RESUMO: O presente estudo trata sobre a terceirização na Administração Pública, na hipótese de impossibilidade comprovada da prestadora dos serviços de satisfazer as obrigações trabalhistas em relação aos seus empregados, em que surge o dever do tomador e beneficiário direto do trabalho em responder subsidiariamente. De início, é apresentada a conceituação e um breve histórico sobre a terceirização no ordenamento jurídico brasileiro, trazendo informações acerca das normas iniciais que consolidaram a ideia de responsabilização, inclusive no âmbito da Administração Pública, como o Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967 e a edição da Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que atribuiu responsabilidade subsidiária do tomador de serviços com relação ao inadimplemento dos direitos trabalhistas dos empregados terceirizados. Alterações posteriores dos termos da mencionada Súmula possibilitaram a responsabilização subsidiária da Administração Pública apenas na hipótese quando evidenciada sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666, de 21.06.1993, com a devida fiscalização e efetivo acompanhamento da execução do contrato quanto à quitação dos débitos trabalhistas. Após o que, foram analisadas as possibilidades de atribuição de culpa à Administração Pública, que deve ter muita cautela na licitação ao selecionar a empresa, especialmente na análise de exequibilidade da proposta. (culpa in eligendo). E a fiscalização dos contratos deve ter um acompanhamento e/ou fiscalização mensal pela empresa da quitação dos débitos trabalhistas. É o efetivo conhecimento e controle da execução do contrato que vai minimizar a responsabilidade da Administração Pública e possíveis condenações futuras na Justiça do Trabalho, almejando que seja afastada a culpa in vigilando e, consequentemente, sua condenação subsidiária ao pagamento dos créditos trabalhistas que decorrem da terceirização.
PALAVRAS-CHAVE: Direito do Trabalho. Terceirização. Responsabilidade subsidiária da Administração Pública.
ABSTRACT: This study deals with outsourcing in Public Administration, in the event of a proven impossibility of the service provider to meet the labor obligations in relation to its employees, in which the borrower and direct beneficiary of the work is obliged to respond in a subsidiary way. Initially, the concept and a brief history of outsourcing in the Brazilian legal system is presented, bringing information about the initial rules that consolidated the idea of accountability, including in the scope of Public Administration, such as Decree-Law No. 200, of 25th of February 1967 and the edition of Precedent No. 331 of the Superior Labor Court, which attributed the subsidiary responsibility of the service taker in relation to the non-compliance with the labor rights of outsourced employees. Subsequent amendments to the terms of the aforementioned Precedent allowed the subsidiary liability of the Public Administration only in the event that its negligent conduct in complying with the obligations of Law No. 8666, of 06.21.1993, with due inspection and effective monitoring of the execution of the contract regarding the discharge is evidenced of labor debts. After that, the possibilities of attributing blame to the Public Administration were analyzed, which must be very cautious in the bidding process when selecting the company, especially in the analysis of the feasibility of the proposal. (guilt in eligendo). And the inspection of contracts must have monthly monitoring and/or inspection by the company of the settlement of labor debts. It is the effective knowledge and control of the execution of the contract that will minimize the responsibility of the Public Administration and possible future convictions in the Labor Court, aiming to remove the guilt in vigilando and, consequently, its subsidiary conviction to pay the labor claims arising from the outsourcing.
SUMÁRIO: Introdução – 1. DA TERCEIRIZAÇÃO. 2. CONCEITO DE TERCEIRIZAÇÃO. 3 EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 72/2013: 4. TERCEIRIZAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. 5. A SÚMULA Nº 331 DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO E AÇÃO DIRETA DE CONSTITUCIONALIDADE Nº 16/2007. 6. Conclusão. 7. Referências.
INTRODUÇÃO
O tema do presente trabalho consiste em falar sobre terceirização, mais especificamente sobre culpa in vigilando da Administração Pública em contratos com as prestadoras de serviços terceirizadas. Pretende-se abordar e aprofundar a terceirização no setor público, quando os encargos trabalhistas não são adimplidos pela empresa prestadora dos serviços contratados pela Administração Pública.
O problema apresentado nesta pesquisa pode ser resumido da seguinte maneira: O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, porém de que forma a atuação do ente fiscalizador pode se mostrar suficiente e satisfatória para atender aos requisitos da Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho? A hipótese explorada está na resposta positiva ao problema, em busca de demonstrar que a fiscalização efetiva do ente público pode inibir sua responsabilização, considerando que a Constituição Federal consagra o valor social do trabalho e a dignidade da pessoa humana como fundamentos da República Federativa do Brasil, não sendo razoável que alguém que se beneficiou de forma considerável do trabalho não responda, sob nenhum aspecto, pelos direitos trabalhistas desencadeados desse pacto laboral, o que seria abuso de direito, e vedado pelo ordenamento jurídico. A posição de responsável subsidiário do Ente Público existe para resguardar os direitos individuais e coletivos dos obreiros que colocaram a sua força de trabalho à disposição e, também, do tomador, que assume, assim como a empresa prestadora de serviço, o risco do empreendimento.
