EDUARDO AUGUSTO MADRUGA DE FIGUEIREDO FILHO
(orientador)
RESUMO: Esta monografia trata de um estudo sobre o instituto da tutela de urgência e as modificações trazidas com o Código de Processo Civil de 2015, com enfoque no instituto da estabilização da tutela antecipada antecedente e suas repercussões no mundo jurídico. Desse modo, esse trabalho tem por objetivo principal a análise dos efeitos causados a partir do deferimento e a, consequente, estabilização da referida espécie de tutela de urgência, ressaltando a não aplicação da coisa julgada material e a incidência ou não de ação rescisória sobre tal decisão. Para isso, inicialmente, realiza-se um breve estudo do CPC/73 e do CPC/15 no que se refere ao tratamento das tutelas provisórias, destacando as efetivas mudanças ocorridas que objetivaram, principalmente, a celeridade processual e, no âmbito das tutelas provisórias, a unificação. Em seguida, como problemática, aborda-se a possibilidade de rediscussão da decisão proferida em sede da estabilização da tutela antecipada antecedente em relação ao prazo previsto no §5º do art. 304 do CPC. Por fim, apresenta-se o questionamento sobre o cabimento da ação rescisória em face do exaurimento do prazo de dois anos previsto no artigo já mencionado.
Palavras-chave: Tutelas Provisórias. Tutela de Urgência. Antecipada. Caráter Antecedente. Estabilização. Coisa Julgada. Ação Rescisória.
ABSTRACT: This article deals with a study on the institute of urgent relief and the innovations brought with the advent of the new Civil Procedure Code, among them the phenomenon of stabilization of the advance (preventive) injunction and its repercussions in the legal world. In this way, this work has as its main objective the analysis of the effects caused by the deferment and consequent stabilization of this kind of urgent relief, emphasizing the non-application of the material res judicata and the incidence or not of rescission action on such decision. To this end, a brief comparative study of CPC/73 and CPC/15 is carried out, highlighting the effective changes that have been made, which mainly aimed the procedural promptness and, in the interim protection scope, the unification. Subsequently, as problematic, the possibility of discussion of the decision made in the context of the stabilization of the preceding advance injunction, in relation to the deadline envisaged in the §5º of the article 304 of CPC. Finally, the question on the adequacy of the rescission action in face of the two years deadline is raised, as preceding in the mentioned article.
Keywords: Interim Protection. Urgent Relief. Advance Injunction. Stabilization. Res Judicata. Motion to set aside judgment.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO. 2 TUTELAS PROVISÓRIAS: BREVE ANÁLISE COMPARATIVA A LUZ DO CPC/73 E CPC/15. 2.1 TUTELAS PROVISÓRIAS NO CÓDIGO CIVIL DE 1973. 2.2 ROUPAGEM CONFERIDA AS TUTELAS PROVISÓRIAS PELO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. 2.2.1 Tutela provisória de evidência. 2.2.2 Tutela Provisória de Urgência. 3 MOMENTO DO REQUERIMENTO: ANTECEDENTE E INCIDENTE. 3.1 TUTELA DE URGÊNCIA CAUTELAR REQUERIDA EM CARÁTER ANTECEDENTE. 3.2 TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA REQUERIDA EM CARÁTER ANTECEDENTE. 3.3 PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. 4 O INSTITUTO DA ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA DE NATUREZA ANTECIPADA REQUERIDA EM CARÁTER ANTECEDENTE. 4.1 REQUISITOS DA ESTABILIZAÇÃO. 4.2 AÇÃO AUTÔNOMA. 4.4 COISA JULGADA versus ESTABILIZAÇÃO. 4.4 COISA JULGADA versus ESTABILIZAÇÃO. CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.
O Código de Processo Civil de 2015 realizou mudanças substanciais no que se refere ao instituto das tutelas provisórias, iniciando pela abolição do processo cautelar e dispondo de capítulo específico para as tutelas provisórias. Assim, o diploma legislativo citado prevê as tutelas provisórias como gênero, do qual são espécies: a tutela de urgência e a tutela de evidência.
Assim, a tutela de urgência caracteriza-se pela comprovação da probabilidade do direito pretendido e a demonstração do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, sendo necessário que a parte requerente demonstre a urgência no pleito. Ao passo que, para ser concedida a tutela de evidência não se faz necessário à demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando restar caracterizada as hipóteses previstas nos incisos do art. 311 do Código de Processo Civil.
Em linhas introdutórias faz-se importante mencionar a relevância desse instituto no mundo jurídico e, principalmente, na realidade do Poder Judiciário brasileiro, o qual se encontra com grandes números de processo para julgamento e com ausência de celeridade processual. A morosidade processual ocasiona, indubitavelmente, falhas na prestação jurisdicional efetiva, sendo assim, as tutelas provisórias possuem a finalidade de diminuir essa má prestação.
Ademais, as tutelas provisórias, mais precisamente a espécie tutela de urgência são meios processuais que objetivam solucionar a “crise” do risco – do tempo - ao resultado útil do processo, ou seja, possuem a finalidade de efetivar sumariamente a prestação jurisdicional por meio de um juízo de probabilidade e incerteza, tendo em vista que se não for concedida naquele dado momento processual, a sua concessão a posteriori não terá mais eficácia prática, em razão do perecimento do direito pleiteado.
Nessa senda, a tutela de urgência possui duas naturezas, as quais têm os requisitos para sua concessão descritos no texto do CPC/15, sendo de natureza cautelar ou de natureza antecipada; para concessão de ambas faz-se necessário que seja demonstrado à probabilidade do direito e o perigo de dano ao resultado útil do processo. Assim, verifica-se que a lei exige os mesmos requisitos para concessão da tutela de urgência cautelar ou antecipada, todavia, o que vai diferenciá-las é a prática, a depender de qual se amolda melhor ao caso concreto.
Além disso, é importante salientar que a doutrina conjuntamente com a jurisprudência entende que no que se refere à concessão da tutela de urgência de natureza antecipada o Código de Processo Civil prevê outro requisito além daqueles supramencionados - o requisito da reversibilidade -, assim, caso os efeitos da concessão da tutela no caso concreto sejam irreversíveis o magistrado não deverá conceder a tutela de urgência antecipada, como apregoa o §3º do artigo 300 do Código de Processo Civil.
Nesse diapasão, outro ponto relevante que adveio com a legislação processual civil foi acerca do momento de requerimento das tutelas de urgência, as quais podem ser requeridas em caráter antecedente ou incidental. Importante pontuar que essa possibilidade foi prevista apenas para as hipóteses de tutelas de urgência, sendo quesito inaplicável as tutelas de evidência, o que é meio de críticas pelos doutrinadores - Daniel Amorim Assumpção Neves - ao argumento de que a tutela de evidência é semelhante à tutela antecipada, uma vez que se caracterizam por ser tutelas satisfativas, possuindo igual satisfação prática, razão por que se fazia razoável e proporcional estender essa previsão à tutela de evidência (NEVES,2018).
Considera-se requerida em caráter antecedente a tutela pleiteada antes do processo principal, possuindo uma exposição sumária da lide e outros requisitos, a depender da sua natureza, se cautelar ou antecipada, conforme será visto minuciosamente ao decorrer da presente monografia. Quanto ao requerimento formulado em caráter incidental, a tutela será pleiteada na petição inicial ou a qualquer momento do trâmite do processo.
