1 INTRODUÇÃO
Inteligência artificial (IA) é uma expressão que encerra uma gama de tecnologias, cujo objetivo último é capacitar os programas computacionais ou informáticos a se retroalimentarem, a partir de dados previamente captados.
Como consta na proposta de regulamento do Parlamento e do Conselho Europeus sobre IA, apresentada pela Comissão Europeia em 21 de abril de 2021, dentre os objetivos da utilização da IA estão a otimização de operações e recursos humanos com vistas à personalização da prestação de serviços, culminando na contribuição de melhores resultados sociais e ambientais, em especial para setores de elevado impacto, a exemplo do Judiciário.
A exposição de motivos da mesma proposta de regulamento afirma que, para se atingir aqueles objetivos, a IA deve ser capaz de predizer fatos, recomendar ações ou tomar decisões capazes de influenciar os ambientes nos quais opera[1].
Entretanto, a IA não traz somente benefícios para a humanidade. Ela também encerra perigos e preocupações, em especial os concernentes às possibilidades de violação de garantias individuais consagradas na Constituição Federal brasileira, como a isonomia, a privacidade e a segurança jurídica. Essas preocupações não passaram despercebidas na proposta europeia de regulamento, cujos Títulos II e III contêm as práticas de IA proibidas; as regras para a classificação de sistemas de IA como de “risco elevado”; e as obrigações dos prestadores de serviços.
Assim, para que a adoção da IA pelo Poder Judiciário brasileiro esteja constitucionalmente legitimada, é necessário se verificar se dois planos de competências estão positivamente preenchidos: o plano da necessidade e o plano da segurança.
O presente projeto tem como tema o uso da IA pelo Judiciário, delimitando-se o estudo ao uso da IA para a análise de temas de repercussão geral, o que poderá contribuir para a eficiência e redução da morosidade do Judiciário.
2 PROBLEMA
O Poder Judiciário brasileiro é um dos que mais julga no mundo, como demonstram dados concretos colhidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e expostos na publicação Justiça em números: 2024. O ano de 2023 foi finalizado com 83,8 milhões de processos judiciais em trâmite[2], o que representa, em média, um processo a cada três habitantes.
Esse quadro calamitoso impele o Poder Judiciário brasileiro a uma incessante busca por soluções que o auxiliem no desempenho de sua função constitucionalmente definida de pacificar os conflitos de interesses de forma célere, eficiente, econômica e igualitária, como determinam os princípios da razoável duração do processo (art. 5º, inc. LXXVIII da CRFB/1988); da eficiência (art. 37, caput da CRFB/1988); da economicidade (art. 70, caput da CRFB/1988); da igualdade (art. 5º, caput da CRFB/1988) e da construção de uma sociedade livre, justa, solidária, desenvolvida, com redução das desigualdades sociais e regionais, e não discriminatória (art. 3º, inc. I a IV da CRFB/1988).
As soluções que têm sido buscadas pelo Poder Judiciário têm se concentrado em duas vertentes de atuação: na estimulação dos métodos de solução adequada de conflitos e na utilização da tecnologia.
No contexto do Poder Judiciário brasileiro, a Justiça Eleitoral, que, entre nós, desempenha as funções legislativa, administrativa e jurisdicional (regulamenta, organiza, fiscaliza e julga as eleições), foi pioneira no uso da tecnologia.
O acúmulo de funções pela Justiça Eleitoral, notadamente as de preparar e administrar eleições de dois em dois anos no quarto maior colégio eleitoral do mundo, torna imprescindível o uso de novas tecnologias, o qual se iniciou com a instituição do cadastro eletrônico de eleitores[3], seguido do desenvolvimento e da adoção das urnas eletrônicas (projeto iniciado em 1996[4]) e, atualmente, da biometrização de todo o eleitorado brasileiro, que, espera-se, votará com identificação biométrica em sua totalidade nas eleições de 2026.
