RESUMO: A Lei Maria da Penha é um marco no combate à violência doméstica e familiar contra a mulher no Brasil. Além das medidas protetivas, a lei estabelece um conjunto de mecanismos para a assistência qualificada às vítimas, visando assegurar sua integridade física, psicológica e social. Diante disso, questiona-se: qual a importância da análise jurídica da assistência qualificada à vítima de violência doméstica? A assistência qualificada à vítima inclui o acompanhamento da mulher ao longo do processo judicial que investiga o crime cometido contra ela. Desta forma, o objetivo geral do presente estudo foi analisar os aspectos jurídicos da assistência qualificada à vítima, conforme previsto na Lei Maria da Penha. A justificativa deste estudo está ligada à relevância do apoio às mulheres vítimas de violência doméstica, não só como um direito, mas como um meio eficaz para garantir a proteção destas mulheres durante todo o procedimento legal, buscando atender às suas necessidades e garantir o respeito a seus direitos como vítima. Desta maneira, realizou-se uma revisão bibliográfica, de abordagem qualitativa, pelo método dedutivo, de classificação exploratória, com intuito de gerar conhecimento para elaboração de texto científico, a fim de proporcionar maior familiaridade com a problemática.
Palavras-chave: Lei Maria da Penha, Assistência Qualificada, Violência Doméstica, Direitos da Mulher, Proteção Jurídica.
ABSTRACT: The Maria da Penha Law is a milestone in the fight against domestic and family violence against women in Brazil. In addition to protective measures, the law establishes a set of mechanisms for qualified assistance to victims, aiming to ensure their physical, psychological and social integrity. In view of this, the question arises: how important is the legal analysis of qualified assistance to victims of domestic violence? Qualified assistance to the victim includes monitoring the woman throughout the judicial process that investigates the crime committed against her. Therefore, the general objective of the present study was to analyze the legal aspects of qualified assistance to victims, as provided for in the Maria da Penha Law. The justification for this study is linked to the relevance of supporting women victims of domestic violence, not only as a right, but as an effective means to guarantee the protection of these women throughout the legal procedure, seeking to meet their needs and guarantee respect for your rights as a victim. In this way, a bibliographical review was carried out, with a qualitative approach, using the deductive method, of exploratory classification, with the aim of generating knowledge for preparing a scientific text, in order to provide greater familiarity with the problem.
Keywords: Maria da Penha Law, Qualified Assistance, Domestic Violence, Women's Rights, Legal Protection.
1 INTRODUÇÃO
A violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar é um desafio sério e intricado, que prejudica muitas mulheres no Brasil. A introdução da Lei Maria da Penha em 2006 marca um progresso importante na batalha contra esse tipo de agressão, ao estabelecer mecanismos para proteger e auxiliar as vítimas. Dentre essas providências, a assistência qualificada se destaca, visando garantir não apenas a segurança imediata da mulher, mas também seu acesso a serviços de saúde, apoio emocional e orientação legal (ROCHA, 2021).
Diante disso, surge a seguinte problemática: qual a importância da análise jurídica da assistência qualificada à vítima de violência doméstica? A Lei Maria da Penha visa proteger mulheres vítimas de violência de gênero, priorizando não apenas a punição do agressor, mas sim o bem-estar e a segurança da vítima. A assistência qualificada à vítima inclui o acompanhamento da mulher ao longo do processo judicial que investiga o crime cometido contra ela.
Desta forma, o objetivo geral do presente estudo é analisar os aspectos jurídicos da assistência qualificada à vítima, conforme previsto na Lei Maria da Penha. Já os objetivos específicos são: verificar a importância da lei maria da penha no combate à violência contra a mulher; estudar as medidas assistenciais à mulher vítima de violência doméstica; examinar a assistência à vítima e o acesso à justiça.
