Resumo: O objetivo deste trabalho consiste em examinar como o incremento no uso dos métodos adequados de tratamento de conflitos pode auxiliar no alcance de soluções mais justas, efetivas e céleres. Inicialmente, serão expostas a origem e a evolução normativa dos métodos consensuais no direito brasileiro. Em seguida, serão apresentadas as características das principais espécies dos métodos adequados de tratamento de conflitos, a saber, a conciliação, a mediação e a arbitragem, bem como as suas vantagens. Ao final, propor-se-á a consolidação e a expansão desses métodos, com destaque para a necessidade de seu alcance às demandas pré-processuais.
Sumário: 1. Origem e histórico normativo dos meios alternativos à jurisdição tradicional no direito brasileiro. 2. Principais espécies de métodos adequados de solução de conflitos e suas vantagens. 2.1. Da arbitragem. 2.2. Da conciliação. 2.3. Da mediação. 3. Necessidade de consolidação e expansão dos métodos adequados de tratamento de conflitos. 4. Conclusão. 5. Referências bibliográficas.
1. Origem e histórico normativo dos meios alternativos à jurisdição tradicional no direito brasileiro
No direito pátrio, a cultura do litígio e a adoção do método tradicional de jurisdição – em que um juiz resolve os conflitos entre as partes por meio de uma sentença – encontram-se bastante arraigadas. Com efeito, desde os primórdios da ciência jurídica brasileira, que sofreu grande influência do direito romano, os atos processuais eram marcados pela formalidade e pela solenidade, além de prevalecer a crença de que somente sentenças judiciais poderiam colocar um fim aos litígios.
Contudo, desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, que conferiu ênfase aos direitos fundamentais e objetivou a ampliação do acesso à justiça, a problemática do assoberbamento do Poder Judiciário passou a aprofundar-se. Com a sua capacidade de resolução dos conflitos quase esgotada, formava-se o embrião para o surgimento dos métodos consensuais de solução de conflitos.
Nesse contexto, a Lei 9.099/95, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, também facilitou o acesso à justiça, trazendo um procedimento mais simplificado para resolver demandas menos complexas. Ao mesmo tempo, previu a figura dos conciliadores e juízes leigos como auxiliadores da justiça e a competência dos Juizados Especiais Cíveis para realizar conciliações nas causas regidas pela referida lei.
Cesar Cury, ao tratar das consequências da edição da Constituição Federal e da Lei 9.099/95, pontua a sobrecarga que recai sobre o Poder Judiciário:
“O resultado dessa equação, ao longo de pouco mais de duas décadas, é o estado de saturação do sistema de justiça convencional, em especial dos tribunais de justiça. Até 1988, tramitavam em todos os juízos do país cerca de 350 mil ações ao ano. Em 2014, esse montante alcançou aproximadamente cem milhões de processos, conforme dados do CNJ.
(...)
É nesse contexto que novas alternativas começaram a surgir a partir da própria incapacidade do Judiciário em atender às expectativas colocadas sob sua responsabilidade, e cogitações acadêmicas e discussões entre os operadores do Direito produzem seus primeiros resultados, alguns extraídos de experiências alienígenas e adaptados à legislação nacional”[1].
No ano seguinte, adveio a Lei 9.307/96, que versa sobre a arbitragem, trazendo a possibilidade de litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis serem solucionados por terceiros capazes e imparciais, intitulados árbitros.
Mas foi no ano de 2010, como consequência do “Movimento pela Conciliação”, encabeçado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que os métodos de resolução de conflitos ganharam maior evidência. Deveras, no indigitado ano, o CNJ editou a Resolução 125, que recomendou a implantação de métodos autocompositivos – a saber, conciliação e mediação – por todos os Tribunais do país, como forma de se alcançar uma prestação jurisdicional mais efetiva e célere.
Luis Fernando Guerrero, ao tratar das diversas previsões para efetivação dos métodos de solução de controvérsias, destaca a relevância da referida Resolução. Confira-se:
“Ademais, merece destaque a Resolução nº 125 do CNJ, de 29 de novembro de 2010, que ampliou institucionalmente, no âmbito do Judiciário, o ‘direito de acesso à Justiça, previsto no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, além da vertente formal perante os órgãos judiciários, [o que] implica acesso à ordem jurídica justa’, criando um flanco importante para a utilização dos métodos de solução de controvérsias, estabelecendo ‘política pública de tratamento adequado dos problemas jurídicos e dos conflitos de interesses’”[2].
