JORGE BARROS FILHO[1]
(orientador)
RESUMO: Desde as primeiras civilizações, o envelhecimento instigou a necessidade de um tratamento especifico àqueles que perdem a força de trabalho e passam a depender de familiares com o avançar da idade. Atualmente, no Brasil, o Estatuto do Idoso, sancionado pela Lei nº. 10.741, de 1º de outubro de 2003, é o diploma legal infraconstitucional responsável por fixar os direitos e mecanismos jurídicos de proteção das pessoas com mais de sessenta anos de idade. Em decorrência da vulnerabilidade desses sujeitos de direito, não são raras as situações em que são tratados com violência dentro de suas casas e também em sociedade, situações estas que ofendem seus direitos fundamentais de dignidade humana. A ocorrência de crimes contra idosos e de práticas violentas em desfavor dessas pessoas exige a aplicação de sanções jurídicas para que não voltem a acontecer. Por tal motivo é que a pesquisa jurídica desenvolvida apresenta as consequências advindas da violência contra idosos. Afim de atender ao seu objetivo geral, a pesquisa bibliográfica, fundada em material científico já publicado, analisados segundo o método exploratório de análise qualitativa dos textos selecionados em doutrinas, matérias jurídicas e jurisprudências nacionais, ao final expõe o resultado obtido com a redação do presente artigo científico.
Palavras-chave: Idoso. Estatuto do Idoso. Violência. Consequências.
ABSTRACT: Since the first civilizations, aging has instigated the need for specific treatment for those who lose their work force and come to depend on family members with advancing age. Currently, in Brazil, the Elderly Statute, sanctioned by Law no. 10,741, of October 1, 2003, is the infra-constitutional legal diploma responsible for establishing the rights and legal mechanisms for the protection of people over sixty years of age. Due to the vulnerability of these subjects of law, situations in which they are treated with violence within their homes and also in society are not rare, situations that offend their fundamental rights of human dignity. The occurrence of crimes against the elderly and violent practices to the detriment of these people requires the application of legal sanctions so that they do not happen again. For this reason, the legal research developed presents the consequences arising from violence against the elderly. In order to meet its general objective, the bibliographic research, based on scientific material already published, analyzed according to the exploratory method of qualitative analysis of selected texts in doctrines, legal matters and national jurisprudence, at the end exposes the result obtained with the writing of this scientific article.
Keywords: Elderly. Elderly Statute. Violence. Consequences.
Sumário: Introdução. Material e Métodos. 1. A evolução da proteção do idoso no ordenamento jurídico brasileiro. 2. O Estatuto do Idoso: principais disposições legais. 3. A violência contra o idoso. 4. Consequências jurídicas da violência contra o idoso. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
A proteção aos indivíduos em sociedade é uma preocupação de todo o ordenamento jurídico nacional, haja vista ser a vida, a saúde e a integridade física, direitos humanos fundamentais, protegidos em cláusula pétrea da Constituição Federal, juntamente com inúmeras outras garantias legais.
Em se tratando de pessoa idosa, a preocupação com seu bem-estar é da sua família, da sociedade e do Estado, uma vez que, sujeito de direito, a tais indivíduos é assegurado a dignidade humana, que deve ser garantida pelo ente estatal em caso de violação.
Há por alguns o pensamento de inutilidade dos idosos, uma vez que, seriam não mais produtivos à sociedade, à família e etc. O resultado disso é o afastamento do convívio, e não raras vezes, a ofensa a seus direitos.
Para proteger os idosos, o Brasil contém, além da legislação constitucional, a Lei nº. 10.741, de 1º de outubro de 2003. O Estatuto do Idoso atribui proteção especial aos indivíduos assim identificados em razão da vulnerabilidade que a idade ocasiona a tais indivíduos perante os demais no convívio social.
Neste contexto, há interesse na redução e combate às mais variadas formas de violência a qual pode ser um idoso submetido e as consequências jurídicas previstas pela legislação brasileira para os autores dessas violências.
