RESUMO: O presente artigo científico objetiva analisar a teria científica da ciência do direito, com suas principais características e métodos, tema de profunda importância para os estudos em Filosofia do Direito. Trata-se de uma pesquisa descritiva, cujo método empregado é o dedutivo, pois que se utiliza de um processo de análise de informação coletada de fontes bibliográficas para se obter uma conclusão. O trabalho foi realizado por meio de pesquisas bibliográficas na área de Direito, mais precisamente na área de Filosofia do Direito e Sociologia do Direito.
Palavras-Chave: Ciência do Direito. Método. Teoria.
ABSTRACT: This scientific article aims to investigate the scientific knowledge of the science of law, with its main characteristics and methods, a topic of profound importance for studies in Philosophy of Law. It is a descriptive research, the method used is the deductive one, since it uses a process of analysis of information collected from bibliographic sources to reach a conclusion. The work was carried out through bibliographic research in the area of Law, more precisely in the area of Philosophy of Law and Sociology of Law.
Keywords: Science of Law. Theory. Method.
Introdução: Ciência Jurídica e Teoria Científica
A ciência do direito e o Direito em si (tido como disciplina social) não são contemporâneos, pois que a ciência do direito veio a se solidificar muito depois de o Direito ser tido como uma realidade social. O mesmo se pode afirmar sobre uma “teoria jurídica da ciência do direito”, sendo raramente encontrada em trabalhos filosóficos e jurídicos. As questões levantadas, ao contrário do que se pensa, são antigas e centrais. Pode-se citar, como problemas, a questão da jurisprudência ser ou não uma fonte formal do direito; ou se ela é ou não uma ciência – apesar de que atualmente ela tem um sentido restrito, sendo definida como uma interpretação em que os tribunais dão à lei, adaptando-a a cada caso concreto submetido a seu julgamento. Esse debate sobre a jurisprudência já é travado por filósofos desde o séc. XVI; em contrapartida, a teoria científica geral não deixa de exercer influência sobre a discussão da jurisprudência. As disciplinas jurídicas vêm se especializando cada vez mais, o que causa a diminuição da evidência dessa influência, mas não a influência em si.
Os juristas, devido à influência de uma teoria científica geral, passam a temer a “invasão” de suas jurisprudências pelas jurisprudências estrangeiras, já que elas trazem preceitos e fundamentos de outro sistema/ordenamento jurídico. Por outro lado, é importante o estudo da jurisprudência estrangeira para se tomar conhecimento sobre formulações e soluções de problemas originários da ciência jurídica. O debate sobre a discussão teórico-científica é de suma importância para a reflexão crítica. Desse modo, o objetivo do presente trabalho é analisar o caráter científico da ciência do direito e os seus elementos centrais, tendo como hipótese que o Direito possui caráter científico, existindo a ciência do direito com objetos e métodos próprios.
1. O Caráter Científico da Ciência Jurídica: A Perspectiva do Objeto
A noção de Direito como ciência é controversa, variando de jurista para jurista. Esse confronto de opiniões se dá por causa dos critérios utilizados para se definir o que é ciência. Para que ocorresse essa definição, seria necessária a criação de uma lista com as normas de confronto, avaliação e escolha, o que faria o conceito de ciência ser fixado com maior exatidão.
O principal critério, geralmente usado, é o de que uma ciência propicia resultados invariáveis, resultados exatos (critério proposto por Aristóteles). De acordo com Abbagnano (1999, p. 126), a objetividade é um ideal de que a pesquisa científica se aproxima à medida de que dispõe de técnicas convenientes e, como o direito visa à objetividade, o direito é uma ciência. Aftalión (1980, p. 41) diz que Ulpiano já classificara a jurisprudência (disciplina jurídica) como ciência, escrevendo no Digesto que a Ciência do Direito é a ciência do que é justo ou injusto. Em 1847, Kirchmann nega a exatidão de resultados como critério para se definir algo como ciência quando disse, em uma conferência sobre “O nenhum valor da jurisprudência como ciência” que “a ciência do direito, tendo por objeto o contingente, é também, contingente: três palavras retificadoras do legislador tornam inúteis uma inteira biblioteca jurídica” (Gusmão, 1984, p. 16). Ainda, para Radbruch (1979, p. 247):
quase todas as noções de justo e de injusto têm um condão de deitar abaixo toda a jurisprudência. Se um meridiano decide da verdade, um par de anos decide de posse. E não só isso: as leis fundamentais também mudam. O direito também tem as suas épocas. […].
