Resumo: Philippe Ariès ao estudar a criança e a família, faz uma importante análise sobre o tema pedofilia. Em sua obra, encontramos uma sociedade totalmente distinta da que conhecemos atualmente. Lá, não existia o conceito atual de criança, e as atitudes despudoradas envolvendo crianças não eram combatidas como nos dias atuais. Com a transformação do antigo regime para o sistema capitalista burguês, conceitos foram alterados como se um mundo deixasse de existir. Assim, aquela criança que outrora era desvalorizada pelo adulto, passou a ser objeto de luxo no âmbito da nova família que se estabelecia. Esta criança, que antigamente era invisível ou despudorada, passou a sofrer um controle maior do Estado e da família, especialmente na esfera sexual. Então, medicina, sistema jurídico e pedagogia passaram a endurecer condutas que antes eram tratadas com vista grossa. Por meio do que Foucault denominou de ‘dispositivo da sexualidade’, aquela sociedade moralista amoedaria novas disposições normativas e legislações para combater eficazmente todos os excessos e o sexo destoante, colocando a sodomia e a pederastia como condutas primazes a serem extirpadas do âmbito social. Neste entremeio, a psiquiatria cunharia na segunda metade do século XIX o afamado termo ‘pedofilia’.
Palavras-chave: Pedofilia; psiquiatria; penalização.
Não há espécie mórbida que não seja constatada, exaltação, depressão ou perversão da sensibilidade genital, desde o onanismo até a satyriasis, desde a violação, o incesto, a exibição, até o tribadismo e a pederastia. Estas psychopathias são tão communs, tão frequentes que consideram-se como syndromas da loucura e não uma espécie particular – a loucura erótica – como queria Ball. (VIVEIROS DE CASTRO, 1934, p.223).
1. Breve Introdução
O assunto pedofilia é a grande coqueluche do momento. Capas de jornais e de revistas estampam com glamour fotos de abusadores todos os dias e a mídia falada não perde nenhuma oportunidade de divulgar os crimes, tratando a situação com grande estardalhaço (HISGAIL, 2007). Em um caldeirão com conteúdo estritamente sensacionalista, indivíduos de toda sorte são ali depositados. Lá são embocados perversos, religiosos, pais de família e raramente pedófilos. É que a mídia não distingue a patologia do crime, levando o clamor público a condenar à fogueira da moralidade, inocentes e culpados nesta verdadeira inquisição do século XXI. Então, não raramente condena-se socialmente antes do julgamento legal.
Logicamente, nesta caça às bruxas, o pobre é quem tem a situação mais agravada. Inobstante existirem pronúncias de todas as classes sociais, é indiscutível que o menos favorecido não terá direito igualitário às beneficies de um bom advogado, e consequentemente, muitas vezes é condenado pelo fervor dos acontecimentos. Não são raros os casos de crianças que são induzidas a mentirem em depoimentos para prejudicarem desafetos de adultos.
Mas é fato também que, no reverso da moeda, sádicos e perversos abusam de crianças indefesas, geralmente se aproveitando da condição de serem membro da família.
Esta faca de dois gumes eleva a responsabilidade do julgador, pois se inexperiente, pode condenar um ótimo pai de família ao patíbulo de uma penitenciária com todos os requintes de crueldade que esta instituição nefasta proporciona, e se negligente, pode deixar impune um crime com requintes de crueldade.
Antes de adentrarmos no quesito jurídico, vamos ouvir o retumbar da história. A conduta de abusar sexualmente de crianças, hoje mundialmente conhecida como pedofilia, nem sempre foi tão combatida.
Philippe Ariès em sua obra “História Social da Criança e da Família” (1981) entoa que a sociedade que conhecemos passou a se personificar a partir do século XVI. Até aquele momento histórico, existia uma natural promiscuidade no comportamento sexual[i] e as atitudes de abuso contra crianças quase nunca eram observados, pois a criança não era valorizada como na atualidade, já que morria precocemente e assim, o adulto não podia contar com seus préstimos. Quando sobrevivia, misturava-se aos adultos e trabalhavam desde cedo.
Com a mudança de comportamento das famílias, os pais passaram a prestar maior atenção aos seus rebentos e começaram a “paparicar” as crianças, observando com afinco seus comportamentos, achando engraçadinhas as traquinagens destes pequenos seres (ARIÈS, 1981).
Mas esta criança, tão pequena e desprotegida, não podia ser misturada com os adultos. Ela agora era um ser inocente e frágil, e como tal, deveria ser privada de malícias e distorções de conduta inerentes à fase adulta. (ARIÉS, 1981). Então, médicos, juristas e pedagogos se mobilizaram para que comportamentos impróprios não abarcassem essas crianças. A medicina adentrou o seio familiar e passou a ditar regras de conduta (FOUCAULT; 2001; COSTA, 1979; FERREIRA, 2013a), domesticando condutas sexuais e proibindo qualquer atitude que destoasse da normalidade. O sexo de agora em diante deveria ser feito com prudência, e a semente do ato sexual seria a pupila do Estado, ou seja, um cidadão ávido a receber todas as orientações legais e morais, afável para construir uma pátria com requintes de progresso e prosperidade (COSTA, 1979).