MATERIAIS E MÉTODOS
Realizada no município de Gurupi, Estado do Tocantins e apresentada para a Universidade de Gurupi – UnirG como requisito para obtenção do título de bacharel em direito, esta pesquisa científica se classifica bibliográfica, uma vez que o objeto da pesquisa está previsto no ordenamento nacional, com vasta repercussão na doutrina e jurisprudência. Quanto aos objetivos, a pesquisa se enquadra na espécie exploratória, haja vista que apresenta as principais disposições referentes ao assunto, de forma aprofundada.
Os dados e informações coletados foram analisados segundo a metodologia de utilização de técnicas de análise qualitativa do texto, são elas: análise de conteúdo, análise do discurso e confrontamento de informações, especialmente a apresentação das formas de violência contra o idoso e a exposição das consequências jurídicas dela advindas.
1 A EVOLUÇÃO DA PROTEÇÃO DO IDOSO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Até chegar ao status atual de proteção aos idosos, um longo período se passou e vários foram os dispositivos legais que regularam os direitos dos indivíduos no ordenamento legal nacional. O motivo das modificações legislativas decorre principalmente da mudança social acerca das pessoas protegidas pelo dispositivo.
Quando o assunto é a velhice das pessoas, o papel histórico desempenhado pelos idosos influenciou diretamente a visão estatal sobre eles. Antigamente, eram tidos como privilegiados, assim tratados em sociedade; contudo, passaram a ser vistos como um peso nas sociedades mais recentes.
Em agrupamentos antigos, havia a crença de que os anciãos possuíam um privilégio sobrenatural, proporcionando-lhes destaque. Considerando uma época em que os mais velhos eram os guardiões da memória do povo, compreende-se o alto grau de sabedoria atribuído a absolutamente qualquer pessoa mais velha. O mesmo tratamento era dado na Ásia, nas culturas americanas antigas e entre os hebreus.
Após a queda de Roma começou um processo de desvalorização do idoso, intensificado ao longo do século VI, durante o qual havia uma associação entre a idade avançada e a cessação da atividade, inclusive com o isolamento em retiros. (CORREA e GOULART, 2019, p.1).
No Brasil, a proteção legal do idoso teve como um dos seus marcos iniciais, no ano de 1974, a aprovação da Lei nº. 6.179, que estabeleceu o amparo previdenciário para os inválidos e maiores de sessenta anos de idade. Na época, apesar de avançada a lei em comento, a mesma impedia que o benefício ultrapassasse o percentual de sessenta por cento do salário mínimo. Consequentemente, a Lei nº. 6.205, corrigiu no ano seguinte, em 1975, descaracterizando o salário mínimo como fator de correção monetária (CORREA e GOULART, 2019, p.1).
Outras leis foram editadas desde a origem do sistema legal em relação aos direitos previdenciários dos idosos, todavia, em relação aos direitos humanos, de proteção à integridade física e mental, não foram muitos os dispositivos que trataram dessa temática.
Apesar da lei infraconstitucional mencionada, já haviam dispositivos constitucionais que previam a aposentadoria por idade, contudo somente com a Constituição de 1988 que a proteção aos idosos ocorreu de forma relevante em relação aos seus direitos de dignidade humana.
No Brasil, a introdução de mudanças foi feito gradativamente, as Constituições anteriores a de 1988, como as de 1937, 1947 3 1969 apenas mencionaram o termo idoso e a previsão de a aposentadoria assegurada com o avanço da idade. Assim, a Carta Magna de 1988 foi importante marco, pois ao trazer princípios norteadores como o da dignidade humana, trouxe embutida a ideia de respeito a todos, sem distinção, acarretando um grande avanço em relação às Constituições anteriores (LIMA, 2019, p.1).