Além disso, a seleção do assunto abordado neste estudo está ligada à relevância do apoio às mulheres vítimas de violência doméstica, não só como um direito, mas como um meio eficaz para garantir a proteção destas mulheres durante todo o procedimento legal, buscando atender às suas necessidades e garantir o respeito a seus direitos como vítima. Além da criação de leis de proteção, que geralmente têm caráter punitivo, o apoio à vítima é também uma ferramenta essencial que deve ser promovida pelo Estado na luta contra a violência de gênero, especificamente no âmbito legal.
O presente estudo realizou uma revisão bibliográfica, de abordagem qualitativa, pelo método dedutivo, de classificação exploratória, com intuito de gerar conhecimento para elaboração de texto científico, a fim de proporcionar maior familiaridade com a problemática. O desenvolvimento da análise foi com base na conceituação das palavras-chave: Lei Maria da Penha, Assistência Qualificada, Violência Doméstica, Direitos da Mulher, Proteção Jurídica. Cuja revisão de literatura foi realizada através de um levantamento bibliográfico, utilizando como base de dados: Google Scholar e Diário da Justiça Eletrônico. Foram incluídos artigos científicos que abordem diretamente sobre a temática do presente estudo. Foram excluídos artigos que não estejam diretamente relacionados ao tema ou que apresentem baixa qualidade acadêmica. A inclusão foi baseada em critérios de relevância, rigor acadêmico e contribuição para a compreensão do problema proposto.
Assim, é de suma importância a análise jurídica da Defensoria na assistência qualificada à vítima, pois, diante da execução de suas funções será possível melhorias na prestação de assistência, com o intuito de assegurar uma proteção mais efetiva e integral às mulheres em situação de vulnerabilidade.
2 A LEI MARIA DA PENHA E O COMBATE À VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER
A Lei 11.340/06 foi criada como uma resposta à condenação do Estado brasileiro pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, devido à falta de ação diante da violência doméstica e à tolerância a esses atos, infringindo os compromissos estabelecidos na Convenção de Belém do Pará (SOUZA, 2008).
O processo relatado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos tratava da tentativa de assassinato e dos ataques sofridos por Maria da Penha Maia Fernandes em 1983, os quais eram frequentes no ambiente familiar por parte de seu marido, Marco Antônio Heredia Viveiros. O caso de Maria da Penha foi levado ao sistema judicial brasileiro, no entanto, ao longo de 15 anos, nenhuma providência foi tomada para investigar e processar criminalmente o acusado. Em 1998, a CIDH recebeu o caso e, em 2001, determinou que o Estado brasileiro tomasse medidas para responsabilizar o agressor, além de adotar ações para garantir a efetiva investigação e processamento dos casos de violência doméstica (OEA, 2001, p. 04).
Até a implementação da Lei 11.340/06, os atos relacionados à violência doméstica eram julgados conforme o disposto na Lei 10.886/04, que inseriu o parágrafo 9° no Art. 129 do Código Penal. Contudo, essa legislação limitava a violência doméstica à esfera penal apenas em relação à agressão física e negligenciava outros tipos de violência decorrentes da discriminação de gênero (ROCHA, 2021).
Através da implementação da Lei Maria da Penha, novos comportamentos violentos foram definidos e caracterizados como violência doméstica, além disso, houve um aumento na penalidade estabelecida no Art. 129, parágrafo 9° do Código Penal, que agora é de 3 (três) meses a 3 (três) anos, em vez de 6 (seis) meses a 1 (um) ano (BRASIL, 2006).
No entanto, é importante ressaltar que a Lei Maria da Penha vai além de simplesmente aumentar as punições para os agressores. Além de colocar em evidência a questão da violência doméstica no Brasil e ampliar esse debate no campo jurídico, essa legislação representa um avanço significativo ao prever a implementação de tratamentos assistenciais multidisciplinares para ajudar as vítimas desse tipo de violência.
