base da sociedade (art. 226 da Constituição Federal de 1988). A presença parental é essencial para o desenvolvimento de uma criança. É dentro de seu lar que ela deve encontrar as referências de qual tipo de pessoa se tornar, o que é certo e errado, para onde ir ou não ir, e adquirir o direcionamento necessário para se tornar um bom cidadão.
[...] As figuras centrais de autoridade e modelo para os filhos são os próprios pais. A adolescência é um período de importantes modificações psicológicas, familiares e sociais. Devido a modificações corporais internas, o púbere procura estabelecer referências externas fixas. Se o ambiente apresenta modificações, o púbere pode agravar a sua confusão (TIBA, Içami, Quem ama educa, 1998, p. 87).
ANDRADE (2019) ressalta que a família é a matriz da identidade pessoal e social de um indivíduo, desenvolvendo-se o sentimento de independência e autonomia, baseado na diferenciação que permite a consciência de si mesmo como alguém diferente. É essencial a família permitir que cada um construa um mundo seu com viabilidade ecológica no interior dos outros e na realidade, e que se estruture em relações organizadoras.
Mas o que acontece quando ocorre a ausência de um dos genitores, ou até mesmo das duas figuras dentro de um lar?
De fato, o problema inerente à esfera privada torna-se um problema social e, como consequência, surge a demanda por abusos contra a estruturação da ordem pública e da justiça criminal. A prática da violência pode ser reflexo do adolescente buscar aspectos do meio social que deveriam ser compreendidos em sua personalidade, e não foram por relações familiares disfuncionais.
Abandono afetivo paterno ou materno pode causar prejuízos de ordem imaterial à formação da sua personalidade, circunstância que merece proteção jurídica à luz da Constituição Federal de 1988, que possui como princípio maior a proteção da dignidade da pessoa humana. Os deveres dos pais decorrentes da parentalidade responsável não se restringem ao suporte material, alcançando também o cuidado moral e afetivo. (SOUZA, 2016)
Nesse trabalho, a teoria abordada é de que o abandono afetivo é um fator altamente contribuinte para que crianças e adolescentes procurem a aceitação, validação, e importância que não tiveram dentro de seu lar, na criminalidade, tráfico, prostituição e tudo o que o mundo do crime pode oferecer.
2. O ABANDONO AFETIVO
2.1 CONCEITO
O abandono afetivo acontece quando os pais, ao negligenciarem sua relação com seus filhos, faltam com afeto e obrigações, conforme exposto no artigo 277 da Constituição Federal, que institui como dever do Estado, da Família e da Sociedade:
“assegurar à criança ou adolescente, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. Grifo nosso, (BRASIL, CF, 1988)
Ou seja, faltam com os deveres mínimos que um pai deveria ter com seu filho, o afeto, apoio emocional, psicológico e social, o cuidado e a proteção; passando a tratá-los com indiferença e ausência. Segundo Maria Berenice Dias, 2015, p. 416, a omissão do genitor em cumprir os encargos decorrentes do poder familiar, deixando de atender ao dever de ter o filho em sua companhia, produz danos emocionais merecedores de reparação. O poder familiar deve ser exercido não somente para atender às necessidades materiais do menor, mas deve também suprir suas carências psicológicas e intelectuais.
A presença e o tempo de qualidade dos pais para com os filhos são de extrema importância e necessidade para a construção de um ambiente saudável que irá forjar o caráter e dar segurança a criança para se desenvolver sem traumas ou obstáculos psicológicos que o façam desviar o caminho para se tornar um cidadão de boa conduta. Ao contrário do que muitos pensam, o apoio financeiro não substitui e jamais substituirá o afeto e a presença dos genitores.
2.2 DANOS CAUSADOS PELO ABANDONO AFETIVO
Quando mencionamos o abandono afetivo, não tratamos do abandono financeiro, pelo contrário, muitos responsáveis utilizam o apoio financeiro como substituto de sua presença na vida dos filhos, com o pensamento de que irá suprir a ausência de afeto e cuidado.
Segundo a psicologia, a ausência parental pode gerar danos psicológicos, assim como o comprometimento do desenvolvimento saudável da criança.
