É de se ressaltar que nos dias atuais, os jovens de 16 anos de idade – adolescentes – possuem plenamente capacidade de entendimento psíquico e vontade para agir – ação ou omissão –, no sentido do conhecimento sobre a licitude ou a ilicitude de sua conduta anti-social.
Não é mais possível, hoje, a tentativa para justificar o injustificável ou defender o inaceitável, posto que diariamente ocorrem infrações ou delitos graves e bárbaros cometidos por adolescentes de 16 anos, acompanhados e de comum acordo com maiores de 18 anos de idade.
Diante do exposto, apresentamos algumas propostas legislativas, talvez inéditas, a questão não pode e não deve ser tratada com uma única proposta, ou seja, de somente reduzir a idade de 18 para 16 anos, para se definir simplesmente a responsabilidade penal.
Se faz necessário um conjunto amplo de medidas legais; a saber: s.m.j.
1) Emenda Constitucional.
Incluir parágrafo único no art. 228 da Constituição federal com a seguinte redação:
“Os maiores de 16 anos e menores de 18 anos de idade, se reincidentes ou não, que praticarem atos definidos como crime no código penal ou nas leis penais extravagantes, poderão ser processados e julgados pelo juízo criminal com tratamento de rito especial, conforme definido em lei”.
2) Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90).
Discricionariedade e livre convencimento do juiz da Vara da Infância e da Juventude.
Incluir, por Lei Federal, parágrafo único, no art.171 do ECA, no com a seguinte redação:
“Quando houver reiteração ou não, de conduta infracional, praticada com violência ou grave ameaça à pessoa e tráfico de entorpecentes, por maior de 16 anos e menor de 18 anos de idade, poderá o juiz da Vara da Infância e da Juventude, ouvido o Ministério Público, segundo o princípio e critério do livre convencimento, declinar de sua competência e remeter o processo ao juízo criminal, a fim de ser julgado o ato sob rito especial, conforme definido em lei”
3) Rito processual penal especial (Lei Federal).
Aprovar lei processual penal especial para processamento e julgamento de autores de delitos com idade entre 16 e 18 anos.
Rito célere composto de todas as garantias judiciais fundamentais individuais da cidadania, nos termos da Constituição federal e dos Direitos Humanos, com a participação obrigatória, em todos os atos judiciais, de defensor, de representante do Ministério Público, do pai ou responsável do adolescente, para assisti-lo, podendo inclusive ser nomeado pelo juízo, tutor ou curador, sem prejuízo também do acompanhamento de representante do Conselho Municipal da Infância e Juventude, que poderá ser intimado para comparecer e prestar depoimento em juízo, sempre que necessário, sobre a vida social-educacional e pregressa do(a) adolescente processado(a).
O novo rito processual penal especial para julgamento de crimes praticados por maiores de 16 anos e menores de 18 anos de idade, poderia inclusive (?), neste novo sistema democrático e moderno, incluir todos os jovens-adultos, aqueles com idade até 21 anos, se primários, afastando-os desta forma dos contatos com criminosos reincidentes com idade mais avançada, e também de todos os outros males do cárcere produzido pelo processo negativo de prisionalização, permitindo assim a maior possibilidade de reintegração e de readaptação social, nos termos do art. 1º da LEP. Teríamos, nessa proposta, um sistema moderno e ainda mais humanitário (inédito na América Latina).
4) Revogar a Lei nº 2.252/1954, que dispõe sobre a corrupção de menores.
Incluir dispositivo, por Lei Federal, parágrafo ou inciso, no artigo 29 ou 59, do Código Penal – Parte Geral (Lei nº 7.209/84), no que se refere a co-autoria e/ou a aplicação da pena; a seguinte redação:
“Maior de 18 anos de idade que praticar qualquer espécie de delito, seja na forma tentada ou consumada, fazendo-se acompanhar de menor de 18 anos de idade, qual for o grau de participação ou co-autoria do menor, a pena imposta, ao maior, será obrigatoriamente duplicada”.