A vanguarda tecnológica encabeçada pela Justiça Eleitoral brasileira foi acompanhada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que, desde 2002, televisiona suas sessões plenárias, exponenciando a transparência dos julgamentos com a transmissão pela TV Justiça, pela Rádio Justiça e, mais atualmente, pelo canal do STF no YouTube. A partir de 2007, o STF também passou a julgar processos colegiadamente em ambiente virtual, no “Plenário Virtual”[5], que foi ampliado, na sessão administrativa de 18 de março de 2020, para permitir que todos os processos de competência daquele Tribunal venham a ser julgados naquele espaço, observadas as competências das Turmas ou do Plenário.
Todas as ferramentas citadas foram desenvolvidas para suprir necessidades palpáveis do Poder Judiciário. Como eram tecnologias com as quais a sociedade brasileira tinha familiaridade, sua implementação não gerou grandes resistências. Hoje, sua imprescindibilidade restou comprovada durante a Pandemia da COVID-19 e foram essenciais para que o Poder Judiciário brasileiro não colapsasse e não paralisasse suas atividades[6].
Entretanto, semelhante aceitação não ocorre com a IA, que ainda gera incompreensões dos jurisdicionados, razão da importância de se ressaltar que seu uso é tão necessário quanto seguro.
O desenvolvimento e aplicação de IA no Poder Judiciário pode vir a atender algumas necessidades que vão desde automação de etapas procedimentais (e até mesmo processuais) à uniformização de decisões e ao “assessoramento” a juízes, membros do Ministério Público e advogados.
A realidade é que, em razão do grande volume de processos, torna-se, cada vez mais complexo, que o Poder Judiciário brasileiro, contando somente com a mão de obra humana, consiga entregar uma prestação jurisdicional eficiente e em tempo razoável. A inteligência artificial consegue uniformizar a marcha de tramitação dos processos, além de indicar decisões coerentes e assemelhadas para questões jurídicas assemelhadas[7].
Como exemplo, citam-se as execuções fiscais, que representam grande parte dos processos judiciais em tramitação no Poder Judiciário. A maioria das execuções fiscais, quando chega à análise de algum servidor, já conta com a incidência da prescrição intercorrente, o que resulta, ao final, em aleatoriedade com relação a quem deverá pagar ou não o débito tributário.
Por outro lado, acredita-se que as atividades desenvolvidas por essas ferramentas inteligentes representam baixo risco aos jurisdicionados, porque são supervisionadas por seres humanos, sendo seus resultados expostos ao escrutínio das partes e dos operadores do direito e à eventual correção por meio dos recursos judiciais cabíveis, o que contribui para a acurácia das manifestações judiciais e, ao final, para a diminuição das desigualdades e das injustiças cometidas[8].
Feitas estas pontuações iniciais, o problema que norteará a pesquisa ora proposta é: Quais as possíveis contribuições do uso da inteligência artificial na análise de temas de repercussão geral para a eficiência e diminuição da morosidade do Judiciário?
Tem-se como hipótese que o uso da IA na análise de temas de repercussão geral pode ser uma ferramenta poderosa para aumentar a eficiência do Judiciário e reduzir a morosidade dos processos, desde que implementada com cuidado e responsabilidade.
Assim, a problemática suscitada pela pesquisa é avaliar as melhorias do implemento da IA na estrutura do Poder Judiciário, mais especificamente, em sede de repercussão geral, expondo, contudo, a impossibilidade de substituição de todos os procedimentos pelas máquinas, uma vez que estariam em detrimento dos direitos e garantias fundamentais.
3 OBJETIVOS
3.1 Objetivo Geral
Discutir as possíveis contribuições do uso da inteligência artificial na análise de temas de repercussão geral para a eficiência e diminuição da morosidade do Judiciário.
3.2 Objetivos Específicos
a) Abordar a inteligência artificial aplicada ao Judiciário brasileiro, com ênfase na gestão de jurisprudência;
b) Explicar a implementação, funcionalidades e formas de uso do Software Victor para temas de repercussão geral;
c) Pesquisar as possíveis contribuições do Software Victor para a eficiência e redução da morosidade do Judiciário com vistas à consolidação do sistema de precedentes brasileiro;
d) Compreender os limites éticos e legais para o uso de decisões judicial inteligentes.
4 JUSTIFICATIVA
O Poder Público, ao longo dos últimos anos, tem se valido das benesses provocadas pelos mecanismos de IA e suas evoluções, tal qual os modelos de aprendizado de máquina (AM), costumeiramente denominado em inglês “machine learning”, majorando sua produtividade alicerçado nos princípios constitucionais da administração pública da celeridade, economia e eficiência[9].