No que tange a concessão da tutela de urgência de natureza antecipada em caráter antecedente, a qual é o cerne do presente trabalho, o CPC/15 abordou de forma inédita o instituto denominado “Estabilização da Tutela Antecipada Antecedente”, sendo a novidade mais importante no que se refere às regras das tutelas provisórias. Salienta- se que institutos correlatos já existiam em outros ordenamentos jurídicos, como na Itália e na França. Assim, o novel instituto vem dando azo a diversos questionamentos no mundo jurídico, tais como:
A parte demandada só pode se valer do meio recursal para impugnar a decisão que concede a tutela antecipada antecedente?
Sendo estabilizada a tutela - em virtude da não impugnação – a ausência de eventual de propositura da Ação prevista no §5º do art. 304 do CPC/15 ocasiona a coisa julgada material?
Qual seria a diferença entre coisa julgada material e estabilização?
Depois de esgotado o prazo de 2 (dois) anos da Ação prevista no §5º do art. 304 do CPC/15, as partes poderão se valer da Ação Rescisória?
Em vista desses questionamentos, surge a existência de uma decisão estabilizada, a qual foi proferida em sede de cognição sumária e juízo de probabilidade, não assegurada pela coisa julgada material conforme expressa disposição legal. Contudo, a lei prevê (art. 304, §2º, CPC) uma ação ordinária específica para revisão, reforma ou invalidação da tutela antecipada estabilizada, por qualquer das partes, com prazo de 2 (dois) anos e, em não sendo proposta a respectiva ação, a decisão torna-se imutável e indiscutível.
Nessa senda, depois de esgotado o prazo supracitado há quem sustente não haver coisa julgada material, mas sim um instituto semelhante, tendo em vista que acarreta os mesmos efeitos de imutabilidade e indiscutibilidade, próprio de uma decisão de mérito que pode ser impugnada por meio de ação rescisória.
A problemática surge após o esgotamento do prazo para ação específica, nessa hipótese, haverá coisa julgada material, apta a ser objeto de ação rescisória? Sustenta- se que não, ao argumento de que a lei prevê expressamente a inexistência de coisa julgada material, de modo que passa a existir em nosso ordenamento jurídico uma decisão definitiva que jamais será objeto de ação rescisória, mas que foi proferida em sede de cognição sumária e juízo de probabilidade.
Desta feita, a presente monografia objetiva discorrer acerca da estabilização da tutela antecipada, os meios pelos quais o réu poderá insurgir-se da decisão, bem como diferenciar os institutos da coisa julgada material e da estabilidade; por fim, analisar-se-á a (im) possibilidade de essa decisão ser revestida de coisa julgada material, com o respectivo cabimento de ação rescisória após o esgotamento do prazo de ação própria.
2.TUTELAS PROVISÓRIAS: BREVE ANÁLISE COMPARATIVA A LUZ DO CPC/73 E CPC/15
É fundamental que se perpasse pela análise das tutelas no anterior diploma processual civil para entender o objetivo do legislador em estabelecer novos contornos a esse instituto, compreendendo alterações de caráter legal propriamente ditas, bem como reformulações procedimentais.
Para iniciarmos o presente estudo, neste capítulo, será analisado o tratamento jurídico conferido às tutelas provisórias no Código de Processo Civil de 1973 e o código vigente, observando as modificações ocasionadas e as intenções legislativas.
2.1 TUTELAS PROVISÓRIAS NO CÓDIGO CIVIL DE 1973
A Constituição da República Federativa do Brasil prevê o acesso à justiça, contudo, sabe-se que apesar de garantido pela Constituição Federal o acesso à justiça e o direito a uma prestação jurisdicional célere, conforme prevê o artigo 5°, incisos XXXV e LXXVIII, a burocracia e a morosidade do judiciário vêm se destacando como principais dificuldades na efetividade dos referidos direitos.
Diante da necessidade de criar mecanismos que garantissem que o objeto da pretensão não fosse prejudicado com o decurso do tempo e a incerteza da decisão, o legislador criou o instituto das tutelas provisórias e, no Código de Processo Civil de 1973 destinou alguns artigos para tratar o tema.
A tutela provisória caracteriza-se por ser um instrumento do direito processual que tem como intuito antecipar a tutela jurisdicional e resguardar a eficácia do bem da vida pretendido, através de uma cognição sumária e não definitiva. Tal entendimento prevalecia no código passado e se manteve intacto, entretanto houve mudanças de terminologia e classificação, as quais serão exploradas no presente capítulo.
O Código de Processo Civil de 1973 trazia quatro espécies de tutelas provisórias, que estavam distribuídas pelo diploma normativo, quais sejam: as Tutelas Cautelares, as Tutelas Antecipadas, as Tutelas de Evidência e as Tutelas Satisfativas Autônomas.
Essas espécies não estavam compreendidas em um único espaço no código, pelo contrário, encontravam-se espalhadas pelo diploma legal. O processo cautelar, por exemplo, juntamente com os processos de conhecimento e de execução, formava o tripé do Código de Processo Civil na obtenção da prestação da tutela jurisdicional, e estava regulado no Livro III do CPC/73, dispondo sobre a aplicação de processo autônomo para preservar a eficácia do provimento jurisdicional. Já a tutela antecipada, que buscava antecipar os efeitos da futura decisão, estava consagrada no artigo 273, dentro do Livro I do CPC/73 (LEITE, 2018).
No que se refere à tutela de evidência não havia previsão expressa, mas a doutrina e a jurisprudência defendiam sua aplicação por meio do inciso II do artigo 273 do CPC/73. Por sua vez, as tutelas satisfativas autônomas, consideradas medidas atípicas, eram previstas dentro do rito cautelar, no já citado Livro III, resguardando o poder geral de cautela do magistrado (ALVES, 2018).
O Novo CPC, no entanto, alterou tal disposição, além de suprimir o livro que tratava do processo cautelar, objetivando a celeridade e a efetividade na prestação jurisdicional. Nesse contexto, distribuiu em seu Livro V todas as modalidades de tutelas provisórias, a partir do artigo 294, divididas em tutela de urgência e de evidência. Sistematizou o regime das tutelas de urgência já que unificou o procedimento de suas espécies, cautelar e antecipada, havendo, inclusive, a possibilidade de fungibilidade entre elas.
Nesse diapasão, afirma Humberto Theodoro Júnior (2016, p.786):
Sob o rótulo de ‘Tutela Provisória’, o novo CPC reúne três técnicas processuais de tutela provisória, prestáveis eventualmente em complemento e aprimoramento eficacial da tutela principal, a ser alcançada mediante o provimento que, afinal, solucionará definitivamente o litígio configurador do objeto do processo. Nesse aspecto, as ditas ‘tutelas provisórias’ arroladas pela legislação processual civil renovada correspondem, em regra, a incidentes do processo, e não a processos autônomos ou distintos. De tal sorte que a antiga dicotomia do processo principal (de cognição ou execução) e cautelar, existente no Código revogado, não mais subsiste na nova lei, pelo menos como regra geral, restando bastante simplificado o procedimento. Correspondem esses provimentos extraordinários, em primeiro lugar, às tradicionais medidas de urgência – cautelares (conservativas) e antecipatórias (satisfativas) -, todas voltadas para combater o perigo de dano que possa advir do tempo necessário para cumprimento de todas as etapas do devido processo legal. [sic]
Outro ponto de destaque foi à criação da figura da estabilização da tutela antecipada, objeto de maior análise na presente monografia, que ocorre quando a medida é deferida por meio de tutela antecipada – satisfativa – em caráter antecedente, mas não é impugnada pelo “respectivo recurso”, conforme preleciona o artigo 304 do CPC/15.
