Resumo: No presente artigo, buscou-se analisar a possibilidade de se retroagir os parâmetros do art. 112, VI, alínea “a” da Lei nº 13.694/2019 para fins de progressão de regime do condenado reincidente genérico que tenha praticado crime hediondo com resultado morte, anteriormente a 23/01/2020, sem que isso gere na vedação ao direito ao livramento condicional. Para avaliação do tema, foi realizado uma breve contextualização sobre as alterações do pacote anticrime no que tange a progressão de regime e ao livramento condicional. Posteriormente foi analisada a interpretação da jurisprudência sobre a ocorrência da combinação de leis, ao se utilizar critérios da progressão de regime e de livramento condicional dispostos em leis distintas. A metodologia utilizada envolveu análise da legislação vigente e da jurisprudência dos Tribunais Superiores. Ao final, verificou-se que o Supremo Tribunal Federal adotou um posicionamento que impede a aplicação parcial do art. 112, VI, alínea “a” da Lei nº 13.964/2019, na contramão da evolução positiva que tinha sido apresentada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 1196.
Palavras chaves: Pacote Anticrime. Progressão de Regime. Livramento condicional. Combinação de leis. Divergência entre os Tribunais Superiores.
Abstract: This article aims to analyze the possibility of retroactively applying the provisions of Article 112, item VI, letter “a” of Law No. 13.694/2019 to allow for the progression of the prison regime for generic recidivist offenders convicted of heinous crimes resulting in death before January 23, 2020, without leading to the revocation of their right to conditional release. To address this issue, the article presents a brief contextualization of the anti-crime package reforms regarding regime progression and conditional release. Subsequently, it examines judicial interpretations concerning the combination of legal provisions when regime progression and conditional release criteria originate from different laws. The methodology employed involves an analysis of current legislation and the jurisprudence of higher courts. Ultimately, it was concluded that the Federal Supreme Court adopted a restrictive stance, prohibiting the partial application of Article 112, item VI, letter “a” of Law No. 13.964/2019, diverging from the more progressive position established by the Superior Court of Justice in Theme 1196.
Keywords: Anti-Crime Package. Regime Progression. Conditional release. Combination of laws. Divergence between the Superior Courts.
1. Introdução
O art. 5º, XL da Constituição Federal prevê que a “lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”.
De maneira semelhante, o art. 2º do Código Penal prevê que:
Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.
Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.
Apesar da possibilidade de retroação da lei benéfica, a doutrina não é unânime sobre a possibilidade de selecionar as parcelas benéficas de lei distintas, o que configuraria combinação de leis. Quanto ao tema, Cleber Masson explicita:
A discussão reside na possibilidade ou não de o juiz, na determinação da lei penal mais branda, acolher os preceitos favoráveis da primitiva e, ao mesmo tempo, os da posterior, combinando-os para utilizá-los no caso concreto, de modo a extrair o máximo benefício resultante da aplicação conjunta dos aspectos mais interessantes ao réu. O cerne da discussão reside em definir se cabe ou não ao Poder Judiciário a formação de uma lex tertia, ou seja, uma lei híbrida [...]
Nelson Hungria revelava sua incredulidade nessa possibilidade de o membro do Poder Judiciário se arvorar em legislador, sob pena de violação da regra constitucional de separação de poderes. Compartilham desse entendimento Heleno Cláudio Fragoso e Aníbal Bruno.
Com opinião diametralmente oposta, José Frederico Marques pugnava pela admissibilidade da combinação de leis. São suas as palavras: Dizer que o juiz está fazendo lei nova, ultrapassando assim suas funções constitucionais, é argumento sem consistência, pois o julgador, em obediência a princípios de equidade consagrados pela própria Constituição, está apenas movimentando-se dentro dos quadros legais para uma tarefa de integração perfeitamente legítima.[1]
Vale mencionar ainda o fundamento de Juarez Cirino dos Santos para defender a combinação de leis, ao asseverar que “a expressão de 'qualquer modo' (art. 2º, parágrafo único, do Código Penal) não conhece exceções”[2]. De maneira semelhante, Cezar Roberto Bittencourt, sustenta a possibilidade de aplicação apenas dos dispositivos favoráveis de cada lei, comparando a atividade de combinação de leis à integração promovida pelo juiz no caso de normas penais em branco, in verbis:
Se a lei intermediária for a mais favorável, deverá ser aplicada. Assim, a lei posterior, mais rigorosa, não pode ser aplicada pelo princípio geral da irretroatividade, como também não pode ser aplicada a lei da época do fato, mais rigorosa. Por princípio excepcional, só poderá ser aplicada a lei intermediária, que é a mais favorável. Nessa hipótese, a lei intermediária tem dupla extra-atividade: é, ao mesmo tempo, retroativa e ultra-ativa!
[...]
Grande setor da doutrina nacional e estrangeira opõe-se a essa possibilidade, porque isso representaria a criação de uma terceira lei, travestindo o juiz de legislador. Bustos Ramirez, contrariamente, admite a combinação de leis no campo penal, pois, como afirma, nunca há uma lei estritamente completa, enquanto há leis especialmente incompletas, como é o caso da norma penal em branco; consequentemente, o juiz está configurando uma terceira lei, que a rigor, não passa de simples interpretação integrativa, admissível na atividade judicial, favorável ao réu. [3]
Em outras palavras, a discordância doutrinária consiste em avaliar se o Juiz, ao combinar as leis, estaria substituindo a vontade do legislador e, como consequência violando a separação de poderes (art. 2º da Constituição Federal) e o princípio da reserva legal (art. 5º, XXXIX da Constituição Federal). Ou se, de maneira diversa, o Juiz estaria apenas aplicando concretamente as normas, por meio de atividade interpretativa para garantir a individualização de pena (art. 5º, XLVI da Constituição Federal) e atender a literalidade da obrigação de aplicação da lei mais benéfica (art. 5º, XL da Constituição Federal).
De outro lado, os Tribunais Superiores têm apresentado posicionamento contundente no sentido de ser vedada a combinação de leis.
Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça, analisando a possibilidade de aplicação do tráfico privilegiado (art. 33, §4º da Lei 11.343/2006) a crimes cometidos na vigência da lei anterior, editou a Súmula 501, a qual enuncia que:
É cabível a aplicação retroativa da Lei n. 11.343/2006, desde que o resultado da incidência das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da aplicação da Lei n. 6.368/1976, sendo vedada a combinação de leis.[4]
Analisando o tema, também o Supremo Tribunal Federal se manifestou pela impossibilidade de cumulação dos institutos benéficos de lei distintas, conforme ementa abaixo transcrita:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. PENAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. CRIME COMETIDO NA VIGÊNCIA DA LEI 6.368/1976. APLICAÇÃO RETROATIVA DO § 4º DO ART. 33 DA LEI 11.343/2006. COMBINAÇÃO DE LEIS. INADMISSIBILIDADE. PRECEDENTES. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I – É inadmissível a aplicação da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 à pena relativa à condenação por crime cometido na vigência da Lei 6.368/1976. Precedentes. II – Não é possível a conjugação de partes mais benéficas das referidas normas, para criar-se uma terceira lei, sob pena de violação aos princípios da legalidade e da separação de Poderes. III – O juiz, contudo, deverá, no caso concreto, avaliar qual das mencionadas leis é mais favorável ao réu e aplicá-la em sua integralidade. IV - Recurso parcialmente provido.[5]
Quase 10 (dez) anos depois desses precedentes, a questão da cumulação de leis voltou a ser discutido a partir da alteração promovida pela Lei nº 13.946/2019, sendo o objetivo desse artigo responder ao seguinte questionamento: é possível adotar os critérios para a progressão de regime dispostos na Lei do Pacote Anticrime, mantendo o direito ao livramento condicional no caso de condenado por hediondo com resultado morte que seja reincidente genérico?
Nesse contexto, foi realizada uma pesquisa teórica, em uma vertente jurídico social, a partir da análise da legislação vigente e da jurisprudência, tendo sido o artigo dividido em 5 (cinco) tópicos: introdução; considerações iniciais sobre as alterações promovidas pelo Pacote Anticrime nos institutos da progressão de regime e do livramento condicional; ausência de combinação de leis: o posicionamento do STJ sobre as alterações promovidas pela Lei nº 13.964/2019; violação ao princípio da reserva legal e da separação de poderes: o posicionamento do STF e a conclusão.
2.Considerações iniciais sobre as alterações promovidas pelo Pacote Anticrime nos institutos da progressão de regime e do livramento condicional
A Lei de Execuções Penais (Lei 7.210/1984), em sua redação originária, previa que no artigo 112 que “A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva, com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo Juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos 1/6 (um sexto) da pena [...]”.
Nesse contexto, não previa qualquer diferenciação entre condenados primários ou reincidentes. Obviamente, em razão da data de sua publicação (anterior a criação dos crimes hediondos), também não previa frações distintas para crimes hediondos e comuns.
Posteriormente, a Lei nº 8.072/1990 criou os crimes hediondos, prevendo, na redação originária do art. 2º, parágrafo primeiro, que os condenados por esses crimes cumpririam a pena “integralmente em regime fechado”, negando-lhes, assim o direito à progressão de regime.
Tal dispositivo, contudo, foi considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus 82.959 assim ementado:
PENA - REGIME DE CUMPRIMENTO - PROGRESSÃO - RAZÃO DE SER. A progressão no regime de cumprimento da pena, nas espécies fechado, semi-aberto e aberto, tem como razão maior a ressocialização do preso que, mais dia ou menos dia, voltará ao convívio social. PENA - CRIMES HEDIONDOS - REGIME DE CUMPRIMENTO - PROGRESSÃO - ÓBICE - ARTIGO 2º, § 1º, DA LEI Nº 8.072/90 - INCONSTITUCIONALIDADE - EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL. Conflita com a garantia da individualização da pena - artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal - a imposição, mediante norma, do cumprimento da pena em regime integralmente fechado. Nova inteligência do princípio da individualização da pena, em evolução jurisprudencial, assentada a inconstitucionalidade do artigo 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90.[6]
Diante desse fato, foi publicada a Lei nº 11.464/2007, a qual alterou o art. 2º da Lei nº 8.072/1990, passando a prever que “A progressão de a regime, no caso dos condenados aos crimes previstos neste artigo, dar-se-á após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três quintos), se reincidente”.
Esclareça-se que para definição da fração de progressão considerava-se a ocorrência de reincidência genérica, de modo que o requisito de três quintos era exigido daqueles condenados por 2 (dois) crimes hediondos ou por um crime comum e outro hediondo.
A partir de 2007, portanto, tem-se que a progressão de regime obedecia aos seguintes critérios objetivos:
a) 1/6 (equivalente à 16,67%) para condenados apenas por crimes comuns, independente de serem primários ou reincidentes;
b) 2/5 (equivalente à 40%) para condenados primários em crimes hediondos;
c) 3/5 (equivalente à 60%) para condenados reincidentes genéricos, cujo algum dos crimes seja hediondo.
Mais recentemente, a Lei nº 13.964/2019, alterou a legislação penal e processual penal, com destaque, ao que interessa ao presente artigo, à modificação do art. 112 da Lei de Execuções Penais (Lei nº 7.210/1984), passando a prever os seguintes percentuais para progressão de regime:
a) 16% (dezesseis por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
b) 20% (vinte por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;
c) 25% (vinte e cinco por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
d) 30% (trinta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;
e) 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário;
f) 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for condenado: a) pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário; ou b) por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado; ou c) condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada;
g) 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado;
h) 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte.[7]
O Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral (Tema 1169) no julgamento do Agravo em Recurso Extraordinário nº 1.327.963, fixou sua jurisprudência no sentido de que a reincidência tratada na Lei nº 13.964/2019 seria específica.