2.1 MEDIDAS ASSISTENCIAIS À MULHER VÍTIMA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
Uma informação relevante é que a Lei Maria da Penha não se limita a oferecer soluções legais para o problema da violência doméstica. A legislação inova ao estabelecer medidas de caráter de políticas públicas, que são detalhadas nos artigos 8° e 9° e vistas como fundamentais na prevenção e no combate à violência contra a mulher. Esses dispositivos abordam a importância da criação de uma rede de serviços especializados, para além das estratégias legais, voltada para atender às necessidades da mulher vítima de violência (MELLO; PAIVA, 2019).
O Artigo 8 da Lei Maria da Penha aborda as ações conjuntas de prevenção, estabelecendo orientações que devem ser seguidas e implementadas por todas as esferas governamentais com o intuito de impedir que a violência contra mulheres aconteça, envolvendo a realização de campanhas e programas educativos fundamentados na concepção de gênero, raça e etnia. Já o Artigo 9, porém, são demonstradas ações de apoio que devem ser realizadas quando a mulher está em uma situação de violência doméstica, as quais também devem ser garantidas pelo Estado para proteger a saúde mental e física da mulher que sofreu violência (ROCHA, 2021, p.19).
Este dispositivo jurídico ressalta também que tais ações precisam ser executadas considerando os princípios e diretrizes da Lei Orgânica de Assistência Social e dos Sistemas Únicos de Saúde e Segurança Pública, o que ressalta a abordagem multidisciplinar na oferta de serviços por essa rede especializada. As determinações previstas neste dispositivo englobam garantias de caráter assistencial e trabalhista, assim como relacionadas à saúde, reparação de danos e educação fundamental dos filhos da mulher vítima de violência.
Em conformidade com o que está previsto na legislação conhecida como Lei Maria da Penha, o governo do Brasil instituiu, no ano de 2011, a Política Nacional de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres, com o propósito de coordenar os diferentes níveis de governo para estabelecer uma estrutura de atendimento especializado, que forneça serviços de maneira ininterrupta e planejada com o objetivo de eliminar e prevenir a violência contra as mulheres (ROCHA, 2021). De acordo com essa política, a rede de atendimento inclui os seguintes serviços:
Locais de Referência de Atendimento à Mulher (LRAM), Centros de Acolhimento à Mulher, Residências de acolhimento e abrigo temporário, Delegacias Especializadas no Atendimento à Mulher (DEAMs), Pontos ou Postos de Atendimento à Mulher nas Delegacias Comuns, Forças Policiais Civil e Militar, Instituto Médico Legal, Defensorias das Mulheres, Juizados de Violência Doméstica e Familiar, Linha de Atendimento à Mulher (Disque 180), Canais de Ouvidoria (incluindo a Ouvidoria da Mulher da Secretaria de Políticas para as Mulheres), Serviços de Saúde especializados no tratamento dos casos de violência sexual e doméstica, Pontos de atendimento humanizados nos aeroportos e, por último, o Centro de Apoio à Mulher da Casa do Migrante (BRASIL, 2011, p.01).
A inserção do apoio policial na rede de combate à violência doméstica cumpre, principalmente, o que está estabelecido no Art. 10 da Lei Maria da Penha (BRASIL, 2006), que aborda a importância do atendimento prestado pela autoridade policial, o qual deve ser feito por profissionais qualificados e conscientes das questões de gênero presentes na violência doméstica, de preferência do sexo feminino, com o intuito de evitar que a mulher que procura a delegacia seja revitimizada.
2.2 AS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA
As medidas protetivas de emergência estão descritas nos artigos 22 e 24 da Lei Maria da Penha e têm como objetivo interromper o ciclo de violência contra a mulher, sem restringir a liberdade do agressor, mas sim proteger imediatamente a integridade da vítima de forma eficaz, rápida e simples. Tanto a doutrina quanto a jurisprudência concordam que são medidas cautelares independentes de um processo judicial, seja ele de natureza cível ou criminal (MELLO; PAIVA, 2019).