Desse modo, inicialmente, o estudo sobre a cientificidade da ciência jurídica guiou-se pelo conceito de Aristóteles de ciência. A área de estudo de Aristóteles era a epistemologia e sua abordagem era empírica (naquela época não existia o Empirismo – ele ainda não havia sido desenvolvido), utilizando-se da observação (diferentemente de Platão que se utilizava da especulação). A Ciência (epistemologia), para ele, é uma disciplina metódica que analisa o ser, o objeto a partir de si mesmo, a partir de seus princípios; sendo que os elementos constitutivos daquela são a inalterabilidade e a existência do objeto de estudo.
De acordo com o doutrinador Adeodato (1996, p. 52 - 53), Hartmann se baseia nas ideias de Aristóteles (sobre o que é ciência e o que é a epistemologia) para construir sua filosofia; o ponto de partida de sua filosofia é “a questão do ser” ou “do ente enquanto ser” que estuda o ser enquanto tal, tal como ele é. Segundo Adeodato (1996, p. 52 - 53), para Hartmann, o ser não deve ser estudado através de suas manifestações, ou diversos entes particulares; não se podendo estudá-los através das evidências do que eles aparentam ser.
Ainda de acordo com Aristóteles, se a ciência jurídica se ocupar de disciplinas cujo objeto de estudo podem ser afetado por variações históricas, ela só poderá ser concebida como prudência ou arte; com base nessa afirmação, um bom argumento em favor do Direito como Ciência Jurídica é o debate sobre justiça e equidade proposto por Aristóteles, que continua tão atual quanto no tempo em que foi criado[1].
Kirchmann, como já foi dito, questiona o critério da exatidão de resultados, já que este é apenas um, para tentar afirmar o Direito como Ciência. Existem outras disciplinas, como a História, que, se fosse usado o critério da invariabilidade do objeto, seria negado a elas a classificação de ciência, pois o objeto das ciências humanas varia segundo o lugar e o tempo.
A partir disso, a ciência jurídica classifica-se como uma ciência iconográfica (que formula descrições singulares e representa ideias pictórica ou graficamente), contudo, indaga-se se a dogmática jurídica seria absolutamente gráfica, ou seja, descritiva; já que ela tem como objetivo a criação de regras jurídicas inexistentes. Faz-se um adendo apenas para citar a outra ciência dicotômica à ciência iconográfica que é a ciência nomotética (ciência que formula ou trata de leis gerais para o entendimento de um determinado evento, circunstância ou objeto).
Quanto ao aspecto do método, se a definição de ciência se der a partir do método utilizado por ela para se estudar um objeto pré-definido, então o Direito pode ser concebido como ciência, pois que ele estuda uma área do conhecimento de forma sistemática com o objetivo de acumular conhecimento.
Por fim, outro ponto de destaque é a condição para que uma atividade científica seja classificada como tal: a possibilidade do exame das afirmações proferidas. Essa condição é o resultado de um processo racionalmente controlável que tenta obter conhecimentos ordenados com o auxílio de métodos de pensamento específicos.
2. Ciência Jurídica e Teoria Científica Analítica
A Ciência jurídica, vista sob o critério da teoria científica analítica, passa a ser delimitada pela possibilidade de exame empírico. Avaliando a Ciência Jurídica sob esse prisma, podemos afirmar que ela deveria formar um conjunto de conhecimentos sistematizados adquiridos através da observação, pesquisa, identificação e explicação de determinadas categorias de fenômenos e fatos, e formulados metódica e racionalmente. Caracterizar-se-ia por sua natureza empírica e lógica, baseada em provas, princípios, argumentações ou demonstrações que garantam ou legitimem a sua validade.
