GUSTAVO ANTÔNIO NELSON BALDAN
(orientador)
RESUMO: O presente estudo tem por objetivo analisar o encarceramento da população LGBTQIA+ no âmbito do sistema prisional brasileiro. LGBTQIA+ é uma sigla internacionalmente utilizada para se referir aos cidadãos e cidadãs Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Mulheres Transexuais, Homens Trans, Intersexuais e o símbolo “+” significando todas as outras orientações sexuais e identidades de gênero. O estudo abordará a evolução histórica do sistema carcerário, inicialmente com relação ao histórico das penas, como surgiram e o passo a passo das formas como se punir e sequencialmente, abordará os problemas enfrentados pelos presos LGBTQIA+, seja a superlotação, a violência, a escassez de recursos, a desigualdade, o racismo, além dos desafios da ressocialização e como os direitos humanos agem nesses casos. Por fim, será abordado sobre a adoção de medidas públicas e sobre a criação de celas/alas especificas para a população LGBTQIA+ que cumprem pena no sistema prisional. O estudo foi realizado através de pesquisa descritiva bibliográfica, com revisão da literatura existente sobre o tema, bem como, com a análise de resoluções e cartilhas impressos ou disponíveis em meio eletrônico.
Palavras-chave: População, LGBTQIA+, Sistema Prisional, Direitos Humanos, Violência.
ABSTRACT: The present study aims to analyze the incarceration of the LGBTQIA+ population within the Brazilian prison system. LGBTQIA+ is an internationally used acronym to refer to Lesbian, Gay, Bisexual, Transvestite, Transgender Women, Trans Men, Intersex citizens and the symbol “+” stands for all other sexual orientations and gender identities. The study will address the historical evolution of the prison system, initially with respect to the history of penalties, such as butterflies and the step-by-step ways of punishing oneself and, sequentially, will address the problems faced by LGBTQIA+ prisoners, whether overcrowding, violence, reduction of resources, inequality, racism, in addition to the challenges of resocialization and how human rights age in these cases. Finally, it will definitely be about the adoption of public measures and the creation of specific cells/wings for the LGBTQIA+ population who are serving time in the prison system. The study was carried out through descriptive bibliographical research, with a review of the existing literature on the subject, as well as, with the analysis of ingestion and printed booklets or available in electronic media.
Keywords: Population, LGBTQIA+, Prison System, Human Rights, Violence.
1.INTRODUÇÃO
Cada indivíduo possui características próprias, isto é, a chamada individualidade. A sigla LGBTQIA+ é um acrônimo para lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros e queer, com um sinal “+” para reconhecer as orientações sexuais ilimitadas e identidades de gênero usadas pelos membros dessa comunidade.
O sistema carcerário brasileiro consiste nas prisões federais e estaduais, tanto masculinas quanto femininas.
De acordo com a Constituição Federal de 1988, todos os presos, independentemente do crime cometido, têm assegurado o direito à vida, à integridade física e moral, além de garantida a proteção contra tratamento cruel ou degradante ou tortura.
A Lei de Execução Penal (LEP) garante ao preso assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa e impõe, a todas as autoridades, o respeito à integridade física e moral dos presos já condenados e aos provisórios. O preso perde a liberdade, mas tem direito a um tratamento digno, bem como o direito de não sofrer violência física e moral. O artigo 41 da Lei de Execução Penal ainda prevê outros direitos à população prisional, tais como: vestuário, alimentação, trabalho remunerado, entre outros (BRASIL, 1984).
Infelizmente, a população LGBTQIA+ no sistema carcerário brasileiro enfrenta diversas violações de direitos humanos, tais como a falta de políticas públicas específicas, o preconceito e a discriminação por parte dos agentes prisionais e dos próprios detentos.
No Brasil, a preocupação com a visibilidade da parcela de encarcerados que se identificam como LGBTQIA+ dentro da população no sistema prisional é recente, e a intervenção, sempre parcial e precária, carecendo de políticas públicas que efetivamente sejam praticadas.