Ocorrerá, então, a extinção do processo e um efeito semelhante à coisa julgada, tendo em vista que a tutela estabilizada não será alterada, a não ser por ação própria de impugnação e desde que ajuizada em um prazo de 2 (dois) anos, como dispõe o §5° do referido artigo.
2.2 ROUPAGEM CONFERIDA AS TUTELAS PROVISÓRIAS PELO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015
É imprescindível a análise da roupagem conferida às tutelas provisórias no Código de Processo Civil vigente, observando a natureza jurídica e as peculiaridades inerentes a cada espécie.
Como é sabido no ordenamento jurídico brasileiro a prestação jurisdicional pode ser concedida de forma definitiva ou provisória, tem-se por prestação definitiva aquela obtida por meio de cognição exauriente e juízo de certeza, demandando, via de regra, um trâmite processual mais demorado e com aptidão de forma coisa julgada material.
Observa-se que com a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015, não existe mais o “processo cautelar”, haja vista que o livro destinado a esse instituto foi inteiramente extinto, com o novo regime, as medidas cautelares serão concedidas dentro do processo principal (BORBA, 2018, p.55).
As tutelas provisórias no CPC/15 é gênero, que tem duas espécies, quais sejam: a tutela provisória de urgência e a tutela provisória de evidência. No ordenamento jurídico brasileiro as tutelas provisórias foram inseridas pelo legislador para serem concedidas de forma provisória, por meio de cognição sumária e juízo de mera probabilidade, tendo em vista que poderá ser modificada ou revogada a qualquer momento no processo, conforme dispõe o artigo 296 do CPC.
2.1.1 Tutela provisória de evidência
A tutela provisória tem como uma de suas espécies a tutela de evidência, que se caracteriza por ser concedida independente da existência de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, desde que a hipótese pleiteada se adeque a um dos incisos previsto no artigo 311 do Código de Processo Civil.
A característica mais importante dessa espécie é a desnecessidade de demonstrar o perigo de dano, quem pleitear a concessão da tutela de evidência deve requerer alguma das hipóteses previstas para sua concessão, não havendo necessidade de preencher o requisito do perigo de dano, por outro lado, para concessão da tutela de urgência a presença deste requisito é imprescindível.
As hipóteses para sua concessão são: quando ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte; quando as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante; quando se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequado do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação e multa; e quando a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.
No que tange a tutela de evidência, verifica-se que o Código de Processo Civil no artigo 311 previu quatro hipóteses de concessão e, no parágrafo único desse dispositivo legal o CPC estabeleceu que o juiz poderá decidir liminarmente duas das quatro hipóteses de concessão, quais sejam: quando as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante e quando se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequado do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação e multa. Assim, o dispositivo ao prevê que o juiz decidirá liminarmente, quis dizer que o magistrado decidirá sem ouvir a parte requerida acerca do pleito.
O objetivo desta espécie é de conferir tratamento jurídico diverso para aquele autor que é titular de um direito evidente, pois não é razoável nem proporcional exigir que o autor de um direito evidente suporte a demora do trâmite processual para obter uma tutela definitiva, quando é portador de um direito evidente.
A doutrina entende que o legislador foi feliz ao destinar um artigo específico para a tutela de evidência, pecando apenas na enumeração das hipóteses, as quais deveriam ter uma enumeração mais abrangente, louvável também é a possibilidade da tutela de evidência ser pleiteada em qualquer espécie de processo e de procedimento, podendo ser concedida no âmbito dos Juizados Especiais, no bojo da impetração de um Mandado de Segurança e dos demais tipos de processos e procedimentos.
Nesse sentido, preleciona Daniel Amorim Assunção Neves (2018, p.541):
O art. 311, caput, do Novo CPC consagra expressamente o entendimento de que tutela de evidência independe da demonstração de perigo da demora da prestação da tutela jurisdicional, em diferenciação clara e indiscutível com a tutela e urgência. É cabível em qualquer espécie de processo ou de procedimento (exemplificativamente o Enunciado 49 da I Jornada de direito processual civil do CJF: “A tutela de evidência pode ser concedida em mandado de segurança”), inclusive nos Juizado Especiais.
Apesar de ser divergência entre os doutrinadores, prevalece que o rol previsto no artigo 311 do Código de Processo Civil, o qual enumera as hipóteses de cabimento da tutela de evidência, trata-se de rol exemplificativo, tendo em vista que no próprio Código de Processo Civil há outras hipóteses de tutela de evidência, tais como: a liminar em ações possessórias e a concessão liminar do mandado monitório.
2.1.2 Tutela Provisória de Urgência
Como supracitado, as tutelas provisórias sofreram uma reformulação no Código de Processo Civil vigente em razão da tentativa de adequação à realidade social e o constante combate a morosidade do judiciário. Desse modo, o legislador buscou sistematizar tal instituto, atribuindo-lhe a unificação, facilitando seu entendimento e sua aplicação, principalmente em relação às tutelas de urgência que compartilham os mesmos requisitos de concessão e, por isso, tornam-se sujeitas a fungibilidade.
A tutela provisória de urgência, seja antecipada ou cautelar, é uma medida que visa afastar o risco de prejuízo gerado em função da demora do processo e pressupõe a demonstração de dois requisitos próprios para sua concessão, quais sejam: o juízo de probabilidade e o risco ao resultado útil do processo,é o que dispõe o artigo 300 do CPC/2015 (BRASIL, 2018), vejamos:
Artigo 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Assim, para sua concessão é necessário que se esteja presente a aparência do direito alegado, ou seja, as alegações do requerente devem demonstrar a probabilidade jurídica do pleito, conhecida como “fumus boni iuris” e, diferentemente da tutela de evidência, tem que está presente o “periculum in mora”, demonstrando a necessidade de amparo imediato visto o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.
Ademais, de acordo com §1° do artigo supra, o juiz pode exigir como garantia, caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo esta caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la, assim, o CPC prevê a possibilidade da exigência da prestação de caução, de acordo com o doutrinador Daniel Amorim Assunção a prestação só deve ser exigida quando ou juiz estiver e, dúvida a respeito da concessão da tutela e notar, no caso concreto, a presença da irreversibilidade recíproca (NEVES,2018, p. 509).
Ao prevê a possibilidade de fixação de caução, o legislador visou uma forma de proteger a parte requerida em razão do princípio geral do direito de que todo aquele que causar prejuízo tem o dever de indenizar, bem como da teoria do risco-proveito, de modo que o beneficiário responde objetivamente pelos danos causados à parte contrária na hipótese de eventual e futura revogação ou modificação da tutela.
Além disso, a prestação de caução também serve para que a finalidade do instituto não seja desviada, devendo o requerente pleitear a tutela nos casos que seu direito seja provável e que exista efetivamente o perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo.
Salienta-se que a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo são requisitos idênticos para concessão da tutela de urgência de natureza cautelar e de natureza antecipada, contudo, a finalidade dessas duas subespécies de tutela de urgência é distinta.
As espécies de tutela de urgência se distinguem quanto ao que objetivam; enquanto a cautelar busca conservar o objeto da demanda, assegurando a futura prestação, a tutela antecipada tem caráter satisfativo, adiantando o direito pretendido. Ou seja, nas palavras de Pontes de Miranda, “a tutela cautelar garante para satisfazer, já a tutela antecipada satisfaz para garantir” (apud ORTEGA, 2016).