Justifica-se a necessidade de revogação da Lei nº 2.252/1954, vez que a jurisprudência pátria definiu a sua inaplicabilidade quanto não existir prova concreta de ter imputável corrompido menor de 18 anos de idade. Apesar do Ministério Público estar, sempre, denunciado, a tendência é a absolvição daqueles que se utilizam reiteradamente de menores para praticarem crimes graves – homicídios, assaltos, estupros e tráfico de substâncias tóxicas -, conforme as decisões de nossos Tribunais:
Para a configuração do crime de corrupção de menor definido na lei 2252/54 não basta a prática do delito em co-autoria com o menor. É mister, mais, que se impute e se demonstre, no curso da instrução, a atuação do acusado sobre o imaturo, de modo a lhe aluir a resistência moral ou fazer prosperar uma corrupção em curso.” (TJSP - Ap. 74.373-3 - 3ª C. -j. 16.4.90 - Rel. Des. Carlos Bueno, g.n. ).
Tipo da Ação: APELACAO CRIMINAL
Número do Processo: 1999.050.00123
Data de Registro : 07/10/1999
Órgão Julgador: QUARTA CAMARA CRIMINAL
Votação: JDS.DES.MARCUS QUARESMA FERRAZ
Julgado em 07/06/2001
Ementa: ROUBO QUALIFICADO - CONCURSO DE PESSOAS (ADOLESCENTES INFRATORES). CRIME DE CORRUPCAO DE MENOR DEFINIDO NO ART. 1º . DA LEI 2.252/54. INOCORRENCIA . Não havendo nos autos provas segura de que os adolescentes foram corrompidos e de que eles já não estivessem com suas personalidades deturpadas. Impossível é o reconhecimento da prática do referido ilícito.
5) Quantum da pena aplicada aos maiores de 16 anos e menores de 18 anos de idade (ou menores de 21 anos – primários ?) .
Possibilidade de redução a critério do magistrado (outra alternativa)
Incluir dispositivo no Código Penal (Lei Federal)
A pena do crime praticado por maior de 16 anos e menor de 18 anos (ou 21 anos ?) de idade, obviamente que será sempre a mesma definida no Código Penal e nas Leis Penais Extravagantes; porém, podendo o juiz criminal sentenciante, reduzir de 1/3 a ½, como forma de atenuante especial, em consideração a idade, grau de participação, danos à vítima e primariedade.
6) Local de internamento de adolescentes.
O internamento do jovem-infrator de 16 anos e menores de 18 anos de idade, continua sendo em estabelecimento reeducador, diferenciado dos estabelecimentos prisionais. Prevendo-se, ainda, taxativamente, por Lei Federal responsabilidade penal, civil e administrativa, para autoridades, servidores ou agentes públicos que permitirem, autorizarem ou se omitirem quanto a internação de menor de 18 anos de idade, em estabelecimento penal destinado aos maiores de 18 anos.
7) Ministério Público.
Nas Promotorias de Justiça da Infância e da Juventude deverá existir equipe inter e multidisciplinar para atender menores infratores e seus familiares, composta por profissionais competentes e especializados, como: assessores jurídicos, psicólogos, pedagogos e assistentes sociais, para o melhor desempenho das atribuições ministerias, e seus agentes, junto as Varas da Infância e Juventude.
8) Serviço Militar ( ? ).
Rever o artigo 143 da Constituição Federal, incluir § 3º para definir com serviço militar obrigatório para os jovens de 16 anos de idade, por tempo de 2 anos, especialmente para aqueles que não estiverem matriculados em escolas públicas ou privadas ou ainda para aqueles que não freqüentem as aulas diariamente.