A nova criança seria educada pela nova família como um ser puro, desprovido de malícia e privado de todos os instintos animais que poderia fazer dela um indivíduo doente. O onanismo passou a ser combatido como causa de infindáveis doenças[ii] pelos médicos e pelos pedagogos, e os destoantes, passaram a ser considerados fora das normas, e enviados a prisões e asilos (FOUCAULT, 2001; COSTA, 1979; DONZELOT, 1986; CASTEL, 1991; LOBO, 2008).
É exatamente neste momento que os crimes sexuais contra crianças passam a ser combatidos com maior intensidade. As crianças que até aquele momento histórico, ou eram desprezadas, ou espancadas e abusadas sexualmente (DEMAUSE, 1991, MOTT, 1989), agora passam a ser melhor percebidas pelas autoridades constituídas. Os Códigos Criminais passam a tratar do tema com maior objetividade e cartilhas de pedagogia são criadas para educar crianças e evitar contato com o mundo da perversão.
Krafft-Ebing cunha o termo pedofilia no final do século XIX, e é através de suas escritas que a medicina psiquiátrica dá início a classificação de distúrbios mentais e comportamentos destoantes que deveriam ser afastados do ventre social (LANTERI-LAURA, 1994; FOUCAULT, 1987). O Estado passa a ser o perseguidor voraz de condutas sexuais impróprias e passa a denominar aqueles que não seguem as normas de ‘anormais’ (FOUCAULT, 2001). Sodomia e Pederastia são os embriões jurídicos da pedofilia (MOTT, 1989), e emanados pela volúpia de entidades moralistas, indivíduos considerados pederastas ou sodomitas passam a ser cassados e reprimidos por meio da justiça penal.
É nesse campo minado de preconceitos e distorcidas visões de mundo que a sociedade do final do século XIX acabou por punir condutas meramente uranistas como condutas pederastas, colocando homossexuais como seres destoantes e desencaminhadores de menores (PRETES; VIANA, 2008; GREEN, 2000). De lá para cá, muitas vezes pelo abarrotamento do Poder Judiciário e de julgadores despreparados, o martírio de se condenar precocemente indivíduos inocentes ainda se faz, enquanto criminosos sexuais elitizados sequer esquentam uma cela de prisão.
2. Pedofilia é doença?
A palavra pedofilia deriva de ‘pedo’ – criança e ‘filia’ – filho, significando “atração sexual de um adulto por crianças[iii]” (DICIONÁRIO, 2013). Esta atração sexual foi através dos tempos carregada pelo termo ‘perversão’. Até 1896, perversão se confundia com as infindáveis classificações que a psiquiatria estava cunhando de anomalias ligadas a comportamentos destoantes. Após esta data, Sigmund Freud deu ao termo o sentido de desvio sexual em relação a uma determinada norma (CASTRO; BULAWSKI, 2011). Temos então uma definição médica no seguinte sentido:
(...) pedófilo é um termo clínico, utilizado para fazer referência a um adulto que possui um desvio de personalidade, envolvendo um interesse específico e focado em crianças pré-púberes. Ainda que a maioria dos pedófilos sejam homens, abusadoras mulheres não são desconhecidas, e por mais que alguns pedófilos tenham um interesse focado em meninas ou meninos, outros não possuem uma preferência consistente por qualquer dos gêneros” (DAVIDSON, 1996 apud LANDINI, 2004, p. 322-323).
O pedófilo, portanto, pode ser considerado doente, pois possui uma disfunção sexual que lhe priva de qualquer prazer nesta esfera, salvo se a atividade for realizada com crianças. “Sua libido está direcionada para a criança e dela não consegue desvencilhar-se” (ALBERTON, 2005, p.125).
Neste mesmo sentido, desmembrando o conceito:
Do ponto de vista médico, a pedofilia é uma psicopatologia, perversão sexual com caráter compulsivo e obsessivo. O pedófilo é chamado agressor sexual preferencial. O conceito social de pedofilia define-se pela atração erótica por crianças. Esta atração pode ser elaborada no terreno da fantasia ou se materializar em atos sexuais com meninos ou meninas. A pedofilia pode ser sintoma de um indivíduo impotente e inseguro. Normalmente, esse indivíduo imagina-se criança, projetando essa fantasia nas crianças reais do mundo externo e busca tratá-los como gostaria de ser tratado. Desta forma, quando abusa sexualmente de uma criança, ele se vê como uma criança, diminuindo (em sua percepção) a culpa de seu ato (SANTO, 2004 apud ALBERTON, 2005, p.125).