No ano de 2015, dois relevantes diplomas foram editados em prosseguimento à política adequada de tratamento de conflitos de interesses, a saber, o Código de Processo Civil (CPC/15) e a Lei de Mediação (Lei 13.140/15). Aliás, o CPC/15 prevê, logo em seu início, que o Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual de conflitos, sem prejuízo de que todos os atores processuais estimulem os métodos autocompositivos (art. 3º, §§ 2° e 3°), como consequência do dever de cooperação.
Como se não bastasse, o novo Diploma Processual Civil estabelece a audiência de conciliação como primeiro ato do processo, excepcionando tal procedimento somente nos casos em que não se admitir a autocomposição e em que houver manifestação de desinteresse de ambas as partes.
Michele Paumgartten bem enfatiza a intenção do novo Código de promover a conciliação:
“O art. 334 do CPC/2015 reflete o intuito conciliatório que se espera do magistrado na condução do processo judicial sob a novel legislação. Se a petição inicial preencher os requisitos legais e não for caso de improcedência liminar do pedido (art. 332 CPC/2015), o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação, antes do oferecimento da contestação pelo réu.
Será prioritário que, antes de qualquer decisão judicial o magistrado busque a reconciliação das partes, conforme preceitua o § 3° do art. 3º do CPC/2015, salvo quando a matéria não admitir a autocomposição (que é mais amplo do que direitos disponíveis), ou quando ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual”[3].
Dessa forma, percebe-se que, apesar de relativamente recentes, os métodos adequados de solução de conflitos ganharam expressão normativa no ordenamento brasileiro, sobretudo tendo em vista a necessidade de desafogar o Poder Judiciário e de garantir a resolução mais efetiva e célere dos litígios.
2. Principais espécies de métodos adequados de solução de conflitos e suas vantagens
Os métodos adequados de solução de conflitos abrangem os meios autocompositivos e os heterocompositivos. Nos primeiros, a construção da solução é alcançada pelas próprias partes, ainda que com o auxílio de terceiros. A título de exemplo, destacam-se a mediação e a conciliação. Já nos métodos heterocompositivos, a resolução é formulada e aplicada por um terceiro imparcial, como ocorre com a arbitragem.
Em relação às vantagens gerais aplicáveis a esses métodos, os ensinamentos de Marco Aurélio Buzzi são elucidativos. Veja-se:
“Os meios alternativos de resolução de conflitos rendem ensejo que as partes envolvidas adquiram maior intimidade e conhecimento das circunstâncias do caso a ser dirimido, e assim, formem o seu próprio convencimento e tenham discernimento suficiente para adotar uma deliberação, sopesando todos os aspectos, de modo que são muito maiores, no âmbito dessas práticas voltadas à solução dos litígios, as chances de resolução do conflito sociológico concomitante a todas as pendências que se pretende solucionar”[4].
A seguir, será abordado cada um dos principais métodos adequados de solução de controvérsia – arbitragem, mediação e conciliação –, ressaltando-se suas vantagens específicas.
2.1. Da arbitragem
A arbitragem foi um dos primeiros métodos alternativos surgidos em nosso ordenamento. A rigor, a sua origem remonta ao Código Comercial de 1850, que previa a resolução de conflitos comerciais por meio dessa figura.
Na arbitragem, ao invés de as partes submeterem os seus conflitos a um juiz togado, elas elegem um terceiro, capaz e neutro, para fazê-lo. Ou seja, a solução do litígio será externa, sendo imposta pelo árbitro, após as partes nele confiarem a sua demanda.
Carlos Alberto Carmona define o método heterocompositivo em tela, diferenciando-o da conciliação e da mediação:
“Trata-se de mecanismo privado de solução de litígios, por meio do qual um terceiro, escolhido pelos litigantes, impõe sua decisão, que deverá ser cumprida pelas partes. Esta característica impositiva da solução arbitral (meio heterocompositivo de solução de controvérsia) a distancia da mediação e da conciliação, que são meios autocompositivos de solução, de sorte que não existirá decisão a ser imposta às partes pelo mediador ou pelo conciliador, que sempre estarão limitados à mera sugestão (que não vincula as partes)”[5].