O objetivo central do trabalho consiste emanalisar a culpa in vigilando, que caracteriza a responsabilidade subsidiária da Administração Pública por encargos trabalhistas não cumpridos na contratação de serviços terceirizados. Demonstrar as possibilidades de atribuição de culpa à Administração Pública, tendo em vista a má escolha do prestador de serviços (culpa in eligendo) ou a omissão estatal no cumprimento do dever legal de acompanhamento e fiscalização da execução dos contratos (culpa in vigilando). Verificar se o ônus de referida prova compete ao trabalhador, que alega a falta de fiscalização, ou ao Ente Público, que afirma que o inadimplemento ocorreu apesar da fiscalização realizada. Explicar que a responsabilidade subsidiária da Administração Pública não é automática, sendo necessárias contundentes provas de falhas na atividade de fiscalização, as quais devem estar conectadas pelo nexo de causalidade aos danos sofridos pelos empregados terceirizados.
Como se trata de um tema recente, o legislador pátrio somente preocupou-se em disciplinar o fenômeno da terceirização diante do surgimento das novas formas de organização da atividade produtiva, como a amplitude da terceirização das atividades-meio da Administração Pública no Brasil com o intuito de facilitar a execução de suas atividades-fim justificam a importância do tema, de grande relevância no ramo do direito do trabalho e administrativo.
A diversidade de casos de condenação subsidiária de entes públicos nos contratos de terceirização, que depende da análise de cada caso separadamente, buscando a apuração da conduta culposa da Administração, confirmada pela má escolha do prestador de serviços ou pela ausência da adequada fiscalização da execução contratual, vem gerando uma série de iniciativas do Poder Público, como a edição constante de Instruções Normativas e outros instrumentos legais utilizados para regular a fiscalização e execução de contratos.
O efeito da terceirização passou a ser mais encontrado e “aceito” inicialmente nas instituições privadas, pois ficou permitida para além dos casos antes definidos, bastando a atividade não estar relacionada com a atividade-fim da empresa.
Já quando se fala em setor público, constata-se que a terceirização de serviços pela administração pública é aceita e dentro da legalidade quando diz respeito às atividades-meio, não sendo cabível quando for destinada ao exercício de atribuições próprias dos servidores de cargos efetivos próprios dos quadros do respectivo ente contratante, ou para o exercício de funções relativas ao poder de polícia administrativa ou prática de atos administrativos.
A responsabilização subsidiária da Administração Pública vem sendo constante em inúmeros casos sob análise da Justiça do Trabalho, o que merece estudo para que possa ser explicitado pela conduta culposa do órgão público na condução da fiscalização contratual.
A terceirização é uma ferramenta de gestão muito utilizada pelas instituições com vistas à redução de custos e aumento de produtividade e qualidade dos seus produtos ou serviços, pois permite uma maior concentração dos seus esforços em suas atividades-fim para as quais foram estabelecidas, considerando que as atividades-meio são repassadas a outras empresas especializadas na realização daqueles serviços secundários existentes.
Algumas atividades-fim, em casos específicos podem ser repassadas à terceirizadas, como nos casos de trabalho temporário, porém a essência da terceirização é repassar algumas ou todas as atividades acessórias da empresa, de modo que ela possa se dedicar integralmente ao escopo de sua constituição.
2 CONCEITO DE TERCEIRIZAÇÃO
Em todas as instituições, sejam públicas ou privadas, existem atividades a serem realizadas que, em conjunto, servem de “apoio” para a realização ou entrega dos seus serviços ou produtos finais. Atividades que são necessárias, mas que podem ser realizadas por “terceiros”, tais como manutenção, limpeza, conservação, segurança, vigilância, entre outras.
O conceito de terceirização pode ser definido como o processo pela qual a empresa deixar de fazer ou produzir algumas atividades secundárias que realizava diretamente e transferem essas atividades a outras empresas. Esse processo sempre ocorre com a contratação de uma empresa que, no caso, é a intermediária entre o tomador de serviço e a mão-de-obra, com um contrato de prestação de serviços.
É importante ressaltar que existe uma relação de emprego entre o trabalhador e a empresa terceirizada, prestadora de serviços, e não diretamente com quem contrata estes serviços.
O termo “terceirização” advém de um neologismo da expressão terceiro, no sentido de “intermediário”. Este termo foi evidenciado pelo setor de administração de empresas como forma de expressar a descentralização de atividades de uma empresa para outras especializadas naquele tipo de serviço. (DELGADO, 2017, p.502).
Segundo o mesmo autor, a terceirização caracteriza-se pela existência de três sujeitos, chamada de relação trilateral ou triangular, pois existe um terceiro sujeito, o intermediador da mão de obra, mais conhecido como prestador de serviços. Pode-se verificar que a terceirização é resultado do que é feito pelo trabalhador, pelo intermediador dessa mão de obra (prestador de serviços) e pelo tomador dos serviços.