Tomando os enunciados acima para uma discussão, é importante salientar que nem todo indivíduo diagnosticado como pedófilo é um violador de crianças, pois “é possível que essa pessoa mantenha seus desejos sexuais apenas no nível da fantasia” (LANDINI, 2004, p.323). Ele pode se satisfazer sozinho “simplesmente contemplando fotos de revistas ou fotografias comuns, que retratam crianças ou adolescentes em poses inocentes[iv]” (ALBERTON, 2005, p.125). Em outra vertente, os abusadores de crianças podem realizar o ato por vários motivos, não necessariamente pela preferência em ter relações sexuais com crianças pré-púberes:
(...) nem toda pessoa que comete um ato de violência sexual é um pedófilo, ainda que considerássemos a pedofilia de uma forma mais branda, simplesmente o interesse sexual por crianças. Esse é o caso, por exemplo, de pessoas que abusam de crianças pelos seguintes motivos: a prostituição infantil, em muitos casos é mais ‘barata’ do que a adulta; em alguns lugares é mais fácil encontrar crianças em situação de prostituição e consentindo em participar de fotos pornográficas do que adultos; muitas vezes são também levadas de uma a outra região; em alguns lugares do mundo (...) (LANDINI, 2004, p.323).
Existem ainda outras possibilidades de incentivo a abusos sexuais sem conotação de pedofilia, como crenças que preconizam que relações sexuais com crianças poderiam “trazer sorte ou curar doenças sexualmente transmissíveis”. (LANDINI, 2004, 323).
O que se pode afirmar com exatidão é que “não é considerado pedófilo aquele que se excita com adultos e crianças” (ABDO apud LANDINI, 2004, p.323).
Não obstante, existe quase que uma unanimidade entre os pesquisadores no sentido de que, sempre existe a atitude de sedução por parte do adulto face à criança, geralmente se aproveitando da confiança daquele pequeno ser. Assim, a criança, sem entender plenamente os efeitos do ato, até mesmo porque sua mentalidade ainda não se desenvolveu totalmente, acaba sucumbindo às investidas sexuais, entendendo-a como normal, e muitas vezes calando-se sobre o abuso (CASTRO; BULAWISKI, 2011).
A Classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial de Saúde define pedofilia como uma "preferência sexual por crianças, quer se trate de meninos, meninas ou de crianças de um ou do outro sexo, geralmente pré-púberes ou não" (CID 10, 2013)[v].
Assim, é estranho ao mundo jurídico o termo aqui debatido, pois “a pedofilia não está vinculada a uma definição legal, mas a uma definição clínica” (LANDINI, 2004, p.322). Ela flutua em uma linha tênue entre os institutos da Medicina Legal e da Psiquiatria, ora considerada como parafilia, ora como perversão.
Então, pessoas diagnosticadas como pedófilas necessitam de tratamento e acompanhamento caso a caso. Muitas vezes, pessoas que usam da rede mundial de computadores para distribuição e venda de fotos e vídeos de crianças sendo abusadas sexualmente não são pedófilos. Ora, “Uma pessoa pode produzir, vender ou trocar pornografia infantil, até mesmo fazer sexo com uma criança em situação de prostituição nas ruas, sem que seja necessariamente um pedófilo” (LANDINI, 2004, 323).
É que a mídia, nos seus diversos formatos, fazem um estardalhaço com as informações que possuem, colocando doentes e aproveitadores em um mesmo balaio, não se preocupando em conceituar o pedófilo como doente, e sim como criminoso que tem que ser punido e não tratado. É interessante frisar que a pornografia infantil é perseguida pelos dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente, tornando-se crime apenas com uma única conduta delitiva. Já a pedofilia necessita de uma reiteração das atitudes (CASTRO; BULAWISKI, 2011).
3. Leis que disciplinam o tema
A Constituição de 1988, conhecida como Constituição Cidadã é considerada por muitos como um verdadeiro pacto de cidadania, visto que foi a Carta Política que mais enfatizou os direitos humanos até o momento. O Estatuto da Criança e Adolescente de 1990 germinou de suas entranhas, pois muito antes desta cartilha de direitos, o legislador constitucional já se preocupava com os direitos das crianças e adolescentes, especialmente em seu artigo 227[vi]. No § 4º do retro artigo, presenciamos a preocupação da lei maior com os abusos contra crianças, ditando que “a lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente” (PINTO; WINDT; CÉSPERES, 2007, p. 69). Tal disposição legal procura proteger a liberdade sexual e a dignidade da pessoa humana, princípios basilares, que quando dirigidos á crianças, tomam ainda maior proporção.
O Estatuto da Criança e Adolescente vem então complementar o referido artigo, trazendo um rico arcabouço de enunciados que defendem com veemência os direitos dos pequenos seres.