No julgamento em questão, também foi destacado que o percentual de 40% previsto pelo Pacote Anticrime para primários (e, por força da decisão, para reincidentes genéricos) em crimes hediondos seria mais benéfico que a fração de 3/5 prevista na Lei nº 8.072/1990, razão pela qual teria sua aplicação retroativa, na forma do art. 5º, XL da Constituição Federal. Veja-se a ementa:
Repercussão geral no recurso extraordinário com agravo. Constitucional. Processo Penal. Execução. 2. Progressão de regime prisional. Condenado por crime hediondo ou equiparado, sem resultado morte, reincidente por crime comum (não específico). Art. 112, incisos V, VI e VII, da Lei de Execução Penal, com redação dada pela Lei 13.964/2019 (Pacote Anticrime). 3. Princípio da legalidade (art. 5º, XXXIX, CF): taxatividade e interpretação mais benéfica ao réu. Retroatividade da norma mais benéfica ao réu (art. 5º, XL, CF). Repercussão geral reconhecida. 4. A leitura dos dispositivos legais (art. 112 e incisos, LEP) atinentes à progressão de regime permite constatar a existência de verdadeiro vácuo normativo. Referida legislação não disciplinou, de forma expressa, a fração para progressão do condenado por crime hediondo ou equiparado reincidente em crime comum. 5. Diante da lacuna legislativa, não se pode admitir a aplicação de norma mais gravosa a partir de interpretação prejudicial ao réu. Tendo em vista a ausência de previsão aplicável a apenados condenados por crimes hediondos ou equiparados, mas reincidentes genéricos (condenação anterior por crime não hediondo ou equiparado), deve-se integrar a norma a partir de interpretação em benefício do réu, já que vedada a analogia in malam partem. 6. A Lei 13.964/19 (Pacote Anticrime) resultou em tratamento mais benéfico a condenados por crime hediondo, sem resultado morte, reincidentes não específicos. Nesse cenário, a norma mais benéfica deve retroagir mesmo para fatos criminosos passados. 7. Julgamento do mérito por reafirmação de jurisprudência: RHC 200.879/SC, Rel. Min. Edson Fachin, Segunda Turma, por unanimidade, DJe 14.6.2021; RHC 196.810 AgR/SC, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, por maioria, DJe 25.6.2021; RHC 198.156 AgR/SC, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, por maioria, DJe 25.6.2021; ARE 1.330.176/SC, Rel. Min. Edson Fachin, decisão monocrática, DJe 6.8.2021; HC 202.691/SP, Rel. Min. Nunes Marques, decisão monocrática, DJe 6.8.2021; HC 193.187/PR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, decisão monocrática, DJe 25.5.2021. 8. Agravo no recurso extraordinário provido para conhecer mas não prover o recurso extraordinário interposto pelo Ministério Público Federal. 9. Fixação da tese: “Tendo em vista a legalidade e a taxatividade da norma penal (art. 5º, XXXIX, CF), a alteração promovida pela Lei 13.964/2019 no art. 112 da LEP não autoriza a incidência do percentual de 60% (inc. VII) aos condenados reincidentes não específicos para o fim de progressão de regime. Diante da omissão legislativa, impõe-se a analogia in bonam partem, para aplicação, inclusive retroativa, do inciso V do artigo 112 da LEP (lapso temporal de 40%) ao condenado por crime hediondo ou equiparado sem resultado morte reincidente não específico.[8]
De maneira análoga, o Superior Tribunal de Justiça, no rito dos recursos repetitivos, fixou a Tese 1084, no âmbito do Recurso Especial 1.910.240/MG, segundo a qual:
[...] é reconhecida a retroatividade do patamar estabelecido no art. 112, V, da Lei n. 13.964/2019, àqueles apenados que, embora tenham cometido crime hediondo ou equiparado sem resultado morte, não sejam reincidentes em delito de natureza semelhante. [9]
Considerando a ratio decidendi das decisões dos Tribunais Superiores com força de precedentes vinculantes, de maneira análoga, seria possível entender pela aplicação do percentual de 50% previsto no art. 112, VI, “a” da Lei nº 7.210/1984 aos condenados por crime hediondo com resultado morte que sejam reincidentes genéricos.
A dúvida surge quanto a retroação do percentual de 50% para crimes cometidos antes da vigência da Lei nº 13.964/2019, isso é, isso é, antes de 23 de janeiro de 2020. Especificamente em relação à fração a ser cumprida, é evidente que o percentual da Lei do Pacote Anticrime é mais benéfico que o percentual de 3/5 (equivalente a 60%) previsto na Lei nº 8.072/1990.
Ocorre que o art. 112, VI, alínea “a”, além de alterar a fração para progressão, previu que seria “vedado o livramento condicional”.
Nesse contexto, aqueles que defendem a impossibilidade de combinação de leis e, por consequência, a necessidade de observar a integralidade do previsto em cada diploma normativo, tem entendido que a previsão do revogado art. 2º, §2º da Lei nº 8.072/1990 seria mais benéfico que aplicar o percentual de 50% fixado pela Lei nº 13.964/2019, na medida que garantiria ao condenado o direito ao livramento condicional. Outros, contudo, interpretam que a aplicação retroativa do percentual de 50% não impediria automaticamente o livramento condicional, como é o caso dos julgados do Superior Tribunal de Justiça, que serão detalhados a seguir.
3.Da ausência de combinação de leis: o posicionamento do STJ sobre as alterações promovidas pela Lei nº 13.964/2019
À época da análise da aplicabilidade da causa de diminuição do tráfico privilegiado (art. 33, §4º da Lei nº 11.343/2006) aos crimes praticados na vigência da Lei nº 6.368/1976, o Superior Tribunal de Justiça possuía firme entendimento de que não era cabível a combinação de leis, tendo inclusive editado a Súmula 501.
Apreciando a questão relativa à Lei nº 13.964/2019, contudo, o Superior Tribunal de Justiça parece ter adotado uma interpretação diferente quanto aos limites para a combinação de leis.
Nesse sentido, cite-se o Agravo nos Embargos de Declaração no Habeas Corpus nº 689.031/SC, de relatoria do Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 16/11/2021, no qual se entendeu ser possível aplicar o percentual de progressão de regime previsto na Lei nº 13.964/2019, sem prejuízo da manutenção do direito ao livramento condicional.
O primeiro fundamento apresentado pelo relator Soares da Fonseca é o fato de não ser possível verificar, de maneira genérica e sem apreciar o caso concreto, o que seria mais benéfico: se aplicação do percentual de 60% para progressão de regime com o direito ao livramento condicional ou se a aplicação do percentual de 50% sem o direito ao livramento, in verbis:
Primeiramente, observo ser difícil aferir, taxativamente, se a vedação de livramento condicional seria, ou não, mais prejudicial ao executado do que a imposição de cumprimento de mais tempo de pena para que pudesse pleitear a progressão de regime, ainda que se possa admitir que as condições de cumprimento de livramento condicional são, em tese, mais brandas do que uma eventual concessão mais rápida de progressão para o regime semiaberto e/ou aberto.[10]
Esse raciocínio tem como fundamento o fato de que para a concessão do livramento condicional, não basta a aferição de requisitos objetivos, isso é, não basta que o apenado tenha cumprido o tempo mínimo de pena estabelecido pelo Código Penal. É necessário que tenha sido constatado o cumprimento de todos os demais requisitos previstos no art. 83 do Código Penal, os quais incluem, por exemplo, aptidão para prover a própria subsistência, bom comportamento carcerário[11] e, em situações específicas (como seria o caso dos crimes hediondos com resultado morte[12]), até mesmo a constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir.
Nesse contexto, é possível que um condenado por crime hediondo com resultado morte, reincidente genérico, que tenha cumprido o percentual de dois terços da pena (art. 83, V do Código Penal), não tenha o direito ao livramento em razão de não cumprir os requisitos subjetivos. Nessa hipótese, a defesa da irretroatividade do disposto na Lei nº 13.964/2019 seria extremamente gravoso ao apenado, na medida que não usufruiria do livramento condicional e ainda teria que cumprir 60% da sua pena (requisito previsto no revogado art. 2º, §2º da Lei nº 8.072/1990) para ter direito à progressão de regime.