A Ciência Jurídica deveria efetuar observação ou investigação minuciosa sobre as leis reguladoras da organização social, além de revelar e ter cognição direta sobre as leis reguladoras da natureza social do homem e do ordenamento jurídico das inúmeras sociedades humanas.
De acordo com esse ponto de vista, a Ciência Jurídica teria a função de – além de descrever os atos legislativos e judiciais – fazer uma previsão das sentenças judiciais. Contudo, a análise da Ciência Jurídica sob o prisma analítico empírico causaria “mutilações” no Direito, pois o juiz não pode emitir sua decisão antecipadamente fundamentada em critérios empírico-sociológicos, já que a Ciência Jurídica seria, antes de tudo, uma ciência dogmática; não satisfazendo, então, o critério de sentido empírico. Além disso, de acordo com o empirismo lógico, só a lógica e a matemática podem exigir a classificação de ciência.
A cientificidade de uma disciplina, mais exatamente uma ciência da observação, não está no método utilizado por ela para acúmulo de conhecimento, mas sim no seu grau de intersubjetividade. Consequentemente, pergunta-se se há um sistema de controle da evidência da observação no domínio jurídico.
Responde Eike von Savigny essa questão. Ele se baseia na ciência jurídica penal alemã quando diz que ela é um sistema normativo que pode ser falsificado por juízos de valor. Por juízos de valor, entendem-se as concepções ético-morais de cada um, e como cada um faz uso das doutrinas deontológicas.
A Ciência Jurídica, segundo os estudos de Savigny, mostra-se descuidada em relação aos desenvolvimentos das teorias científicas em geral. Ainda é matéria de estudos e pesquisas até onde vai a semelhança entre as ciências empíricas e a Ciência Jurídica, levando-se em consideração o fato de que o Direito, além de admitir argumentos que exprimem valores, também admite argumentos históricos, lógicos, sistemáticos etc.
3. O Modelo de Falsificação no Saber Jurídico
Neste ponto, é importante abrirmos um parêntese para avaliar o que o pensador Karl Popper pensa sobre o empirismo e o método indutivo usado por ele; análise esta que pode ser transportada para a discussão jurídica aqui estabelecida. Para Popper, a ciência, que pretender utilizar o raciocínio indutivo como método, deve entender que uma proposição universal não pode ser derivada de observações particulares.
Popper discordava de que uma ciência devesse sempre estar em busca da verdade, ele estava ciente das potencialidades e das fragilidades humanas e por isso não deveríamos buscar a verdade das teorias (ou tentar criar teorias verdadeiras), mas sim buscar provas de falsidade nas teorias que temos. Contudo, uma inferência indutiva não permite a justificação de um enunciado universal, por exemplo: se fizéssemos uma pesquisa sobre a cor do cisne e depois de certo tempo só tivéssemos visto cisnes brancos, não podemos afirmar que todos os cisnes são brancos; pois, na verdade, não vimos todos ainda. E ainda que tivéssemos visto todos os cisnes, ainda assim não poderemos afirmar que todos são brancos pois ainda não vimos os que estão dentro dos ovos.
As estruturas lógicas das ciências empíricas se baseiam nas proposições universais, o que quer dizer que o conhecimento desenvolvido por aquelas tem apenas um caráter transitório, e que estas podem ser apenas confirmadas indiretamente.
A utilização do método de falsificação é questionável na dogmática jurídica, por exemplo: de acordo com a dogmática jurídica se uma pessoa se apossar de algo alheio, ela deverá ser punida. Essa norma não pode ser falseada com base na prova de que uma pessoa não deva ser punida por esse crime.
Outra questão a ser levantada é saber se o único método do acúmulo de conhecimento jurídico é a falsificação. Isto estaria certo se as proposições da dogmática forem corrigíveis, excluindo-se a prova irrefutável de sua exatidão ou excluindo-se sua verificação. As teorias do saber jurídico não devem ser restringidas ao método do falseamento ou da verificação; elas devem ser fundamentadas em argumentos positivos a seu favor.