Outra lei importante é a nº. 8.842/1994, que instituiu a Política Nacional do Idoso, criou o Conselho Nacional do Idoso e deu outras providências, dentre as quais se destaca a priorização do atendimento do idoso em órgãos públicos e privados prestadores de serviços, e o recebimento de assistência asilar estatal àqueles que não tenham família e encontrem-se desabrigados (CORREA e GOULART, 2019).
Além das leis mencionadas, a principal legislação protetiva dos idosos foi o Estatuto sancionado no ano de 2003, sobre o qual o item a seguir se debruça.
2 O ESTATUTO DO IDOSO: PRINCIPAIS DISPOSIÇÕES LEGAIS
Tal como mencionado anteriormente, com o passar dos anos e avançar da idade, as pessoas tornam-se mais velhas e por isso tem suas capacidades reduzidas o que as coloca em uma situação de vulnerabilidade que exige cuidados. Nos últimos anos, o aumento da população idosa exigiu um olhar mais atento para esses indivíduos.
No Brasil, houve uma grande redução da taxa de mortalidade dos idosos, neste sentido aumentou consideravelmente o índice de violência a estes. Estima-se que a população do Brasil possui quase 25 milhões de indivíduos acima de 60 anos. Estes idosos estão sofrendo violência, sendo acarretados com abuso e maus e maus tratos físicos, pressão psicológica, abuso sexual e financeiro, abandono e falta de assistência. O principal agressor advém do seio familiar, indivíduos que dependem financeiramente dos idosos ou até mesmo aqueles que são remunerados para prestar-lhes serviços assistenciais (COSTA, 2016, p.1).
Justamente para garantir a todos indistintamente os seus direitos é que existem legislações especiais, atendendo a necessidade de determinados grupos em sociedade. Em se tratando de idosos, o Estatuto do Idoso contém as disposições centrais de proteção a tais pessoas, assim entendidas aquelas que contem idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos (BRASIL, 2003).
O Estatuto trata-se de dispositivo legal que, após sete anos tramitando no Congresso Nacional, foi aprovado pela Lei nº 10.741, de 1° de outubro de 2003 e estabeleceu uma série de normas capazes de gerar uma maior participação e inclusão dos idosos na sociedade (CORREA e GOULART, 2019).
O Estatuto do idoso foi fruto do Projeto de Lei nº 3.561/1997, e costuma ser indicado como uma das maiores conquistas, por entes da sociedade civil, tais como associações de aposentados, pensionistas e pela população idosa em geral. Sua proposta incluía regular os direitos assegurados às pessoas, considerando-se a idade cronológica igual ou superior a 60 anos e de dispor de seus direitos fundamentais e de cidadania, bem como a assistência judiciária. Sua preocupação estava direcionada à execução dos direitos, sua vigilância e defesa, por meio de instituições públicas. (CORREA e GOULART, 2019, p.1).
Portanto, o Estatuto é um marco na regulamentação dos direitos das pessoas com mais de sessenta anos de idade, posto que em seus artigos vários dispositivos foram inovadores, principalmente os relacionados às violências praticadas contra esses indivíduos.
Criado pela Lei 10.741, em 1º de outubro de 2003, quando o Brasil tinha 15 milhões de idosos, o estatuto trouxe, de forma inédita, princípios da proteção integral e da prioridade absoluta às pessoas com mais de 60 anos e regulou direitos específicos para essa população.
[...]
A partir do estatuto, pela primeira vez, negligência, discriminação, violência de diferença tipos, inclusive a financeira, e atos de crueldade e opressão contra o idoso foram criminalizados e hoje são passíveis de punição. O estatuto também aumentou o conhecimento e a percepção dos idosos sobre seus direitos (BRITO, 2018, p.1).
Para ressaltar a sua relevância, o Estatuto logo nos seus primeiros artigos deixa clara a necessidade de proteção dos direitos dos idosos:
Art. 2o O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade (BRASIL, 2003).