Outro argumento apresentado pelo Ministro Relator é o fato de a progressão de regime e o livramento condicional serem institutos distintos, tratados em leis diversas. Isso porque, enquanto a progressão de regime é tratada no âmbito da Lei de Execução Penal, o livramento condicional é regulamentado pelo Código Penal. É o que se extrai do trecho abaixo:
Por consectário lógico, no caso concreto, não há por que vedar a aplicação da retroatividade no tocante à fração para progressão de regime, em razão da vedação do livramento condicional, porque não há combinação de leis, uma vez que este instituto estava há época regulamentado materialmente em lei diversa da lei que dispunha sobre a progressão de regime.[13]
O Ministro Reynaldo ainda acrescentou que a Lei nº 13.964/2019 não promoveu qualquer alteração no inciso V do art. 83 do Código Penal, de modo que a única vedação ao livramento condicional continuava sendo no caso das pessoas reincidentes específicas em crimes hediondos[14]. Nesse contexto, não seria possível afirmar que houve interesse do legislador em ampliar as vedações ao instituto pela simples alteração promovida no art. 112, VI, a da Lei de Execuções Penais. Para melhor compreensão, transcreve-se trecho do voto:
Em segundo lugar, como bem ponderou a Defensoria Pública de Santa Catarina, na inicial da presente impetração, ainda que a Lei 13.964/2019 tenha trazido disposições sobre o livramento condicional, não promoveu alteração nem revogação expressa do texto normativo pelo qual este instituto era regido à época do crime e que correspondia, no caso concreto, ao Código Penal, com as alterações trazidas pela Lei 7.209/1984 e pela Lei 13.344/2016, disposições essas que ainda estão em vigência.
Consulte-se o exato teor da norma do Código Penal que trata de livramento condicional, na parte que interessa à hipótese em exame: Art. 83 do CP. O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) (...) V - cumpridos mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.
[...]
Portanto, não haveria a criação de uma terceira lei, nem se violaria a vontade do Poder Legislativo, porque o diploma legislativo que delibera sobre as regras do livramento condicional para o condenado em crime hediondo com resultado morte é o Código Penal alterado pela Lei 7.209/1984 e pela Lei 13.344/2016 que permanece em plena vigência, e não a Lei 7.210/1984 e a Lei 8.072/1990, como no caso da progressão de regime, as quais eram vigentes na data do delito.[15]
Registre-se que o legislador teve a oportunidade de alterar as vedações do art. 83 do Código Penal, mas não o fez, tendo se limitado a inserir, através da Lei nº 13.964/2019, um novo requisito para o livramento condicional, qual seja: o não cometimento de falta grava nos últimos 12 (doze) meses.
Diante desses fundamentos, o Ministro Relator propôs uma interpretação sistemática do art. 112, V da Lei de Execução Penal, de modo a considerar que “a vedação de concessão de livramento condicional somente atingiria o período previsto para a progressão de regime, não impedindo posterior pleito com fundamento no art. 83, V, do CP”[16].
Em outras palavras, na visão do relator, não haveria combinação de leis, por interpretar que a alteração da Lei nº 13.964/2019 apenas vedaria a concessão de livramento condicional enquanto o apenado estivesse cumprindo a fração necessária à progressão de regime. Assim, a partir do momento que o apenado cumprisse a fração e também obedece aos requisitos do art. 83 do Código Penal, faria jus ao direito ao livramento.
Vale mencionar que o cometimento de falta grave faz com que a contagem do prazo para progressão de regime se reinicie (art. 112, §6º da Lei de Execução Penal e Súmula 534 do Superior Tribunal de Justiça[17]), sem, contudo, interromper o computo do prazo do livramento condicional (Súmula 431 do Superior Tribunal de Justiça[18]). Desse modo, que é possível que, em virtude das interrupções, o apenado ainda não tenha cumprido o percentual de progressão (50%, considerando a retroatividade da Lei nº 13.964/2019), ainda que, à princípio, ele seja inferior ao do livramento condicional (66,67%), o que corroboraria a interpretação dada pelo Relator.
Com efeito, após diversas decisões permitindo a aplicação retroativa da Lei nº 13.964/2019 aos reincidentes genéricos que cometeram crimes hediondos com resultado morte[19], no âmbito do Recurso Especial 2.012.101/MG, o Superior Tribunal de Justiça fixou o tema repetitivo 1196, com o seguinte teor:
É válida a aplicação retroativa do percentual de 50% (cinquenta por cento), para fins de progressão de regime, a condenado por crime hediondo, com resultado morte, que seja reincidente genérico, nos moldes da alteração legal promovida pela Lei n. 13.964/2019 no art. 112, inc. VI, alínea a, da Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal), bem como a posterior concessão do livramento condicional, podendo ser formulado posteriormente com base no art. 83, inc. V, do Código Penal, o que não configura combinação de leis na aplicação retroativa de norma penal material mais benéfica.[20]
No voto condutor do Recurso Especial em epígrafe, o ministro Jesuíno Rissato, citando diversos precedentes do Superior Tribunal de Justiça, destacou a aplicabilidade do percentual de 50% para progressão de regime, sem que isso implique em vedação ao livramento condicional, considerando a interpretação de que a limitação ao instituto seria apenas enquanto não cumprido o tempo para progressão de regime. Transcreve-se:
[c]onforme precedentes do STJ, diante da inexistência de previsão a disciplinar a progressão de regime para a hipótese dos autos, uma vez que os percentuais de 60% e 70% foram destinados aos reincidentes específicos, a nova lei deve ser interpretada mediante a analogia in bonam partem, aplicando-se, para o condenado por crime hediondo, com resultado morte, que seja reincidente genérico, o percentual de 50%, previsto no inciso VI do art. 112 da Lei de Execução Penal.
[...]