Giselda Hinoraka ressalta que:
“O dano causado pelo abandono afetivo é antes de tudo um dano à personalidade do indivíduo. Macula o ser humano enquanto pessoa, dotada de personalidade, sendo certo que esta personalidade existe e se manifesta por meio do grupo familiar, responsável que é por incutir na criança o sentimento de responsabilidade social, por meio do cumprimento das prescrições, de forma a que ela possa, no futuro, assumir a sua plena capacidade de forma juridicamente aceita e socialmente aprovada.” (HIRONAKA, 2016, p. 34).
Nota-se que o dano causado pelo abandono afetivo parental nos filhos não é somente individual, mas afetará também o meio em que o menor convive e a sociedade que ele se insere, tendo em vista que sua personalidade e caráter serão moldados de acordo com a maneira em que foi criado, em âmbito moral e afetivo. Por exemplo, uma criança que teve que aprender conviver sem a segurança e proteção dos pais, certamente irá ter dificuldades para se sujeitar a autoridades no futuro.
Nesse sentido, conclui-se a importância da presença afetiva dos genitores para com os filhos, uma vez que são responsáveis não só pelo suporte financeiro, mas também pelo amparo afetivo, tendo em vista que a ausência deste pode gerar danos quase irreversiveis ao menor. É dever dos pais guiarem os seus filhos e oferecerem um lar onde a criança tenha a oportunidade de um crescimento saudável tanto fisíco quanto psicológico.
3. RESPONSABILIDADE CIVIL
Maria Helena Diniz conceitua a responsabilidade civil como a aplicação das medidas que obrigam um cidadão a reparar dano moral ou patrimonial ocasionado a terceiros em decorrência de ato próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda ou, ainda, de simples imposição legal. (2007, p. 35).
Nota-se que a responsabilidade civil tem como intuito proteger e defender o direito de pessoas que foram prejudicadas pela ação ou omissão de outrem. O Código Civil institui que:
“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” (BRASIL, CC, 2002)
Existem dois tipos de responsabilidade civil, podendo ser ela objetiva ou subjetiva. A subjetiva é quando tem-se a necessidade de provar a culpa do agente, enquanto que na objetiva não há essa necessidade de comprovar a culpa.
Sobre o tema, Rui Stoco argumenta que a necessidade de maior proteção à vítima fez nascer a culpa presumida, de sorte a inverter o ônus da prova e solucionar a grande dificuldade daquele que sofreu um dano demonstrar a culpa do responsável pela ação ou omissão. O próximo passo foi desconsiderar a culpa como elemento indispensável, nos casos expressos em lei, surgindo a responsabilidade objetiva, quando então não se indaga se o ato é culpável”. (STOCO, 2007, p. 157).
Pode-se notar, então, que para que ocorra a responsabilidade civil são necessários os seguintes requisitos: a ação ou omissão voluntária, a relação de causalidade ou nexo causal, o dano e a culpa, sendo essa em determinadas situações dispensável, colocando em jogo a culpa presumida, que é quando o fato lesivo é considerado, por si só, como culposo.
3.1. A RESPONSABILIDADE CIVIL POR ABANDONO AFETIVO DOS PAIS PARA COM OS FILHOS
Conforme a Carta Magna institui em seu Art. 229, os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores. Entretanto, em casos não muito incomuns, percebe-se a falta de afeto pela criança da parte de um ou ambos os genitores. O afeto e cuidado recebidos na infância são requisitos ( ou condições ) essenciais para a construção do caráter de uma pessoa, como também de relacionamentos saudáveis. Quando os genitores se negam a conviver e se relacionar com o filho estão na verdade violando princípios não só morais, mas fundamentais como a dignidade da pessoa humana e o princípio da afetividade.
Apesar de o Código Penal Brasileiro não abranger o abandono afetivo em seus artigos, o Superior Tribunal de Justiça vem se posicionando favoravelmente quanto a concessão de indenização aos filhos lesados pelo abandono moral afetivo. Perante a visão jurídica, o amor é facultativo, porém, o cuidar é dever. Através desse posicionamento, atualmente, no direito de família, existe a possibilidade de punir pais que abandonaram seus filhos afetivamente. É possível, por exemplo, o filho pleitear indenização como uma forma de compensar a ausência de afeto, cuidado, amparo moral e psicológico, ausência essa que fere a obrigação legal da criação, cuidado e presença que são previstos na Constituição Federal.
A indenização em si, claramente, não será suficiente para apagar o trauma causado pela ausência parental, entretanto, oferta um certo amparo e sensação de justiça. Trazendo, possivelmente, consciência aos pais e também servindo como alerta a outros genitores para que não repitam o ato de abandono.