De acordo com o disposto no artigo 8 do Estatuto, o envelhecimento é um direito personalíssimo e é um direito social a sua proteção. Para tanto, diz o artigo 9º que é do Estado a obrigação de garantir a proteção à vida e a saúde da pessoa idosa (BRASIL, 2003).
Além de determinar a criação e efetivação de políticas públicas que proporcione um envelhecimento saudável de digno, no âmbito penal, o Estatuto do Idoso apresenta um capítulo específico de tipificação dos crimes contra idosos em espécie.
3 A VIOLÊNCIA CONTRA O IDOSO
Por serem vistos por alguns como pessoas cuja importância social é pequena, por não mais serem produtivos para o mercado de trabalho e por terem se tornado vulneráveis, os idosos são vítimas de abandono, cujas causas são apontadas a seguir:
Entende-se por abandono, situação de solidão vivenciada pelo homem, principalmente pelos idosos, ocasionado por múltiplas causas, quais sejam: afastamento da convivência familiar, inexistência de parentes e amigos, relações conflituosas do grupo ao qual pertencem, dificuldades de estabelecer laços de amizade, incapacidade psicossocial, dentre muitas outras. (CORREA e GOULART, 2019, p.1).
Infelizmente, a situação social de muitos idosos perante seus familiares e na comunidade ainda se agravou nos últimos anos em razão da Pandemia causada pela Covid-19, que repercutiu diretamente na vida das pessoas, causou redução da capacidade econômica da população e elevou ainda os casos de violência, conforme os dados oficiais já constataram.
A pandemia de covid-19 trouxe um aumento nos casos de violências contra a população idosa. Sendo parte do grupo de risco, essa parcela da população foi forçada a mudar seus hábitos adotando a quarentena para garantir sua saúde. No entanto, essa medida de isolamento, por mais efetiva que seja para diminuir o contágio do vírus, acabou aumentando o número de casos de violência contra o idoso no ano de 2020.
De acordo com dados disponibilizados pelo Disque 100, canal de atendimento que recebe, analisa e encaminha denúncias de violação dos direitos humanos para os órgãos competentes, de 2019 para 2020 o número de chamadas para reportar algum tipo de violência contra o idoso foi de 48,5 mil para cerca de 77 mil denúncias; houve um aumento de 53% no número de denúncias. Até o primeiro semestre de 2021, o número de denúncias registradas ultrapassou 30 mil (FUENTES, 2021, p.1).
A situação de abandono é apenas uma das formas de violência praticada contra essas pessoas, mas não pode ser normalizado. Conforme o Estatuto do Idoso e as disposições da Constituição Federal de 1988, um dos propósitos estatais consiste em impedir a violência contra idosos, a qual pode acontecer de várias formas, são elas:
A-Violência sociopolítica: refere-se principalmente às relações sociais mais gerais que envolvem grupos e pessoas consideradas delinquentes comuns e as estruturas econômicas e políticas da desigualdade nas relações de exclusão/exploração/periferização de conglomerados humanos significativos. Dessa violência a os idosos e idosas falam, denunciam, tratando-se de uma “violência falada” nos debates, nas denúncias comuns nas Delegacias de Polícia. Essa violência atinge idosos e não idosos, mas tem sua especificidade ao se aproveitar de situações de fragilização ou vulnerabilidade das pessoas idosas para a prática de furtos, assaltos, roubos, discriminação aos transportes, discriminação no transporte, descriminação social. B-Violência institucional: refere-se a um tipo de relação existente nos abrigos e instituições de serviços, privadas ou públicas, nos quais se negam ou atrasa o acesso, não se leva em conta a prioridade legal, não se ouve com paciência, devolve-se para casa, humilha-se por incontinência ou alguma perda, infantiliza-se o idoso, hostiliza-se a pessoa idosa, não se ouve sua palavra e não se respeita sua autonomia. C-Violência intrafamiliar: é a “violência calada”, sofrida em silencio muitas vezes, praticadas por filho, filhas, cônjuges, netos, netas, irmãos, irmãs ou parentes e vizinhos próximos, conhecidos da vítima (FALEIROS, 2005, p. 43).