Caso não exista esse tripé, não há como ser considerada uma terceirização, passando a configurar uma relação de emprego diretamente com a instituição contratante.
Delgado (2017) diz ainda que a terceirização para o Direito do Trabalho pode ser conceituada como o fenômeno pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação jus trabalhista que lhe seria correspondente. Por tal fenômeno insere-se o trabalhador no processo produtivo do tomador de serviços sem que se estendam a este os laços jus trabalhistas, que se preservam fixados com uma entidade interveniente. A terceirização provoca uma relação trilateral em face da contratação de força de trabalho no mercado capitalista: o obreiro, prestador de serviços, que realiza suas atividades materiais e intelectuais junto à empresa tomadora de serviços; a empresa terceirizante, que contrata este obreiro, firmando com ele os vínculos jurídicos trabalhistas pertinentes; a empresa tomadora de serviços, que recebe a prestação de labor, mas não assume a posição clássica de empregadora desse trabalhador envolvido.
Segundo os ensinamentos de Nascimento (2004, p. 559/560), a terceirização pode ocorrer na espécie terceirização de serviços e ou terceirização de mão de obra. Há uma diferença na terceirização da mão de obra para a de serviços, pois a empresa que terceiriza (tomadora dos serviços) contrata outra empresa (fornecedora dos serviços), para que esta lhe preste os serviços que foram repassados por meio de trabalhadores qualificados para o desenvolvimento das atividades dentro dos estabelecimentos da contratante. Já a terceirização de serviços é aquela em que uma empresa transfere à outra a execução de determinados serviços a serem prestados fora do seu estabelecimento.
Neste contexto, é possível compreender que o propósito existencial e histórico da terceirização é transferir à empresa prestadora de serviços as atividades que não representam o objetivo principal do tomador, e não toda e qualquer atividade deste último.
Assim, com a celebração do contrato entre as empresas tomadora e a prestadora de serviços, os empregados da terceirizada são direcionados para trabalhar em favor da primeira, formando-se a relação trilateral ou triangular.
3 HISTÓRICO DA TERCEIRIZAÇÃO
A terceirização remete à época da revolução industrial, por volta do século XVIII, quando surgiram as primeiras leis trabalhistas e as entidades sindicais que buscavam melhorias nas condições precárias de trabalho a que eram submetidos os empregados.
A revolução industrial trouxe melhorias para o setor de produção, com a utilização de diversas máquinas que reduziram a necessidade de mão de obra e, logo, acarretaram o desemprego de milhares de pessoas. Em consequência, muitos obreiros que perderam seus empregos por terem sido substituídos pelas máquinas, passaram a ser opção para prestação de serviços sem vínculo empregatício para essas indústrias.
Após esse período da Revolução industrial e posteriormente com os avanços tecnológicos e a globalização foi que surgiu o movimento da terceirização do trabalho, que anteriormente era realizado pelos empregados da empresa e passaram a ser realizados por obreiros contratados sem vínculo empregatício.
Já no Brasil, o advento da terceirização explodiu no século XX com a indústria automobilística que cresceu no mercado interno, com as famosas linhas de montagem dos produtos e sendo chamadas de “montadoras”.
Devido à falta de regulamentação na época, além os incentivos recebidos do governo para alavancar a economia do país, essas empresas encontraram na terceirização um meio de aumentarem suas produções, mas com a diminuição dos encargos trabalhistas e previdenciários.
4 TERCEIRIZAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
As empresas privadas enxergavam na terceirização a possibilidade de redução de custos bem como para aperfeiçoar as atividades presentes que culminam com seu produto final e aumentar suas produtividades, a qualidade dos seus produtos ou serviços e, principalmente, os seus lucros.
No caso da Administração Pública, o poder público buscou meios para “desafogar” o Estado de atividades que, supostamente, poderiam ser realizadas de modo mais eficiente por particulares, buscando descentralizar as atividades da alçada da Administração, que são consideradas como apoio para realização da atividade principal.
O Decreto-lei 200/67 trata da terceirização de atividade, de serviços (FERRAZ, Pag.2) e fala de desobrigar-se da realização material de tarefas, as quais não são típicas de órgão ou de entidades administrativas, podendo ser desempenhadas por terceiros, sem infringir a regra do artigo 37, II, da Constituição Federal.
As demandas trabalhistas que buscam comprovar a existência de responsabilidade subsidiária ou não do Ente Público pelos débitos trabalhistas de sua contratada, prescindem da existência do vínculo empregatício entre o trabalhador e o tomador do serviço, pois nesses casos o trabalhador não postula o reconhecimento do vínculo de emprego direto com o Ente Público, mas sim a sua condenação subsidiária, conforme o que dispõe o art. 71, § 1º, da Lei 8.666/93, já que se presume como verdadeira a prestação de serviços, nos termos dos artigos 336 e 341 do Código de Processo Civil.