Em geral, o processo de solicitação de medidas de proteção se inicia quando a vítima comparece à delegacia. O pedido é então encaminhado pela autoridade policial para a vara especializada em casos de violência doméstica. O juiz tem até 48 horas para decidir sobre a concessão das medidas, considerando o boletim de ocorrência, depoimentos de testemunhas, exames médicos, relatórios de profissionais especializados e outras provas enviadas. Se as medidas forem deferidas, o agressor é informado e tem cinco dias para se manifestar. Além disso, a vítima também é notificada. Conforme o Art. 19 da Lei Maria da Penha, o Ministério Público também pode solicitar as medidas de proteção (MATIELLO; TIBOLA, 2013, p. 23).
As medidas protetivas de urgência previstas nos Artigos 22 a 24 são exemplificativas e não exaustivas.
As medidas descritas no art. 22 são aplicadas ao agressor, ou seja, punem o agressor ou impõem alguma restrição ou obrigação, como afastamento do domicílio ou proibição de se aproximar da vítima. Já as medidas dos artigos 23 e 24 são voltadas para a vítima, sem caráter punitivo. As primeiras buscam proteger a integridade física e psicológica da mulher e tirá-la do ciclo de violência, enquanto as últimas protegem os aspectos patrimoniais da vítima (PORTELA, 2011, p.51).
Assim, a introdução do Art. 24-A na Lei Maria da Penha pela Lei 13.641/2018 trouxe uma nova tipificação penal: o ato de desrespeitar uma ordem judicial que determina medidas protetivas de urgência. Antes dessa alteração legislativa, a violação das medidas protetivas resultava apenas na possibilidade de decretação de prisão preventiva, conforme previsto no Art. 313, III do CPP, alterado pelo Art. 42 da Lei 11.340/06. O Juizado de Violência Doméstica é o órgão competente para processar e julgar esse tipo de crime (PORTELA, 2011).
3 A ASSISTÊNCIA À VÍTIMA PREVISTA NA LEI Nº 11.340/06
A Lei Maria da Penha estabelece que em todas as etapas legais, tanto cíveis quanto criminais, a mulher que sofre violência doméstica e familiar deve estar assistida por um advogado. Além disso, garante a todas as mulheres em situação de violência doméstica e familiar o acesso aos serviços da Defensoria Pública ou da Assistência Judiciária Gratuita, de forma específica e humanizada, tanto na delegacia quanto no tribunal, de acordo com os artigos 27 e 28 dessa lei (BRASIL, 2006).
As inúmeras mudanças na legislação em favor da proteção jurídica das mulheres permitiram uma nova perspectiva sobre a mulher que sofre com a violência do patriarcado. Diante dessa situação de vítima, a mulher passa a ser reconhecida como titular de direitos e garantias essenciais, os quais precisam ser respeitados principalmente no curso dos processos legais, e não apenas como a parte prejudicada do crime ou instrumento de obtenção de evidências (DIAS, 2008. p. 27).
O suporte à vítima constitui, portanto, uma medida estabelecida pela legislação da Maria da Penha com o objetivo de garantir a proteção dos direitos fundamentais e interesses da mulher que sofre violência doméstica, fornecendo-lhe auxílio, direcionamento jurídico e preservando a sua dignidade humana, especialmente para evitar que ela seja novamente vitimizada durante os procedimentos legais (BIANCHINNI, 2013).
Por revitimização é entendido como o processo vivenciado por mulheres, crianças e adolescentes que foram vítimas de violência, no qual seu sofrimento é prolongado devido à falta de acolhimento adequado nos locais onde buscaram ajuda. A mulher vítima de violência é revitimizada quando, ao solicitar auxílio, seja na esfera judicial ou extrajudicial, é exposta a situações de constrangimento, desrespeito ou vexame, que colocam em dúvida sua dor e a agressão sofrida, além de tentar culpá-la pelos eventos de violência ocorridos. A revitimização ocorre quando uma mulher, ao relatar um episódio de violência, é interrogada sobre sua conduta, rotina, vestimenta, vida pessoal, entre outros aspectos, com o intuito de responsabilizá-la pelo ato violento, ou seja, de fazer parecer que a violência foi de alguma forma provocada por ela (BRASIL, 2016, p. 60).