Atualmente, a arbitragem encontra-se devidamente regulamentada pela Lei 9.307/96, que sofreu recente alteração em virtude da previsão do seu uso nas relações com a Administração Pública. Há também a previsão de que o árbitro decidirá o conflito, valendo-se tanto de regras de direito como de equidade (art. 2º).
Dentre as vantagens desse método, o Manual de Mediação Judicial, do CNJ, coordenado por André Gomma de Azevedo, destaca as seguintes:
“Antes de iniciada a arbitragem, as partes têm controle sobre o procedimento na medida em que podem escolher o(s) árbitro(s) e as regras procedimentais da preparação à decisão arbitral. Havendo consenso entre as partes quanto ao procedimento, a liberdade de escolha estende-se inclusive ao direito e à possibilidade de julgamento por equidade pelo árbitro.
A arbitragem é conhecida por ser mais sigilosa e célere que o processo judicial na maior parte dos casos. A menos que estejam limitadas por regras acordadas anteriormente, as partes e seus advogados podem controlar o processo e agilizá-lo drasticamente, reduzindo custos e tempo”[6].
Além desses benefícios, o uso da arbitragem é recomendável e pode ser extremamente eficaz quando o litígio a ser resolvido demandar conhecimento técnico do terceiro imparcial. Isso porque muitos árbitros destacam-se por possuir capacitação específica em dada área, sendo muitas vezes escolhidos pelas partes justamente em virtude de tal expertise.
A despeito da importância da arbitragem, sobretudo na evolução dos métodos alternativos, hodiernamente há uma tendência em se incentivar os métodos autocompositivos, que possuem a vantagem de atribuir às próprias partes a resolução dos conflitos, empoderando-as.
2.2. Da conciliação
A conciliação consiste no método de resolução de controvérsias em que o conciliador facilita a comunicação e o diálogo entre as partes, orientando-as a encontrar a melhor solução para os seus conflitos. É exemplo clássico de meio autocompositivo, pois não há a imposição de qualquer decisão pelo conciliador, sendo as partes as verdadeiras responsáveis pela solução alcançada.
Marco Aurélio Buzzi, valendo-se das lições de Dinamarco, esclarece:
“Conciliação é acordo de vontades que resulta de concessões mútuas, em que um terceiro imparcial ajuda, orienta e facilita a composição. O conciliador, além de orientar pode sugerir soluções, desenvolve atividade de modo imparcial, avalia a situação litigiosa propondo uma solução ao conflito, enunciando as vantagens e desvantagens que a transação acarreta aos litigantes (DINAMARCO, 2005, p. 142)”[7].
Segundo o novo CPC, o conciliador atuará preferencialmente em casos nos quais não haja vínculo anterior entre as partes, além de poder sugerir soluções durante as sessões. A conciliação geralmente relaciona-se com litígios menos complexos, já que as partes não se conhecem previamente e, portanto, o nível de animosidade é mais neutro.
Nessa esteira, extrai-se a principal diferença entre a conciliação e a mediação. De fato, ambos os métodos coincidem quanto à proposta autocompositiva, diferindo-se, porém, quanto à atuação do terceiro imparcial, já que o mediador deve agir de forma mais profunda no litígio, de modo a preocupar-se com a relação pretérita entre as partes – e não se cingir apenas ao cerne da controvérsia.
Atualmente, encontra-se superada a característica específica da conciliação, acentuada por alguns doutrinadores, quiçá influenciados pelo contexto da edição da Lei 9.099/95, no sentido de que ela visaria tão somente o acordo. Com efeito, após a Resolução 125/2010 do CNJ, prevalece que esse método consensual objetiva, na verdade, a harmonização social das partes e, se possível, a restauração das relações sociais entre elas.
Daí se extraem as vantagens da conciliação, como a humanização do processo, a maior atenção despendida pelo conciliador para que haja a efetiva compreensão da solução pelas partes, a busca por um desfecho satisfatório no menor prazo possível, a confidencialidade e a informalidade. Além disso, o conciliador vale-se de técnicas multidisciplinares, a fim de incentivar o alcance, pelas partes, de uma resolução construtiva e com o enfoque prospectivo.
2.3. Da mediação
A mediação pode ser definida como o método de solução de conflitos em que um terceiro imparcial auxilia na comunicação entre as partes, sem, contudo, oferecer-lhes opções de acordo. Assim, o mediador, eleito ou aceito pelas partes, não possui poder decisório, mas estimula o desenvolvimento de soluções para os conflitos de interesses.