A contratação do reclamante nos casos de responsabilidade subsidiária se dá pela empresa prestadora do serviço e a atividade desempenhada é em prol do tomador, o contratante. Não é possível dispensar a Administração Pública da responsabilidade pelos encargos trabalhistas não quitados pela contratada, pois não pode usufruir da força de trabalho do empregado, mesmo que a relação de emprego se dê entre o trabalhador e a empresa prestadora do serviço, sem assumir nenhuma responsabilidade nas relações jurídicas das quais é parte.
Quando descumpridas as normas de fiscalização do contrato de prestação de serviços celebrado, fica configurada a culpa in vigilando do Ente Público, visto que não foram observadas as disposições acerca da fiscalização da execução, presentes nos artigos 58, III, e 67,§1°, da Lei nº 8.666/93, in verbis:
Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de
III - fiscalizar-lhes a execução;
(...)
Art. 67. A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição.
§ 1º O representante da Administração anotará em registro próprio todas as ocorrências relacionadas com a execução do contrato, determinando o que for necessário à regularização das faltas ou defeitos observados.
Essa é uma falha por parte da Administração Pública, prática administrativa que não compatibiliza com o art. 71 da Lei nº 8.666/1993, caracterizando a sua culpa e consequentemente não podendo se falar em transferência “automática” da responsabilidade ao Poder Público.
O Ente Público não pode se valer de suas prerrogativas para se eximir de suas obrigações legalmente previstas, enquanto beneficiário do serviço terceirizado, e sim, o Estado tem o dever de colaborar com todos os procedimentos necessários para evitar quaisquer violações trabalhistas provocados por seus contratados.
É importante ressaltar que mesmo que o contrato tenha sido celebrado após procedimento licitatório legítimo com a prestadora de serviços não se pode eliminara responsabilidade subsidiária da Administração Pública pelos créditos trabalhistas do trabalhador. Isso porque, se for comprovado o descumprimento das obrigações trabalhistas pela empresa terceirizada, deve o contratante ser responsabilizado, pois incide em culpa in eligendo, por conta da má escolha na contratação, ainda que tenha selecionado por meio licitatório.
Além do mais, a contratação dos empregados pela empresa prestadora de serviços é pelo interesse público, pois presta seus serviços em nome da Administração Pública, a favor de toda a coletividade.
A condição de responsável subsidiário do Ente Público serve para resguardar os direitos individuais e coletivos dos obreiros que colocam a sua força de trabalho à disposição, também, do tomador, que assume, assim como a empresa prestadora de serviço, o risco do negócio.
A Constituição Federal consagra o valor social do trabalho e a dignidade da pessoa humana como fundamentos da República Federativa do Brasil, não sendo razoável que alguém que se beneficiou de forma considerável do trabalho não responda, sob nenhum aspecto, pelos direitos trabalhistas que se formaram desse pacto laboral, o que seria abuso de direito, vedado pelo ordenamento jurídico.
É importante ressaltar que no julgamento da ADC nº 16 - DF na sessão do dia 24 de novembro de 2010, o Supremo Tribunal Federal considerou constitucional o art. 71 da Lei nº 8.666/93, consignando expressamente a sua posição de que o citado dispositivo da Lei de Licitações não afasta o reconhecimento da responsabilidade subsidiária à administração pública nos casos em que fique comprovado que agiu com culpa in vigilando, ao não fiscalizar o adimplemento dos direitos trabalhistas.
O Ministro Relator Cezar Peluso manifestou-se, por meio de fl. 1.225 da LTr, vol. 75, nº 10, de outubro/2011, no seguinte sentido:
Realmente, a mera inadimplência do contratado não transfere a responsabilidade nos termos do que está na lei, nesse dispositivo. Então esse dispositivo é constitucional. Mas isso não significa que eventual omissão da administração pública na obrigação de fiscalizar as obrigações do contratado não gere a responsabilidade à administração. É outra matéria, são outros fatos, examinados à luz de outras normas constitucionais. Então, em outras palavras (...), nós não temos discordância sobre a substância da ação, eu reconheço a constitucionalidade da norma. Só estou advertindo ao tribunal que isso não impedirá que a Justiça do Trabalho recorra a outros princípios constitucionais e, invocando fatos da causa, reconheça a responsabilidade da administração, não pela mera inadimplência, mas por outros fatos (...).
Nesse mesmo caminho, a Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho, nos itens V e VI, atribui responsabilidade ao Ente Público que, de alguma forma, beneficiou-se do trabalho, mesmo que tenha sido por intermédio de empresa terceirizada, senão vejamos:
V- Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666/93, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
VI - A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.
A observação dessa súmula é de primordial importância, pois representa o fruto da harmonização de vários princípios e da interpretação de dispositivos legais e constitucionais, não podendo se falar em qualquer violação à legislação federal ou à Carta Magna, sendo, assim, imprescindível para a efetivação dos direitos fundamentais do trabalhador.
A teoria do risco assumido pelo tomador ao contratar prestador de serviços que não é o mais preparado deve ser considerada, ainda que por meio de processo licitatório, e o princípio da proteção que justifica a preocupação de não deixar ao desabrigo o trabalhador que dispensou sua força de trabalho em prol do ente estatal. A responsabilidade do tomador de serviços deve ser analisada também à luz dos princípios e regras constitucionais que visam, no geral, à proteção do trabalhador na dupla qualidade de empregado e cidadão.