A formulação de políticas públicas está intrinsecamente ligada à necessidade de promover o bem comum da sociedade por meio de leis, regulamentações, planos de governo e decisões do corpo político. Assim, pode-se entender por política pública o conjunto de decisões e ações de um governo para solucionar problemas que em um dado momento os cidadãos e o próprio governo de uma comunidade política consideram prioritários ou de interesse público (CALDAS, CRESTANA, 2005).
O estudo do tema é de grande importância, pois a população LGBTQIA+ apesar de ser uma minoria, deve ser respeitada em todos os âmbitos, já que garantir dignidade e cidadania é o básico para a existência humana em um estado democrático de direito.
A fundamentação teórica do artigo será feita por meio de análises em artigos, doutrinas, leis, documentários, e dados numéricos trazidos do Levantamento Nacional de Informações Penitenciarias (INFOPEN), sendo desnecessário a utilização de pesquisa de campo.
O artigo tem como objetivo geral a demonstração da necessidade da universalização das alas LGBTQIA+ nos presídios brasileiros englobando as circunstâncias que levam a inevitabilidade da criação destas, de modo a combater a escassez e propagar a garantia dos direitos humanos do grupo LGBTQIA+.
2.O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO
O sistema prisional brasileiro é um tema que suscita grande debate na sociedade, especialmente pela sua incapacidade de cumprir seus objetivos principais de reabilitação e ressocialização dos presos. Há inúmeros problemas que afetam o sistema, como a superlotação, a falta de recursos, a violência, a corrupção e a falta de políticas públicas efetivas.
O Brasil até 1830, não tinha um Código Penal próprio devido ser ainda uma colônia portuguesa, submetia-se às Ordenações Filipinas, que em seu livro V trazia o rol de crimes e penas que seriam aplicados no Brasil. Naquela época não existia a previsão de privação de liberdade como pena (NASCIMENTO, 2022).
Em 1824, com a nova Constituição, o Brasil iniciou uma reforma no sistema punitivo: as penas de açoite, a tortura, o ferro quente e outras penas cruéis foram extintas e foi determinado que as cadeias deveriam ser seguras, limpas e bem arejadas, havendo diversas casas para a separação dos réus, conforme a circunstâncias, e natureza dos seus crimes (NASCIMENTO, 2022).
Em 1830, criou-se o Código Criminal do Império. A pena de prisão foi introduzida no Brasil de duas maneiras: a prisão simples e a prisão com trabalho, que podia ser perpétua, mas ainda se mantinha a pena de morte. (NASCIMENTO, 2022).
Somente em 1940 que foi sancionado o atual código penal brasileiro. O artigo 32 do Código Penal (CP) estabeleceu três espécies de penas: penas privativas de liberdade, restritivas de direito e multa (BRASIL, 1940).
As penas privativas de liberdade consistem na privação da liberdade do condenado, que é recolhido em estabelecimento prisional para cumprir sua pena. Essa modalidade de pena é reservada para os crimes mais graves, nos quais a sociedade exige uma punição mais severa, como é o caso dos crimes contra a vida, contra a dignidade sexual e contra o patrimônio em situações de grande gravidade.
As penas restritivas de direito, por sua vez, consistem em uma limitação de direitos do condenado, como a proibição de frequentar determinados locais, de exercer determinada profissão ou de se ausentar da cidade onde reside. Essa modalidade de pena é aplicada em casos menos graves, nos quais não é necessária a privação da liberdade do condenado.
Enquanto que as penas de multa consistem no pagamento de um valor em dinheiro pelo condenado. Essa modalidade de pena é aplicada em casos nos quais a infração penal é de menor gravidade e não exige a privação da liberdade do condenado. O valor da multa é fixado de acordo com a capacidade financeira do condenado e pode ser convertido em prestação de serviços à comunidade.