A propósito, as características da mediação são adequadamente descritas por Diogo Assumpção Resende de Almeida, Fernanda Medina Pantoja e Juliana Loss de Andrade:
“A mediação possui algumas características próprias, independentemente da escola ou da abordagem adotadas ou do escopo eleito. Sempre será guiada por terceiro imparcial sem poder decisório, capacitado com técnicas capazes de auxiliar os envolvidos no alcance do resultado desejado. A mediação é um método autoral, na medida em que a decisão cabe aos participantes, que mantêm o protagonismo nas suas escolhas. Conquanto sejam levadas à mediação por imposição legal ou judicial, como ocorre nos países em que sua adoção é compulsória em certos casos, os participantes podem abandoná-la a qualquer tempo. A obrigatoriedade limita-se à participação inicial, normalmente na fase de pré-mediação. Dessa forma, a voluntariedade é um de seus traços essenciais”[8].
Vale lembrar que apenas recentemente foi editado o marco legal da mediação, a saber, a Lei 13.140/15. Tal norma limitou o objeto da mediação, sobre o qual recaía discussão, e previu diversos princípios a serem observados durante o procedimento, quais sejam, a imparcialidade do mediador, a isonomia entre as partes, a oralidade, a informalidade, a autonomia de vontade das partes, a busca do consenso, a confidencialidade e a boa-fé (art. 2°).
A lei em tela inova ao prever não só a mediação judicial, mas também a extrajudicial. Nesse aspecto, as novas previsões revelam-se de grande valia, já que a mediação judicial não é suficiente para resolver o esgotamento da capacidade do Poder Judiciário, outrora enfatizado. Desse modo, não é necessário que se aguarde o ajuizamento da ação, a fim de que as partes procurem o auxílio do mediador. Aliás, antes que haja a judicialização, o nível de animosidade encontra-se mais neutro, favorecendo o alcance de um acordo entre as partes.
Outra inovação trazida pela lei consiste na mediação pública, que se torna extremamente importante quando consideramos o grande número de ações envolvendo entes da Administração Pública. Além de expressivas, as ações envolvendo entes públicos, muitas vezes, são complexas e de tramitação lenta, o que amplia as chances de o uso de métodos adequados de solução de conflitos produzirem bons resultados.
Nessa linha, confira-se a opinião de Luciane Moessa:
“Não obstante seja necessário reconhecer a peculiaridade dos conflitos envolvendo o Poder Público, ainda assim o caminho da consensualidade se revela, em muitos casos – e aí eu saliento a situação daqueles conflitos que envolvem políticas públicas –, a solução mais adequada para o problema, para não dizer a única possível, notadamente em situações em que os impasses criados geram autênticas paralisações do aparato estatal”[9].
Mister destacar, noutro giro, que, apesar de a institucionalização representar um avanço à mediação, ainda há grandes desafios a serem vencidos. A superação desses desafios perpassa pela necessidade de uma verdadeira mudança cultural, conforme bem pondera a doutrina:
“Finalmente, espera-se que, com o marco legal, a mediação se consagre como um meio realmente acessível e de qualidade no Brasil. Um grande passo foi dado, mas ele é somente o início de um caminho a ser percorrido pelos profissionais do direito e da mediação, aos quais caberá encontrar saídas práticas e adaptadas à cultura brasileira para seu exercício produtivo”[10].
Logo, não obstante a mediação tenha conquistado notável espaço, ainda é necessário o seu aperfeiçoamento e incremento, assim como em relação aos demais métodos adequados, a fim de se alcançar um cenário de resolução de conflitos verdadeiramente eficiente.
3. Necessidade de consolidação e expansão dos métodos adequados de tratamento de conflitos
Com a criação dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos (CEJUSCs) pelos diversos Tribunais, sobretudo após a edição da Resolução 125/2010 do CNJ e, posteriormente, com o novo CPC, houve um início de adoção dos métodos adequados de solução de conflitos em âmbito nacional, ainda que com níveis de intensidade variáveis.
Contudo, a simples aplicação das técnicas consensuais de conflitos dentro dos CEJUSCs, geralmente associadas a demandas já ajuizadas, é insuficiente para desafogar o Poder Judiciário e importar na prestação de um serviço de qualidade. É preciso, pois, a efetiva consolidação e expansão do uso dos métodos adequados de solução de conflitos para atingir, por exemplo, causas pré-processuais.