Ratificando esse entendimento, Arion Sayão Romita defende que:
...por ter a Constituição de 1988 elevado a dignidade da pessoa humana à categoria de valor supremo e fundante de todo o ordenamento brasileiro, fácil é atribuir aos direitos sociais a característica de manifestações dos direitos fundamentais de liberdade e igualdade material porque, encarados em sua vertente prestacional (...), tais direitos tem por objetivo assegurar ao trabalhador proteção contra necessidades de ordem material, além de uma existência digna.” (EBERT, Paulo Roberto Lemgruber. A responsabilidade subsidiária da administração pública por obrigações trabalhistas devidas a terceirizados - negritei.
Nesse caminho, essa situação atrai a incidência da Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que nos seus incisos IV, V e VI, impõe a responsabilidade daquele que, de alguma forma, se beneficiou do trabalho humano, ainda que por intermédio de empresa terceirizada, senão vejamos:
(...)
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.
Por fim, é necessário registrar que a Súmula 331 do TST não colide com a Lei nº 8.666/93, na medida em que ambas devem estar em harmonia com o art. 1º, incisos III e IV, da Constituição Federal de 1988, assim como a constitucionalidade do art. 71, da citada lei.
A Administração Pública não pode ser responsável pelas obrigações trabalhistas existentes de quem contratou para a prestação de determinados serviços, porém possui o dever e a obrigação de escolher dentre as opções uma empresa idônea, com a devida regularidade fiscal e trabalhista, além do dever de fiscalizar no decorrer do contrato de trabalho a continuidade da regularidade da empresa e, em caso de perda superveniente dos requisitos de habilitação do contratado, deve rescindir unilateralmente o contrato.
Seguindo essa premissa, o ente público atrai para si a responsabilização subsidiária pela não quitação dos créditos trabalhistas dos trabalhadores da terceirizada contratada, mas desde que seja comprovada a conduta culposa da Administração, nos termos do item V da Súmula 331 do TST, que prevê:
V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
No caso de o ente estatal não apresentar documentos que comprovem a devida fiscalização da empresa contratada, configura-se a culpa in vigilando da Administração Pública, por conta da falta de fiscalização e tomada de medidas coercitivas para corrigir o inadimplemento trabalhista da prestadora de serviços. O inadimplemento da empresa pode ser verificado com uma simples fiscalização documental.
É importante ressaltar o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho de que cabe à Administração Pública provar que efetivamente fiscalizou os pagamentos das verbas trabalhistas dos empregados da empresa contratada. Eis a ementa:
[...] RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA - ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - CULPA CARACTERIZADA - SÚMULA Nº 331, V E VI, DO TST 1. O acórdão regional está em harmonia com o entendimento firmado na Súmula nº 331, item V, do TST, uma vez que a responsabilização subsidiária do ente público decorreu do reconhecimento de conduta culposa na fiscalização da empresa prestadora. 2. Compete à Administração Pública o ônus da prova quanto à fiscalização, considerando que: (i) a existência de fiscalização do contrato é fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do Reclamante; (ii) a obrigação de fiscalizar a execução do contrato decorre da lei (artigos 58, III, e 67 da Lei nº 8.666/93); e (iii) não se pode exigir do trabalhador a prova de fato negativo ou que apresente documentos aos quais não tenha acesso, em atenção ao princípio da aptidão para a prova. Julgados. 3. O E. STF, ao julgar o Tema nº 246 de Repercussão Geral - responsabilidade subsidiária da Administração Pública por encargos trabalhistas gerados pelo inadimplemento de empresa prestadora de serviço, RE 760931 -, não fixou tese específica sobre a distribuição do ônus da prova pertinente à fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas. 4. Nos termos do item VI da Súmula nº 331 do TST, "a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral". Agravo de Instrumento a que se nega provimento. (TST, 8ª Turma, AIRR - 10603-13.2015.5.15.0084, Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 19/12/2017).
Desta feita, cabe à Administração Pública, detentora dos meios e documentos necessários a demonstrar a devida verificação, provar o regular exercício do poder-dever de fiscalização, sendo injusto impor ao trabalhador o pesado encargo de apurar a execução dos procedimentos administrativos de acompanhamento dos contratos celebrados pelo poder público. Ressalta-se que a orientação contida no inciso IV da Súmula nº 331 do TST apenas visa a efetivar a aplicação da lei, tendo em vista os fins sociais a que ela se dirige e as exigências do bem comum, nos termos do art. 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.
Imputar a responsabilidade subsidiária ao beneficiário dos serviços prestados por trabalhadores é forma de evitar a prática comum de contratar mão-de-obra através de empresas que não possuem idoneidade, por parte de empregadores privados e entes públicos, com o intuito de esquivarem-se do cumprimento da legislação trabalhista, de maneira que aqueles que vendem a sua força de trabalho ficam ao desabrigo de qualquer proteção no tocante à percepção dos serviços prestados.