Considerações finas justificadoras das propostas
Têm-se como necessário esclarecer que cláusula pétrea significa dispositivo legal que deve ser cumprido obrigatoriamente, aquele que não permite renúncia ou inaplicabilidade, por ser petroso ou por estar petrificado, duro, imóvel, inquebrável e intocável. É norma que se cumpre sem qualquer discussão quanto a sua interpretação de viabilidade – fática ou de direito -, dispositivo legal taxativamente blindado pela ordem constitucional, não se modifica, não se revoga ou não se reforma, é portanto, superior, hierarquicamente falando, quanto a sua validade e soberania.
O artigo 60 § 4º da Carta Magna estabelece que não poderão ser motivo de propostas para deliberação, nem por emenda constitucional as clausulas pétreas; a saber:
- a que se refere a forma federativa de Estado, quanto a República e o Estado Democrático de Direito, objetivos, fundamentos e princípios (art. 1º, 3º e 4º CF);
- no que diz respeito ao voto direito, secreto, universal e periódico, ante o sistema democrático de sufrágio universal (art. 14 CF);
- sobre a separação dos Poderes, executivo, legislativo e judiciário, posto que todo Poder estatal emana do povo e em seu nome será exercido, sendo independentes e harmônicos entre si (art.2º CF); e
- quanto aos direitos e garantias individuais da cidadania (art. 5º CF), onde o § 2º dispõe que possuem aplicação imediata, em outras palavras, que não necessita de lei regulamentar, devendo ser aplicada pelo Poder Judiciário imediatamente, mesmo com a falta ou carência de lei ordinária.
Todos os demais dispositivos constitucionais, incluindo-se o artigo 228 da CF (que define a responsabilidade penal) são passíveis de reforma, de maneira total ou parcial, através de inclusões ou exclusões de texto (reforma com nova redação), por emendas constitucionais, porque se incluem nas chamadas cláusulas pétreas; cito como exemplo dois assuntos de extrema importância que foram modificados, sobre o sistema de juros (art. § 3º do art. 192 CF) e a reforma do Poder Judiciário (EC nº 45/2004), e em nenhum momento foi ventilado a sua impossibilidade por serem ou não cláusulas pétreas.
Para fins de definições internacionais, por exemplo, as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores (Assembléia Geral ONU Res. 40/33, de 29-11-85), conceitua “menor” como toda criança ou adolescente que o sistema jurídico de cada País possa sancionar por um delito de forma diferente daquele procedimento feito a um adulto; e “menor delinqüente” é toda criança ou adolescente que se impute um delito e que se considere culpado por seu comportamento (ação ou omissão), art. 2.2 letras “a”, “b” e “c”. Permite inclusive prisão, detenção ou apreensão preventiva de jovem infrator, devendo ser recolhido em estabelecimento distinto ou em recintos separados, onde estiver preso adulto, com todas as garantias legais e proteção assistencial, social, psicológica, médica e física, tendo em conta a sua idade, arts. 13.1, 13.2, 13.3, 13.4 e 13.5.
Também as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores, no tocante aos Princípios Norteadores da Decisão Judicial, no art. 17, estabelece que a autoridade judicial deverá pautar sua decisão, “na resposta à infração, proporcional não só às circunstâncias e à gravidade da infração, mas também às circunstâncias e às necessidades do jovem, como as necessidades da sociedade” e “a privação da liberdade pessoal do jovem-infrator poderá ser imposta, quando tenha praticado ato grave, envolvendo violência contra a pessoa ou por reincidência no cometimento de outras infrações sérias”, grifei e destaquei.
Devemos interpretar de maneira correta, a disposição do art. 1º da Convenção sobre Direitos da Criança (ONU/1989, adotada pelo governo brasileiro, via Decreto nº 99.710/1990), quando estipula: “Para efeitos da presente Convenção considera-se como criança todo ser humano com menos de dezoito anos de idade, a não ser que, em conformidade com a lei aplicável à criança, a maioridade seja alcançada antes”.