Apesar dessa distinção, e em razão de tais institutos possuírem os mesmos fundamentos para a sua concessão e viverem sob o mesmo rótulo da urgência, admite-se a fungibilidade, conforme aduz o art. 305 do CPC/15, parágrafo único, e o enunciado 502 do Fórum Permanente de Processualistas Civis. Sendo assim, entende-se que se o pedido tem natureza satisfativa, mas foi postulado como tutela cautelar antecedente, cabe ao juiz examinar o requerimento de acordo com a sua verdadeira natureza e vice-versa, ainda que omisso o código nesse sentido (CASADO, 2018).
Importante frisar que quanto ao momento de interposição, elas podem ser concedidas em caráter antecedente ou incidental. Diz-se antecedente aquela pleiteada antes da dedução em juízo do pedido principal, enquanto a última refere-se àquela requerida depois de iniciada o processo, com pedido de tutela como tópico na própria petição inicial ou através de petição devidamente fundamentada, sem a necessidade de novas custas (NEVES, 2016).
3.MOMENTO DO REQUERIMENTO: ANTECEDENTE E INCIDENTE
O CPC inova ao trazer a possibilidade de concessão da tutela de urgência, podendo ser concedidas em caráter antecedente ou incidente, nos termos do parágrafo único do artigo 294 do CPC. Essa classificação é feita quanto ao momento processual que a tutela for requerida.
Neste capítulo, serão abordadas as considerações acerca das tutelas de urgências requeridas em caráter antecedente e incidental, haja vista que a depender do instante que é requerida os atos processuais subsequentes serão diferentes, bem como os efeitos porventura ocorridos também serão diversos e, por fim, será destinado um tópico para tratar sobre a aplicação do Princípio da Fungibilidade às tutelas provisórias de urgência.
É importante frisar que o dispositivo exclui a possibilidade da tutela de evidência, prevista no artigo 311 e já abordada exaustivamente no capítulo anterior, ser concedida de forma antecedente, ou seja, em momento anterior ao pedido principal da demanda (NEVES, 2018, p. 495).
3.1 TUTELA DE URGÊNCIA CAUTELAR REQUERIDA EM CARÁTER ANTECEDENTE
A tutela cautelar caracteriza-se por ser a subespécie da tutela de urgência que visa assegurar o direito pleiteado pelo autor, encontra-se prevista no artigo 301 do Código de Processo Civil (BRASIL,2015), que dispõe:
Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito.
Essa tutela cautelar pode ser requerida de forma antecedente ou incidental, esta última se verifica quando o autor requer a tutela junto com a Petição ou curso do processo. Assim, a forma incidental é aquela que o autor faz o pedido de tutela cautelar junto com a Petição Inicial ou, após o protocolo da exordial, quando no trâmite do processo o autor atravessa uma petição requerendo uma tutela cautelar.
Sem mais complicações para o requerimento feito de modo incidental, maiores considerações e peculiaridades encontram-se ao requerimento feito de forma antecedente. Quando a tutela cautelar for requerida de forma antecedente, incumbe ao autor posteriormente formular o pedido principal.
O artigo 305 do CPC prevê o procedimento que deve ser adotado para o requerimento da tutela cautelar em caráter antecedente, a petição inicial deve ter os seguintes requisitos: indicar a lide e o seu fundamento; fazer a exposição sumária do direito que objetiva assegurar com a tutela cautelar e, por fim expor o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Requisito importante, que não está previsto de forma expressa no artigo 305 do CPC, mas tratando-se de Petição Inicial deve ser observado, no que couber o artigo 319 do CPC, é o de que a parte autora deverá indicar, desde logo, o valor da causa. Nesse sentido é o Enunciado 44 da I Jornada de direito processual civil do CJF, que dispõe: “É requisito da petição inicial da tutela cautelar requerida em caráter antecedente a indicação do valor da causa” (NEVES, 2018, p.528/529).
No que concerne ao requisito da exposição da lide e do seu fundamento é a incumbência do autor de demonstrar ao Juízo o que será discutido futura mente no pedido principal do mérito da demanda e, quanto a exposição sumária do direito entende os doutrinadores como a demonstração do fumus boni iuris, e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo a presença do periculum in mora.
Acerca dos requisitos dispõe Daniel Amorim Assumpção Neves (2018, p.528):
Por “lide e seus fundamentos” entende-se a indicação do objeto da ação principal, o que se exige em razão da instrumentalidade da ação cautelar. Cabe ao requerente, portanto, indicar do que tratará o futuro pedido principal, o que permitirá ao juiz analisar se a cautelar efetivamente cumpre sua missão de acautelamento. A “exposição sumária do direito ameaçado” é sinônimo de fumus boni iuris, enquanto o receio de lesão é o periculum in mora . Trata-se do mérito do pedido cautelar.
No que tange ao procedimento da tutela cautelar antecedente, tem-se a existência e a previsão legal do princípio do contraditório na demanda cautelar, em consonância com o que dispõe o artigo 306 do CPC, que prevê a citação do réu, no prazo de 5 (cinco) dias para contestar o pedido e indicar as provas que pretende produzir.
Observa-se que nessa “contestação preliminar” o réu poderá arguir todas as defesas processuais existentes, contudo, é defeso, neste momento processual, apresentar reconvenção e pleitear as modalidades da intervenção de terceiros (NEVES, 2018530/531).
O artigo 307 do CPC dispõe acerca dos efeitos jurídicos que irão ocorrer, na hipótese do réu não apresentar contestação ao pedido de tutela cautelar. Devidamente citado, caso o réu mantenha-se inerte, a legislação prevê que os fatos alegados pelo autor no pedido de tutela cautelar serão presumidamente aceitos pelo réu como ocorrido.
Nesse ponto, verifica-se uma redação legislativa diferente da prevista no artigo 344 do CPC, em que prevê a presunção de veracidade das alegações de fatos formuladas pelo autor, todavia, para a doutrina, essa modificação na redação textual não tem relevância prática, tendo em vista que a natureza do instituto da revelia não se altera e os efeitos que lhe são próprios são gerados independentemente da natureza do pedido que deixou de contestar (NEVES, 2018, P. 531).
Após a realização desses atos processuais já abordados neste tópico, seguirá o procedimento comum, de acordo com o parágrafo único do artigo 307 do CPC. De início, no artigo 308 do mesmo diploma legislativo, é de bom alvitre atentar para a utilização do verbo efetivar, nota-se que o termo inicial para apresentação do pedido principal só começara a contar a partir da efetivação da tutela cautelar.
O legislador ao prever a efetivação da tutela cautelar foi claro e objetivo na intenção de dizer que é irrelevante o momento da propositura da demanda ou da concessão da tutela cautelar para iniciar o prazo de 30 (trinta) dias para elaboração do pedido principal, só será relevante o momento em que a tutela cautelar for efetivada, ou seja, é o devido cumprimento do acautelamento no mundo dos fatos.
Assim, após a efetivação da tutela cautelar requerida e concedida em caráter antecedente, a parte autora terá o prazo de 30 (trinta) dias para formular o pedido principal, sendo a apresentação do pedido principal realizada nos mesmos autos e independente do pagamento de novas custas processuais. Como já dito, seguirá o procedimento comum, ou seja, com a apresentação do pedido principal, as partes serão intimadas para audiência de conciliação ou de mediação e, em não havendo composição, iniciará o prazo para apresentação de contestação, nos termos do que preceitua o artigo 335 do CPC.