Temos como um dos marcos de combate a pornografia infantil os ditames do artigo 241 do ECA:
Art. 241. Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.” (NR)
Art. 2o A Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990, passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 241-A, 241-B, 241-C, 241-D e 241-E:
“Art. 241-A. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
§ 1o Nas mesmas penas incorre quem:
I – assegura os meios ou serviços para o armazenamento das fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo;
II – assegura, por qualquer meio, o acesso por rede de computadores às fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo.
§ 2o As condutas tipificadas nos incisos I e II do § 1o deste artigo são puníveis quando o responsável legal pela prestação do serviço, oficialmente notificado, deixa de desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito de que trata o caput deste artigo.
Art. 241-B. Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
§ 1o A pena é diminuída de 1 (um) a 2/3 (dois terços) se de pequena quantidade o material a que se refere o caput deste artigo.
§ 2o Não há crime se a posse ou o armazenamento tem a finalidade de comunicar às autoridades competentes a ocorrência das condutas descritas nos arts. 240, 241, 241-A e 241-C desta Lei, quando a comunicação for feita por:
I – agente público no exercício de suas funções;
II – membro de entidade, legalmente constituída, que inclua, entre suas finalidades institucionais, o recebimento, o processamento e o encaminhamento de notícia dos crimes referidos neste parágrafo;
III – representante legal e funcionários responsáveis de provedor de acesso ou serviço prestado por meio de rede de computadores, até o recebimento do material relativo à notícia feita à autoridade policial, ao Ministério Público ou ao Poder Judiciário.
§ 3o As pessoas referidas no § 2o deste artigo deverão manter sob sigilo o material ilícito referido.
Art. 241-C. Simular a participação de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica por meio de adulteração, montagem ou modificação de fotografia, vídeo ou qualquer outra forma de representação visual:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda, disponibiliza, distribui, publica ou divulga por qualquer meio, adquire, possui ou armazena o material produzido na forma do caput deste artigo.
Art. 241-D. Aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem:
I – facilita ou induz o acesso à criança de material contendo cena de sexo explícito ou pornográfica com o fim de com ela praticar ato libidinoso;
II – pratica as condutas descritas no caput deste artigo com o fim de induzir criança a se exibir de forma pornográfica ou sexualmente explícita.
Art. 241-E. Para efeito dos crimes previstos nesta Lei, a expressão “cena de sexo explícito ou pornográfica” compreende qualquer situação que envolva criança ou adolescente em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou exibição dos órgãos genitais de uma criança ou adolescente para fins primordialmente sexuais. (BRASIL, 2013a).
Assim, a maioria dos doutrinadores abraçou o artigo em concordância com o preceito condenatório da letra da lei, ou seja, punir não só o produtor de pornografia infantil, mas também o consumidor final, pois é este último que acaba alimentando toda a maquinaria.
Com este alargamento de penalidades e dispositivos que protegem a criança trazidos pelo ECA, a mídia erroneamente passou a conclamar que houve aumento dos instrumentos de combate e punição à pedofilia, se esquecendo que, como dissemos alhures, pedofilia é termo clínico e não jurídico. Aumentou sim à punição a divulgação e armazenamento de imagens pornográficas infantis, inibindo inclusive o ato abusatório, mas não ao problema psiquiátrico da pedofilia, que deve ser conceituadA melhor e o sujeito tratado devidamente. Se diverso disso, estaria à legislação punindo o agente por aquilo que ele é, e não por aquilo que ele fez (CASTRO; BULAWISKI, 2011).
Como exposto no início deste trabalho, em outros tempos, quando a criança sofria violência sexual, o violentador era punido pelo ato, qual seja, estupro presumido. Ninguém conhecia o termo ‘pedofilia’, pois ele era exclusivo da seara psiquiátrica. Atualmente, o ato de abusar é necessariamente um ato pedofílico, sem no entanto um estudo mais detalhado do abusador para saber se o mesmo é acometido pela parafilia. E raramente o explorador sexual ou o distribuidor de produtos pornográficos é realmente um pedófilo. Na maioria gritante dos casos ele se ocupa deste investimento pela facilidade de sedução de uma criança ou para auferir lucro com o comércio milionário da pornografia infantil.