As violências acima mencionadas são identificáveis nas condutas típicas contidas nos dispositivos do Estatuto do Idoso e também em outros delitos do Código Penal Brasileiro e, portanto, são passiveis de consequências jurídicas penais, melhor tratadas a seguir.
4 CONSEQUENCIAS JURÍDICAS DA VIOLÊNCIA CONTRA O IDOSO
Além de apontar os princípios e as diretrizes legais de salvaguarda dos direitos dos idosos, o Estatuto do Idoso destina parte significativa de seus artigos para prever os crimes contra essas vítimas, as medidas de proteção desses sujeitos e as políticas de atendimento dos idosos.
Desta feita, existem consequências imediatas à constatação de violência, dentre as quais, para resguardar a integridade da vítima, o artigo 44 autoriza que as medidas de proteção são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos no Estatuto do Idoso forem ameaçados e violados por ação ou omissão do Estado, da sociedade, da família, por curador ou entidade de atendimento e em decorrência de sua condição pessoal (BRASIL, 2003).
As medidas específicas de proteção estão enumeradas no artigo 44 e seguintes do Estatuto:
Art. 44. As medidas de proteção ao idoso previstas nesta Lei poderão ser aplicadas, isolada ou cumulativamente, e levarão em conta os fins sociais a que se destinam e o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários.
Art. 45. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 43, o Ministério Público ou o Poder Judiciário, a requerimento daquele, poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:
I – encaminhamento à família ou curador, mediante termo de responsabilidade;
II – orientação, apoio e acompanhamento temporários;
III – requisição para tratamento de sua saúde, em regime ambulatorial, hospitalar ou domiciliar;
IV – inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a usuários dependentes de drogas lícitas ou ilícitas, ao próprio idoso ou à pessoa de sua convivência que lhe cause perturbação;
V – abrigo em entidade;
VI – abrigo temporário (BRASIL, 2003).
Na prática, o processamento das medidas protetivas se dá no âmbito do direito processual civil e é mantida enquanto perdurar o risco à segurança do idoso, não apenas no campo físico, mas também no psicológico, cujo abalo também viola direitos da personalidade.
A seguir um exemplo jurisprudencial:
APELAÇÃO CÍVEL. MEDIDA PROTEÇÃO AO IDOSO. PLEITO DE RETORNO À RESIDENCIA DO GENITOR, PARA MORADIA. IMPOSSIBILIDADE. COMPROVADA VIOLAÇÃO AO DIREITO DO IDOSO. VIOLENCIA PSIQUICA EVIDENCIADA. SENTENÇA CONFIRMADA. Caso dos autos em que as provas produzidas são suficientes a comprovar violação à dignidade do idoso, consistente em violência psíquica. Inadequado o idoso residir com pessoa que apresenta sintomas depressivos em alto índice, com perfil agressivo, sem que antes alcance estabilidade comportamental a garantir que sejam preservados os direitos do apelado/idoso. Apelação desprovida. (TJ-RS – AC: 70076972371 RS, Relator: José Antônio Daltoe Cezar, Data de Julgamento: 19/07/2018, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: 24/07/2018).
As medidas acima pretendem proteger as vítimas para que não reiterem as condutas de violência. Por outro lado, já em relação ao violador dos direitos dos idosos, o mesmo será responsabilizado criminalmente por seus atos, desde que enquadrado nos tipos penais.
De ação penal pública incondicionada, os crimes contra o idoso estão enumerados do artigo 96 aos 108, punindo várias condutas, dentre elas: o abandono, a discriminação, a ausência de assistência quando é possível fazê-lo; a exposição a perigo; a apropriação de bens ou renda do idoso; entre outros (BRASIL, 2003).