Vale ressaltar que a ausência afetiva parental prejudica não somente a criança, mas a sociedade no qual ela está inserida. Através de pesquisas sociais, constata-se que crianças que não tiveram a presença parental em sua infância possuem uma certa tendência a procurarem o mundo do crime. Segundo Miguel Granato Velasquez:
Um dado que pode espantar, ou não, é que mais de 90% dos adolescentes infratores internados vêm de famílias desestruturadas, marcadas por agressões físicas e emocionais, problemas psiquiátricos e ausência de um dos genitores, seja por rejeição pura e simples, seja por doença ou morte, que, muitas vezes foi causada por violência urbana. (VELASQUEZ, 2020, online).
Apresentado os fatos, é importante frisar a importância de certos requisitos para a validação da Responsabilidade Civil e suas consequências, sendo eles descritos no artigo 186 do Código Civil: A conduta ou omissão da mesma, o nexo de causalidade, o dano e a culpa, que em determinados momentos é dispensável, trazendo então a culpa presumida.
4. A INFLUÊNCIA PARENTAL SOBRE OS COMPORTAMENTOS DO MENOR IMPÚBERE
O exercício do poder familiar possui como um dos seus principais objetivos preservar o desenvolvimento sadio e equilibrado do menor em todos os aspectos da formação humana, seja educacional, emocional ou familiar. (FIGUEIREDO; ALEXANDRIDIS, 2014, p. 19-25)
Filipa Alexandra das Neves Mendes afirma que a família é o primeiro contexto de socialização e, como tal, cumpre, desde cedo, um papel fundamental no desenvolvimento da criança. Na adolescência, fase em que, por diversos motivos, o risco de envolvimento em comportamentos de risco é mais elevado, um funcionamento familiar assente em estratégias e comportamentos parentais desadequados assume-se como um fator de risco da delinquência juvenil.
Oliveira e Assis (1999) realizaram um estudo em instituições responsáveis pela custódia judicial de jovens delinquentes no Rio de Janeiro e verificaram que poucos destes adolescentes viviam numa família intacta.
Em um outro estudo, realizado por Demut e Brown (2004) para além de se ter verificado que as famílias dissociadas estavam mais associadas à delinquência juvenil, foi também verificado que os níveis de delinquência eram bastante mais elevados nos adolescentes que vivem só com o pai do que para os que viviam com ambos os progenitores. Segundo os autores, estas diferenças encontradas nas estruturas familiares parecem ser uma função das características da criança/jovem e dos pais nos processos familiares – efetivamente, é notável que os níveis de envolvimento, supervisão e monitorização são mais altos em famílias onde estão presentes os dois progenitores do que nas famílias em que apenas um deles está presente. Ou seja, este resultado parece dever-se essencialmente a um envolvimento parental inadequado, à falta de supervisão/monitorização e à ausência de relações próximas entre o progenitor e o filho. (MENDES, Filipa Alexandra das Neves Mendes, 2020).
Segundo CARRILHO (2000), aspectos como a coesão familiar baixa, a fraca adaptabilidade familiar, um clima familiar percepcionado como pouco afetivo e com acentuada conflitualidade, constituem contributos familiares para a trajetória delinquente. A interação mútua entre o comportamento dos pais e do adolescente, influenciando-se reciprocamente, constituindo o pano de fundo da rede de interações familiares, no processo de desenvolvimento da trajetória delinquente. A conflitualidade é própria no período da adolescência. O agir desta conflitualidade para fora da família tem como consequência a prática de comportamentos desviantes.
Para ANDRADE (2019), o desenvolvimento físico, psíquico e social, de cada ser humano depende do relacionamento com a família, todo o crescimento e desenvolvimento de cada indivíduo é influenciado pela vivência parental. A família, se for “saudável”, é uma fonte de ajuda ativa, sendo o sistema de autoridade claro e aceitável, e a comunicação aberta baseada em controle e apoio, que são indispensáveis ao desenvolvimento do indivíduo. Quando a família não está “saudável”, os padrões de autoridade modificam-se, sendo a comunicação e a distribuição de papéis funcionais deteriorados, o que dificulta o controle dos sentimentos negativos, levando ao aumento da angústia, da hostilidade e da violência. Por vezes, a falta de respeito dos diversos elementos do grupo familiar, como a intolerância, a agressividade o desinteresse ou a superproteção, marcam a personalidade do indivíduo.