Mesmo após a decisão do Excelso Supremo Tribunal Federal, proferida nos autos da Ação Direta de Constitucionalidade n. 16/DF, que declarou a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei n. 8.666/93 (Lei de Licitações), persiste a responsabilidade subsidiária da Administração Pública tomadora de serviços terceirizados quando, com base nos fatos de cada causa, constatar-se a sua omissão culposa, consubstanciada na sua culpa in vigilando quanto ao correto cumprimento das obrigações trabalhistas pela empresa prestadora de serviços que contratou. Com efeito, deve-se verificar a existência, ou não, da ausência de fiscalização pelo órgão público contratante.
A Súmula 16 do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região ainda prevê:
SÚMULA 16. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CULPA IN VIGILANDO. A constitucionalidade do art. 71, §1º, da Lei nº 8.666/93, declarada pelo STF na ADC nº 16, não obsta o reconhecimento da responsabilidade de ente público quando este não comprova o cumprimento de seu dever de fiscalização do prestador de serviços.
A culpa in vigilando do Ente Público é constatada por descumprimento das normas de fiscalização do contrato de prestação de serviços celebrado, porquanto não comprovado que sejam observadas quaisquer das disposições da Lei nº 8.666/93.
A Administração Pública deve analisar a qualificação econômico-financeira da prestadora de serviço até o final do cumprimento do contrato e, verificando as dificuldades financeiras da prestadora, deverá adotar medidas que viabilizem a execução do serviço e a quitação dos créditos trabalhistas.
Trata-se, na verdade, de responsabilidade subjetiva, o que se traduz da Súmula 331, IV, do TST, como bem analisado pelo STF, à luz do julgamento da ADC 16, em 24/11/2010.
A responsabilidade objetiva da Administração Pública não serve para imputar ao Ente Estatal responsabilidade subsidiária porque pressupõe a existência de ato ilícito praticado pelo Estado, o que não ocorre nas hipóteses em que se efetiva fiscalização da Administração Pública quanto à idoneidade financeira da prestadora de serviço.
Nessa esteira, deve-se dizer que, se o Estado, devendo agir por força de lei, for omisso, ou realizar fiscalização deficiente, responde pela omissão perpetrada; por outro lado, se agir rigorosamente nos ditames da lei, fiscalizando, e mesmo assim ocorrer o evento danoso, não há como responsabilizá-lo, visto que o Estado não é o autor do dano.
Não se deve perder de vista o ensinamento da doutrina a respeito do tema, nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello:
Em síntese: se o Estado, devendo agir por imposição legal, não agiu ou o fez deficientemente, comportando-se abaixo dos padrões legais que normalmente deveriam caracterizá-lo, responde por essa incúria, negligência ou deficiência, que traduzem um ilícito ensejador do dano não evitando quando, de direito, devia sê-lo. Também não o socorre eventual incúria em ajustar-se aos padrões devidos (MELLO, 1997, p. 615)
Deve-se esclarecer que Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADC nº 16/DF, na sessão do dia 24 de novembro de 2010, considerou, de fato, constitucional o art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93, de modo a afastar, em regra, a responsabilidade do Ente público contratante de empresa fornecedora de mão de obra pelos débitos trabalhistas de sua contratada, nos casos de inadimplemento das obrigações da terceirizada. Entretanto, ao se referir à terceirização lícita das atividades-meio da Administração Pública, deixou consignado expressamente sua posição de que o citado dispositivo da Lei de Licitações não afasta a possibilidade de a Justiça do Trabalho atribuir a responsabilidade subsidiária ao Poder público nos casos em que fique comprovado que agiu com culpa in vigilando, ao não fiscalizar o adimplemento daqueles direitos pelo prestador de serviços, que é o devedor principal.
Ademais, não se pode esquecer que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 760.931/DF, em 30 de março de 2017, em regime de repercussão geral (Tema nº 246), consolidou a tese jurídica no sentido de que: “O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93”.
Ao estabelecer que a responsabilidade pelo inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não se transfere “automaticamente” ao Poder Público contratante, se por um lado não deixou explícita a total impossibilidade de transferência da responsabilidade aos Entes Públicos contratantes em qualquer cenário abrangendo a terceirização lícita, por outro, também não definiu com clareza se essa responsabilização poderia advir da comprovação efetiva da ausência ou falhas na fiscalização da execução do contrato. Discute-se que o ônus da prova da conduta culposa de deve recair sobre os empregadores, por ser prova excessivamente difícil, senão impossível, de ser produzida pelo trabalhador terceirizado, que em regra não tem acesso aos meandros da burocracia estatal, o que atrai a incidência do § 2º do art. 373 do CPC.