Em todos os tipos penais, para que do fato haja a imposição de sanção penal aos envolvidos em situação de violência contra o idoso, é indispensável a comprovação da materialidade delitiva e autoria. Nesse sentido, a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal serve de exemplo:
APELAÇÃO CRIMINAL. ESTATUTO DO IDOSO. CRIME DE EXPOR A PERIGO A INTEGRIDADE E A SAÚDE DO IDOSO. ART. 99 DA LEI N. 10.741/03. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. SENTENÇA MANTIDA. 1. Demonstrado pelas provas colhidas nos autos que o apelante praticou os crimes de expor a perigo a integridade e a saúde de pessoa idosa, privando-a de alimentos e cuidados indispensáveis com higiene pessoal, a condenação é medida que se impõe. 2 RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJ-DF 00037801420168070001 – Segredo de Justiça 0003780-14.2016.8.07.0002, Relator: Humberto Ulhôa, Data de Julgamento: 17/06/2021, 1ª turma Criminal, Data de Publicação: Publicado no PJe: 24/06/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada).
Consequentemente, a ausência de provas levou à absolvição do agente no Tribunal de Justiça de Goiás, em razão da aplicação do princípio da presunção de inocência, também denominado in dubio pro reo:
APELAÇÃO CRIMINAL. ESTATUTO DO IDOSO. CRIME PREVISTO NO ARTIGO 99, § 2º, Lei 10.741/03. ABSOLVIÇÃO. POSSIBILIDADE. FRAGILIDADE DAS PROVAS. IN DUBIO PRO REO. 1 – A absolvição mostra-se viável quando o conjunto probatório não demonstra, equivocadamente, a prática de crime contra idoso, devendo a dúvida favorecer o agente, por aplicação do princípio in dubio pro reo. 2 – Recurso conhecido e provido. (TJ-GO – APR: 02380648720168090041, Relator: Dr. Fábio Cristovão de Campos Faria, Data de Julgamento: 30/10/2018, 1ª Câmara Criminal, Data de Publicação: DJ 2637 de 29/11/2018).
Por existirem uma série de crimes comuns, cujo polo passivo pode ser qualquer indivíduo em sociedade, os idosos podem ser vítimas dos crimes previstos na lei ordinária.
Deste modo, além dos crimes tipificados na legislação especial, o Código Penal ainda enumera como circunstancia agravante dos crimes, quando não são qualificadoras do tipo, se for cometido contra vítima maior de 60 (sessenta) anos de idade, nos termos do artigo 61, inciso II, alínea “h” (BRASIL, 1940).
A agravante é comumente aplicada nos crimes comuns previstos no Código Penal:
APELAÇÃO CRIMINAL – FURTO QUALIFICADO – TENTADO – IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL – CONDENAÇÃO NAS SANÇÕES DO ARTIGO 157 §2º INCISO II DO CÓDIGO PENAL – DESCABIMENTO – VIOLÊNCIA E GRAVE AMEAÇA NÃO EVIDENCIADAS – RECONHECIMENTO DA AGRAVANTE DO ARTIGO 61 INCISO II ALÍNEA H – NECESSIDADE – IDADE DO IDOSO COMPROVADA – RECURSO MINISTERIAL PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Mantém-se a condenação do apelado nas sanções do artigo 155 §4º inciso IV do Código Penal eis que não evidenciada violência ou grave ameaça na prática delitiva. 2. Reconhece-se a agravante do artigo 61, inciso II, alínea h do Código Penal porquanto comprovada a idade da vítima. 3. Recurso ministerial parcialmente provido. (TJ-MG – APR: 10021412424985001 MG, Relator: Pedro Vergara, Data de Julgamento: 27/11/2018, Data de Publicação: 03/12/2018).
Por tudo quanto o apresentado, uma vez constatada a violação de direitos dos idosos brasileiros, as consequências para aquele que pratica uma das formas de violência prevista na legislação especial e também na comum, ocorrerão no âmbito civil e criminal, podendo levar à condenação ao cumprimento de pena privativa de liberdade nos casos mais gravosos e também ao afastamento do convívio com a vítima.