Por outro diapasão, é cabível a discussão de qual o limite para a utilização e substituição da inteligência e supervisão humana por máquinas previamente dotadas de capacidade de superar as vicissitudes que envolvem decisões e atos na esfera judicial, cabendo ao Estado regulamentar as novas aplicações de modo que os princípios da dignidade da pessoa humana sejam respeitados e aplicados no Poder Judiciário brasileiro.
O obstáculo da regulação, todavia, surge entre outros motivos por conta do conflito inerente entre o veloz e exponencial desenvolvimento tecnológico, que avança suprimindo barreiras espaciais e temporais, e o lento processo legislativo, que, geralmente, estabelece-se com olhar ao passado, por condutas já perpetuadas e que foram consideradas pelo legislador como merecedoras da tutela jurídica.
Isto posto, o estudo se justifica pois há evidências de que o uso da IA na análise de temas de repercussão geral pode trazer inúmeras contribuições para o sistema judiciário, especialmente em termos de eficiência e redução da morosidade. A repercussão geral é um filtro que permite STF selecionar os recursos extraordinários que serão julgados, com fundamento na relevância jurídica, política, social ou econômica da questão e as contribuições da IA incluem: automatização de processos; análise de jurisprudência, previsibilidade de decisões, gestão do volume de casos, suporte à tomada de decisões e redução de custos.
A IA pode automatizar a triagem de recursos, identificando temas de repercussão geral de maneira mais célere e precisa, diminuindo o tempo gasto por juízes e servidores nessa etapa. Também, Sistemas de IA podem analisar vastos bancos de dados de decisões anteriores, identificando padrões e precedentes relevantes, o que pode auxiliar os juízes na fundamentação de suas decisões, garantindo maior consistência nos julgamentos.
Ademais, algoritmos de IA podem prever a probabilidade de um recurso ser aceito com base em decisões passadas, ajudando a filtrar recursos que têm menos chance de sucesso, o que pode reduzir o número de processos que chegam ao STF. Ainda, com a análise automatizada, é possível administrar melhor o grande volume de processos que chegam ao Judiciário, priorizando aqueles que realmente apresentam questões de grande relevância, evitando o acúmulo de casos menos importantes.
Por derradeiro, a IA pode fornecer aos juízes um conjunto de informações bem estruturadas e analisadas, permitindo uma tomada de decisão mais informada e ágil. Assim, com processos mais rápidos e automatizados, há uma potencial redução de custos operacionais para o Judiciário, o que pode liberar recursos para outras áreas necessitadas.
A pesquisa justifica-se também pela necessidade de demonstrar que não obstante a IA traga muitos benefícios, é crucial abordar desafios como a transparência dos algoritmos, o viés nas decisões automatizadas, e a necessidade de supervisão humana para garantir que os princípios de justiça e equidade sejam sempre respeitados.
Assinale-se que a pesquisa ora proposta não pretende, e, nem conseguiria, efetuar o esgotamento do tema, diante da evolução exponencial dos conteúdos e novas problemáticas que envolvem toda a questão. No entanto, serve de um lumiar ao novo prisma que surge na presente era.
5 METODOLOGIA
Trata-se de pesquisa hipotético-dedutivo, que avalia a inferência da hipótese sobre determinada linha teórica ou conjunto social previamente determinado. O objetivo é testar ou descartar uma hipótese central a partir de discussões teórico-científicas, avaliando o que lastreia o que se busca compreender como verdadeiro ou não verdadeiro. Esta é uma das metodologias mais evidentes na área de direito, em que pese todas as discussões doutrinárias aportarem diferentes visões de um mesmo instrumento e/ou instituto.
Referente à técnica de pesquisa, será utilizada a revisão bibliográfica e a pesquisa documental em entendimentos jurisprudenciais referentes à temática abordada, notadamente a base jurisprudencial que compõe o arcabouço jurídico do Supremo Tribunal Federal (STF). Ainda, destaca-se que a análise da bibliografia pesquisada será feita por meio de análise de conteúdo, objetiva e subjetiva.