4. Discussões dos Tribunais: Algumas ementas
Nas próprias decisões jurisprudenciais, observamos o uso do termo pedofilia de forma confusa, ora com singela inclinação do legislador para configurar o abusador como doente e consequentemente semi-imputável, ora tratando-o como mero criminoso. Vejamos:
EMENTA: APELAÇÃO CRIME. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. RÉU SEMI-IMPUTÁVEL. 1. SUBSTITUIÇÃO DA PENA RECLUSIVA POR MEDIDA DE SEGURANÇA. ACOLHIDO. Réu submetido à avaliação psiquiátrica cujo laudo diagnosticou tratar-se de indivíduo portador de pedofilia, reconhecendo o nexo de causalidade entre a referida patologia mental e a conduta criminosa praticada pelo réu. Avaliação pericial que recomenda aplicação de medida de segurança para o tratamento da patologia apresentada. Sentença que desconsiderou a recomendação dos expertos e aplicou pena reclusiva em regime aberto, mesmo tratando-se de crime hediondo praticado contra criança de oito anos, mediante violência real. Patologia mental diagnosticada que conduz o réu a impulsos sexuais desviados, sendo forte a probabilidade de siga praticando abusos sexuais em crianças se não for submetido a um rigoroso tratamento médico. Possibilidade de cura para a patologia reconhecida pelos expertos. Substituição da pena reclusiva por medida de segurança que se mostra recomendável, nos termos do art. 98 do Código Penal. Determinada a internação do réu no Instituto Psiquiátrico Forense Maurício Cardoso (IPF), pelo período mínimo de dois anos. APELO PROVIDO. (Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Apelação Crime Nº 70011372471, Oitava Câmara Criminal. Relator: Des. Lúcia de Fátima Cerveira. Acórdão de 09 julho de 2007).
Nesta decisão acima, percebe-se claramente a preocupação da Julgadora em classificar o réu como semi-imputável, por entender que o mesmo possui a classificação psiquiátrica da pedofilia, e, portanto deve ser enquadrado nas assertivas do artigo 26[vii], com medida de segurança insculpida no artigo 98[viii], ambas do Código Penal de 1940.
Porém, nas demais decisões, esta preocupação dificilmente é vislumbrada:
Ementa: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. ESTUPRO DEVULNERÁVEL (CRIANÇA DE 8 ANOS DE IDADE). PRISÃO PREVENTIVA EM 17.01.11. DECISÃO FUNDAMENTADA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E DAINSTRUÇÃO CRIMINAL. INCLINAÇÃO PARA A PEDOFILIA. AMEAÇAS EPROVOCAÇÕES AO PAI DA VÍTIMA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. PARECER DO MPF PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO DESPROVIDO. 1. In casu, o reconhecimento da materialidade do delito e da presença de indícios suficientes de autoria, a aparente inclinação do acusado para atos de pedofilia e as ameaças que vem sofrendo o pai da pequena vítima, constituem motivação idônea para a segregação cautelar do acusado, como forma de resguardar a ordem pública e por conveniência da instrução criminal. Precedentes. 2. A preservação da ordem pública não se restringe às medidas preventivas da irrupção de conflitos e tumultos, mas abrange também a promoção daquelas providências de resguardo à integridade das instituições, à sua credibilidade social e ao aumento da confiança da população nos mecanismos oficiais de repressão às diversas formas de delinquência. 3. Parecer do MPF pelo desprovimento do recurso. 4. Recurso desprovido. (STJ - RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS RHC 30105 MG 2011/0075440-6 - Data de publicação: 31/08/2011).
Ementa: HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. PEDOFILIA. PLEITOPELA REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA MANTIDA NA SENTENÇACONDENATÓRIA. CIRCUNSTÂNCIAS AUTORIZADORAS PRESENTES. DECISÃOFUNDAMENTADA. PRECEDENTES. 1. As Turmas componentes da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça já cristalizaram o entendimento de inexistir constrangimento ilegal quando a prisão, suficientemente fundamentada, retratar a necessidade da medida para as garantia da ordem pública e aplicação da lei penal. 2. No caso concreto, a manutenção da prisão cautelar, por meio de sentença condenatória, encontrava-se, à época, fundamentada na garantia da ordem pública, uma vez que o paciente responde pela prática de outros crimes contra a dignidade sexual, totalizando pena unificada superior a 30 (trinta) anos de prisão, o que denota a periculosidade e o desrespeito às normas legais, caracterizados pela reiteração da prática delituosa. 3. Ordem denegada. (STJ - HABEAS CORPUS HC 166509 RO 2010/0051282-1 - Data de publicação: 29/11/2011)