A utilização dos meios consensuais antes mesmo da existência de demandas judiciais tem se mostrado bastante producente, sobretudo ante a constatação de que, na fase anterior à judicialização, a animosidade entre as partes revela-se menos acirrada. A esse respeito, confiram-se os apontamentos de Fabiana Muniz:
“Tem-se que a conciliação extrajudicial se apresenta como a melhor opção para a efetividade do processo civil contemporâneo, haja vista que sequer há a existência de um processo judicial. Salienta-se que, pelo fato de ser uma conciliação que ocorre em regra em Centrais e Câmaras, fora do ambiente forense, as expectativas de conciliação são maiores, haja vista que a mera propositura de uma ação judicial, bem como o comparecimento das partes em um fórum, pode aumentar o clima de competição e rivalidade, o que reduz ainda mais as chances de autocomposição”[11].
Na mesma esteira, enfatizam Giselle Marques e Delton Meirelles:
“Ressalta-se que, em nosso entender, a mediação deveria ser um procedimento extrajudicial e também pré-processual, promovido antes da busca pelo Poder Judiciário. Vale destacar que ‘as vias extrajudiciais de resolução de conflitos são aquelas que não receberam, da parte do Estado, uma atenção específica pela institucionalização efetivada via Poder Judiciário. As pessoas envolvidas utilizam a mediação como uma prática de comunicação, como superação (não necessariamente eliminação) do conflito antes mesmo da busca pela institucionalização do litígio, seguindo parâmetros legais e socialmente aceitos pela coletividade.
(...)
Um grande benefício gerado pela mediação, ao lado da recomposição do equilíbrio social, é a sua utilização antes mesmo de o conflito se tornar judicial, podendo alcançar assim uma maior eficácia por meio de um procedimento (em seu sentido mais amplo) extrajudicial, sem a presença institucionalizadora do Estado-Jurisdição”[12].
Noutro giro, é preciso o uso da criatividade pelos Tribunais e pelos órgãos públicos para ampliar o alcance e a efetividade dos novos métodos, ao mesmo tempo em que devem ser realizadas campanhas visando modificar a cultura social, muito apegada à jurisdição tradicional[13].
A propósito, é louvável a iniciativa de alguns Tribunais no sentido de descentralizar do Poder Judiciário a condução dos métodos adequados para a solução de conflitos, a exemplo da utilização de líderes ou mesmo de pessoas da comunidade, devidamente capacitadas, para buscar pacificar conflitos de interesses existentes em uma determinada sociedade, evitando, assim, o ajuizamento de demandas judiciais.
Também deve ser incentivado o uso de novas tecnologias e de meios eletrônicos[14], de modo a possibilitar a aproximação das partes e, consequentemente, o início de uma negociação, sem necessidade de que elas estejam fisicamente presentes ao fórum ou ao ambiente de determinado Tribunal[15]. A comodidade para os participantes, aliada à redução dos custos e à celeridade, verificadas nesses casos, são evidentes.
Nessa ordem de ideias, a expansão dos métodos adequados de tratamento de conflitos para abarcar, por exemplo, demandas pré-processuais, perpassando pela utilização de projetos inovadores e de novas ferramentas tecnológicas, contribui sobremaneira para o alcance de soluções mais céleres, plenas e efetivas. Ao mesmo tempo, permite a diminuição de demandas submetidas ao Poder Judiciário, que poderá concentrar-se na análise de casos mais pontuais e complexos ou que envolvam direitos indisponíveis.
4. Conclusão
Desde o surgimento do direito pátrio, a cultura da sentença revelou-se muito forte em nossa sociedade. Tradicionalmente, os atos processuais sempre foram extremamente solenes e formais, prevalecendo a crença de que somente um juiz togado, por meio de uma sentença, seria capaz de colocar fim aos litígios.
Esse cenário começou a mudar após, sobretudo, a promulgação da Constituição Federal de 1988 e a edição da Lei 9.099/95, porquanto houve um inequívoco movimento pela ampliação do acesso à justiça e pela simplificação de procedimentos. Com a facilitação do ingresso, inúmeras novas demandas foram distribuídas para os Tribunais, abarrotando o Poder Judiciário.