Na imposição da responsabilização, caberá ao julgador impor as medidas que se apresentarem necessárias à situação e a sanção imposta deverá ser proporcional ao dano causado e ao caso concreto.
CONCLUSÃO
Os indivíduos que se tornam idosos, quando alcançam uma idade mais avançada, passam a perceber a mudança de comportamento da sociedade perante a sua existência, como se com o passar dos anos, tornassem menos necessários àqueles que por muito tempo foram úteis, enquanto tinham força de trabalho e atuavam de forma mais presencial na vida em sociedade.
Certo é que a sociedade não vê com tão bons olhos os idosos, tal qual nas primeiras civilizações se observava, isto porque o ideal socioeconômico mudou para que a produtividade se tornasse o fator principal na qualificação dos indivíduos. Ocorre que, além do desprestígio, o cometimento de violências contra esses indivíduos é motivo de preocupação.
Resultado da proteção Estatal foi a entrada em vigor da Lei nº 10.741, de 1° de outubro de 2003, que instituiu o Estatuto do Idoso e trouxe mais ampla regulamentação dos direitos dos idosos no Brasil, em complemento com as disposições advindas da Constituição Federal de 1988 e dos documentos internacionais relacionados aos direitos humanos.
Além de firmar os direitos fundamentais dos indivíduos com mais de sessenta anos de idade, o Estatuto reserva em seus dispositivos a previsão de garantias de atendimento prioritário, acesso à justiça, até mesmo a imposição de medidas protetivas para resguardar a saúde física e mental das pessoas colocadas em situação de violência, tanto no ambiente familiar, como também perante a sociedade e em locais públicos.
Quando a violência atinge o indivíduo de forma significativa, enquadrando-se em uma conduta típica, haverá a aplicação de pena, após o desenrolar do devido processo penal, segundo a lei que o tipifica, seja o Estatuto do Idoso, com crimes específicos, assim como o Código Penal, com a imposição da agravante prevista no seu artigo 61, inciso II, alínea “h”.
Portanto, a legislação não ignora a violação de direitos dos cidadãos, haja vista que existem consequências legais, as quais serão aplicadas quando devidamente comprovada a ocorrência de uma situação de violência contra o idoso no Brasil
REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto-lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em 09 de mar. 2022.
BRASIL. Lei nº. 10.741, de 1º de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.741.htm >. Acesso em 09 mar. 2022.
BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal. TJ-DF 00037801420168070001 – Segredo de Justiça 0003780-14.2016.8.07.0002, Relator: Humberto Ulhôa, Data de Julgamento: 17/06/2021, 1ª turma Criminal, Data de Publicação: Publicado no PJe: 24/06/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada. Disponível em: <https://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/1237477543/37801420168070002-segredo-de-justica-0003780-1420168070002>. Acesso em 12 de mar. 2022.
BRASIL. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. TJ-MG – Tribunal de Justiça de Minas Gerais. APR: 10021412424985001 MG, Relator: Pedro Vergara, Data de Julgamento: 27/11/2018, Data de Publicação: 03/12/2018. Disponível em: <https://tj-mg.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/654458540/apelacao-criminal-apr-10024142424985001->. Acesso em 08 mar. 2022.
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LIMA, Lorenna. Breve histórico dos direitos dos idosos no Brasil e no mundo. Jus.com, 2019. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/71311/breve-historico-dos-direitos-dos-idosos-no-brasil-e-no-mundo>. Acesso em 25 fev. 2022.
Bacharelando do Curso de Direito da Universidade de Gurupi- UnirG. E-mail: [email protected]
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LEAL, Marco Antônio Franco. Consequências jurídicas da violência contra o idoso Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 maio 2022, 04:08. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/58377/consequncias-jurdicas-da-violncia-contra-o-idoso. Acesso em: 29 dez 2024.
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