EMENTA EXTRADIÇÃO. CRIMES RELACIONADOS À ATIVIDADE DEPEDOFILIA. CORRESPONDÊNCIA COM CRIMES TIPIFICADOS NA LEI Nº 8.069 /90. DUPLA INCRIMINAÇÃO CONFIGURADA. PRESCRIÇÃO: NÃO-OCORRÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE ÓBICES LEGAIS À EXTRADIÇÃO. CONTENCIOSIDADE LIMITADA. ENTREGA CONDICIONADA À ASSUNÇÃO DE COMPROMISSO QUANTO À DETRAÇÃO DA PENA. 1. Pedido de extradição formulado pelo Governo dos Estados Unidos da América que atende os requisitos da Lei nº 6.815 /1980 e do Tratado de Extradição específico. 2. Crimes de receber, distribuir e possuir, em arquivos de computador, imagens e filmes de menores em conduta sexual explícita que correspondem aos crimes tipificados nos artigos 241-A e 241-B da Lei nº 8.069 /90. Dupla incriminação atendida. 3. Não-ocorrência de prescrição e inexistência de óbices legais. 4. O processo de extradição não comporta análise aprofundada de matéria relacionada ao quadro probatório ou ao mérito da acusação. Limites da contenciosidade limitada. 5. O compromisso de detração da pena, considerando o período de prisão decorrente da extradição, deve ser assumido antes da entrega do preso, não obstando a concessão da extradição. O mesmo é válido para os demais compromissos previstos no art. 91 da Lei nº 6.815 /1980. 6. Extradição concedida. (STF - EXTRADIÇÃO Ext 1292 DF - Data de publicação: 05/06/2013)
Ementa: PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. SENTENÇA. PEDOFILIA. DIREITO DERECORRER EM LIBERDADE. MODUS OPERANDI DOS DELITOS. GRAVIDADE CONCRETA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA. 1. A prisão provisória é medida odiosa, cabível apenas quando patentes os pressupostos e fundamentos de cautelaridade. In casu, a necessidade da custódia cautelar restou demonstrada com base em dados concretos dos autos, conforme recomenda a jurisprudência desta Corte, estando o decreto prisional fundamentado na gravidade das condutas do paciente que teria aliciado e corrompido, reiteradas vezes, adolescentes, praticando com elas atos libidinosos,induzindo-os à prostituição e ao uso de drogas, obrigando algumas a presenciar atos de libidinagem e a participar de orgias, produzindo ainda fotografias delas em cenas de nudez e de sexo, que teriam sido publicadas na internet. 2. Eventuais predicados do paciente, como residência fixa, primariedade, inexistência de antecedentes e emprego definido não são bastantes para obstarem a segregação prévia, tampouco para autorizar a sua revogação. Precedentes. 3. Ordem denegada. (STJ - HABEAS CORPUS HC 199722 RO 2011/0050818-1 - Data de publicação: 31/08/2011).
EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIMES DEPEDOFILIA E PORNOGRAFIA INFANTIL, PRATICADOS VIA INTERNET, E DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. CONEXÃO INSTRUMENTAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. I – Crimes de pedofilia e pornografia infantil praticados no mesmo contexto daquele de estupro e atentado violento ao pudor, contra as mesmas vítimas. Reunião dos processos, em virtude da existência de vínculo objetivo entre os diversos fatos delituosos e de estarem imbricadas as provas coligidas para os autos, nos quais foram apuradas as práticas das condutas incriminadas. II – Há conexidade instrumental: a prova relacionada à apuração de um crime influirá na do outro, razão pela qual é competente para conhecer da controvérsia a Justiça Federal. III – Ordem de habeas corpus indeferida, ficando mantida, em consequência, a decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça no Conflito de Competência 111.309/SP.(STF - HABEAS CORPUS HC 114689 SP - Data de publicação: 28/08/2013)
Ementa:HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. PENA TOTAL DE 6 ANOS DE RECLUSÃO, EM REGIME FECHADO. PROGRESSÃO PARA O REGIME SEMIA BERTO INDEFERIDA PELO JUIZ DA VEC, E MANTIDA PELO TRIBUNAL A QUO. AUSÊNCIA DE REQUISITO SUBJETIVO. LAUDOS PSICOLÓGICO E PSICOSSOCIAL DESFAVORÁVEIS. TENDÊNCIA À PEDOFILIA. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA PARA APRECIAR O MÉRITO SUBJETIVO DO APENADO. PARECER MINISTERIAL PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. ORDEM DENEGADA. 1. Conforme entendimento cristalizado nesta Corte Superior, a realização do exame criminológico pode ser solicitada quando as peculiaridades da causa assim o recomendarem. Súmula 439 /STJ. 2. In casu, restou demonstrado, pelo Tribunal de origem, com base no laudo psicossocial desfavorável, que o condenado não ostenta condições pessoais que lhe propiciem a progressão, razão pela qual deve ser mantida a decisão que reconheceu o não preenchimento do requisito subjetivo. 3. O Habeas Corpus não é adequado para o exame do preenchimento dos requisitos subjetivos para a concessão de progressão prisional, diante da necessidade de dilação probatória incompatível com a natureza da Ação, que pressupõe prova pré-constituída do direito alegado. Precedentes. 4. Ordem denegada, em conformidade com o parecer ministerial (STJ - HABEAS CORPUS HC 175400 RS 2010/0103077-1 - Data de publicação: 13/12/2010).
