Direito à saúde e amianto - 2
Em julgamento desprovido de eficácia vinculante por não alcançar o quórum exigido pelo art. 97 (1) da Constituição Federal (CF) em razão de impedimento dos ministros Roberto Barroso e Dias Toffoli, o Plenário, em conclusão, não pronunciou juízo de constitucionalidade ou inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 9.055/1995 (2), que disciplina a extração, industrialização, utilização, comercialização e transporte do asbesto/amianto crisotila e dos produtos que o contenham. (vide Informativo 873).
Os ministros Rosa Weber (relatora), Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e Cármen Lúcia (presidente) julgaram procedente o pedido e declaram a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 9.055/1995.
A relatora consignou que, diante das determinações constitucionais direcionadas ao legislador, a tolerância ao uso do amianto crisotila, tal como positivada no art. 2º da Lei 9.055/1995, não protege adequada e suficientemente os direitos fundamentais à saúde e ao meio ambiente, tampouco se alinha aos compromissos internacionais de caráter supralegal assumidos pelo Brasil, sendo caso de inconstitucionalidade por proteção insuficiente.
O ministro Edson Fachin reconheceu a existência de omissão caracterizada por proteção insuficiente à saúde e ao meio ambiente, precisamente, porque, 22 anos depois da entrada em vigor da norma atacada, o conjunto das circunstâncias técnico-científicas precisa ser revisitado.
O ministro Ricardo Lewandowski afirmou não haver dúvida, na comunidade científica mundial e brasileira, quanto ao potencial cancerígeno de todas as variedades do amianto, inclusive do crisotila. Para ele, ainda que houvesse alguma dúvida com relação à lesividade do amianto crisotila para a saúde humana, é o caso de se aplicar o princípio da precaução, segundo o qual, para que o ambiente seja protegido, serão aplicadas pelos Estados, de acordo com as suas capacidades, medidas preventivas. Onde existam ameaças de riscos sérios ou irreversíveis, não será utilizada a falta de certeza científica total como razão para o adiamento de medidas eficazes, em termos de custo, para evitar a degradação ambiental.
O ministro Celso de Mello ressaltou que a legislação federal ora em exame mostra-se incompatível com valores básicos e direitos fundamentais consagrados pela ordem constitucional, pois não dispensa tutela adequada e proteção suficiente ao direito à saúde, a revelar situação configuradora de inconstitucionalidade por omissão, resultante da falta ou da realização incompleta e imperfeita de um programa social que deveria ter sido efetivamente assumido e implementado pelo Estado. Segundo o ministro, o conteúdo material do preceito normativo em causa também vulnera a cláusula inscrita no art. 225 da Constituição da República, que consagra o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
A ministra Cármen Lúcia assentou a importância do princípio da precaução para a manutenção do meio ambiente equilibrado.
Já os ministros Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Gilmar Mendes e Marco Aurélio reputaram improcedente o pleito e declaram constitucional a norma impugnada
O ministro Alexandre de Moraes salientou que, ao autorizar somente a variedade amianto crisotila, a norma visou proteger a saúde e o meio ambiente equilibrado. O caráter protetivo da legislação ficou demonstrado na medida em que veda expressamente outras formas de amianto. Ademais, ao permitir a exploração do amianto crisotila, a norma impõe inúmeras restrições, além de observância contínua e permanente da evolução da legislação sobre segurança, higiene, medicina do trabalho, acordos e convenções internacionais e dos acordos entre sindicatos de empregados e empregadores.
O ministro Luiz Fux enfatizou que há uma profunda controvérsia na comunidade científica em relação ao amianto, o que recomenda a autorrestrição do Poder Judiciário.
O ministro Gilmar Mendes ponderou que esse é um caso limítrofe, em termos de jurisdição constitucional. Para ele, talvez se devesse adotar um juízo sensório na constatação de uma possível caminhada rumo à inconstitucionalização. Seria o caso de recomendar que o Congresso reavaliasse o sistema adotado, o que poderia levar até, eventualmente, à supressão da exploração. Entretanto, sublinhou que a hipótese não seria de declaração de inconstitucionalidade de caráter cassatório.
O ministro Marco Aurélio afirmou que, ao declarar a inconstitucionalidade do dispositivo legal, o Poder Judiciário substituiu o Congresso Nacional, em ofensa a independência e a harmonia entre os Poderes.
(1) Constituição Federal/1988: “Art. 97 Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”.
(2) Lei 9055/1995: “Art. 2º O asbesto/amianto da variedade crisotila (asbesto branco), do grupo dos minerais das serpentinas, e as demais fibras, naturais e artificiais de qualquer origem, utilizadas para o mesmo fim, serão extraídas, industrializadas, utilizadas e comercializadas em consonância com as disposições desta Lei. Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, consideram-se fibras naturais e artificiais as comprovadamente nocivas à saúde humana”.
ADI 4066/DF, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 23 e 24.8.2017. (ADI-4066)
1ª Parte:
2ª Parte:
3ª Parte:
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Decisão publicada no Informativo 874 do STF - 2017
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