Entretanto, posteriormente, o Supremo Tribunal Federal, em outros julgados, manifestou-se concluindo que a tese da repercussão geral fixada no bojo do mencionado RE 760.931/DF não afasta o reconhecimento da responsabilidade subsidiária da Administração Pública, nas hipóteses em que, examinado o caso concreto, restar evidenciada sua conduta omissiva culposa, a exemplo do seguinte aresto:
EMENTA: RECLAMAÇÃO. RESPONSABILIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. TEMA 246. REPERCUSSÃO GERAL. RE 760931. TESE FIXADA: “O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93”. Responsabilidade Administração Pública, na qualidade de tomadora dos serviços, imputada ante a efetiva comprovação da conduta culposa – na modalidade in vigilando - no cumprimento e/ou na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais (Lei nº 8666/93), por parte da empresta prestadora dos serviços. Reconhecimento judicial da responsabilidade subsidiária do Poder Público em harmonia à tese da repercussão geral fixada no RE 760931 e ao quanto decidido pelo Supremo Tribunal Federal na ADC 16. Seguimento negado. (Rcl 28300, Relator(a): Min. ROSA WEBER, julgado em 29/09/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-225 DIVULGADO 02-10-2017 PUBLICADO 03/10/2017)
A Ministra ROSA WEBER, ao negar seguimento à Reclamação Constitucional 28.300/SP, teceu os seguintes esclarecimentos a respeito da distribuição do ônus probatório em tais casos, in verbis:
(...)
7. Nesse sentir, observado o julgamento do RE 760.931, tenho por corroborada a minha compreensão acerca do quanto decidido por esta Suprema Corte já ao exame da ADC 16 – precisamente a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei 8666/93 e a consequente inviabilidade da imputação automática da responsabilidade subsidiária à Administração Pública, como mera consequência do inadimplemento por parte da prestadora de serviços de direitos trabalhistas. A tese de repercussão geral fixada por esta Casa, além de reafirmar a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei 8666/93, nos moldes em que decidido ao exame da ADC 16, assenta não a absoluta irresponsabilidade da Administração Pública, na qualidade de tomadora dos serviços, mas, sim, a possibilidade de a ela se imputar - desde que tal não se opere automaticamente - a responsabilidade subsidiária pelos encargos trabalhistas dos empregados. A vedação está, portanto, na imputação “automática” da responsabilidade, sem que reste evidenciada a conduta culposa – na modalidade in vigilando - da Administração Pública no cumprimento e/ou na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais (Lei nº 8.666/93), por parte da empresta prestadora. Obsta a tese da repercussão geral (Tema nº 246) que se impute a responsabilidade à Administração Pública tão somente como corolário do mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa contratada, entendimento por mim já adotado inúmeras vezes, à luz das balizas anteriormente firmadas por esta Casa ao exame da ADC 16. Assim, entendo que o reconhecimento judicial da responsabilidade subsidiária da Administração Pública, nas hipóteses em que, examinado o caso concreto, restar evidenciada conduta omissiva culposa, opera-se não somente em perfeita harmonia à tese da repercussão geral fixada no bojo do RE 760.931, como também ao quanto decidido na ADC 16, e, nesse sentido, em estrita conformidade com o ordenamento jurídico (Lei nº 8.666/93).
8. Respeitadas tais premissas, entendo que a decisão reclamada - ao contemplar o exame do caso concreto com base nas provas, bem como a conclusão pela conduta omissiva culposa do ente público na fiscalização da prestadora dos serviços – se encontra em absoluta consonância com o quanto decidido na ADC 16. Nesse sentir, eventual acerto ou desacerto daquela conclusão há de ser apreciado por meio dos remédios processuais adequados, não se prestando a reclamação constitucional a reexame da prova.
Limitado, outrossim, o julgamento da ADC 16 a obstaculizar a responsabilização subsidiária automática da Administração Pública - como mera decorrência do inadimplemento da prestadora de serviços -, não resultou enfrentada a questão da distribuição do ônus probatório, tampouco estabelecidas balizas para a apreciação da prova ao julgador, a inviabilizar o manejo da reclamação com espeque em alegada afronta à ADC 16 sob tais enfoques, conforme já decidido em várias reclamações: Rcl 14832/RS, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 19.11.2012 , Rcl 15194/DF, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe 18.3.2013, Rcl 15385/MG, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe 15.3.2013.
9. No ponto, cumpre igualmente assentar que, ao julgamento do RE 760.931, esta Suprema Corte, muito embora tenha debatido aspectos acerca das regras de distribuição do ônus da prova na espécie, culminou por não fixar balizas, respeitada, a meu juízo, a soberania das instâncias ordinárias no exame do acervo fático-probatório, cujo revolvimento é de todo vedado na instância extraordinária, assim como no bojo da reclamação constitucional.
Mesmo com um procedimento licitatório regular para contratação da prestadora do serviço, se o poder público mostrar-se omisso no seu dever de fiscalização do contrato administrativo, principalmente no momento da cessação do vínculo empregatício com a terceirizada (arts. 58, III, e 67, caput e §§ 1º e 2º, todos da Lei nº 8.666/1993), sem ter provas de que exercia efetivamente a fiscalização da execução do contrato, fica plenamente caracterizada sua responsabilidade em caso de inadimplência das verbas rescisórios devidos ao trabalhador.