Das decisões acima, vislumbra-se o gargalo da garrafa. Como distinguir com absoluta precisão o pedófilo considerado doente com os demais autores de crimes sexuais contra crianças, especialmente impúberes? As análises clínicas que comumente são realizadas por experts no assunto relatam que a maioria esmagadora de abusadores, especialmente em camadas desfavorecidas da população não são considerados pedófilos, mas sim, meros criminosos sexuais (CASTRO; BULAWISKI, 2011). A grande preocupação desta questão toda é saber se o Estado possui estrutura adequada com profissionais gabaritados e em número suficiente, enfim, especialistas capazes de examinar cada abusador para, com diagnósticos precisos, separar o joio do trigo. Eis então uma necessidade maior de debate da sociedade civil sobre o tema.
5. Últimas Considerações
Foi no final do século XVIII que observamos uma substancial mudança na sociedade em relação à criança. Neste momento histórico, descobre-se a criança e é inventada a noção de infância que conhecemos, pois a criança deixa de trabalhar e parte para a escola. A infância é então este período. A criança estuda e brinca, deixando de se sacrificar no trabalho. Como vive mais, ela passa a ser paparicada e protegida. Este retrato diz respeito a criança da classe elitista, logicamente.
Esta proteção acaba, porém, em determinado momento, se tornando um tanto descomedida, pois eleva atitudes como o onanismo a status de aberração. Então a humanidade adentra em uma espécie de estufa moralista, tendo neste marco o exagero como componente principal. Todos que destoassem da manada seriam considerados anormais. A caça às bruxas passa a punir condutas criminosas, mas também pune o diferente. Homossexuais são perseguidos pelos seus trejeitos e loucos e doentes passam a ser considerados escória e acabam afastados do seio social, depositados como animais em asilos e hospitais. Os psiquiatras criam uma infinidade de classificações[ix], uma para cada espécie de indivíduo considerado anormal. Dentre tantas, cria-se o esboço da pedofilia. Todo indivíduo com inclinações desejosas por crianças pré-puberes, independente do sexo de escolha, seria considerado pedófilo. A pedofilia hibernou nos campos psiquiátricos até a década de oitenta do século XX. Antes disso, pessoas eram chamadas de sodomitas, de pederastas, mas raramente de pedófilos. Punia-se a sodomia, o estupro, o defloramento e o atentado violento ao pudor, nunca a pedofilia.
Invenção dos tempos modernos, eis que a pedofilia virou classificação psiquiátrica e dispositivo legal concomitantemente. Todos querem condenar abusos sexuais com a chancela da pedofilia. Até os julgadores das mais altas Cortes de justiça embaralham o tema. Cortem as cabeças dos pedófilos, eis o brado universal.
Inobstante, é certo dizer que a globalização fomentada pela tecnologia galopante aumentou sobremaneira o abuso e a exploração sexual de crianças. Redes organizadas de pedofilias pipocam na web todos os dias. Precaução, cautela e combate devem caminhar juntos diuturnamente, tanto no âmbito familiar, como na sociedade civil como um todo. Os crimes sexuais devem ser combatidos. Abusadores de crianças devem esquentar os bancos das cadeias sim.
Mas há de se ter precaução. É necessário separar o joio do trigo. Existem diferenças gritantes entre abusadores ocasionais e pedófilos. Este primeiro consegue ter controle de suas atitudes, este último é doente e atormentado por desvios de comportamento e perturbações mentais e sexuais que, em muitas ocasiões, podem até privá-lo de discernimento.
Assim, pedófilos que se satisfazem apenas com olhares devem ser direcionados para tratamento psiquiátrico adequado. Aqueles que chegarem as vias de fato, mas que se submetidos a exame clínico, restar evidente sua incapacidade de discernir, devem ser diagnosticados como doentes. Para eles, nada mais justo do que as beneficies da semi-imputabilidade, com aplicação de medida de segurança com tratamento, medicação e orientação adequada. Para os demais, pedófilos que praticam crimes com discernimento e todos os demais criminosos sexuais de crianças, devem ser encaminhados inconteste a julgamento, e se condenados, a eles, devem ser aplicados os rigores da lei.