3.2 TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA REQUERIDA EM CARÁTER ANTECEDENTE
A tutela antecipada, como já citada, também poderá ser requeria em caráter incidental e antecedente e, na legislação processual civil, encontramos maiores peculiaridades na tutela antecipada concedida em caráter antecedente, tendo em vista a criação do instituto da estabilização da tutela antecipada antecedente, o qual é o ponto central da presente monografia.
O ordenamento jurídico brasileiro ao criar a tutela antecipada requerida em caráter antecedente inspirou-se no Direito Francês no instituto denominado juridiction référé, este instituto francês é reconhecido por ter uma jurisdição de cognição sumária, salienta-se, que a legislação brasileira “bebeu na fonte” do ordenamento francês para implementar a estabilização, contudo, não se trata de institutos idênticos..
No ordenamento jurídico francês, o processo denominado référé é autônomo ao processo principal, não sendo considerado um processo preliminar em relação ao principal, considera-se que ambos giram em torno do mesmo litígio, porém não possui o mesmo objeto, motivo pelo qual não pode ser considerado um preliminar e outro principal (SILVA, 2015).
Nesse ínterim, consoantes lições de Jaqueline Mielke Silva:
Ao contrário da nossa vigente tutela antecipada, que sempre está condicionada ao julgamento do pedido principal, não passando de um acessório, cujo destino fica sempre vinculado ao acertamento a ser feito futuramente, no direito francês, o procedimento do référé é completamente autônomo em relação ao processo de fundo. (...) A autonomia em questão faz com que o juiz do référé não seja alguém que delibera no aguardo de uma posterior e necessária intervenção de fundo em outra prestação jurisdicional. Essa ulterior composição do litígio, de caráter definitivo, pode eventualmente acontecer, mas não como necessidade sistemática ou orgânica. Mesmo que os dois procedimentos girem em torno do mesmo litígio, não perseguem o mesmo objeto e, por isso, não pode um ser considerado como preliminar do outro. O fim principal e específico do référé não é a composição definitiva do conflito, mas sim a “estabilização de uma situação, a interrupção de uma ilicitude ou a paralisação de um abuso”. Mas tudo é feito sumariamente e sem aspiração de definitividade. (sn, 2015).
No référé do Direito Francês não se exige nem se espera um julgamento com definitividade, ademais, os processos são independentes, não se tratando de um processo preliminar e outro principal. Verifica-se que a legislação processual civil do Brasil exige que, após a concessão da tutela antecipada antecedente, o requerente, obrigatoriamente, proceda com o aditamento da petição inicial, sob pena da extinção do processo sem resolução de mérito. Segundo preleciona Loureiro apud Gustavo Bohrer Paim: “as decisões pautadas no référé podem ser utilizadas de fato como substituto eficaz de uma decisão definitiva, já que não há obrigação legal de dar início a um processo de fundo” (sn, 2020).
Ademais, o aditamento deverá ocorrer no mesmo processo em que foi requerida a tutela, ou seja, nesta questão, já se observa uma diferença com o ordenamento francês, pois, na França, os processos são autônomos e, o que a legislação brasileira estabelecer é a existência de um pedido preliminar e de um pedido final, inclusive, utiliza-se da denominação “pedido de tutela final” no §4º do artigo 303 do CPC.
Além disso, alguns doutrinadores criticam o legislador brasileiro por não ter previsto um âmbito de incidência maior da estabilização, restringindo-se apenas a tutela antecipada antecedente, sendo outra diferença encontrada com o référé, tendo em vista que este não exige o requisito da urgência, findando por ter um âmbito de aplicação mais amplo.
Em consonância com os dizeres de Loureiro apud Gustavo Bohrer Paim (sn, 2020):
O référe provision oferece um exemplo próximo da mutação da função da proteção jurisdicional provisória, em favor da destituição da condição de urgência. O référé provision é, sem dúvida, o exemplos mais notável de um référé cuja execução não é submetida à urgência (...) Não há qualquer vinculação à urgência.
Sem intenção de esgotar todas as diferenças do instituto do référé com o instituto da estabilização da tutela antecipada antecedente, objetivando apenas demonstrar que o legislador brasileiro inspirou-se no ordenamento francês, passaremos nesse momento a analisar o tópico de acordo com a legislação prevista no Código de Processo Civil de 2015.
Nessa questão, é importante pontuar, que a estabilização só ocorre na tutela antecipada requerida em caráter antecedente, conforme preceitua o artigo 303 e seguintes do CPC. Então, com atenção à celeridade processual, à urgência do requerimento e ao fato de que o decurso normal do processo pode ensejar a perda da eficácia do procedimento ou até mesmo o desaparecimento do direito pleiteado, a legislação estabeleceu que o autor pode formular uma Petição Inicial mais simplificada, não necessitando, neste momento processual preliminar, atender a todo os requisitos do artigo 319 do CPC.
Assim, nas hipóteses em que a urgência é contemporânea à propositura da ação, o CPC concede uma opção ao requerente, haja vista que a lei prevê que o autor poderá limitar a petição inicial aos seguintes requisitos: requerimento da tutela antecipada; indicação do pedido de tutela final; exposição da lide e do direito que se busca realizar; e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo.
Além disso, em acertada e feliz previsão, o §5º do artigo 303 do CPC prevê que o autor indicará na petição inicial que pretende utilizar-se do benefício do requerimento em caráter antecedente da tutela antecipada, haja vista que poderão existir casos em que essa opção não fique clara e, o juiz precisa saber que o autor está apresentando uma petição inicial mais simplificada e, posteriormente vai completa-lá
A esse respeito, Mozart Borba (2018, p.59):
Pois é, o CPC/15 traz para o ordenamento brasileiro uma OPÇÃO de pedido de tutela antecipada. Como vimos no artigo supratranscrito, o autor poderá fazer sua inicial limitando-se à exposição do pedido de urgência (explicar o que está acontecendo e requerer a liminar), bem como indicar os pedidos de tutela final. Tipo uma petição inicial de uma ou duas folhas (é a petição inicial PROVISÓRIA).
Após a distribuição ou o registro da petição inicial, o juiz ao analisar a tutela antecipada, caso entenda que há elementos para sua concessão, intimará o autor para cumprir sua obrigação de fazer, consistente no dever de aditar a petição inicial em 15 (quinze) dias ou em outro prazo maior que fixar.
O aditamento da inicial exige do autor a complementação da argumentação jurídica, a juntada de novos documentos e, neste momento, o requerente confirma o pedido de tutela final e, após essas exigências, seguira o trâmite do procedimento comum, com a citação do réu e intimação para comparecer a audiência de conciliação ou mediação, na forma do artigo 334 do CPC.
Sabe-se que a tutela antecipada antecedente pode ser indeferida, na hipótese do juiz entender que não há elementos para sua concessão e, nesse caso, o juiz intimará o autor para emendar a petição inicia, no prazo de 5 (cinco) dias, sob pena de indeferimento da petição inicial e, consequente extinção do processo sem resolução de mérito.
Dessa forma, observa-se que os atos processuais são diferentes no caso de concessão ou de não concessão da tutela antecipada, no entanto, o comportamento do autor é essencial para que o processo prossiga e, na hipótese, de inércia a consequência será a mesma para ambas as hipóteses, qual seja: extinção do processo sem resolução de mérito.
3.3 PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE
No ordenamento jurídico brasileiro, o princípio da fungibilidade vem sendo aplicado para muitos institutos, percebe-se a sua grande aplicação nos entendimentos jurisprudências e, por esses motivos, o legislador, cada vez mais, vem dando atenção ao princípio e positivando a sua regulamentação.