O princípio da indução, contudo, não deve ser usado como prova, pois que os processos intelectuais de tentativa e de experimentação são os princípios fundamentadores. Os processos de invenção (tendo por significado a elaboração de uma solução adequada para um problema social definido) e descoberta, possibilidades não excluídas, possibilitam à ciência jurídica uma dinâmica, um progresso dentro do saber jurídico.
4. Problemas da Formação de Conceitos Jurídicos e as Teorias na Dogmática Jurídica
O conhecimento jurídico, em parte, se baseia em conceitos abstratos, tais como “pessoa jurídica”, “propriedade” etc (conceitos teóricos) que não podem ser transformados em dados empíricos, pois esses conceitos são base (princípios gerais do direito) para a formulação de normas. O que se pode fazer é uma dupla leitura sobre esses conceitos, como “propriedade”, lendo-se ela tanto como consequência quanto como ponto de encontro entre as possibilidades do seu emprego. Dessa forma, entender-se-ia “propriedade” como a ligação direta das condições (quem tem uma coisa móvel em seu poder durante 10 anos), ou como as consequências jurídicas pela aquisição da propriedade (a pessoa que adquire uma propriedade pode usá-la como bem quiser).
Faz-se mister, nesse trabalho, uma conceituação de princípio geral do direito: dentre as diversas literaturas jurídicas, a descrição mais precisa é a de Orlando Gomes (1971, p. 55) que diz que os princípios gerais do direito seriam regras gerais induzidas pela Ciência e pela Filosofia do Direito tendo cunho de universalidade. Também tem-se a descrição de Batista e Costa (2006, p. 233), para os quais: “os princípios gerais do direito são aqueles princípios em que se assenta a legislação positiva e, embora não se achem formulados em nenhum lugar, formam o pressuposto lógico necessário das várias normas dessa legislação”. Em suma, princípios gerais são mandamentos nucleares do sistema jurídico, uma espécie de norte, de farol que guia o intérprete da lei, são normas jurídicas abertas que trazem um conteúdo de relevância histórica e que são passíveis de valoração.
As teorias da dogmática jurídica não são necessariamente semelhantes (em estrutura) às teorias das ciências empíricas. O significado da palavra “teoria” pode coincidir nos dois casos, contudo pode também indicar uma confusão sobre o status teórico-científico de uma teoria.
Por “teoria”, compreende-se o conjunto de conhecimentos (ou princípios básicos) de caráter hipotético ou sintético, metódico, especulativo e organizado que norteiam uma disciplina e que cria regras ou leis sistematicamente organizadas aplicadas a uma determinada área; e que tem como consequência uma doutrina ou conjunto de opiniões e ideias sobre um dado tema que tem como objetivo o esclarecimento de um ou mais problemas (Guimarães, 1995, p. 521). Logo, a estrutura de fatos desconhecidos será a mesma da dos fatos desconhecidos que apresentam o mesmo prognóstico, sendo funções complementares das teorias científicas os prognósticos e as explicações. Por prognóstico, entende-se a suposição que traça o provável desenvolvimento futuro ou o resultado de um processo (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2009, p. 1558).
As teorias dogmáticas do direito e as funções complementares das teorias científicas possuem algumas semelhanças, quais sejam: explicar princípios jurídicos dados e colocar à disposição conceitos ainda não dados – função heurística, ou seja, cria uma “hipótese de trabalho que, a despeito de ser verdadeira ou falsa, é dotada do título de provisória como ideia diretriz na investigação dos fatos” (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2009, p. 1017); e facilitam as matérias jurídicas de forma didática devido as suas estruturações. Dessa forma, estabelece-se a semelhança entre as ciências empíricas e as teorias dogmáticas, tanto em função da relação prognóstica das ideias quanto em relação às funções explicativas.