No que concerne ao marco teórico, a tese será fundamentada em doutrinas diversas, a exemplo de Daun e Paião[10], Dantas, Alencastro e Urtiga[11], Mendes[12], Pinto e Ernesto[13], Vigliar[14], dentre outros
6 REFERENCIAL TEÓRICO
No âmbito do Supremo Tribunal Federal, durante a presidência da Ministra Cármen Lúcia, iniciou-se um projeto de desenvolvimento de IA que foi posteriormente chamado de Victor, em homenagem a Victor Nunes Leal, ministro do STF entre os anos de 1960 a 1969 e principal responsável por sistematizar a jurisprudência do STF em súmulas.
Desde o início do projeto Victor, foi decidido que ele seria desenvolvido em parceria com a Universidade de Brasília (UnB), dispensando-se o uso de ferramentas pertencentes a entidades privadas que, à época, foram oferecidas gratuitamente ao Tribunal. A escolha foi acertada, pois permitiu não apenas o desenvolvimento de uma tecnologia exclusiva, mas também o enriquecimento da academia, por sua participação em um projeto de ponta.
O software Victor otimiza a análise da repercussão geral, um dos critérios para a admissibilidade do recurso extraordinário e classifica e separa as peças processuais por seus assuntos. Atualmente, no STF, existem 860 temas contemplados por julgamentos em repercussão geral, e se esta análise de que o assunto já foi ou não contemplado por este instituto jurídico, fosse feita por um servidor, demoraria cerca de 11 minutos, enquanto o Victor realiza este trabalho em 10 segundos com um acerto de 84%, já a verificação e separação das peças por assunto, feito que o Victor também desempenha, se efetuada por um servidor, seriam necessários 15 minutos, o que Victor faz em 4 segundos com 94% de acerto, além de ter eliminado a necessidade de investir cerca de R$ 3 milhões por semestre em gastos com a estrutura administrativa deste setor do tribunal[15].
O nível de interação entre diversos ramos do conhecimento num projeto como o Victor impressiona, sendo inquestionável o ganho em escala proporcionado por investimentos financeiros relativamente pequenos. Além disso, essa experiência demonstra quão fundamental é haver conexão entre o Poder Judiciário e a comunidade acadêmica para o desenvolvimento de políticas públicas em IA, tendo em vista a demanda por conhecimentos técnico-científicos em diferentes áreas, como Ciência da Computação, a Engenharia de Software, a Linguística, o Direito, dentre outros.
De início, o projeto não tinha como objetivo resolver os problemas com automação de atividades internas, mas sua mera existência tinha o potencial de alterar a visão que os servidores e colaboradores tinham sobre o uso da tecnologia como facilitador das atividades corriqueiras (e maçantes) que eram desenvolvidas acriticamente todos os dias, o que já teve uma função motivacional.
O Victor foi desenvolvido para funcionar na tramitação inicial dos recursos extraordinários no STF, na análise da existência, ou não, de tema de repercussão geral a ser aplicado ao recurso. Essa é uma atividade feita antes mesmo da distribuição de recurso a um dos ministros, sob a supervisão da presidência da Suprema Corte.
Ao final do projeto, espera-se que, além do STF, todos os tribunais do Brasil possam utilizá-lo para pré-processar os recursos extraordinários logo após sua interposição, atuando ainda em conjunto com o Módulo de Jurisdição Extraordinária (MJE), que começou a ser desenvolvido em 2019, em parceria com o Conselho Nacional de Justiça e com o Superior Tribunal de Justiça. O MJE auxilia no reconhecimento das demandas com potencial de replicação em massa, promovendo uma gestão inteligente da admissibilidade recursal desde o peticionamento do recurso na origem, dinamizando a entrega da prestação jurisdicional nacionalmente, reduzindo o custo do processo e tornando o seu trâmite mais célere.