A incapacidade do Poder Judiciário de responder, de forma rápida e efetiva, a todas essas ações era, pois, evidente – e, o cenário, propício ao desenvolvimento de novos métodos adequados de resolução de conflitos. Assim, tanto os meios heterocompositivos, a exemplo da arbitragem, como os autocompositivos, a exemplo da conciliação e da mediação, ganharam relevo no sistema brasileiro, o que também decorreria das inúmeras vantagens que acarretam (redução dos custos, celeridade, informalidade, confidencialidade, efetividade, resolução plena dos conflitos, entre outras).
No ano de 2010, foi editada a Resolução 125 pelo Conselho Nacional de Justiça, que instituiu a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário. Já em 2015, o novo CPC estimulou o princípio da cooperação e o uso dos meios consensuais por todos os atores do processo, além de prever a realização de audiência de conciliação como primeiro ato do processo após a citação.
Contudo, os recentes avanços legislativos não se mostram suficientes para alterar a dura realidade da massificação de conflitos. É necessária a consolidação dos métodos adequados de solução de conflitos, mormente nos Tribunais em que essas iniciativas ainda são muito tímidas, bem como a expansão do seu uso para abarcar demandas pré-processuais.
De fato, os resultados produzidos pelos meios consensuais são ainda mais frutuosos quando a tentativa de negociação ocorre antes do ajuizamento das ações judiciais. O ânimo das partes e a propensão ao alcance de um acordo são inequivocamente maiores. Nesse contexto, são louváveis as iniciativas de alguns Tribunais no sentido de valerem-se de líderes ou agentes comunitários capacitados com técnicas mediativas para auxiliarem na busca da pacificação em uma dada comunidade, assim como o uso da internet e de novas tecnologias para aproximar as partes, sem a necessidade de suas presenças físicas nos ambientes dos Tribunais.
Sem se pretender esgotar o tema, espera-se ter contribuído com uma visão crítica do atual estágio dos métodos adequados de tratamento de conflitos, bem como com a necessidade de intensificação do seu uso para a obtenção de soluções mais céleres, efetivas e justas.
5. Referências bibliográficas
BRASIL, CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Azevedo, André Gomma (org.). Manual de Mediação Judicial. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/07/f247f5ce60df2774c59d6e2dddbfec54.pdf. Brasília: CNJ, 2016. Acesso em: 23 de março de 2018.
BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. A Mudança de Cultura pela Composição de Litígios. In: Superior Tribunal de Justiça – Doutrina: edição comemorativa, 25 anos. Brasília: Superior Tribunal de Justiça, 2014, p. 488-489.
BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Métodos mais adequados de resolução de conflitos: núcleo duro da política judiciária nacional. In: Juiz Constitucional: Estado e poder no Século XXI – Homenagem ao Ministro Enrique Ricardo Lewandowski/coordenadores Monica Herman Caggiano, Claudio Salvador Lembo, Manoel Carlos de Almeida Neto. 1ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.
CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e Processo: um comentário à Lei n° 9.307/96. 3ª edição, revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Atlas, 2009.
CURY, Cesar. Poder Judiciário: novos direitos e desafios à proteção: protagonismo judicial e mecanismos de gestão de demandas. In: Segurança jurídica e protagonismo judicial: desafios em tempos de incertezas: estudos jurídicos em homenagem ao Ministro Carlos Mário da Silva Velloso. 1ª ed. Rio de Janeiro: GZ, 2017, p. 99-113.
GAIO JÚNIOR, Antônio Pereira e SANTOS, Evandro Marcelo dos (org). Reflexões do Direito Brasileiro na Contemporaneidade. Curitiba: CRV, 2017.
GRINOVER, Ada Pellegrini, WATANABE, Kazuo, COSTA, Susana Henriques da (coord.). O processo para solução de conflitos de interesse público. Salvador: Juspodivm, 2017.
GUERRERO, Luis Fernando. Os Métodos de Solução de Conflitos e o Processo Civil. São Paulo: Atlas, 2015.
HALE, Durval, PINHO, Humberto Dalla Bernardina de, CABRAL, Trícia Navarro Xavier (org.). O marco legal da mediação no Brasil: comentários à Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015. São Paulo: Atlas, 2016.
PAUMGARTTEN, Michele Pedrosa. Novo processo civil brasileiro: métodos adequados de resolução de conflitos. Curitiba: Juruá, 2015.