É inegável a absurda influência que o comportamento parental tem sobre a vida e construção da personalidade dos menores, o abandono afetivo, as palavras malditas lançadas sobre eles, o peso da solidão e, consequentemente, de ter que “se virar” sozinho. O fato da criança ter que resolver seus questionamentos e problemas adversos que a vida traz sozinho abre portas para que a visão de mundo desta criança seja através do ódio e da dor, fazendo, muitas vezes, com que ele repita com seus filhos o que viveu na infância e, assim, repetindo o ciclo.
5. A DELINQUÊNCIA JUVENIL COMO CONSEQUÊNCIA DO ABANDONO AFETIVO
De acordo com Moraes, o conceito de família está intimamente ligado aos laços afetivos que, ao transbordarem sobre o indivíduo durante sua criação e ligação inicial com a sociedade, formulam suas opiniões e definem alguns de seus princípios. É evidente que a família auxilia na formação do caráter e na personalidade do cidadão. Pontos vitais para toda a convivência social, pois se há disfunção na família, esse equívoco provocará reflexos na sociedade e na nação. (MORAES, 2006, p. 88).
Silvia Filipa explica que fracas relações entre pais-filhos, caracterizadas por uma pobre comunicação, afeto e receptividade, irão danificar o processamento de emoções do jovem, incapacitando-o de transformar vergonha em culpa e, consequentemente, de se colocar no lugar do outro, reagindo violentamente perante cenários adversos. (MOREIRA, 2013)
Um dos pontos críticos da ausência parental é quando os pais não dão nem sequer o devido valor a educação do menor. É comum presenciar no Brasil adolescentes abandonando a escola e os pais não tomando a devida providência ou exercendo a autoridade que lhe é devida para direcionar o filho a um futuro melhor.
“[...] na fase de desenvolvimento da personalidade, quanto maior o vínculo escolar e o envolvimento pessoal com professores e amigos da escola, menor a possibilidade de envolvimento com delinquência, pois a escola, assim como outras instituições formadoras de personalidade e do conhecimento humano, reproduz a ordem instituída. “ (SHECAIRA, Sérgio Salomão. 2008)
Daniel Cerqueira, técnico de Planejamento e Pesquisa do IPEA ressalta que o crime não é uma constante na vida do cidadão. “Existe um ciclo que começa por volta dos 12 ou 13 anos e vai até os 30. Se a pessoa não se envolveu até essa idade, dificilmente se envolverá”. Esse é um dos motivos da importância da escolarização. “Se o grupo de colegas dentro da escola é melhor do que aquele que o jovem tem fora, nas ruas, o comportamento dele tende a melhorar, o que acaba afastando-o das atividades criminais”. (CERQUEIRA, 2016)
Outro ponto, infelizmente, comum de ser visto, é a de crianças e adolescentes começarem a se envolver com drogas. As drogas são o ponto de partida e a porta de entrada para o mundo do tráfico e outros crimes, geralmente começam a consumirem substâncias ilícitas para preencherem lacunas que não foram supridas em sua criação, como uma espécie de refúgio. Os jovens praticam atos infracionais de todo tipo, desde os mais leves até os mais gravíssimos previstos no ordenamento jurídico. Um dos mais frequentes são os atos infracionais relacionados as drogas, onde o número vem aumentando consideravelmente com o passar do tempo. Desde o consumo, que ainda é considerado ilícito, até o crime de tráfico, que é muito mais grave. O tráfico de drogas é o crime mais frequente entre os jovens, existindo quase 60 mil processos ativos tramitando pelas Varas de Infância e Juventude do país por este ato infracional, de acordo com a pesquisa do CNJ. (MARTINIELLI, 2022)
Rovílio Costa, associa que as características que perfazem um menor infrator passam da formação social a partir do envolvimento com drogas e outros entorpecentes até o abandono dos pais, da sociedade e da escola, na formação do caráter do indivíduo, que cultua a cultura desenvolvida fora do ambiente caseiro, em ruas ou becos (COSTA, 1979, p. 19)
Não é possível definir, com exatidão, as características do menor infrator, mas os fatores que o possibilitam formar seu caráter, e aqui se abre espaço para entender o Abandono Afetivo como um método que gera tais indivíduos na sociedade, afinal, ao passo que se deixa um indivíduo em formação à mercê das leis formadas na rua, a própria personalidade dele se alavanca dentro desse entendimento. É preciso agir dentro da formação da família, conhecendo quais são seus princípios e o que o ferimento desses traz para a concepção do indivíduo em desenvolvimento. (CHAGAS, 2021)
A psicóloga Beatriz Prudêncio Soares, que trabalhou com adolescentes que cumprem medidas socioeducativas no Centro de Internação da Grande Florianópolis, expõe que o envolvimento com atos infracionais denuncia dificuldades familiares e, muitas vezes, a família acaba por manter este sintoma para que não sejam abertas feridas difíceis de serem tratadas, como o sentimento de fracasso dos pais frente a educação dos filhos ou a identificação de abandonos sofridos ao longo de gerações anteriores. Por isso, pode-se interpretar o cometimento de atos infracionais da parte de crianças e adolescentes como um pedido de socorro, como uma tentativa do adolescente de chamar a atenção para si e para sua família para recompor seus respectivos projetos de vida. (SOARES, 2008).