Indubitavelmente, o princípio auxilia na prestação de uma atividade jurisdicional efetiva, tendo em vista que a sua utilização, no caso concreto, colocam em prática outros princípios, tais como o da economia processual e o da celeridade, beneficiando assim as partes da relação.
É imprescindível ressaltar que apesar das diferenças existentes entre a tutela antecipada e a tutela cautelar, a prática forense, em razão da sua dinâmica, que lhe é inerente, traz, constantemente, situações que colocam os operadores do direito em zonas de incerteza quanto a espécie de cabimento de tutela, situações que ocasionam dúvida – insegurança – objetiva entre os profissionais.
Assim, diante das possíveis dúvidas objetivas existentes e dos benefícios processuais, surgiu a necessidade de prevê a fungibilidade para as tutelas cautelar e antecipada, relativizando assim o formalismo exacerbado em prol da celeridade e efetividade processual (MARTINS, 2015).
No que se refere ao princípio da fungibilidade das tutelas de urgência, com previsão no parágrafo único do artigo 305 do CPC, a sua aplicação dá-se na tutela de urgência (antecipada ou cautelar) requerida em caráter antecedente, visto que são os requisitos desta espécie de tutela que, normalmente, ocasiona a denominada dúvida objetiva, que se caracteriza por ser uma divergência doutrinária ou jurisprudência acerca de determinado assunto (PATRIOTA, 2020, sn).
Assim, não há que se falar da aplicação do princípio da fungibilidade no requerimento de tutela de urgência de forma incidental, haja vista que, nesta espécie, o procedimento a ser adotado é o mesmo, conforme os ensinamentos do doutrinador Daniel Amorim Assumpção Neves (2018, p. 305):
(...) Note-se que a relevância pratica da fungibilidade consagrada em lei limita-se ao pedido de tutela de urgência antecedente, já que no pedido incidental o procedimento é idêntico às duas espécies de tutela, sendo, nesse caso, irrelevante na prática a distinção entre tutela cautelar e tutela antecipada.
Como já citado, detalhadamente, no presente trabalho, o legislador, não unificou o procedimento da tutela cautelar e da tutela antecedente, por mais que existam muitas semelhanças entre as duas, à legislação conferiu tratamento específico para cada uma.
O artigo 305, parágrafo único, do CPC prevê que caso o juiz entenda que o pedido de tutela cautelar antecedente tem, na verdade, natureza antecipada, o magistrado deverá receber como tutela satisfativa e observar o rito previsto no artigo 303 do mesmo diploma legal.
Assim, a legislação prevê que o juiz ao percebe a hipótese de fungibilidade, deverá aplicar, desde logo, as regras inerentes a tutela correta, independente de qualquer comportamento do requerente, não à inicial, a fungibilidade acabava perdendo sua importância prática na celeridade e na efetividade.
Nessa senda, percebe-se que o Princípio da Fungibilidade, nessa espécie, é de suma importância prática, em virtude da urgência no pleito das tutelas, além do mais, assegura o direito fundamental das partes da razoável duração do processo judicial, prevista no inciso LXXVIII da Constituição da República Federativa do Brasil.
4.O INSTITUTO DA ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA DE NATUREZA ANTECIPADA REQUERIDA EM CARÁTER ANTECEDENTE
O Código de Processo Civil vigente inovou em alguns institutos, dentre eles, nos requisitos e efeitos do (in)deferimento da Tutela Antecipada como já explanado na presente monografia e, neste capítulo, busca-se analisar o instituto da estabilização da tutela satisfativa antecipada.
Preconiza o doutrinador Daniel Amorim Assunção (2018, p.520) que esta é a maior e mais relevante novidade quanto á tutela provisória trazida pela legislação, qual seja: a Estabilização da tutela antecipada.
Ressalta-se que a tutela antecipada de caráter antecedente foi à única contemplada com a estabilização, não incluindo a tutela cautelar e tutela de evidência, opção legislativa que recebe crítica doutrinária no que se refere a não inclusão da estabilização para a tutela de evidência, tendo em vista a sua natureza satisfativa igualmente a tutela antecipada.
Nesse sentido, preleciona Daniel Amorim Assumpção Neves (2018, p. 520/521):
Compreendo a opção do legislador em não ter incluído na regra da estabilização a tutela cautelar, afinal, essa espécie de tutela provisória de urgência tem natureza meramente conservativa, criando uma nova situação fática diferente daquela que seria criada com o acolhimento da pretensão do autor. (...) O mesmo, entretanto, não se pode dizer da tutela provisória de evidência, que, a exemplo da tutela antecipada, tem natureza satisfativa. Nesse caso, o legislador parece ter dito menos do que deveria, porque as mesmas razões que o levaram a criar a estabilização da tutela antecipada indiscutivelmente aplicam-se à tutela de evidência.
4.1 REQUISITOS DA ESTABILIZAÇÃO
O instituto da estabilização da tutela antecipada antecedente encontra-se previsto no artigo 304 do CPC, em que estabelece os requisitos para sua concessão, assim, o dispositivo legal prevê que a tutela antecipada antecedente concedida, torna-se estável, se da decisão que a deferiu não for interposto o recurso cabível e, caso a decisão torne- se estável o processo será extinto, conforme §1º do dispositivo citado.
O texto legal exige que a parte réu, ao se sentir prejudicada, interponha o respectivo recurso da decisão e, na sua inércia, a concessão será estabilizada e o processo extinto, esta previsão fez surgir grandes controvérsias, visto que a exigência do legislador para que o réu recorra da decisão viola o princípio da voluntariedade, inerente ao sistema recursal.
Da intepretação literal do dispositivo supracitado, vê-se que o réu não pode apenas se insurgir da decisão dentro do mesmo processo que foi deferida a tutela, tendo a obrigatoriedade de recorrer, no entanto, em virtude das enormes críticas doutrinárias, e também da incongruência do previsto no dispositivo com as demais normas do ordenamento jurídico, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça deu interpretação diversa ao dispositivo.
A jurisprudência da Corte Superior estabeleceu que apesar de o artigo 304, caput, do CPC, prevê “recursos”, deve ser feita uma leitura do dispositivo à luz de uma interpretação teleológica e sistemática do instituto, de modo que a tutela só se tornará estável se não houve nenhum tipo de impugnação, ou seja, o réu poderá se valer de outros meios processuais para se insurgir contra essa decisão.
Nesse teor, preleciona o professor Márcio Alexandre André Lopes Cavalcante sn, 2019):
Uma das grandes novidades trazidas pelo novo CPC a respeito do tema é a possibilidade de estabilização da tutela antecipada requerida em caráter antecedente, instituto inspirado no référé do Direito francês, que serve para abarcar aquelas situações em que ambas as partes se contentam com a simples tutela antecipada, não havendo necessidade, portanto, de se prosseguir com o processo até uma decisão final (sentença), nos termos do que estabelece o art. 304, §§ 1º a 6º, do CPC/2015. A ideia central do instituto é que, após a concessão da tutela antecipada em caráter antecedente, nem o autor nem o réu tenham interesse no prosseguimento do feito, isto é, não queiram uma decisão com cognição exauriente do Poder Judiciário, apta a produzir coisa julgada material. Por essa razão, é que, apesar de o caput do art. 304 do CPC/2015 falar em “recurso”, a leitura que deve ser feita do dispositivo legal, tomando como base uma interpretação sistemática e teleológica do instituto, é que a estabilização somente ocorrerá se não houver qualquer tipo de impugnação pela parte contrária. STJ. 3ª Turma. REsp 1.760.966-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 04/12/2018 (Info 639)
O instituto da Estabilização foi criado e pensado para a solução de casos concretos simples, que por sua natureza não precisem de uma tramitação processual tão morosa, tendo em vista que as partes já conseguem seu objetivo final no momento processual de estabilização da tutela antecipada.