Um dos principais ganhos do projeto Victor adveio da maior conscientização do Poder Judiciário e de seus membros e servidores, a respeito da tecnologia e de seu próprio aprendizado. Apenas para se ter uma ideia, quando iniciado o projeto, entre o final de 2017 e início de 2018, poucas notícias havia sobre projetos dessa natureza no país. Seu anúncio resultou numa espécie de competição dentro do Poder Judiciário, com o surgimento de outros bem-vindos projetos de IA, como o projeto Sócrates, do Superior Tribunal de Justiça; o LEIA, do Tribunal de Justiça do Acre; o Hércules, do Tribunal de Justiça de Alagoas; o Horus, o Amon e o Toth, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios; o Radar, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais; o Elis, do Tribunal de Justiça de Pernambuco; o Poti, o Clara e o Jerimum, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, além da plataforma SINAPSES, do Tribunal de Justiça de Rondônia[16], dentre outros.
Com relação ao Victor, uma das principais dificuldades enfrentadas, em especial quanto aos índices de acurácia na identificação de temas de geral, decorre mais das deficiências da base de dados em que foi treinado e da complexidade da linguagem jurídica do que da falha tecnológica. Como destacado pelos pesquisadores que participaram do projeto:
Um dos problemas [a ser enfrentado] pelo sistema, contudo, é a dimensão de conceito jurídico indeterminado do requisito de admissibilidade da repercussão geral, subdividindo-se em dois grupos de admissão: os filtros monocráticos de admissão recursal e os filtros colegiados de admissão recursal, [que se] utilizam da reafirmação de jurisprudência. A partir disso, a alimentação do Projeto Victor se dará em razão das decisões proferidas, com a análise de série temporal da jurisprudência firmada e o acesso ao banco de dados estabelecido no tribunal[17].
Mas o fato de ser possível chegar a essa conclusão já é reflexo dos efeitos positivos do projeto, pois demonstram avanço na identificação de problemas, ultrapassando-se a fronteira de questões até então desconhecidas.
Por outro lado, o projeto jamais teve a pretensão de substituir pessoas por máquinas. Pelo contrário. Seu propósito sempre foi aproveitar o potencial humano para a solução de casos complexos, reduzindo a quantidade de pessoas voltadas a atividades banais, redirecionando recursos humanos preciosos para trabalhos que não podem ser realizados por máquinas[18].
Nem o Victor nem qualquer outra ferramenta utilizada no Poder Judiciário substituirão a decisão do magistrado. Eles apenas[19] realizarão uma triagem e recomendarão um tema de repercussão a ser aplicado no caso, com sugestão de decisão. Também é importante sublinhar a necessidade de se publicizar a alimentação da ferramenta Victor para se possibilitar o distinguishing permitido nos §§ 9º e seguintes do art. 1.036 do Código de Processo Civil.
De acordo com Mariana Dionísio de Andrade e outros, a ferramenta Victor utiliza “dois modelos de redes neurais: Rede Neural Convolucional (Convolutional Neural Network – CNN) e Modelo Bidirecional de Memória de Longo Prazo (Bidirectional Long Short-Term Memory)”, sendo esse último “uma variação do estudo de Redes Neurais Recorrentes (Recurrent Neural Network – RNN)”[20]. Em termos simples, o Victor preserva o erro.
Há expectativas de que o Victor cumpra integralmente o que fora prometido em seu projeto inicial. Entretanto, houve a necessidade de que um projeto dessa envergadura fosse inserido definitivamente na rotina do STF para que suas redes neurais se aprimorassem com seus próprios erros a partir da supervisão humana, já que a indicação no sistema por uma pessoa de que a sugestão de tema feita pelo Victor está errada ou certa é essencial para sua evolução[21].
De toda forma, até que toda a sua potencialidade seja alcançada, há a expectativa de que o Victor continuará sendo um importante propulsor da transformação digital do STF, mas é importante ter em mente que a introdução da IA nas rotinas judiciais está apenas começando. Não se conhece ainda a exata dimensão do porvir e, principalmente, os problemas que serão enfrentados.
O importante é que o Poder Judiciário se mantém aberto para a inovação, com responsabilidade e planejamento, permitindo sua constante evolução, pari passu com as necessidades apresentadas pela sociedade brasileira, que cada vez exige soluções mais rápidas e eficientes para os problemas da modernidade.