Referências
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[i] Philippe Ariès entoa que, o leitor contemporâneo, quando toma conhecimento do diário do médico de Henrique IV, fica boquiaberto com as passagens familiares relacionadas à Luís XIII, exatamente porque naquela época existia uma liberdade maior no trato com crianças, o que para a atualidade, confunde-se com grosserias e indecências. É fascinante pensar que as brincadeiras de 400 anos atrás são hoje consideradas graves imoralidades. Ouçamos o historiador: “Luís XIII ainda não tem um ano: ‘Ele dá gargalhadas quando sua ama lhe sacode o pênis com a ponta dos dedos’. Brincadeira encantadora, que a criança não demora a dominar. Ele chama um pajem ‘com um Ei, e levanta a túnica, mostrando-lhe o pênis’. Luís XIII tem um ano: ‘Muito alegre’, anota Heroard, ‘ele manda que todos lhe beijem o pênis’. Ele tem certeza de que todos se divertem com isso. Todos se divertem também com sua brincadeira diante de duas visitas, o Senhor de Bonnières e sua filha: ‘Ele riu muito para (o visitante), levantou a roupa e mostrou-lhe o pênis, mas sobretudo à sua filha; então, segurando o pênis e rindo com seu risinho, sacudiu o corpo todo’. (...) Levantou a túnica, e mostrou-lhe o pênis com um tal ardor que ficou fora de si. Ele se deitou de costas para mostrá-lo melhor’. Luís XIII tem um pouco mais de um ano quando seu casamento com a Infanta de Espanha é decidido. As pessoas explicam-lhe o que isso significa e ele compreende muito bem. Perguntam-lhe: ‘Onde está o benzinho da Infanta? Ele põe a mão no pênis” (ARIÈS, 1981, p.75).
[ii] E essas febres lentas nervosas, essas phtisicas que ceifam tanta juventude em flor apenas aberta, não são as mais das vezes geradas pelo funesto habito do onanismo? E essas mortes repentinas não são, em muitos casos castigo e vingança da moral ultrajada? Pode-se dizer sem exageração (os factos ahi estão que o attestam): as três quartas partes são ocasionadas pela embriagues, pela gula, pela cólera e pela libertinagem. (...) Perguntai aos médicos alienistas quaes são as causas mais ordinárias da alienação mental? Elles vos responderão: são – por ordem de frequencia – o abuso de licores alcoholicos, os pezares domesticos, o desgoverno, a libertinagem, a perda de fortunas, a ambição, o terror, o amor contrariado. (...) A eplepsia, a dansa de S. Guydo, as tremulas nervosas, as convulsões, as paralysias, provém muitas vezes de um acesso de terror ou de cólera, de excessos venéreos, ou do habito da masturbação (...) (MELLO MORAES, 1872, p.315).
[iii] Luiz Mott contempla que: “Dentre os tabus sexuais mais repelidos pela ideologia ocidental contemporânea estão a pedofilia – relação sexual de adulto com criança pré-pubere - e a pederastia – relação sexual de adulto com adolescente - também chamado efebolia. (1989, p. 33).
[iv] Fani Hisgail cita uma obra de Morton Cohen (1995), onde o biografo do escritor Lewis Carroll o enfatiza como uma pessoa que tinha “um dom especial para entender as crianças e foi muito amado por elas (...). Achava que as meninas personificavam a essência do romantismo: admirava aquela beleza natural; valorizava as declarações espontâneas; apreciava a ilimitada inocência; e dedicava o tempo, energia e imaginação a entretê-las e edificá-las, enfim as idolatrava” (COHEN, 1995 apud HISGAIL, 2007, p.44-45). Fani Hisgail ainda enfatiza que Carroll teria passado 13 anos fotografando nus infantis, “as vezes em longas sessões de estúdio e, quase sempre, com autorização dos pais” (HISGAL, p. 45).
[v] Todos da categoria F - Categoria: Transtornos da preferência sexual [F65] - Grupo: F60-F69 - Transtornos da personalidade e do comportamento do adulto - Capítulo: Capítulo V - Transtornos mentais e comportamentais. (CID 10, 2013).
[vi] É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (PINTO; WINDT; CÉSPERES, 2007, p.68).
[vii] Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)..
Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) (PINTO; WINDT; CÉSPERES, 2007, p.549).
[viii] Art. 98 - Na hipótese do parágrafo único do art. 26 deste Código e necessitando o condenado de especial tratamento curativo, a pena privativa de liberdade pode ser substituída pela internação, ou tratamento ambulatorial, pelo prazo mínimo de 1 (um) a 3 (três) anos, nos termos do artigo anterior e respectivos §§ 1º a 4º. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) (PINTO; WINDT; CÉSPERES, 2007, p.557).
[ix] Há os exibicionistas de lasègue, os fetichistas de Binet, os zoófilos e zooerastas de Krafft-Ebing, os automonossexualistas de Rohleder,; haverá os mixoscopófilos, os ginecomastos, os presbiófilos, os invertidos sexoestéticos e as mulheres dispanêunicas” (FOUCAULT, 1999, p.44).
Doutorando em Educação pela Universidade Federal de São Carlos (Bolsista CNPq). Desenvolve investigações vinculadas à linha de pesquisa "Diferenças: relações étnico-raciais, de gênero e etária" e participa do grupo de estudos sobre a criança, a infância e a educação infantil: políticas e práticas da diferença vinculado à UFSCar. É também Advogado. O presente artigo é parte modificada de minha Dissertação de Mestrado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERREIRA, Emerson Benedito. Pedofilia: reflexões Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 nov 2013, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/37390/pedofilia-reflexoes. Acesso em: 06 nov 2024.
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