O entendimento jurisprudencial firmado no STJ é no sentido, segundo o qual, há possibilidade de concessão do livramento condicional da pena aos condenados por crimes hediondos com resultado morte, não reincidentes ou reincidentes genéricos, pois a vedação trazida pela Lei n. 13.964/2019, que alterou a Lei n. 7.210/84, refere-se apenas ao período previsto para a progressão de regime, havendo a possibilidade de formulação de pedido do referido benefício posteriormente, após o cumprimento do percentual estabelecido, com base no art. 83, inc. V, do CP, que permanece vigente no ordenamento jurídico, não havendo que se falar em combinação de leis. Portanto, o pedido do recorrente não deve ser acolhido.[21]
Com efeito, a motivação do voto do relator, pode ser sintetizado na ementa do julgado abaixo transcrita:
RECURSO ESPECIAL. PROCESSAMENTO SOB O RITO DO ART. 543-C DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. EXECUÇÃO PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME. ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI N. 13.964/2019 (PACOTE ANTICRIME). CRIME HEDIONDO COM RESULTADO MORTE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO DOS LAPSOS RELATIVOS AOS REINCIDENTES GENÉRICOS. LACUNA LEGAL. INTEGRAÇÃO DA NORMA. NORMA REVOGADA MAIS BENÉFICA POR NÃO AFASTAR O LIVRAMENTO CONDICIONAL DA PENA. 1. Recurso Especial processado sob o regime previsto no art. 543-C, §2º, do CPC, c/c o art. 3º do CPP, e na Resolução n. 8/2008 do STJ. 2. O STJ firmou jurisprudência, segundo a qual, é "possível aplicação retroativa do art. 112, VI, 'a', da LEP aos condenados por crime hediondo ou equiparado com resultado morte que sejam primários ou reincidentes não específicos, sem que tal retroação implique em imposição concomitante de sanção mais gravosa ao apenado, tendo em vista que, em uma interpretação sistemática, a vedação de concessão de livramento condicional prevista na parte final do dispositivo somente atingiria o período previsto para a progressão de regime, não impedindo posterior pleito com fundamento no art. 83, V, do CP" (AgRg nos Edcl no HC n. 689.031/SC, relator o Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 19/11/2021). 3. Não prevalece o argumento recursal, segundo o qual, ao adotar retroativamente a fração de progressão de regime prisional mais benéfica, necessariamente, teria que também ser adotada a vedação de livramento condicional da pena prevista na última parte da alínea a, inc. VI, art. 112, da Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal), haja vista a impossibilidade de combinação de normas penais, pois ambas as turmas da Terceira Seção do STJ entendem que não há combinação de normas. 4. Recurso especial representativo da controvérsia improvido, a fim de, no caso concreto, manter a decisão do Juiz da Execução Penal que aplicou retroativamente a fração de 50% (cinquenta por cento) para a progressão de regime prisional, sem prejuízo da eventual concessão de livramento condicional da pena; e, assentar, sob o rito do art. 543-C do CPC a seguinte TESE: "É válida a aplicação retroativa do percentual de 50% (cinquenta por cento), para fins de progressão de regime, a condenado por crime hediondo, com resultado morte, que seja reincidente genérico, nos moldes da alteração legal promovida pela Lei n. 13.964/2019 no art. 112, inc. VI, alínea a, da Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal), bem como a posterior concessão do livramento condicional, podendo ser formulado posteriormente com base no art. 83, inc. V, do Código Penal, o que não configura combinação de leis na aplicação retroativa de norma penal material mais benéfica".[22]
Em que pese o voto do relator ter centrado sua motivação no fato de que a vedação da Lei nº 13.964/2019 referir-se apenas ao período previsto para a progressão de regime, não se pode olvidar de todos os demais fundamentos que precedem essa conclusão e que foram detalhados pelo Ministro Reynado Soares da Fonseca no Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no Habeas Corpus n. 689.031/SC.
Acrescente-se, por fim, que tendo o Recurso Especial 2.012.101/MG sido julgado sob a sistemática de recurso especial, tem caráter de precedente vinculante para os tribunais de piso, nos termos do art. 1.039 do Código de Processo Civil[23].
4.Da violação ao princípio da reserva legal e da separação de poderes: o posicionamento do STF
O Supremo Tribunal Federal, em junho de 2024, posteriormente a publicação do Tema 1196 pelo Superior Tribunal de Justiça, proferiu decisão no Agravo Interno em Recurso Extraordinário 1.464.496, na qual entendeu que a retroatividade do art. 112, VI, alínea “a” da Lei de Execução Penal apenas no que tange à progressão de regime, mantido o direito ao livramento condicional, seria combinação de leis. É o que se observa da ementa abaixo transcrita:
AGRAVO INTERNO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PENAL E PROCESSUAL PENAL. RETROATIVIDADE PARCIAL DO ARTIGO 112, VI, A, DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL, INCLUÍDO PELA LEI 13.964/2019 (PACOTE ANTICRIME). COMBINAÇÃO DE LEIS. INADMISSIBILIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Nos termos do artigo 5º, XL, da Constituição Federal, “A lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”. 2. A justificativa para a irretroatividade da lei penal reside na proteção dos indivíduos contra o superveniente aumento no rigor do tratamento penal de um fato, excetuados os casos de lei penal mais benigna ao status libertatis dos que se encontram sob persecução penal, quando deve retroagir. 3. In casu, a controvérsia jurídica sob exame diz respeito à retroatividade das regras do novo regime da progressão de regime, estabelecido pela Lei n. 13.964/2019, conhecida como “Pacote Anticrime”. Consiste em definir se é possível manter a retroatividade da Lei n. 13.964/2019 no que tange à fração para progressão de regime prevista no art. 112, VI, a, da LEP, mas afastando as vedações ao livramento condicional e às saídas temporárias; ou não permitir a retroatividade, tendo em vista que tal possibilidade seria uma combinação de partes de duas leis diferentes para ser formar uma terceira, mais benéfica ao apenado. 4. Nesta Corte, há precedentes da lavra de Ministros das duas Turmas, no sentido da necessidade de aplicação integral de apenas uma das leis, vedada a combinação de partes delas. No RE 1.394.070, Rel. Min. Nunes Marques, DJe de 04/05/2023; e no RE 1.392.782, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 09/08/2022, concluiu-se no sentido de “determinar novo julgamento para que seja analisado, no caso concreto, como disposto no inc. XL do art. 5º da Constituição da República e sem criação de terceira lei, qual a interpretação mais benéfica ao recorrido: a aplicação integral das normas anteriores à Lei n. 13.964/2019 ou a aplicação integral das normas posteriores à Lei n. 13.964/2019”. 5. Este entendimento encontra-se alinhado com a longeva jurisprudência desta Corte em tema de combinação de leis penais. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 600.817/MS, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, fixou, em sede de repercussão geral, a compreensão no sentido de que “Não é possível a conjugação de partes mais benéficas das referidas normas, para criar-se uma terceira lei, sob pena de violação aos princípios da legalidade e da separação de Poderes” 6. Trata-se de confirmação da compreensão história desta Corte, pela lavra do Ministro Paulo Brossard: “os princípios da ultra e da retroatividade da lex mitior, tal como formulados, não autorizam a combinação de duas normas para se extrair uma terceira que mais beneficie o réu. Penso que o desígnio das normas postas foi o de reservar a aplicação da lex mitior na sua integridade, e não o de favorecer os agentes dos crimes praticados durante a vigência das normas que se conflitam no tempo, com uma terceira norma não legislada que traga benefícios que excedam os previstos nas outras duas consideradas de per si” (HC 68.416/DF, Segunda Turma, DJ de 30/10/1992). 7. Verifica-se, portanto, que a lex tertia decorrente da conjugação das disposições trazidas no artigo 112, VI, a, da Lei de Execução Penal, com redação dada pela Lei n. 13.964/2019, com o disposto no artigo 2º, § 2º, da Lei 8.072/1990 (revogado), viola os princípios constitucionais da legalidade e da separação dos poderes. 8. Nego provimento ao agravo interno.[24]
No inteiro teor, o ministro Fux alinhou-se à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal refletida no já citado Recurso Extraordinário 600.817/MS (que tratou da alteração da Lei de Drogas), esclarecendo que a combinação de leis violaria os princípios da legalidade e da separação de poderes. Nesse contexto, determinou que fosse avaliado o caso concreto para aferição sobre qual seria a lei mais benéfica quando aplicada em sua integralidade: se a progressão de regime após cumprido 60% da pena com direito ao livramento condicional ou se a progressão de regime observando o percentual de 50% da pena sem direito ao livramento, ipsis litteris:
Não é possível a conjugação de partes mais benéficas das referidas normas, para criar-se uma terceira lei, sob pena de violação aos princípios da legalidade e da separação de Poderes com uma terceira norma não legislada que traga benefícios que excedam os previstos nas outras duas consideradas de per si”. Nesse contexto, determinou que fosse avaliado “o caso concreto, aplicando apenas uma das leis, nomeadamente a que se revelar mais favorável ao recorrido, ouvida sua defesa.[25]
No mesmo sentido, o ministro Alexandre de Moraes afirmou em voto vista que “não é possível "corrigir" o legislador para afastar essa restrição por meio da combinação das partes mais benéficas da antiga e da nova legislação, sob pena de afronta ao princípio da legalidade”[26].