8 REFERÊNCIAS
ANDRADRE, Mariana Dionísio; PINTO, Eduardo Régis Girão de Castro; LIMA, Isabela Braga de; GALVÃO, Alex Renan de Sousa. Inteligência artificial para o rastreamento de ações com repercussão geral: o projeto Victor e a realização do princípio da razoável duração do processo. Revista Eletrônica de Direito Processual-REDP, ano 14, vol. 21, número 1, pp. 312-335, jan.-abr./2020.
BREHM, Katie; HIRABAYASHI, Momori; LANGEVIN, Clara; NUÑOZCANO, Bernardo Rivera; KASTSUMI, Sekizawa. (Coord. sob a orientação de André Corrêa D’Almeida para o Conselho Nacional de Justiça e Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro). O futuro da IA no sistema judiciário brasileiro: mapeamento, integração e governança da IA. 2020. Disponível em: https://itsrio.org/wp-content/uploads/2020/ 07/TRADUC%CC%A7A%CC%83O-The-Future-of-AI-in-the-Brazilian-Judicial-Sys tem.pdf. Acesso em: 18 agosto 2024.
COMISSÃO EUROPEIA. Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, que estabelece regras harmonizadas em matéria de inteligência artificial e altera determinados atos legislativos da União. Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/HTML/?uri=CELEX:52021PC0206& from=EN#:~:text=A%20proposta%20apoia%20o%20objetivo,especificamente%20pelo%20Parlamento%20Europeu%204%20. Acesso em: 18 agosto 2024.
CONSELHO NACIONAL JUSTIÇA – CNJ. Justiça em números – 2024. Brasília: CNJ, 2024. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2024/05/justica-em-numeros-2024-v-28-05-2024.pdf. Acesso em: 18 agosto 2024.
DANTAS, Ivo; ALENCASTRO, Emiliane; URTIGA, Rafael Beltrão. Inteligência Artificial aplicada ao gerenciamento de precedentes na corte constitucional brasileira. Revista de Direito e as Novas Tecnologias, São Paulo, v. 11, n.4, p. 1-12, abr./jun. 2021.
DAUN, Rafaela Rabelo, PAIÃO, Olivie Samuel. O uso da inteligência artificial no direito: a aplicação nos precedentes judiciais e na uniformização da jurisprudência. In: RIGOLDI, Vivianne; NASCIMENTO, Arthur Ramos do; BONAVIDES, Samia Saad Gallotti; DOS SANTOS, Amanda Querino (Org.). Direito Constitucional Contemporâneo I, Jacarezinho: UENP, 2019. p. 159-173.
LAGE, Fernanda de Carvalho. A inteligência artificial na repercussão geral: análise e proposições da vanguarda de inovação tecnológica no Poder Judiciário brasileiro. 2020. 279 f., il. Tese (Doutorado em Direito) — Universidade de Brasília, Brasília, 2020. Disponível em: http://repositorio2.unb.br/jspui/handle/10482/46708. Acesso em: 18 agosto 2024.
MENDES, Alexandre José. O aprimoramento da qualidade da decisão judicial apoiado em modelos de inteligência artificial e sua contribuição para a consolidação do sistema de precedentes brasileiro. Curitiba, 2021. 294 f. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Direito, Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
MORAIS, Fausto Santos de. O Uso da Inteligência Artificial na Repercussão Geral: Desafios Teóricos e Éticos. Revista Direito Público, Brasília, v. 18, n. 100, p. 306-326, out./dez., 2021.
NUNES, Thâmylla da Cruz; GOMES, Luísa Caroline. Decisões Judiciais Conflitantes e o Impacto Da Inteligência Artificial na Uniformização Da Jurisprudência. Revista de Direito e Atualidades - Debates Jurídicos, [S.l], vol.1, n. 3, p. 86-104, jan. 2022.
PINTO, Henrique Alves; ERNESTO, Leandro Miranda. Inteligência artificial aplicada ao direito: por uma questão de ética. Revista de Processo, v. 327/2022, p. 431-449, maio, 2022.
SUSSKIND, Richard. Online courts and the future of justice. Oxford: Oxford Press, 2019.
VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Urnas eletrônicas: um pouco de sua história. Conjur, 05.11.2020. Disponível em: https://www.conjur.com.br/dl/artigo-carlos-velloso.pdf. Acesso em: 18 agosto 2024.