Portanto, de acordo com o artigo do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990), adolescente é aquele jovem entre 12 até 18 anos de idade (art. 2º); e o Código Civil pátrio (Lei nº 10.406/2002) prevê no art. 4º inc. I que são relativamente incapazes os maiores de 16 anos e menores de 18 anos de idade.
A Constituição federal no art. dá uma das maiores responsabilidades ao jovem de 16 anos, quando prevê o direito de votar e eleger o Presidente da República, a autoridade máxima que governa e conduz os destinos da Nação.
Ademais, a Convenção sobre Direitos da Criança, reza que: “Os Estados Partes reconhecem o direito de uma criança que tenha sido internada em um estabelecimento pelas autoridades competentes para fins de atendimento, proteção ou tratamento de saúde física ou mental a um exame periódico de avaliação do tratamento ao qual está sendo submetida e de todos os demais aspectos relativos à sua internação”.
Note-se portanto, a internação ou detenção de um jovem-infrator é possível, de acordo com as normas internacionais de Direitos Humanos fundamentais, sempre quando necessária e a circunstância assim recomendar, em nome da ordem e segurança pública.
Nenhum instrumento internacional de Direitos Humanos específico ao tema da prevenção da delinqüência juvenil e da administração da justiça de menores, não definem taxativamente a idade de 18 anos como a mais adequada para a responsabilização penal.
A Convenção sobre os Direitos da Criança, conceitua que entende-se por criança-jovem-adolescente os menores de 18 anos de idade, e estes não devem ser objeto de ingerências arbitrárias por parte das autoridades estatais, ademais, que todo menor de 18 anos de idade, pode estar privado de liberdade, porém, deverá ser separado dos adultos (art. 37); por sua vez, o item 56 das Diretrizes da ONU para a Prevenção da Delinqüência Juvenil (adotadas pela Assembléia Geral em 14-12-90, Res. 45/112), prevê que os atos delituosos sancionados aos adultos não sejam considerados da mesma forma, quando cometidos por um jovem.
Assim, entendemos que o artigo 228 da Constituição federal, s.m.j. pode ser perfeitamente modificado por emenda constitucional, sem qualquer problema de ordem jurídica, posto que não se trata de cláusula pétrea, nos termos da doutrina, literatura moderna e do sistema legal constitucional pátrio.
São estas as propostas para a prevenção e repressão da “delinqüência juvenil”, e não apenas a idéia de rebaixar o limite de idade para a imputabilidade penal. É preciso existir uma séria de ações de política social e penal estatal de maneira integrada e eficiente para construirmos uma sociedade livre, justa e solidária (inc. I, art. 3º CF), em respeito a inviolabilidade do direito à vida, à integridade física, à liberdade, à honra e à propriedade (art. 5º “caput” CF); posto que a segurança pública é dever do Estado (art. 144 CF), direito e responsabilidade de todos.
Professor Pesquisador e de Pós-Graduação (Especialização e Mestrado). Associado ao Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito (CONPEDI). Pós Doutor em Direito. Mestre em Ciências Penais e Criminológicas. Expert em Direitos Humanos (Consultor Internacional das Nações Unidas - Missão MINUGUA 1995-96). Promotor de Justiça de Foz do Iguaçu-PR. Do Movimento Nacional Ministério Público Democrático (MPD). Secretário de Justiça e Segurança Pública do Ministério da Justiça (1989/90). Assessor do Procurador-Geral de Justiça do Estado do Paraná, na área criminal (1992/93). Membro da Association Internacionale de Droit Pénal (AIDP). Conferencista internacional e autor de várias obras jurídicas publicadas no Brasil e no exterior. Site: www.direitoshumanos.pro.br . E-mail: [email protected]
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NETO, Cândido Furtado Maia. Responsabilidade penal ou inimputabilidade criminal - propostas práticas e objetivas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 jan 2009, 02:10. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/16557/responsabilidade-penal-ou-inimputabilidade-criminal-propostas-praticas-e-objetivas. Acesso em: 26 dez 2024.
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