[1] CURY, Cesar. Poder Judiciário: novos direitos e desafios à proteção: protagonismo judicial e mecanismos de gestão de demandas. Rio de Janeiro: GZ, 2017, p. 105-106.
[2] GUERRERO, Luis Fernando. Os Métodos de Solução de Conflitos e o Processo Civil. São Paulo: Atlas, 2015, p. 5.
[3] PAUMGARTTEN, Michele Pedrosa. Novo processo civil brasileiro: métodos adequados de resolução de conflitos. Curitiba: Juruá, 2015, p. 194.
[4] BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. A Mudança de Cultura pela Composição de Litígios. In: Superior Tribunal de Justiça – Doutrina: edição comemorativa, 25 anos. Brasília: Superior Tribunal de Justiça, 2014, p. 488-489.
[5] CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e Processo: um comentário à Lei n° 9.307/96. São Paulo: Atlas, 2009, p. 31-32.
[6] BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Azevedo, André Gomma (org.). Manual de Mediação Judicial. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/07/f247f5ce60df2774c59d6e2dddbfec54.pdf. Brasília: CNJ, 2016, p. 24. Acesso em: 23 de março de 2018.
[7] BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. A Mudança de Cultura pela Composição de Litígios. In: Superior Tribunal de Justiça – Doutrina: edição comemorativa, 25 anos. Brasília: Superior Tribunal de Justiça, 2014, p. 456.
[8] ALMEIDA, Diogo Assumpção Rezende de, ANDRADE, Juliana Loss de e PANTOJA, Fernanda Medina. Fundamentos. In: O marco legal da mediação no Brasil: comentários à Lei n° 13.140, de 26 de junho de 2015. São Paulo: Atlas, 2016, p. 41.
[9] SOUZA, Luciane Moessa de. Mediação de Conflitos e Administração Pública. In: O marco legal da mediação no Brasil: comentários à Lei n° 13.140, de 26 de junho de 2015. São Paulo: Atlas, 2016, p. 228.
[10] ALMEIDA, Diogo Assumpção Rezende de, ANDRADE, Juliana Loss de e PANTOJA, Fernanda Medina. Fundamentos. In: O marco legal da mediação no Brasil: comentários à Lei n° 13.140, de 26 de junho de 2015. São Paulo: Atlas, 2016, p. 90.
[11] MUNIZ, Fabiana Miranda. A efetividade dos meios alternativos de solução de conflitos no processo civil contemporâneo. Curitiba: CRV, 2017, p. 103.
[12] MARQUES, Giselle Picorelli Yacoub e MEIRELLES, Delton Ricardo Soares. Mediadores. In: O marco legal da mediação no Brasil: comentários à Lei n° 13.140, de 26 de junho de 2015. São Paulo: Atlas, 2016, p. 121-122.
[13] Conforme bem enfatiza o ministro Marco Aurélio Buzzi, existe a necessidade de se alterar a cultura da sentença, bem como a mentalidade da sociedade, dos operadores do direito e da academia (BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Métodos mais adequados de resolução de conflitos: núcleo duro da política judiciária nacional. In: Juiz Constitucional: Estado e poder no Século XXI – Homenagem ao Ministro Enrique Ricardo Lewandowski/coordenadores Monica Herman Caggiano, Claudio Salvador Lembo, Manoel Carlos de Almeida Neto. 1ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015).
[14] Aliás, a própria Lei 13.140/15 prevê a realização da mediação por meio da internet ou por outro meio de comunicação que permita a transação à distância, desde que as partes estejam de acordo (art. 46).
[15] Como modelo da utilização de métodos alternativos e digitais para a resolução de conflitos, cite-se a ferramenta consumidor.gov, que permite ao consumidor se comunicar com empresas participantes, as quais se comprometem a dar uma resposta para as reclamações formuladas.
graduada pela Universidade de Brasília (UnB) e pós-graduada em Direito e Jurisdição pela Escola da Magistratura do Distrito Federal (ESMA-DF).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RAMOS, Fernanda Rocha. Métodos adequados de solução de conflitos: necessidade de consolidação e expansão Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 mar 2018, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/51487/metodos-adequados-de-solucao-de-conflitos-necessidade-de-consolidacao-e-expansao. Acesso em: 06 nov 2024.
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
Por: PRISCILA GOULART GARRASTAZU XAVIER
Precisa estar logado para fazer comentários.