Conforme estabelecido no Art. 27 da Lei Maria da Penha, destaca-se as principais atribuições como protetor dos direitos e da integridade da mulher vítima, especialmente no que diz respeito à prevenção da revitimização. Isso quer dizer que o papel defensor público na Lei Maria da Penha deve ser focado unicamente nas necessidades da vítima, ouvindo e respeitando suas vontades, após explicar claramente as consequências legais de suas decisões (BELLOQUE, 2011).
É importante lembrar que a assistência jurídica visa reduzir os impactos secundários da vitimização, bem como garantir os direitos da mulher agredida, que muitas vezes é tratada como mera espectadora no processo judicial. Portanto, o suporte legal deve priorizar os interesses expressados pela mulher vítima de violência. A inclusão da assistência jurídica para mulheres em situação de violência no sistema jurídico brasileiro cumpre também as exigências da Convenção de Belém do Pará, que estabelece que os países signatários devem tomar medidas para garantir a proteção completa das mulheres também no âmbito judicial (BELLOQUE, 2011, p. 344).
É importante destacar que fornecer ajuda às vítimas está de acordo com o que está previsto na Recomendação Geral número 33 do Comitê da CEDAW da ONU, a qual estabelece orientações para melhorar o acesso das mulheres à justiça, tanto de maneira judicial quanto extrajudicial.
É fundamental garantir que os sistemas judiciais sejam acessíveis economicamente para as mulheres, o que inclui a oferta de assistência jurídica, aconselhamento e representação legal gratuita ou com baixo custo em todos os tipos de processos legais. Os Estados devem estabelecer sistemas de assistência jurídica e defensoria pública que sejam acessíveis, sustentáveis e adequados às necessidades das mulheres. Além disso, é importante que esses serviços sejam prestados de maneira eficaz e oportuna em todas as etapas dos processos legais, incluindo os métodos de resolução de conflitos alternativos e os processos de justiça restaurativa. Os prestadores de assistência jurídica devem ter acesso irrestrito a toda documentação relevante e informações necessárias, como declarações de testemunhas. Também é essencial que esses profissionais sejam competentes, sensíveis ao gênero, respeitem a confidencialidade e dediquem tempo adequado para defender as mulheres atendidas (ONU, 2015, p.01).
Destaca-se que a Recomendação Geral nº 33 aborda claramente a importância da Defensoria Pública para garantir o acesso à justiça das mulheres vítimas de violência, sendo imprescindível que o Estado promova a formação dos profissionais com consciência de gênero para que possam atender de maneira acolhedora às demandas das mulheres em situação de violência.
3.1 ASSISTÊNCIA À VÍTIMA E ACESSO À JUSTIÇA
Quando se referem ao acesso à justiça, Cappelletti e Garth (1988, p. 8) associaram este conceito a duas finalidades essenciais do sistema jurídico: "a busca por direitos e a solução de disputas". Para tal, é imprescindível que o Estado, por meio da aplicação da justiça, assegure que todos os cidadãos tenham acesso equitativo a esse sistema. Contudo, os autores identificaram algumas dificuldades que precisavam ser superadas para que o acesso efetivo à justiça fosse garantido.
A escassez de dinheiro das camadas mais pobres da sociedade para arcar com despesas legais, a complexidade de um conjunto de indivíduos em se unir para defender seus direitos como uma coletividade e o prolongado tempo e gastos envolvidos na solução de questões de menor importância. Uma possível solução para os desafios da falta de recursos financeiros enfrentado pelas classes mais carentes é a sugestão dos escritores de que os governos ofereçam serviços de apoio jurídico gratuitos às pessoas com insuficiência econômica, permitindo que elas levem seus problemas aos tribunais sem custos (MENDES, 2020, p.117).