Desta forma, podemos afirmar que a presença parental possui extrema importância para a formação do caráter de jovens saudáveis e estruturados, e que a ausência desse papel parental possui um efeito negativo que pode causar danos difíceis de serem reparados, trazendo então falhas no caráter do jovem em crescimento, culminando com a possibilidade do mesmo envolver-se em atos ilícitos.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Existem várias teorias e causas para que jovens, adolescentes e crianças se tornem pessoas com traços delinquentes, entretanto, foi possível abordar neste presente artigo como o abandono afetivo é capaz de danificar o caráter de uma pessoa. Menores buscam na criminalidade um refúgio que possa preencher o vazio que a ausência parental causou em sua formação, muitas vezes usando o mal comportamento através de atos infracionais como forma de chamar a atenção daqueles que deveriam ter sido presentes em sua vida, lhes dando a importância devida.
Um estudo realizado pela Criminal Justice & Behavior (Vol 14, p 403-26, 1978) nos Estados Unidos demonstrou que 80% dos estupradores vieram de lares sem a presença paterna, assim como uma pesquisa feita pela National Principals Association Report revela que 71% de todos os que abandonaram o ensino médio vêm de lares sem pais – 9 vezes a média. De acordo com a Single Parent Success Foundation, 75% das crianças que estão em clínicas para dependentes químicos vêm de famílias de pais solteiros, ou seja, que não tem a presença de um dos genitores.
Através dos estudos expostos é necessário frisar a importância da presença parental na vida e crescimento de uma criança, os comportamentos muitas vezes incompreendidos pela maioria são reflexos da ausência e negligência das pessoas que mais importantes na vida de uma criança: seus genitores.
A intenção do presente estudo não é culpar exclusivamente o abandono afetivo pelo crescimento da delinquência juvenil, existem inúmeros fatores que contribuem para tal distúrbio, contudo, o intuito é conscientizar e “abrir os olhos” da sociedade para que voltem a enxergar o lar como a esperança para a geração presente e as vindouras. A maneira como criamos, educamos e cuidamos de nossas crianças é a chave que ditará o futuro e a segurança de nossa sociedade.
Filhos são como flechas nas mãos dos pais, e a responsabilidade do direcionamento para o alvo que tal flecha deve acertar é inteiramente dos genitores, seja ela positiva ou negativa.
BIBLIOGRAFIA
ANDRADE, Sofia, A importância da família na construção de relações saudáveis. 2019. Disponível em: https://www.psicologia.pt/artigos/ver_opiniao.php?a-importancia-da-familia-na-construcao-de-relacoes-saudaveis&codigo=AOP0500. Acesso em 26/12/2022.
BRASIL. Código Civil de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.html Acesso em: 20/12/ 2022.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990. Acesso em: 20/12/2022.
CARRILHO, Luisa Maria Gentil Ferreira, Influências familiares no desenvolvimento de trajectórias desviantes em adolescentes institucionalizados. 2000. Disponível em: https://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/22934/2/29754.pdf Acesso em 23/12/2022.
CHAGAS, Paulo Ricardo Carvalho das, O menor infrator como consequência do abandono afetivo e da violação ao Princípio da Prioridade Absoluta. 2021. Disponível em: https://periodicos.processus.com.br/index.php/multi/article/view/550/619 Acesso em 23/12/2022.
COSTA, R. Delinquência juvenil: antecedentes, descrição dos antecedentes da delinquência juvenil em Porto Alegre. 2. ed. Caxias do Sul: Universidade de Caxias do Sul,1976.