Nas ciências empíricas, as teorias são concatenadas a determinadas realidades, contudo são livres em relação à escolha e ao domínio dos objetos enquanto estão apenas em abstrações teóricas. Em relação às ciências dogmáticas, são as teorias que fazem parte do objeto, ou seja, as teorias são os objetos das legislações; sendo que é o próprio direito que delimita as suas regulações (tanto em sentido vertical – teorias dogmáticas e metodologia – quanto horizontal – domínio juridicamente indiferente).
É importante salientar que o direito possui competência tanto dentro de seu domínio externo quanto no seu metadomínio, ou seja, o legislador possui competência para legislar normas morais e para positivar normas morais. As teorias dogmáticas só tem caráter normativo quando estão dentro da jurisdição do legislador, a partir do momento em que ela sair da jurisdição dele, passará a ter caráter cognitivo.
As teorias dogmáticas – até certo ponto – também estão sujeitas à abertura cognitiva, ou seja, estão sujeitas tanto à consistência interna quanto à externa. Por causa disso, as teorias dogmáticas estão entre a formulação/estabelecimento de normas e o conhecimento/organização delas, o que torna difícil estabelecer se as teorias dogmáticas são teorias em sentido técnico.
5. O Saber Jurídico Como Ciência de Ação
O saber jurídico é ambíguo, pois pode ser entendido como um conhecimento estabelecedor de normas imperativas (formulando conhecimentos dogmáticos) ou como um conhecimento descritivo. Dessa forma, ele é uma disciplina dogmaticamente jurídica, já que serve para preparar as sentenças judiciais e serve como conjunto de normas jurídicas válidas/não-válidas e como normas jurídicas problemáticas (passa a entender-se o direito como objeto do domínio jurídico).
Mas, se for estabelecido como domínio do objeto do saber jurídico a criação e a aplicação do direito, então a função do saber jurídico será o de estabelecer as fundamentações e exames das decisões jurídicas.
Com efeito, o saber jurídico é uma ferramenta/tecnologia social, ou seja, ele é um instrumento que esclarece a validade factual e esclarece a regulação jurídica. A não demarcação de fronteiras entre uma norma e uma declaração sobre norma, resulta na afirmação do saber jurídico de que ele é uma ciência dogmática; sendo que as proposições do saber jurídico são declarações sobre normas, estas, por sua vez, não são normas em si mesmas. O saber jurídico, como já foi dito, é um instrumento social, orientando-se para a prática e tendo por objetivo a divulgação de propostas de normas que se quer positivar.
Para Ferraz Jr. (2011), o Estado, assim como o Direito, tomou para si funções que vão além da ética e além da repressão (como era no Estado Romano); o Direito e o Estado, hoje, têm funções de controle premunitivo, dando ênfase às normas de organização sem atribuir a elas uma sanção em caso de não cumprimento/indisciplina. Isso cria um direito sistematizado, com condições para que haja uma maior eficiência quanto a decibilidade de conflitos juridicamente já definidos.
Contudo, deve ser indagado se a autolimitação do saber jurídico é desejável e possível, o que muitos juristas respondem negativamente, pois a limitação do saber jurídico diminuirá as possibilidades de interpretação e as possibilidades de respostas às perguntas feitas. Além disso, a argumentação será reduzida ao argumento consequencialista se for utilizada somente a interpretação sociotecnológica.
Não interessa saber se o saber jurídico é uma tecnologia social orientada sob o ponto de vista axiológico; já que, por valor, deve-se entender uma avaliação das consequências de uma interpretação. O que não terá espaço dentro do modelo sociotecnológico será a conciliação entre a decisão concreta e a lei.
Resta saber se é desejável que a tecnologia social restrinja o saber jurídico. Deve ser notado que a definição de funções é adequada para simplificar ou resolver o problema das decisões subjetivas (pseudo-denominadas de conhecimentos científicos).
Além disso, o saber jurídico é alopoiético, ou seja, recebe influências de outras disciplinas e de outros saberes, como a religião, a política, a economia etc; e que, de certa forma, tornam-se necessárias à efetiva realização/aplicação do direito e da justiça. Por isso, uma das funções do saber jurídico é tornar o jurista consciente para os fatores que influenciam determinam os conhecimentos jurídicos que se obtêm através da alopoiese (fatores extralegais); fatores estes que são: preferências politicas, preconceitos, informações tendenciosas etc. Isso demonstra que a dogmática e a prática jurídica tem, de certa forma, um caráter político.