É importante destacar que as penas restritivas de direito e as penas de multa têm como objetivo principal a ressocialização do condenado, ou seja, a sua reintegração à sociedade de forma que ele possa se tornar um cidadão produtivo e respeitador das leis. Já as penas privativas de liberdade têm como objetivo a retribuição pelo crime cometido e a proteção da sociedade contra novas práticas delitivas.
Enquanto as prisões e instituições para jovens infratores continuarem a se expandir e o Estado continuar com a política de encarceramento em massa, com tratamento repressor aos pobres, tratando-os como quase inumanos, o circulo não só de institucionalização se manterá, mas o de violência também, atingindo toda a sociedade (VEDOVELLO, 2008, p. 05).
Contudo, um dos principais desafios do sistema prisional brasileiro é a superlotação das unidades prisionais, que resulta em condições precárias de alojamento, alimentação e saúde para os presos. Esse problema é decorrente da falta de políticas públicas eficazes para a prevenção do crime, bem como da ineficácia do sistema judicial em garantir uma justiça rápida e eficiente.
Outro problema grave é a violência dentro das prisões, que afeta tanto os presos quanto os agentes penitenciários. A falta de investimentos em treinamento e capacitação dos agentes penitenciários, bem como a corrupção que permeia o sistema, tornam as prisões ambientes propícios para a prática de violência e abuso de poder.
Além disso, a falta de políticas públicas voltadas para a ressocialização e reintegração dos presos à sociedade é uma grande falha do sistema prisional brasileiro. Muitos presos são liberados sem qualquer preparação ou capacitação para retornar à vida em sociedade, o que aumenta a taxa de reincidência e o número de crimes cometidos.
É importante destacar que a situação do sistema prisional brasileiro afeta principalmente as populações mais vulneráveis, como negros, pobres e moradores de periferias urbanas. O encarceramento em massa dessas populações é uma forma de violência institucional que perpetua a desigualdade social no país.
Para solucionar os problemas do sistema prisional brasileiro, é necessário que sejam adotadas políticas públicas efetivas que visem à prevenção do crime, à diminuição da superlotação, à garantia dos direitos humanos dos presos e à reintegração desses indivíduos à sociedade. Investimentos em educação, saúde, cultura e lazer, assim como a promoção da justiça social e o combate à desigualdade, são fundamentais para a construção de um sistema prisional mais justo e eficaz.
3.DA COMUNIDADE LGBTQIA+
LGBT é a sigla utilizada para denominar Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais ou Transgêneros. Sendo utilizada desde meados dos 1990, a sigla é considerada uma adaptação de LGB, utilizada desde então para substituir o termo “gay” ao fazer referência à comunidade LGBT no fim dos anos 1980 (SANTOS, 2020).
De acordo com a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), a estimativa da população LGBT no Brasil é de cerca de 18 milhões de pessoas, não levando em conta pessoas intersexo e assexuais (Agência Senado, 2021).
O Movimento LGBT brasileiro nasceu durante o período da Ditadura Militar, que foi de 1964 a 1985. A sigla LGBT tem como principal objetivo promover a diversidade cultural com base nas questões de identidade sexual e gênero. Atualmente, é utilizada para se referir a qualquer pessoa que não se enquadra como heterossexual ou cisgênero (SANTOS, 2020).
Com o passar do tempo, a sigla evoluiu, com a inclusão de pessoas de diversas orientações sexuais e identidades de gênero, a sigla LGBTQIA+ representa diferentes grupos, com a oficialização das nomenclaturas, sendo que cada letra representa um grupo de pessoas.
A Constituição Federal de 1988 determina em seu artigo 3° os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, entre eles: promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (BRASIL, 1988).
No entanto, o Brasil é considerado um dos países que mais discrimina e mata pessoas LGBTQIA+ no mundo.
Uma das principais formas de discriminação enfrentada pela comunidade LGBTQIA+ é a violência homofóbica e transfóbica, que muitas vezes é cometida por agentes de segurança pública. O preconceito e a falta de capacitação desses agentes em relação às questões de gênero e sexualidade muitas vezes resultam em abusos e violações de direitos humanos.