Não abordaram, contudo, de maneira detalhada, os fundamentos adotados pelo Superior Tribunal de Justiça para intepretação de que a vedação ao livramento condicional seria apenas durante o período em que se está cumprindo a fração necessária à progressão de regime.
Além disso, a decisão proferida no Agravo Regimental em Recurso Extraordinário em epígrafe, à princípio, não teria eficácia de precedente vinculante, na medida em que não foi submetida ao rito de repercussão geral e também em razão de sua conclusão demandar uma análise do caso concreto para aferição da regra mais benéfica. Nesse contexto, sua aplicação seria apenas interpartes, diferentemente do precedente qualificado do Superior Tribunal de Justiça julgado pelo rito de repetitivo.
Posteriormente, em setembro de 2024, o Supremo Tribunal Federal resolveu reconhecer a repercussão geral da questão, a qual foi sintetizada sob o seguinte título:
Tema 1319: A possibilidade de aplicação retroativa do art. 112, VI, a, da Lei de Execuções Penais (redação da Lei nº 13.964/2019), para garantir a progressão de regime de condenado por crime hediondo, mas sem a incidência da vedação ao livramento condicional e à saída temporária.[27]
Para melhor compreensão da questão, transcreve-se a ementa do Recurso Extraordinário no qual foi reconhecida a repercussão geral:
Ementa: Direito constitucional e penal. Recurso extraordinário. Retroatividade de lei. Pacote anticrime. Combinação de leis penais. repercussão Geral. I. Caso em exame 1. Recurso extraordinário do Ministério Público contra acórdão que determinou a aplicação retroativa do art. 112, VI, a, da Lei de Execuções Penais (redação da Lei nº 13.964/2019), para garantir a progressão de regime de condenado por crime hediondo, mas sem a incidência da vedação ao livramento condicional e à saída temporária, prevista no mesmo ato normativo. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se é possível aplicar retroativamente apenas uma parte de lei penal sobre progressão de pena, decotando-se a vedação ao livramento condicional e à saída temporária prevista na mesma lei, porque mais gravosa ao apenado por crime hediondo. III. Razões de decidir 3. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 169/RG (RE 600.817), sobre a aplicação de partes mais benéficas da Lei nº 11.343/2006 para fatos anteriores a sua vigência, reconheceu a repercussão geral de controvérsia sobre a combinação de partes de leis penais. 4. Constitui questão constitucional relevante a divergência sobre a aplicação retroativa de progressão de regime prevista no art. 112, VI, a, da LEP, sem a incidência de parte da lei nova relacionada à vedação para concessão de livramento condicional e saída temporária. Grande volume de ações a respeito. IV. Dispositivo 5. Repercussão geral reconhecida para a seguinte questão constitucional: saber se é possível aplicar retroativamente apenas a parte mais benéfica de lei penal sobre progressão de pena (art. 112, VI, a, da LEP), decotando-se a vedação ao livramento condicional e à saída temporária prevista na mesma lei, porque mais gravosa ao apenado por crime hediondo.[28]
Em síntese, no voto que ensejou a repercussão geral, o ministro Fux cita que a questão da combinação de leis já foi abordada no âmbito do Tema de Repercussão Geral 169 que tratava da aplicação do crime de tráfico de drogas, além de reconhecer a existência de interpretações diversas quanto a aplicação do art. 112, VI, “a” da Lei de Execuções Penais, citando que:
Especificamente para o art. 112, VI, a, da Lei de Execuções Penais (redação da Lei nº 13.964/2019), sobre a progressão de regime de condenado por crime hediondo, mas sem a incidência da vedação ao livramento condicional e à saída temporária, há decisões do STF que afirmam a violação aos arts. 2º, 5º, II e XL, da Constituição. Sobre o tema: RE 1.392.782, Rel. Min Cármen Lúcia, j. em 08.08.2022; RE 1.394.070, Rel. Min. Nunes Marques, j. em 18.04.2023; RE 1.495.890, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. em 05.07.2024; e RE 1.464.496, Rel. Min. Luiz Fux, j. 05.06.2024.
Por outro lado, também há decisões que não conheceram dos recursos, mantendo, em consequência, os acórdãos do Superior Tribunal de Justiça que determinam a incidência apenas da parcela mais benéfica sobre a progressão de regime. Sobre o tema: RE 1.403.957, Rel. Min. Dias Tofoli, j. em 17.11.2022; e ARE 1.456.075, Rel. Min. Edson Fachin, j. em 14.11.2023.[29]
Diante disso, face a necessidade de uniformização da jurisprudência pátria, importante aguardar a decisão da Repercussão Geral, eis que, apesar de não estar literal e expressamente prevista no art. 927 do Código de Processo Civil como sendo precedente vinculante[30], tem eficácia erga omnes reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal[31].
5.Conclusão
A alteração promovida pela Lei nº 13.964/2019 modificou o artigo 112 da Lei de Execuções Penais ao estabelecer novos critérios de progressão de regime, fazendo diferenciações entre primários e reincidentes específicos, bem como entre condenados por crimes comuns e crimes hediondos.
Especificamente em relação aos condenados por crime hediondo com resultado morte que são reincidentes genéricos e que praticaram o crime em período anterior a 23/01/2020, tem-se que há uma divergência sobre qual seria a regra mais adequada a ser aplicada.
Isso porque há quem entenda, como se observa do voto do ministro Fux Agravo Regimental em Recurso Extraordinário 1.464.496, que eventual retroatividade da previsão do art. 112, VI, “a” da Lei nº 13.964/2019, deveria ser integral, sob pena de ofensa aos princípios da separação de poderes (art. 2º da Constituição Federal) e da reserva legal (art. 5º, XXXIX da Constituição Federal). Desse modo, seria necessário avaliar o caso concreto para aferir se o mais benéfico seria aplicar o percentual de 50% para progressão de regime previsto na Lei nº 13.964/2019, cumulado com a vedação ao livramento condicional ou, se o melhor para o apenado seria a aplicação da regra revogada do art. 2º, §2º da Lei nº 8.072/1990, que previa a progressão após o cumprimento de 60% da pena, mas sem qualquer vedação ao livramento condicional.