O ente público apresenta um comportamento negligente agindo dessa maneira, comportamento administrativo que não se coaduna com a aplicação dos ditames da Lei nº 8.666/1993, caracterizando a sua culpa in vigilando, não podendo se falar em transferência automática da responsabilidade ao Poder Público.
Além do mais, não há como eximir a Entidade Pública da responsabilidade pelos encargos trabalhistas inadimplidos por empresa prestadora de serviços, pois não pode usufruir da força de trabalho de empregado, mesmo que vinculado à empresa terceirizada, sem assumir nenhuma responsabilidade nas relações jurídicas das quais participe. Ademais, a contratação de trabalhadores por empresa terceirizada é de interesse público, pois a prestação desses serviços favorece toda a coletividade.
Esses acontecimentos atraem a incidência da Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que nos seus incisos IV, V e VI, impõe a responsabilidade daquele que se beneficiou, de alguma forma, do trabalho humano, ainda que por intermédio de empresa terceirizada, senão vejamos:
(...)
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.
(...)
Ratificando essa linha de pensamento, o Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região editou a Súmula 16 (publicada no dia 19 de agosto de 2016 no Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho), in verbis:
SÚMULA 16. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CULPA IN VIGILANDO. A constitucionalidade do art. 71, §1°, da Lei n° 8.666/93, declarada pelo STF na ADC n° 16, não obsta o reconhecimento da responsabilidade de ente público quando este não comprova o cumprimento de seu dever de fiscalização do prestador de serviços.
É importante ressaltar que este entendimento não transfere ao poder público a responsabilidade pelo pagamento dos encargos, a qual concerne à empresa terceirizada. Apenas na ocasião de impossibilidade comprovada da prestadora dos serviços de satisfazer as obrigações trabalhistas em relação aos seus empregados, surge o dever do tomador e beneficiário direto do trabalho em responder subsidiariamente.
6 CONCLUSÃO
Com este estudo, é possível observar que é indispensável a atividade de fiscalização de contratos pela Administração Pública, enquanto obrigação de meio, só constituiria a culpa in vigilando do Estado quando não houvesse atuação adequada ao resguardo dos direitos do trabalhadores, demonstrando-se claramente que o órgão público não agiu face à violação de obrigações trabalhistas das empresas com as quais contrata. Estender esta responsabilização de maneira irrestrita violaria a própria ideia de terceirização, fazendo-se imprescindível que haja um claro regramento jurídico para a matéria, de modo que se possam sanar as divergências vislumbradas na jurisprudência e, ainda, impedir a utilização de teses jurídicas genéricas para a condenação direta da Administração Pública sem a efetiva análise do caso concreto.
Sendo assim, é de extrema importância a fiscalização desses contratos com prestadoras de serviços terceirizados pelo Estado e seus agentes. A Administração Pública deve ter muita cautela na licitação ao selecionar qual empresa contratar, principalmente quando da análise de exequibilidade da proposta.
Além do que, esta fiscalização dos contratos deve ter um acompanhamento e/ou fiscalização mensal pela empresa da quitação dos débitos trabalhistas. É o efetivo conhecimento e controle da execução do contrato que vai minimizar a responsabilidade da Administração Pública e possíveis condenações futuras na Justiça do Trabalho, almejando que seja afastada a culpa in vigilando e, consequentemente, sua condenação subsidiária ao pagamento dos créditos trabalhistas que decorrem da terceirização.
7 REFERÊNCIAS
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BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Acórdão nº AIRR: 10197927-2017.5.01.0205, Relator: Jose Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 04/08/2021, 2ª Turma, Data de Publicação: 06/08/2021.
BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Acórdão nº AIRR - 10603-13.2015.5.15.0084, Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, 8ª Turma, Data de Publicação: 19/12/2017.
BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Acórdão nº RR: 676720195110001, Relator: Emmanoel Pereira, Data de Julgamento: 20/10/2021, 8ª Turma, Data de Publicação: 22/10/2021.
BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região, ROT - 0010122-64.2019.5.18.0104, Rel. ROSA NAIR DA SILVA NOGUEIRA REIS, 3ª TURMA, Data de Publicação: 18/10/2019.
BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região, ROT – 0001092-56.2018.5.23.0021.-64.2019.5.18.0104, Relator JOÃO CARLOS RIBEIRO DE SOUZA, Gabinete da Presidência, Data de Publicação: 02/06/2020.
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Bacharelando em Direito pelo Centro Universitário Fametro – CEUNI FAMETRO
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MOURA, LUANDREW GOMES. Terceirização: culpa in vigilando da Administração Pública em contratos com as prestadoras de serviços terceirizadas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 mar 2024, 04:28. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/57777/terceirizao-culpa-in-vigilando-da-administrao-pblica-em-contratos-com-as-prestadoras-de-servios-terceirizadas. Acesso em: 26 dez 2024.
Por: Benigno Núñez Novo
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
Por: Fábio Gouveia Carneiro
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
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