A escolha de uma política judicial penal nos faz encarar um dilema: eficientismo x garantismo. Conforme for a escolha de um modelo, teremos ganhos em eficiência e perdas em garantias, ou vice-versa. A escolha de um modelo mais garantista surge como mais lógica, ao estilo clássico brasileiro, embora enseje um processo mais lento e seja menos dissuasivo da criminalidade, visto que no Brasil tão pouco tempo de garantias democráticas temos tido, e muitas vezes, em diversos períodos, sequer as tivemos. Isso porque aparenta estar a criminalidade brasileira mais associada ao abandono estatal e falta de condições de cidadania, do que a indivíduos ou grupos organizadamente criminosos, embora estes já se encontrem também muito presentes e sejam fruto da permissividade e desestruturação social nacionais. Não parece a solução residir somente num modelo penal para dissuadir o crime (modelo dissuasório clássico, do estado implacável), mas numa mudança de cultura, até porque o crime não poderia ser olhado somente com os olhos do sistema jurídico, que ainda prima por formalidade excessiva. O povo brasileiro é obviamente produto de sua própria história, e seus criminosos também, senão não teriam ambiente para se proliferar. Muitos conflitos penais não são sequer trazidos a juízo. O acesso à justiça ainda é deficiente e caro no Brasil, embora tenha apresentado melhoras recentes bastante consistentes.
Quanto ao modelo ressocializador (de finalidade utilitária), da forma como é executada a ressocialização no Brasil, não parece funcionar a contento. Demonstra não convencer o criminoso, ou que ele próprio não se convence de sua ressocialização e torna a delinqüir, em muitos casos. O modelo dissuasório clássico, cópia malfeita de modelos itálicos e iberos, que vinha há muito sendo utilizado no Estado Brasileiro, já faliu há muito tempo, o que nos leva a avaliarmos essas outras opções menos conflitivas.
O modelo norteamericano utiliza muito a justiça retribuitiva (punitiva, reparatória) negociada (guilty plea e plea bargaining), que na ideologia pragmática anglo-saxã tem funcionado bem, mas com riscos de excessos (overrecommending, overcharging, bluffing, etc.), embora contenha muitíssimos elementos úteis como forma de coação que não parecem descartáveis. Não parece que funcionaria tão bem no Brasil, isoladamente, pois estaria vinculada a uma ideologia que não possuímos na íntegra, por exemplo a econômica, inclusive a accountability (responsabilização) pois que uma coisa é adaptação e outra é a deturpação, risco intenso que provavelmente correríamos no Brasil. O modelo retroprotetivo de justiça retribuitiva provavelmente não funcionaria bem para uso generalizado, pois que carece das possibilidades de acordo mais efetivas.
Entretanto, é possível que uma justiça retributiva para crimes mais violentos chegasse a melhores resultados nesses casos. Um modelo de justiça reparatória mista, com conseqüência penais e cíveis (um viés de justiça reparatória), e com a popularização da suspensão condicional do processo, quiçá fosse mais adequado a nós, ou uma forma mais aproximada do modelo consensuado (com o aprofundamento da desformalização do processo), pois isso provavelmente resultaria mais satisfatório às partes, elas próprias mais participantes (integradas e ativas) na obtenção das soluções penais. Aparenta ser uma tendência atual a preocupação com a vítima e o agressor nos termos de uma justiça restaurativa, tendendo a ser mais produtivo em nossa sociedade. O modelo consensuado poderia privilegiar muito mais a razoabilidade do que a proporcionalidade, e a desformalização processual, uma vez que se quiséssemos ser proporcionais em tudo retornaríamos à Lei do Talião, o que de nada adiantaria, pois que sem trabalhar o perdão não há chance maior de progresso, ainda mais numa sociedade leniente, embora jovem promotora da democracia, dos direitos humanos e da racionalidade. Aparentemente esse modelo consensuado, nas suas vertentes negociada ou restaurativa, conferiria mais estabilidade psicológica às partes, especialmente após a decisão judicial. Nos juizados criminais já contamos com o modelo conciliatório (para crimes de menor potencial ofensivo), mas carecemos de um modelo mediador mais efetivo (com mediadores penais profissionais). Entretanto, ao compararmos as vantagens e desvantagens dos modelos ora propostos, podemos imaginar que funcionariam, no máximo como paliativos, e teríamos que priorizar muitas outras coisas mais cruciais ao povo brasileiro do que a repressão penal.
Referências:
DUARTE, Hugo Garcez. JUSTIÇA CONSENSUAL E DEMOCRACIA: RACIONALIDADE E TUTELA DOS DIREITOS HUMANOS (FUNDAMENTAIS). Acessado em 18/06/2011. Disponível em: www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/.../hugo_garcez_duarte.pdf.
FERNANDES, Antônio Scarance. O CONSENSO NA JUSTIÇA PENAL BRASILEIRA; Acessado em 18/06/2011. Disponível em: http://www.direitoprocessual.org.br/dados/File/enciclopedia/artigos/processo_penal/15%20FERNANDES,%20Ant%C3%B4nio%20Scarance%20- %20O%20consenso%20na%20justi
%C3%A7a%20penal%20brasileira.doc.
GOMES, Luis Flávio. JUSTIÇA PENAL RESTAURATIVA. Acessado em 18/06/2011. Acessado em 18/06/2011. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/10051/justica-penal-restaurativa.
FERNANDES, Antônio Scarance; O CONSENSO NA JUSTIÇA PENAL BRASILEIRA; acessado em 18/06/2011; disponível em http://www.direitoprocessual.org.br/dados/File/enciclopedia/artigos/processo_penal/15%20FERNANDES,%20Ant%C3%B4nio%20Scarance%20- %20O%20consenso%20na%20justi
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