Ponto importante citou o Professor Márcio Alexandre foi que a tutela antecipada estabilizada foi idealizada para aquelas demandas que após a simples concessão da tutela nem o autor nem o réu tenha interesse no prosseguimento do feito, pois ambos já “ficam” satisfeitos com a mera concessão.
A decisão do STJ é prudente, tendo em vista que antes desse entendimento, caso o réu não recorresse ou caso ele quisesse se insurgir da concessão por meio de uma contestação, esta não seria considerada e ele teria contra si uma decisão desfavorável, da qual não exerceu o contraditório substancial, e, ainda, teria que suportar os efeitos da estabilização de uma decisão proferida em cognição sumária e mero juízo de probabilidade.
Apesar dessas consequências, a legislação é clara ao dispor que se o réu não recorrer, a tutela será estabilizada, contudo, atualmente, o réu poderá se impugnar a tutela concedida por qualquer meio processual, não sendo mais restrita só a interposição do Agravo de Instrumento.
Assim, um dos requisitos para que a tutela antecipada seja estabilizada é a inércia do réu, pois caso o réu, por qualquer meio processual de impugnação, opte por não ficar silente a tutela não será estabilizada e, na hipótese do réu optar por recorrer, não se exige o conhecimento e tampouco o provimento recursal, basta que o réu interponha o recurso demonstrando o seu interesse no prosseguimento do feito que a tutela não será estabilizada.
A única hipótese que a maioria da doutrina elenca como inapta a ensejar a não estabilização da tutela é a interposição de recurso intempestivo, no mais, o recurso ainda que imperfeito, é meio apto para impedir a estabilização.
No que se refere ao caso de litisconsórcio passivo, não faz sentindo que a concessão de tutela antecipada seja estabilizada para um réu e para outro não. Razão por que se um dos litisconsortes recorrer à tutela não será estabilizada para o recorrente, como também para os demais réus, tendo em vista que, do ponto de vista prático, não tem lógica o processo prosseguir contra um réu e os demais serem obrigados a ingressarem com a ação prevista no artigo 304, §2º do CPC (nova ação para discutir a estabilização da tutela), que será analisa em tópico próprio ainda neste capítulo.
Outro requisito fundamental para que a tutela antecipada seja estabilizada é a vontade do autor, caso o autor demonstre que quer o prosseguimento do feito, pois além da concessão da tutela pretende ter uma decisão definitiva, a tutela antecipada não será estabilizada.
Nesta senda, afirma Daniel Amorim Assumpção Neves (2018, p. 523/524):
Será inaplicável o art. 304 do CPC se o autor expressar sua vontade de que pretende, atém da concessão da tutela antecipada, pronunciamento fundado em cognição exauriente capaz de gerar coisa julgada material. Contrariar a vontade do autor, nesse sentido, seria negar o exercício pleno de seu direito de ação, em manifesta violação do princípio da inafastabilidade de jurisdição, consagrada no art. 5º, XXXV, da CF.
Verifica-se que a vontade dos sujeitos processuais – autor e réu – são fundamentais para que a estabilização da tutela antecipada ocorra ou não. A lei exige do autor um comportamento positivo, ou seja, que o autor expresse o desejo de ter uma decisão proferida em cognição exauriente e juízo de certeza, enquanto que do réu exige um comportamento negativo, bastando a simples omissão em se insurgir contra a decisão concessiva de tutela antecipada.
Preenchidos os requisitos para estabilização da tutela antecipada antecedente, o processo será extinto, entretanto, a lei não é clara sobre a modalidade de extinção, não prevendo se é com resolução de mérito ou sem resolução. Apesar dessa “falha legislativa”, entende-se que está diante de uma decisão que não há resolução de mérito, porque a cognição não restou exaurida e não houve em aprofundamento de mérito.
O §1º do artigo 304 do Código de Processo Civil ao prevê que preenchidos os requisitos para estabilização o processo será extinto, entendimento congruente é que essa extinção deve ser feita por meio de uma sentença, haja vista ser este o pronunciamento judicial por excelência que põe fim a cognição do juízo de primeiro grau.
Acerca do tema, Daniel Amorim Assumpção Neves (2018, p. 525):
(...) Não imagino outra forma de se extinguir um processo que não seja por meio de sentença, já que a extinção naturalmente dependerá de uma decisão judicial, que, nos termos do art. 203, §1º, do Novo CPC, será uma sentença. (...) A decisão que concede a tutela antecipada não se confunde com a sentença que, depois dela, extingue o processo. Se a primeira é indubitavelmente uma decisão de mérito, a segunda certamente não o é, já que não acolhe ou rejeita qualquer pedido do autor, limitando-se a extinguir o processo. A sentença nesse caso é terminativa, devendo ser fundada no art. 485, X, do Novo CPC.
Dessa forma, na hipótese de estabilização da tutela antecipada, a sentença proferida é uma sentença terminativa, proferida nos termos do artigo 485, inciso X, do CPC, em que o magistrado não resolverá o mérito.
O Código de Processo Civil prevê que qualquer das partes pode demandar no poder judiciário, objetivando rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada, ou seja, ainda que as partes tenham permanecido inerte no processo da estabilização, podem, de acordo com a nossa legislação processual civil, adentrar com um novo processo para discutir a questão que foi estabilizada.
Neste tópico, inicialmente, é importante frisar que a ação autônoma prevista no §5º, artigo 304 do CPC, cria em nosso ordenamento jurídico mais um caso de competência absoluta, de caráter funcional, tendo em vista que o juízo que concedeu a tutela antecipada estabilizada torna-se prevento para o conhecimento e processamento da Ação Autônoma que venha a ser ajuizada eventualmente por qualquer das partes (NEVES, 2018, p.526).
O dispositivo supracitado, em atenção a segurança jurídica, estabelece o limite temporal de 2 (dois) anos para que a ação autônoma seja ajuizada, o que não poderia ser diferente em virtude da finalidade para qual a ação foi criada. Entende-se que o prazo de 2 (dois) anos tem natureza de prazo decadencial, de modo que o direito de ação das partes deve ser obrigatoriamente, exercido dentro desse prazo, pois se esse direito se prolongasse no tempo haveria enorme violação à segurança jurídica e ao princípio da confiança.
O prazo para ajuizar a ação conta-se a partir da ciência da decisão que extingue o processo de estabilização, ou seja, a contagem do prazo inicia-se a partir da ciência das partes acerca da sentença terminativa.
A ação autônoma ajuizada seguira o procedimento comum previsto no Código de Processo Civil, não havendo restrição inerente à espécie, inclusive, é perfeitamente possível o requerimento, no bojo ação autônoma, de tutela antecipada no sentido de que os efeitos da tutela estabilizada fiquem suspensos no decorre do trâmite processual da ação autônoma. Assim, transcreve Daniel Amorim Assumpção Neves (2018, p. 526):
O processo seguirá o procedimento comum, e mesmo que o mais seja a mera inversão dos polos, se comparado com o processo em que foi proferida tutela antecipada, não está vedada a formação de litisconsórcio com terceiro que não participou do processo originário. Nessa ação, como em outra qualquer, será cabível a concessão de tutela provisória, desde que preenchidos os requisitos, para que cessem imediatamente os efeitos da tutela antecipada estabilizada.