De maneira distinta, o Superior Tribunal de Justiça sedimentou jurisprudência, em sede de recurso repetitivos (Tema 1196), no sentido de que “a vedação de concessão de livramento condicional somente atingiria o período previsto para a progressão de regime”, sustentando, a partir dessa interpretação sistemática, que não haveria qualquer tipo de combinação de leis no caso.
Merece destaque o voto do Ministro Reynado Soares da Fonseca no Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no Habeas Corpus n. 689.031/SC, no qual afasta a alegação de combinação de leis, destacando que a progressão de regime e o livramento condicional são institutos distintos e independentes, sendo possível aplicar critérios mais favoráveis de progressão sem implicar na automática vedação ao livramento condicional. Sobre o tema, é forte o argumento de que a Lei nº 13.694/2019 teve oportunidade de alterar o art. 83 do Código Penal, mas se limitou a incluir requisito relacionado as faltas graves, sem inserir qualquer vedação nova no inciso V, de modo que o livramento somente seria proibido para os reincidentes específicos em crimes hediondos ou equiparados.
É importante ainda reiterar que, conforme explicita Juarez Cirino, o próprio Código Penal prevê que deve ser aplicada a lei nova “de qualquer modo favorecer o agente”, não contendo qualquer exceção. Registre-se que o legislador, quando quis, previu expressamente limitação à retroatividade benéfica, como é o caso da previsão do art. 2º, § 2° do Código Penal Militar, segundo a qual “Para se reconhecer qual a mais favorável, a lei posterior e a anterior devem ser consideradas separadamente, cada qual no conjunto de suas normas aplicáveis ao fato”. Não cabe, porém, analogia in malam partem para admitir a aplicação do citado dispositivo as infrações que não sejam militares.
Além disso, como expõe Cezar Bittencourt e José Frederico Marques, a criação de uma lex tertia é uma forma de interpretação integrativa, como ocorre no caso, por exemplo, da lei penal em branco, sem que isso implique em invasão de competências legislativas. Em verdade, é uma forma de fazer com que a norma penal se amolde ao caso concreto, assegurando a individualização da pena (art. 5º, XLVI da Constituição Federal) e o respeito à literalidade da garantia constitucional da retroatividade da lei mais benéfica (art. 5º, XL da Constituição Federal).
Acrescente-se que o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça parece também mais adequado à realidade brasileira, pois considera as dificuldades enfrentadas pela população carcerária no cumprimento de requisitos subjetivos para o livramento condicional, além de estimular a reinserção social do apenado, na medida que adota os percentuais mais brandos para progressão de regime.
A vedação genérica ao livramento condicional, pelo simples fato de ter cometido crime hediondo com resultado morte, frise-se, além de desconsiderar as peculiaridades dos agentes, violando a individualização da pena, fere a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III da Constituição Federal) pois aumenta o tempo de encarceramento em um sistema prisional que reconhecidamente vive em um Estado de Coisas Inconstitucional.
Dessa forma, espera-se que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o mérito da questão em sede de repercussão geral 1319, considere os argumentos apresentados pelo Superior Tribunal de Justiça e promova uma análise criteriosa que contemple outros princípios constitucionais, como a individualização da pena e a proteção à dignidade humana, não se limitando a uma análise formalista dos princípios da separação de poderes e da reserva legal.
Referências
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BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969. Código Penal Militar. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del1001.htm. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Lei de Execução Penal. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990. Dispõe sobre os crimes hediondos. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8072.htm. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Lei nº 11.464, de 28 de março de 2007. Altera a Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990, dispondo sobre a progressão de regime de cumprimento de pena para os crimes hediondos ou equiparados, e dá outras providências. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2007/Lei/L11464.htm. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Brasília, DF: Presidência da República, 2015. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019. Aperfeiçoa a legislação penal e processual penal. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/l13964.htm. Acesso em: dez. 2024.
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BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no Habeas Corpus n. 689.031/SC, Relator: Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 16 nov. 2021. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202102706168&dt_publicacao=19/11/2021. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.910.240/MG, Relator: Ministro Rogério Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 26 maio 2021. Disponível em: https://www.stj.jus.br. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 2.012.101/MG, Relator: Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Terceira Seção, julgado em 22 maio 2024. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202202051073&dt_publicacao=27/05/2024. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 441: "A falta grave não interrompe o prazo para obtenção de livramento condicional".
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 501: "É cabível a aplicação retroativa da Lei n. 11.343/2006, desde que o resultado da incidência das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da aplicação da Lei n. 6.368/1976, sendo vedada a combinação de leis".
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 534: "A prática de falta grave interrompe a contagem do prazo para a progressão de regime de cumprimento de pena, o qual se reinicia a partir do cometimento dessa infração".
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Tema 1196. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/repetitivos/temas_repetitivos/pesquisa.jsp?novaConsulta=true&tipo_pesquisa=T&sg_classe=REsp&num_processo_classe=2012101. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n. 1.464.496, Relator: Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 5 jun. 2024. Disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=777719743. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n. 1.233.430 AgR, Relator: André Mendonça, Segunda Turma, julgado em 26 fev. 2024. Disponível em: https://www.stf.jus.br. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 82.959, Relator: Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 23 fev. 2006. Disponível em: https://www.stf.jus.br. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 600817, Relator: Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, julgado em 7 nov. 2013. Disponível em: https://www.stf.jus.br. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 1.327.963 RG, Relator: Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 16 set. 2021. Disponível em: https://www.stf.jus.br. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 1.464.013 RG, Relator: Ministro Presidente, Tribunal Pleno, julgado em 6 set. 2024. Disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=780132238. Acesso em: dez. 2024.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula Vinculante 26: "Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei n. 8.072/1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche os requisitos objetivos e subjetivos".
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Tema 1319. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/tema.asp?num=1319. Acesso em: dez. 2024.
MASSON, Cleber. Direito Penal: Parte Geral (arts. 1º a 120). São Paulo: Editora Método, 2024. Ebook.
SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito Penal: Parte Geral. Curitiba: ICPC; Lumen Juris, 2006.
[1] MASSON. Cleber. Direito Penal: Parte Geral (arts. 1º a 120). São Paulo: Editora Método. 2024. Ebook.
[2] SANTOS, Juares Cirino dos. Direito Penal: Parte Geral. ICPC; Lumen Juris: Curitiba. 2006. p. 50.
[3] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral 1. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 211.
[4] A citada súmula foi publicada em 28.10.2013, tendo como precedente o Recurso Especial n. 1.117.068/PR, de relatoria da Ministra Laurita Vaz, julgado em 26/10/2011, representativo do Tema 191, que tinha redação idêntica.