Além disso, a comunidade LGBTQIA+ também enfrenta dificuldades no acesso à justiça, uma vez que muitos profissionais do direito não estão preparados para lidar com questões de gênero e sexualidade. Isso resulta em uma subnotificação de crimes e violações de direitos humanos contra essa população, bem como em uma baixa efetividade do sistema de justiça criminal no combate à homofobia e à transfobia.
Outro desafio enfrentado pela comunidade LGBTQIA+ no sistema de justiça criminal é a falta de políticas públicas efetivas que visem à sua proteção e promoção de seus direitos. É necessário que sejam adotadas medidas para capacitar os agentes de segurança pública, promover campanhas de conscientização e combate à homofobia e à transfobia, e garantir a igualdade de direitos e oportunidades para todos os cidadãos, independentemente de sua orientação sexual ou identidade de gênero.
No Brasil existem 884.885 presos, mas somente 4.745 presos se declaram partes da comunidade LGBTQIA+. Ressalta-se que 77% dos LGBTI+ que declaram abertamente sua sexualidade e identidade de gênero, se concentram em prisões que possuem alas/celas para essa população.
O Departamento de Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais - DPLGBT, da Secretaria Nacional de Proteção Global do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos - SNPG/MMFDH, atua cotidianamente para elaborar e implementar políticas públicas capazes de responder aos mais diferentes anseios da sociedade em termos de efetivação dos direitos de todas as pessoas. Mesmo reconhecendo os avanços conquistados nas últimas décadas em relação aos direitos humanos da população LGBTQIA+, é necessário também reconhecer que a violação de direitos ainda é consideravelmente presente na sociedade (PASSOS, 2020).
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1948) dispõe especialmente em seus artigos 2º e 7º sobre a igualdade a que têm direito todos os cidadãos, sem distinção de qualquer espécie, podendo estender essa disposição também quanto ao reconhecimento da identidade de gênero e da sexualidade, não devendo haver distinção, sob pena de violação de direitos humanos.
Em suma, a comunidade LGBTQIA+ é uma população vulnerável que enfrenta diversas formas de discriminação e violência, inclusive no âmbito do sistema de justiça criminal.
4.PROBLEMAS ENFRENTADOS PELA COMUNIDADE LGBTQIA+ NO SISTEMA CARCERÁRIO
Os presídios apresentam preconceito e repressão desproporcionalmente maiores contra indivíduos homossexuais. Para garantir seus direitos fundamentais, alguns estados adotaram alas exclusivas para presos LGBTQIA+ em alguns presídios. Essas alas visam prevenir violência física, moral e institucional, que pode ser praticada tanto por presos quanto por agentes penitenciários, além de garantir o direito dos presos de serem reconhecidos por seu nome de acordo com sua identidade de gênero e de terem acesso a cuidados de saúde específicos, como tratamentos hormonais.
No entanto, ao analisar o inciso XLVIII do artigo 5º da Constituição Federal (BRASIL, 1988), que determina que a pena deve ser cumprida em estabelecimentos distintos de acordo com o sexo do agente, percebe-se que o legislador deixou de considerar indivíduos que não se identificam com o sexo biológico. Não há menção alguma sobre gênero, pois as discussões sobre identidade de gênero ganharam importância recentemente, enquanto na época em que esse dispositivo foi criado, pouco se falava sobre o tema.
Diante da vulnerabilidade desses apenados, principalmente no que tange a omissão de criação de alas protetivas para este grupo, se questiona qual seria o tipo de responsabilidade que o Estado tem perante esses condenados e, deste modo, muitas são as questões sobre esse emblema para garantir a devida indenização ao preso LGBTQIA+ que teve seu direito lesado.