No sistema jurídico do Brasil, foi instituído o formato de assistência jurídica pública, onde o governo incentiva e paga pelos serviços jurídicos oferecidos e executa essa função através de seus próprios representantes. Essa função foi consolidada pela Constituição Federal de 1988 e atribuída à Defensoria Pública:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...) LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;
(...)
Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal (BRASIL, 1988).
As mulheres são claramente consideradas como beneficiárias dessas normas, reconhecendo-se que a discriminação baseada no gênero é um obstáculo ao acesso à justiça e que, por isso, é necessário garantir meios para impedir tratamentos discriminatórios no sistema judiciário e possibilitar um processo justo, eficiente e rápido para as mulheres que buscam a intervenção do Estado em questões judiciais (ROCHA, 2021).
No tocante à atuação da Defensoria Pública, a Lei Complementar 80/94, que é a Lei Orgânica da instituição, menciona explicitamente como uma das funções institucionais a defesa da mulher que sofre violência doméstica e familiar:
Art. 4º São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras:
(...) XI – exercer a defesa dos interesses individuais e coletivos da criança e do adolescente, do idoso, da pessoa portadora de necessidades especiais, da mulher vítima de violência doméstica e familiar e de outros grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção especial do Estado. (BRASIL, 1994).
Dessa forma, é responsabilidade da Defensoria Pública agir em favor das mulheres que sofrem violência doméstica, sem levar em consideração sua situação financeira, tanto em processos judiciais civil como criminal. Essa atuação engloba defender seus direitos e oferecer um apoio qualificado que considere a perspectiva de gênero, oferecendo escuta, orientação e acolhimento.
4 CONCLUSÃO
Diante do exposto, verificou-se que a assistência qualificada à vítima, conforme prevista na Lei Maria da Penha, é um componente fundamental na proteção das mulheres em situação de violência doméstica e familiar.
Dentro desse contexto, o apoio à pessoa prejudicada não se baseia na procura por uma punição criminal, que é a função da assistência à acusação, pois o objetivo do assistente da vítima é garantir seus direitos, considerando sua vulnerabilidade, e proporcionar um acolhimento institucional.
Dessa forma, é imprescindível que o governo e as organizações da sociedade se unam para aprimorar o sistema de acolhimento, proporcionar o acesso à justiça e certificar-se de que as mulheres em situação de violência tenham todo o apoio necessário para superar essa realidade e recomeçar suas vidas com respeito próprio.
A Defensoria Pública atua como assistente das vítimas, desempenhando um papel dedicado à proteção dos direitos das mulheres que sofrem violência. Tem se mostrado fundamental na garantia de um atendimento que leve em consideração as particularidades de gênero. Fica evidente que a presença da instituição é crucial para que as mulheres tenham voz e apoio jurídico, recebendo as informações necessárias para fazer valer seus direitos.
Desta forma, é evidente a relevância do papel desempenhado pela assistência às vítimas de violência doméstica, sendo essencial no enfrentamento da violência e na proteção dos direitos das mulheres.
REFERÊNCIAS
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BELLOQUE, Juliana Garcia. Das medidas protetivas que obrigam o agressor – artigos 22. In: CAMPOS, Carmen Hein de Campos (Org.). Lei Maria da Penha: comentada em uma perspectiva jurídico-feminista. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
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Advogada atuante na área cível e consumerista. Pós-Graduanda em Direito processual Civil pela Faculdade CERS.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CANTANHEDE, Luiza Biazzi. Análise jurídica da assistência qualificada à vítima prevista na Lei Maria da Penha Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 set 2024, 04:47. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/66363/anlise-jurdica-da-assistncia-qualificada-vtima-prevista-na-lei-maria-da-penha. Acesso em: 04 out 2024.
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