Vigliar, José Marcelo Menezes. Inteligência Artificial: aspectos Jurídicos. São Paulo: Almedina, 2023.
[1] COMISSÃO EUROPEIA. Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, que estabelece regras harmonizadas em matéria de inteligência artificial e altera determinados atos legislativos da União. Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/HTML/?uri= CELEX:52021PC0206&from=EN#:~:text=A%20proposta%20apoia%20o%20objetivo,especificamente%20pelo%20Parlamento%20Europeu%204%20. Acesso em: 18 agosto 2024.
[2] CONSELHO NACIONAL JUSTIÇA – CNJ. Justiça em números – 2024. Brasília: CNJ, 2024. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2024/05/justica-em-numeros-2024-v-28-05-2024.pdf. Acesso em: 18 agosto 2024.
[3] Nas palavras de Carlos Mário da Silva Velloso, o cadastro eletrônico foi “implantado em 1985/1986, na presidência do ministro Néri da Silveira. Foi uma tarefa hercúlea, na qual o ministro Néri foi o grande comandante. Na época, integrava o TSE, na representação do antigo Tribunal Federal de Recursos como Corregedor-Geral da Justiça Eleitoral, e pude testemunhar o notável trabalho do ministro José Néri da Silveira, que percorreu praticamente todo o Brasil, tornando realidade o recadastramento dos eleitores em meio eletrônico. Hoje, o maior cadastro do continente, com mais de 140 milhões de eleitores, é de grande importância para a realização da verdade eleitoral” (VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Urnas eletrônicas: um pouco de sua história. Conjur, 05.11.2020. Disponível em: https://www.conjur.com.br/dl/artigo-carlos-velloso.pdf. Acesso em: 18 agosto 2024).
[4] “E por que o voto informatizado tornara-se o meu ideal maior? É que, nas apurações manuais com as cédulas de papel, campeava o mapismo, fraude abominável que elegia e deselegia candidatos. Acabávamos de tomar conhecimento de extensa fraude eleitoral nas eleições de 1994, no Rio de Janeiro. Parte delas chegou a ser anulada. Se isso ocorria no Rio de Janeiro, tambor do Brasil – o que lá ocorre repercute no Brasil inteiro – o que não estaria ocorrendo nos Estados mais distantes? Era preciso, portanto, afastar a mão humana das apurações, tema de conversas intermináveis entre o ministro Pertence, então presidente do TSE, alguns juízes e eu” (VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Urnas eletrônicas: um pouco de sua história. Op. cit.)
[5] O Plenário Virtual concretiza o conceito do Professor Richard Susskind de cortes de internet, segundo o qual as cortes judiciárias, por prestarem um “serviço”, não devem ficar adstritas a um “local” físico (Cf. SUSSKIND, Richard. Online courts and the future of justice. Oxford: Oxford Press, 2019).
[6] MORAIS, Fausto Santos de. O Uso da Inteligência Artificial na Repercussão Geral: Desafios Teóricos e Éticos. Revista Direito Público, Brasília, v. 18, n. 100, p. 306-326, out./dez., 2021.
[7] NUNES, Thâmylla da Cruz; GOMES, Luísa Caroline. Decisões Judiciais Conflitantes e o Impacto Da Inteligência Artificial na Uniformização Da Jurisprudência. Revista de Direito e Atualidades - Debates Jurídicos, [S.l], vol.1, n. 3, p. 86-104, jan. 2022.
[8] ANDRADE, Mariana. Inteligência artificial para a redução do tempo de análise dos recursos extraordinários: o impacto do Projeto Victor no Supremo Tribunal Federal. Revista Quaestio Iuris, Rio de Janeiro, v. 15, n. 1, p. 53-78, 2022.
[9] Vigliar, José Marcelo Menezes. Inteligência Artificial: aspectos Jurídicos. São Paulo: Almedina, 2023, p. 99.
[10] DAUN, Rafaela Rabelo, PAIÃO, Olivie Samuel. O uso da inteligência artificial no direito: a aplicação nos precedentes judiciais e na uniformização da jurisprudência. In: RIGOLDI, Vivianne; NASCIMENTO, Arthur Ramos do; BONAVIDES, Samia Saad Gallotti; DOS SANTOS, Amanda Querino (Org.). Direito Constitucional Contemporâneo I. Jacarezinho: UENP, 2019. p. 159-173.