A comunidade LGBTQIA+ enfrenta uma série de desafios e problemas no sistema carcerário, que incluem:
· Violência e assédio: Pessoas LGBTQIA+ estão em maior risco de sofrer violência e assédio sexual em prisões, incluindo agressões físicas e verbais. Muitas vezes, essa violência é perpetrada por outros presos e até mesmo por funcionários do sistema carcerário.
· Discriminação: Pessoas LGBTQIA+ também enfrentam discriminação no sistema carcerário, incluindo tratamento diferenciado e punitivo em relação a outros presos. Isso pode incluir falta de acesso a serviços e programas educacionais, médicos e psicológicos, bem como acomodações inadequadas.
· Falta de acesso a cuidados médicos adequados: Pessoas LGBTQIA+ muitas vezes têm necessidades de saúde específicas que podem ser ignoradas ou mal atendidas no sistema carcerário. Por exemplo, pessoas transgênero podem precisar de terapia hormonal ou cirurgia de redesignação de gênero, mas muitas vezes não recebem esse tratamento.
· Isolamento: Pessoas LGBTQIA+ são frequentemente colocadas em isolamento por motivos de segurança, mas isso pode ter um impacto negativo em sua saúde mental e emocional. O isolamento também pode ser usado como uma forma de punição.
· Falta de reconhecimento legal: Muitas pessoas LGBTQIA+ são forçadas a se identificar como o gênero com o qual não se identificam ou a serem alojadas em prisões que não correspondem à sua identidade de gênero.
Esses são apenas alguns dos problemas enfrentados pela comunidade LGBTQIA+ no sistema carcerário. É importante que o sistema carcerário trabalhe para garantir que todas as pessoas, independentemente de sua orientação sexual ou identidade de gênero, sejam tratadas com respeito e dignidade e tenham acesso a cuidados de saúde adequados e tratamento justo.
5.SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS LGBTQIA+
O sistema prisional brasileiro é marcado por problemas como superlotação, violência, condições precárias de higiene e saúde e violação dos direitos humanos. Essas questões são ainda mais agravadas para indivíduos LGBTQIA+, que enfrentam discriminação, preconceito e violência dentro das prisões.
Para o WACQUANT (2011, p.12) o crescimento da população carcerária:
É o estado apavorante das prisões do país, que se parecem com campos de concentração para pobres, ou com empresas públicas de depósito industrial dos dejetos sociais, do que com instituições judiciárias servindo para alguma função penalógica [...] entupimento estarrecedor dos estabelecimentos, o que se traduz por condições de vida e de higiene abomináveis, caracterizadas pela falta de espaço, ar, luz e alimentação.
Para tentar lidar com essa realidade, algumas políticas públicas foram criadas para proteger os direitos dos presos LGBTQIA+ e garantir sua dignidade. Uma dessas políticas é a criação de alas exclusivas para LGBTQIA+ em algumas prisões, como já mencionado anteriormente. Essas alas são uma tentativa de garantir a segurança e o bem-estar dos presos, oferecendo um ambiente mais protegido contra a violência e a discriminação.
A Resolução Conjunta nº 1 do Conselho Nacional de Combate a Discriminação de abril de 2014 (BRASIL, 2014), busca sanar essa omissão com os presos que possuem uma identidade de gênero diferente, além de lhes garantir outras disposições referentes à sua identidade.
No parágrafo único de seu artigo 1º fica disposto a quem se direciona a referida resolução, conceituando ainda o termo LGBT, in verbis:
Parágrafo único - Para efeitos desta Resolução, entende-se por LGBT a população composta por lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, considerando-se:
I - Lésbicas: denominação específica para mulheres que se relacionam afetiva e sexualmente com outras mulheres;
II - Gays: denominação específica para homens que se relacionam afetiva e sexualmente com outros homens;
III - Bissexuais: pessoas que se relacionam afetiva e sexualmente com ambos os sexos;
IV - Travestis: pessoas que pertencem ao sexo masculino na dimensão fisiológica, mas que socialmente se apresentam no gênero feminino, sem rejeitar o sexo biológico; e
V - Transexuais: pessoas que são psicologicamente de um sexo e anatomicamente de outro, rejeitando o próprio órgão sexual biológico. (CNCD, 2014)
A resolução acima dispõe sobre a destinação de espaços específicos para travestis e gays que estão cumprindo pena privativa de liberdade em presídios masculinos, porém, isso depende da manifestação de vontade por parte dos detentos.