[5] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 600817, Relator: Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, julgado em 7 nov. 2013. Disponível em: em: https://www.stf.jus.br. Acesso em: dez. 2024.
[6] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus 82.959, Relator: Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 23 fev. 2006. Disponível em: em: https://www.stf.jus.br. Acesso em: dez. 2024. Registre-se que o referido julgamento foi utilizado como precedente para edição da Súmula Vinculante 26, publicada em 23/12/2009, segundo a qual “Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico.”
[7] Registre-se que, a Lei 14.994/2024 acrescentou o inciso VI-A para prever uma progressão de regime diferenciada no caso da prática feminicídio por pessoas primárias, estabelecendo o percentual de 55%.
[8] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo em Recurso Extraordinário 1.327.963 RG, Relator: Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 16 set. 2021. Disponível em: em: https://www.stf.jus.br. Acesso em: dez. 2024.
[9] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1.910.240/MG, Rel. Ministro Rogério Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 26 maio 2021. Disponível em: em: https://www.stj.jus.br. Acesso em: dez. 2024.
[10] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no Habeas Corpus n. 689.031/SC, Relator: Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 16 nov. 2021. Inteiro teor disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202102706168&dt_publicacao=19/11/2021. Acesso em: dez. 2024.
[11] Antes do Pacote Anticrime, a alínea III do art. 83 do Código Penal, inserida pela Lei nº 7.209/1984, previa a necessidade de comprovação de “comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto”. A partir da Lei nº 13.964/2019, foi incluída também a necessidade de não ter sido cometida falta grave nos últimos 12 meses. Além disso, a alínea IV ainda exige a reparação do dano causado pela infração, salvo impossibilidade de fazê-lo.
[12] Conforme parágrafo único do art. 83 do Código Penal: “Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinqüir”.
[13] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no Habeas Corpus n. 689.031/SC, Relator: Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 16 nov. 2021. Inteiro teor disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202102706168&dt_publicacao=19/11/2021. Acesso em: dez. 2024.
[14] Conforme redação dada pela Lei 8.072/1990, a única vedação ao instituto seria para reincidentes específicos: “V - cumprido mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza”. Registre-se que, posteriormente, a Lei 13.344/2016 estabeleceu que o percentual de dois terços também seria aplicável ao tráfico de pessoas.
[15] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no Habeas Corpus n. 689.031/SC, Relator: Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 16 nov. 2021. Inteiro teor disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202102706168&dt_publicacao=19/11/2021. Acesso em: dez. 2024.
[16] Ibidem.
[17] A Súmula 534 do Superior Tribunal de Justiça dispôs que: "A prática de falta grave interrompe a contagem do prazo para a progressão de regime de cumprimento de pena, o qual se reinicia a partir do cometimento dessa infração”. Posteriormente, o Pacote Anticrime incluiu o parágrafo 6º ao art. 112 da Lei de Execução Penal, o qual dispõe que: “O cometimento de falta grave durante a execução da pena privativa de liberdade interrompe o prazo para a obtenção da progressão no regime de cumprimento da pena, caso em que o reinício da contagem do requisito objetivo terá como base a pena remanescente.”
[18] A Súmula 441 do Superior Tribunal de Justiça enuncia que: "A falta grave não interrompe o prazo para obtenção de livramento condicional."
[19] A título de exemplo, no mesmo sentido, também são as decisões BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Habeas Corpus n. 830.865/MT, Relator: Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 30 nov. 2023. Disponível em: https://www.stj.jus.br. Acesso em: dez. 2024. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Habeas Corpus n. 753.899/SC, Relatora: Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 11 mar. 2024. Disponível em: https://www.stj.jus.br. Acesso em: dez. 2024.
[20] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Tema 1196. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/repetitivos/temas_repetitivos/pesquisa.jsp?novaConsulta=true&tipo_pesquisa=T&sg_classe=REsp&num_processo_classe=2012101. Acesso em dez. 2024.
[21] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 2.012.101/MG, Rel. Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Terceira Seção, julgado em 22 maio 2024. Inteiro teor disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202202051073&dt_publicacao=27/05/2024. Acesso em: dez. 2024.
[22] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 2.012.101/MG, Rel. Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Terceira Seção, julgado em 22 maio 2024. Disponível em: em: https://www.stj.jus.br. Acesso em: dez. 2024.
[23] Conforme art. 1.039 do Código de Processo Civil “Decididos os recursos afetados, os órgãos colegiados declararão prejudicados os demais recursos versando sobre idêntica controvérsia ou os decidirão aplicando a tese firmada”.
[24] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 1.464.496, Relator: Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 5 jun. 2024. Disponível em: em: https://www.stf.jus.br. Acesso em: dez. 2024.
[25] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 1.464.496, Relator: Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 5 jun. 2024. Inteiro teor disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=777719743. Acesso em: dez. 2024.
[26] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 1.464.496, Relator: Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 5 jun. 2024. Inteiro teor disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=777719743. Acesso em: dez. 2024.
[27] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Tema 1319. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/tema.asp?num=1319. Acesso em dez. 2024.
[28] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 1.464.013 RG, Relator: Ministro Presidente, Tribunal Pleno, julgado em 6 set. 2024. Disponível em: https://www.stf.jus.br. Acesso em: dez. 2024.
[29] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 1.464.013 RG, Relator: Ministro Presidente, Tribunal Pleno, julgado em 6 set. 2024. Inteiro teor disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=780132238. Acesso em: dez. 2024.
[30] O art. 927 do Código de Processo Civil prevê que: “Os juízes e os tribunais observarão: I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; II - os enunciados de súmula vinculante; III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados”.
[31] “As decisões proferidas pelo Excelso STF com repercussão geral possuem efeito vinculante e eficácia erga omnes, sendo dever de todos os órgãos do Poder Judiciário aplicar a tese firmada pelo Plenário do Excelso STF, sob pena de formação de coisa julgada inconstitucional” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental em Recurso Extraordinário n. 1.233.430, Relator: André Mendonça, Segunda Turma, julgado em 26 fev. 2024. Disponível em: https://www.stf.jus.br. Acesso em: dez. 2024.)
Advogada. Mestre em Direito e Administração Pública pela Universidade Federal de Minas Gerais.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CRUZ, Maria Gabriela Freitas. A (in)existência de combinação de leis para definição de critérios para progressão de regime e livramento condicional sob a ótica do Pacote Anticrime: considerações sobre a divergência entre STF e STJ Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 jan 2025, 04:40. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/67629/a-in-existncia-de-combinao-de-leis-para-definio-de-critrios-para-progresso-de-regime-e-livramento-condicional-sob-a-tica-do-pacote-anticrime-consideraes-sobre-a-divergncia-entre-stf-e-stj. Acesso em: 22 jan 2025.
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