[11] DANTAS, Ivo; ALENCASTRO, Emiliane; URTIGA, Rafael Beltrão. Inteligência Artificial aplicada ao gerenciamento de precedentes na corte constitucional brasileira. Revista de Direito e as Novas Tecnologias, São Paulo, vol. 11, n.4, p. 1-12, abr./jun. 2021.
[12] MENDES, Alexandre José. O aprimoramento da qualidade da decisão judicial apoiado em modelos de inteligência artificial e sua contribuição para a consolidação do sistema de precedentes brasileiro. Curitiba, 2021. 294 f. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Direito, Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
[13] PINTO, Henrique Alves; ERNESTO, Leandro Miranda. Inteligência artificial aplicada ao direito: por uma questão de ética. Revista de Processo, v. 327/2022, p. 431-449, maio, 2022.
[14] Vigliar, José Marcelo Menezes. Inteligência Artificial: aspectos Jurídicos. São Paulo: Almedina, 2023.
[15] PINTO, Henrique Alves; ERNESTO, Leandro Miranda. Inteligência artificial aplicada ao direito: por uma questão de ética. Revista de Processo, v. 327/2022, p. 431-449, maio, 2022.
[16] Cf. BREHM, Katie; HIRABAYASHI, Momori; LANGEVIN, Clara; NUÑOZCANO, Bernardo Rivera; KASTSUMI, Sekizawa. (Coord. sob a orientação de André Corrêa D’Almeida para o Conselho Nacional de Justiça e Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro). O futuro da IA no sistema judiciário brasileiro: mapeamento, integração e governança da IA. 2020. Disponível em: https://itsrio.org/wp-content/uploads/2020/07/TRADUC%CC%A7A%CC%83O-The-Future-of-AI-in-the-Brazilian-Judicial-System.pdf. Acesso em: 18 agosto 2024.
[17] ANDRADRE, Mariana Dionísio; PINTO, Eduardo Régis Girão de Castro; LIMA, Isabela Braga de; GALVÃO, Alex Renan de Sousa. Inteligência artificial para o rastreamento de ações com repercussão geral: o projeto Victor e a realização do princípio da razoável duração do processo. Revista Eletrônica de Direito Processual-REDP, ano 14, vol. 21, número 1, pp. 312-335, jan.-abr./2020, p. 329.
[18] LAGE, Fernanda de Carvalho. A inteligência artificial na repercussão geral: análise e proposições da vanguarda de inovação tecnológica no Poder Judiciário brasileiro. 2020. 279 f., il. Tese (Doutorado em Direito) — Universidade de Brasília, Brasília, 2020. Disponível em: http://repositorio2.unb.br/jspui/handle/10482/46708. Acesso em: 18 agosto 2024.
[19] O “apenas” é locução expletiva, pois a complexidade por trás dessas funcionalidades não sugere atividade simplificada.
[20] ANDRADRE, Mariana Dionísio; PINTO, Eduardo Régis Girão de Castro; LIMA, Isabela Braga de; GALVÃO, Alex Renan de Sousa. Inteligência artificial para o rastreamento de ações com repercussão geral: o projeto Victor e a realização do princípio da razoável duração do processo. Op. cit.
[21] LAGE, Fernanda de Carvalho. A inteligência artificial na repercussão geral: análise e proposições da vanguarda de inovação tecnológica no Poder Judiciário brasileiro. Op. cit.
Doutoranda. Unialfa.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SIQUEIRA, PATRICIA GONZAGA DE. O uso da inteligência artificial para análise de temas de repercussão geral: contribuição para a eficiência e redução da morosidade do Judiciário Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 jan 2025, 04:19. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/67543/o-uso-da-inteligncia-artificial-para-anlise-de-temas-de-repercusso-geral-contribuio-para-a-eficincia-e-reduo-da-morosidade-do-judicirio. Acesso em: 13 jan 2025.
Por: Jorge Hilton Vieira Lima
Por: ELISA CARDOSO BATISTA
Por: ELISA CARDOSO BATISTA
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Precisa estar logado para fazer comentários.