Assim, as alas exclusivas criadas têm como objetivo segregar para proteger, além de buscar a ressocialização dos presos. Embora a resolução inclua todas as medidas necessárias para a implementação de alas protetivas e melhores garantias para os presos LGBTs, ela não é obrigatória para os Estados. Além disso, a falta de destinação de um espaço exclusivo para esses presos é frequentemente justificada pela precariedade da estrutura dessas instituições penais ou por outros motivos, o que evidencia a negligência do sistema penal em relação à população LGBT.
Além disso, o Estado tem o dever de garantir o acesso aos serviços de saúde específicos para a população LGBTQIA+, incluindo atendimento psicológico, tratamento hormonal e prevenção e tratamento de doenças sexualmente transmissíveis. A inclusão de profissionais especializados em questões de gênero e sexualidade é fundamental para garantir o acesso a esses serviços.
Outra política importante é a capacitação de agentes penitenciários em relação às questões LGBTQIA+. O treinamento pode ser feito por meio de cursos específicos que abordem a diversidade sexual e de gênero e que instruam os profissionais sobre como lidar com esses presos, evitando preconceito, discriminação e violência.
Importante também mencionar, que no ano de 2019, uma decisão do ministro Rogério Schietti Cruz determinou que uma travesti em regime semiaberto tivesse o direito de pernoitar na ala feminina do Presídio Estadual de Cruz Alta (RS). Antes, a travesti estava alojada na ala masculina, já que não havia no local ala ou cela específica para o público LGBT+ (Proc. 2019/0065773-1 STJ).
Já no ano de 2021, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Roberto Barroso, decidiu que pessoas trans e travestis, que se identificam com o gênero feminino vão poder escolher cumprir pena em presídios femininos ou masculinos, porém em área reservada, que garanta a sua segurança. A decisão é oriunda de um pedido da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, através da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 527.
Assim, observa-se efetivamente que o Judiciário vem adotando aos poucos medidas para solucionar os problemas no sistema carcerário. No entanto, apesar dessas iniciativas, ainda há muito a ser feito para garantir a proteção dos direitos dos presos LGBTQIA+ no sistema prisional brasileiro. A conscientização sobre a importância de políticas públicas voltadas para a população LGBTQIA+ ainda é insuficiente, e muitos presos continuam sendo alvo de violência e discriminação dentro das prisões.
6.CONCLUSÃO
O sistema prisional brasileiro é um grande obstáculo para o exercício da liberdade. As prisões brasileiras são superlotadas, insalubres e violentas, o que viola os direitos humanos dos presos e dificulta a ressocialização. Além disso, muitas pessoas são presas preventivamente, sem condenação, o que configura uma violação do princípio da presunção de inocência.
As carceragens dos presídios no Brasil são frequentemente associadas à superlotação, condições precárias e um ambiente degradante. Embora sejam projetadas para cumprir a função de estabelecimentos onde os apenados devem cumprir suas sentenças penais como forma de reabilitação e reintegração na sociedade, infelizmente acabam por violar os direitos fundamentais desses presos.
A população LGBTQIA+ no sistema carcerário brasileiro enfrenta diversas formas de violência e discriminação, tanto por parte de outros presos quanto por agentes penitenciários. Essa população é mais vulnerável a abusos, incluindo violência física e sexual, assédio moral e negligência na prestação de serviços de saúde adequados.
Diante dessa realidade, algumas políticas públicas foram criadas para garantir a proteção dos direitos dos presos LGBTQIA+, como a criação de alas exclusivas em algumas prisões e a capacitação de agentes penitenciários em questões de diversidade sexual e de gênero.