Criminal Justice & Behavior, Vol 14, p. 403-26, 1978. Acesso em: 02/03/2023.
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 8 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. Acesso em 20/12/2022.
DINIZ. Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 21. ed.São Paulo: Saraiva, 2007. 35 p. Acesso em 21/12/2022.
FIGUEIREDO, Fabio Vieira e ALEXANDRIDIS,Georgios. Alienação parental. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2014. Acesso em: 23/12/2022.
HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Pressuposto, elementos e limites do dever de indenizar por abandono afetivo. Acesso em: 20/12/2022.
IPEA. A cada 1% a mais de jovens nas escolas, homicídios caem 2%. 2016. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/portal/categorias/45-todas-as-noticias/noticias/2996-a-cada-1-a-mais-de-jovens-nas-escolas-homicidios-caem-2 Acesso em: 27/12/2022.
MARTINIELLI, Stefania, Criminalidade Infantil: contexto histórico e a corresponsabilidade da família, sociedade e do Estado na vida desses jovens infratores. 2021. Disponível em: https://juridicocerto.com/p/martinielle-meneses/artigos/criminalidade-infantil-contexto-historico-e-a-corresponsabilidade-da-familia-sociedade-e-do-estado-na-vida-desses-jovens-infratores-6342 Acesso em: 26/12/2022.
MENDES, Filipa Alexandra das Neves Mendes. Conhecer a parentalidade para prevenir a delinquência: A influência da família na delinquência juvenil. 2020. Disponível em: https://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/129680/2/426715.pdf Acesso em: 23/12/2022.
MORAES, M. C. B de (coord.). Princípios do direito civil contemporâneo. Rio deJaneiro:Renovar, 2006.
MOREIRA, Silvia Filipa Ferreira. A relação entre a ausência de suporte afetivo e a delinquência. 2013. Disponível em: https://bdigital.ufp.pt/bitstream/10284/3938/1/Projeto%20de%20gradua%C3%A7%C3%A3o%20S%C3%Adlvia%20Moreira.pdf Acesso em: 27/12/2022.
National Principals Association Report on the State of High Schools. Disponivel em: https://post.ca.gov/portals/0/post_docs/publications/Building%20a%20Career%20Pipeline%20Documents/safe_harbor.pdf Acesso em 02/03/2023.
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Sistema de garantias e o Direito Penal Juvenil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. Pág. 124.
Single Parent Success Foundation. Disponivel em: https://post.ca.gov/portals/0/post_docs/publications/Building%20a%20Career%20Pipeline%20Documents/safe_harbor.pdf Acesso em 02/03/2023.
SOARES, Beatriz Prudêncio, Adolescentes Infratores e Suas Relações Afetivas. 2008. Disponível em: http://institutofamiliare.com.br/wp-content/uploads/2018/10/Beatriz-Prudencio-Soares-2008-Adolescentes-Infratores-e-suas-Relacoes-Afetivas.pdf Acesso em 27/12/2022.
SOUZA, Jorge Dias de, O abandono afetivo como violação ao princípio da proteção integral da criança e do adolescente, Disponível em: https://jus.com.br/artigos/51937/o-abandono-afetivo-como-violacao-ao-principio-da-protecao-integral-da-crianca-e-do-adolescente. 2016. Acesso em 26/12/2022.
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 7 ed.. São Paulo Editora Revista dos Tribunais, 2007. Acesso em: 20/12/2022.
VELASQUEZ. Miguel Granato. HECATOMBE X ECA. Doutrina – Ministério Público do Rio Grande do Sul. Porto Alegre/ RS. Disponível em: http://www.mp.rs.gov.br/infancia/doutrina/id527.html Acesso em: 20/12/2022.
Bacharelanda em Direito pela Universidade de Gurupi – UnirG .
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FONSECA, Maria Antonia Ferreira. A delinquência juvenil como consequência do abandono afetivo Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 abr 2023, 04:41. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/61356/a-delinquncia-juvenil-como-consequncia-do-abandono-afetivo. Acesso em: 24 nov 2024.
Por: André Luís Cavalcanti Chaves
Por: Lara Pêgolo Buso
Por: Maria Guilhermina Alves Ramos de Souza
Por: Denise Bueno Vicente
Por: CARLOS ALERTO DOS SANTOS JUNIOR
Precisa estar logado para fazer comentários.