No mesmo sentido, enunciado nº 26 da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados – ENFAM (2015, np):
Caso a demanda destinada a rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada seja ajuizada tempestivamente, poderá ser deferida em caráter liminar a antecipação dos efeitos da revisão, reformar ou invalidação pretendida, na forma do art. 296, parágrafo único, do CPC/2015, desde que demonstrada a existência de outros elementos que ilidam os fundamento da decisão anterior.
Assim, qualquer das partes pode requerer o desarquivamento do processo extinto em que a tutela antecipada foi estabilizada, a fim de instruir a petição inicial da ação autônoma com pedido de revogação, reforma ou invalidação, desde que o faça dentro do prazo decadencial de 2 (dois) anos e que ajuíze a ação no juízo que concedeu a tutela antecipada, por ser este prevento nos termos da lei.
4.3 COISA JULGADA versus ESTABILIZAÇÃO
O CPC dispõe expressamente que a decisão de estabilização de tutela antecipada não faz coisa julgada, dessa forma, já excluiria o cabimento da Ação Rescisória durante os 2 (dois) anos previsto no §5º do art. 304, haja vista que esta ação pressupõe, via de regra, a existência da coisa julgada material.
A Ação Rescisória prevista no art. 966 do CPC, não possui natureza recursal, mas sim de Sucedâneo Recursal, para impugnar uma decisão judicial transitada em julgado que foi proferida com um dos vícios previstos nos incisos I ao VIII do artigo mencionado.
É de suma importância mencionar que o rol previsto no art. 966 do CPC, trata-se de um rol taxativo, ou seja, as hipóteses que não estão previstas não podem ser rescindidas por meio de Ação Rescisória. Desse modo, a decisão de estabilização da tutela antecipada antecedente não possui previsão no artigo, além do que esta não faz coisa julgada, o que a torna ainda mais incabível.
Todavia, o Código de Processo Civil mais uma vez aparece com um instituto inovador, previsto no §2º do art. 966 do CPC. Vejamos:
Art. 966 - A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: (. )
§2º Nas hipóteses previstas nos incisos do caput, será rescindível a decisão transitada em julgado que, embora não seja de mérito, impeça: I- nova propositura da demanda; ou II- admissibilidade do recurso correspondente.
Sendo assim, além dos casos previstos, também será cabível Ação Rescisória contra uma decisão terminativa, que embora não julgue o mérito, impede outra propositura da ação ou a admissibilidade do recurso corresponde. Ao analisar os dispositivos em questão, notamos que estamos diante de situações distintas, porém estas se assemelham em alguns aspectos.
Nesse contexto, apesar de a tutela antecipada antecedente estabilizada ser uma decisão de mérito e não ter o condão de formar coisa julgada, pode ser dado uma interpretação ampliativa ao §2º do artigo 966 do CPC, sendo uma hipótese encontrada na nossa legislação processual civil, que possa, por hora, sanar a omissão do esgotamento previsto no §5º do art. 304 do CPC (NEVES, 2016).
4.4 COISA JULGADA VERSUS ESTABILIZAÇÃO
O instituto denominado coisa julgada caracteriza-se por ser aquela decisão que se torna indiscutível e imutável no ordenamento jurídico, gerando segurança jurídica para as partes, tendo em vista que ao ser proferida em cognição exauriente com um juízo de certeza não será novamente discutida.
A tutela antecipada antecedente é proferida em um juízo de probabilidade, por meio de uma cognição sumária, dessa forma, o legislador optou por prevê expressamente no art. 304, §6º, do CPC, que essa decisão não fará coisa julgada. A doutrina comemora a presente situação, visto que mesmo sendo estabilizada a probabilidade, esta não será imutável e indiscutível.
Isso porque o instituto da coisa julgada é constitucionalmente incompatível com decisão proferida com base em cognição superficial, de tal modo que, destacando os princípios da proporcionalidade, razoabilidade, como também a clausula do devido processo legal, seria inviável obtê-la sem que houvesse o necessário aprofundamento da questão. Assim, em face de uma solução célere, sacrifica-se a investigação mais completa e aprofundada das questões relevantes para a solução do conflito, dessa forma, se teria resultados concretos, porém sem garantia de constituição definitiva (TALAMINI, 2016).
Apesar da não formação de coisa julgada, o artigo supracitado, em seu §2º, dispõe que as partes poderão rever, reformar ou anular a decisão estabilizada, desde que o façam dentro do período de 2 (dois) anos. Ademais, o dispositivo cria uma hipótese de competência absoluta, ao tornar prevento para essa nova demanda o juízo que proferiu a decisão de tutela antecipada em caráter antecedente.
Com isso, caso as partes não adentrem com essa nova ação dentro do período de dois anos, que entendemos ser um prazo decadencial, como poderão as partes interessadas discutirem essa decisão? Esse é o objeto do estudo do presente artigo, estudar algum instituto existente no nosso ordenamento processual civil para tentar sanar essa omissão legislativa (NEVES,2018).
Frente a discussão travada neste trabalho, inicialmente, é imperioso destacar que as mudanças trazidas com o novo código geraram benesses, principalmente no combate à morosidade, ainda que em tese, se adequando aos anseios dos jurisdicionados. Partindo-se para o nosso objeto de estudo, como foi visto, houve uma sistematização das espécies de tutela provisória, em que se encontram dispostas no mesmo Livro processual, facilitando, assim, a compreensão e aplicabilidade das tutelas.
É sabido que o nosso ordenamento resguarda a prestação jurisdicional e a duração razoável do processo, entretanto, esta não vem sendo alcançada com efetividade, colocando em risco o objeto do litígio. Assim, as tutelas provisórias são tidas como um mecanismo para resguardar o resultado útil do processo, preservando o direito pleiteado.
Nesse diapasão, a estabilização da tutela antecipada antecedente traz consigo o intuito de efetivar o direito requerido, em virtude da inércia da parte contrária que não se insurge da decisão, exigindo, assim, o comportamento positivo da parte para que se tenha o andamento processual, evitando a protelação da demanda.
Assim, buscou-se entender esse novo instituto e seus efeitos processuais, destacando a possibilidade de estabilização de uma decisão proferida por meio de cognição sumária e em juízo de probabilidade. Em contrapartida, questiona-se a segurança jurídica dessa decisão, visto a impossibilidade de sua rediscussão após dois anos, mesmo não tendo havido coisa julgada, cognição exauriente e juízo de certeza.
Como meio de questionar uma decisão após seu trânsito em julgado, só há previsão do cabimento de ação rescisória, também após dois anos, por isso, diante da omissão legislativa, não se sabe se de fato o que o legislador buscou demonstrar foi a aplicabilidade ou não da ação rescisória na estabilização.
Sendo assim, a doutrina tenta clarear a lacuna existente no artigo 304 do CPC/15, discutindo que poder-se-á utilizar a ação rescisória diante de uma interpretação ampliativa do §2º do artigo 966 do mesmo diploma legal após o esgotamento do prazo preestabelecido na legislação pertinente à tutela antecipada antecedente.
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Assessora de Gabinete de Juiz. Graduada em Direito e pós-graduada em Processo Civil.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MARTINIANO, LUCIANNE SOLANO DE MACEDO. Tutela de urgência de natureza antecipada requerida em caráter antecedente: coisa julgada material versus estabilidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 nov 2023, 04:17. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/63755/tutela-de-urgncia-de-natureza-antecipada-requerida-em-carter-antecedente-coisa-julgada-material-versus-estabilidade. Acesso em: 23 nov 2024.
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