No entanto, ainda há muito a ser feito para garantir a segurança e a dignidade da população LGBTQIA+ no sistema prisional brasileiro, incluindo a conscientização sobre a importância de políticas públicas voltadas para essa população e o fortalecimento das medidas de proteção existentes.
Entender como é hoje o sistema carcerário para a população LGBTQIA+ e quais as necessidades da criação das supracitadas alas tem como finalidade a recuperação de todos os princípios humanos e legais perdidos nos âmbitos das prisões, de modo a garantir os direitos humanos, visando combater a violência nesse ambiente e reagir ante o preconceito de gênero.
REFERÊNCIAS
AGENCIA SENADO. Perguntas sobre orientação sexual poderão ser incluídas no Censo. 2021. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/02/19/perguntas-sobre-identidade-de-genero-e-orientacao-sexual-poderao-ser-incluidas-no-censo>. Acesso em: 09 Nov. 2022.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 1988. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 09 Nov. 2022.
BRASIL. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. 1984. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm>. Acesso em: 09 Nov. 2022.
BRASIL. Código Penal. 1940. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em: 09 Nov. 2022.
BASTOS, C. L; KELLER, V. Aprendendo a aprender. Petrópolis: Vozes, 1995.
CALDAS, Ricardo Wahrendorff; CRESTANA, Silvério. Políticas Públicas Municipais de Apoio às Micro e Pequenas Empresas. São Paulo: Sebrae-SP, 2005.
CONSELHO NACIONAL DE COMBATE À DISCRIMINAÇÃO. Resolução Conjunta Nº 1. 2014. Disponível em: <http://www.lex.com.br/legis_25437433_RESOLUCAO_CONJUNTA_N_1_DE_15_DE_AB RIL_DE_2014.aspx >. Acesso em: 16 Abr. 2023.
Coordenação de Políticas para a Diversidade Sexual. Diversidade sexual e cidadania LGBTI+. 4ª ed. São Paulo: SJC/SP, 2020. Disponível em: <http://www.recursoshumanos.sp.gov.br/lgbt/cartilha_diversidade.pdf>. Acesso em: 10 Nov. 2022.
FONSECA, J. J. S. Metodologia da pesquisa científica. Fortaleza: UEC, 2002.
NASCIMENTO, Stephany. Sistema carcerário brasileiro: a realidade das prisões no Brasil. 2022. Disponível em: https://www.politize.com.br/sistema-carcerario-brasileiro/>. Acesso em: 09 Nov. 2022.
SANTOS, Greice. História da homossexualidade: o preconceito e a luta por igualdade de direitos. 2020. Disponível em: <https://portallitoralsul.com.br/historia-da-homossexualidade-o-preconceito-e-a-luta-por-igualdade-de-direitos/>. Acesso em: 14 Nov. 2022.
SOARES, Patricia Cristina dos Santos Bachega, QUÉIROZ, Imar Domingos. Sistema penitenciário e direitos humanos da população carcerária LGBT em Mato Grosso. 2019. Disponível em: <http://www.joinpp.ufma.br/jornadas/joinpp2019/images/trabalhos/trabalho_submissaoId_1438_14385cca28da879c7.pdf>. Acesso em: 09 Nov. 2022.
VEDOVELLO, Camila de Lima. Uma reflexão sobre o aumento do encarceramento de jovens, as instituições penitenciárias e a sociabilidade dos reclusos. In: Revista Sociologia: A sociedade entre muros Ano II / Edição nº 16 / 2008.
WACQUANT, L. As Prisões da Miséria. 4. Ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.
graduanda em Direito pela Universidade Brasil – Campus Fernandópolis.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Eduarda Luana Batista dos. População LGBTQIA+ no Sistema Carcerário Brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 jun 2023, 04:17. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/61740/populao-lgbtqia-no-sistema-carcerrio-brasileiro. Acesso em: 21 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
Precisa estar logado para fazer comentários.