Esta é uma matéria de explanação para vários juristas. Para Aftalión (1980, p. 84), a Sociologia do Direito deve se ocupar dos processos que condicionam e determinam o desenvolvimento do direito. Desse modo, seria função do sociólogo jurídico procurar as causas e os porquês dos ocorridos no direito, assim como descrever as condições sociais do meio e de formular leis gerais, causais, indutivas e de valores empíricos que levaram o direito e a decisão judicial a serem como são.
Segundo Gusmão (1984, p. 34), a Sociologia Jurídica deve estudar os fatores de transformação, desenvolvimento e declínio dos fenômenos socioculturais que influenciam o direito, indicando a relação dos direitos com as estruturas sociais, culturais e institucionais, demonstrando que o direito é o resultado de um conjunto cujos componentes são a política, a economia, a moral, a religião, a geografia e a demografia.
Nardi-Greco (1907) estipula, em seu livro Sociologia Giuridica, a função desta, que é o de analisar as causas e funções sociais do direito, insistindo que a estrutura do direito é modelada pela estrutura econômica da sociedade. Todas essas afirmações sobre a Sociologia Jurídica são corroboradas por Ascenção (2001, p. 109) quando ele diz que a relação entre a ordem jurídica e a estrutura social global pode ser vista sob diversos ângulos, tendo o sociólogo e o jurista que se indagar sobre as maneiras como o direito se manifesta e quais fatores o influenciam.
Se se quiser analisar as sentenças dos juízes (como também as consciências deles), então se faz necessário um critério de correção das sentenças, ou seja, um padrão da “verdade” de princípios jurídicos – não se podendo fazer uma concordância entre esses princípios jurídicos e normas. É adequado se adotar para a definição dessa “verdade” o conceito de verdade da “teoria do consenso” que diz que a condição de verdade das proposições é um consenso (uma concordância entre todos para se estipular o que é a verdade).
A teoria do consenso possui dois pontos positivos: permite atribuir valores a normas e evita a ameaça de uma verdade factual e objetiva. Logo, a “verdade” é um argumento, uma fundamentação convincente sobre determinado ponto de vista; o que faz com que a teoria científica do saber jurídico desemboque em uma teoria da argumentação jurídica.
Conclusão
O Direito, por muito tempo, foi visto como uma categoria estranha às ciências, sendo descaracterizada qualquer tentativa de conferir caráter científico a ele, pois que possui a si próprio como objeto (sendo continente e conteúdo). Entretanto, com o passar dos anos e o crescimento da influência dos seus estudos e dos seus estudiosos/doutrinadores, começou-se a desenvolver teorias e trabalhos científicos que apontavam e enquadravam o Direito como uma ciência, ou ao menos como tendo uma ciência para a sua investigação.
Atualmente, tornou-se consenso entre os estudiosos e jurisconsultos que o Direito possui caráter científico, existindo a ciência do direito com objetos e métodos próprios. Dessa maneira, desenvolveu-se a ciência jurídica como sendo um conjunto sistematizado de princípios, regras e paradigmas que tem como finalidade regular o estudo do ordenamento jurídico através de um método que permitirá verificar e analisar a estrutura do ordenamento.
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[1] Paulo Nader, Aftalión, Juarez Freitas e Del Vecchio, tratam desse tema em seus livros, respectivamente em: Filosofia do Direito, p. 109 – 112; Introducción ao Derecho, p. 42; As Grandes Linhas da Filosofia do Direito, p. 23 – 26; e Lições de Filosofia do Direito, p. 44 – 50.
Especialista em Direito Processual Civil pela Faculdade Damásio, Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, advogado
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTANA, Guilherme Sabino Nascimento Sidrônio de. A teoria científica da ciência do direito Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 dez 2020, 04:25. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/56002/a-teoria-cientfica-da-cincia-do-direito. Acesso em: 23 dez 2024.
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