DARIO AMAURI LOPES DE ALMEIDA[1]
(Orientador)
RESUMO: Os casos de violência doméstica tiveram um aumento significativo durante a pandemia em curso em todo o mundo, fomentando assim a efetivação de estudos que identifiquem quais aspectos estão relacionados a estas ocorrências, bem como de entendimento das possibilidades de assegurar os direitos da vítima. Este estudo teve como objetivo geral analisar, sob a ótica legal, os impactos da violência doméstica contra a mulher no decorrer da Pandemia do COVID 19 no Estado do Amazonas. Através de um levantamento bibliográfico de estudos anteriores que respeitavam o objetivo proposto e foram devidamente publicados entre 2017 e 2022, e documental com base nas legislações vigentes no país, foi possível identificar que as ocorrências de violência doméstica no período da pandemia estiveram diretamente relacionadas as causas já identificadas em períodos anteriores, sendo potencializadas pela crise de saúde mundial. No Amazonas, assim como em todo o Brasil, as leis em vigência sobre o tema abarcam as questões pertinentes a segurança de vida e de direitos, sendo observada a necessidade de efetivação de direitos neste sentido pelo poder público.
PALAVRAS-CHAVE: Violência Doméstica; Direito; Pandemia.
ABSTRACT: Domestic violence cases have increased significantly during the ongoing pandemic worldwide, thereby encouraging studies to identify which aspects are related to these occurrences, as well as understanding the possibilities of ensuring the rights of the victim. This study aimed to analyze, from a legal perspective, the impacts of domestic violence against women during the COVID 19 Pandemic in the State of Amazonas. Through a bibliographic survey of previous studies that respected the proposed objective and were duly published between 2017 and 2022, and documentary based on the laws in force in the country, it was possible to identify that the occurrences of domestic violence in the pandemic period were directly related to the causes already identified in previous periods, being potentiated by the global health crisis. In the Amazon, as well as throughout Brazil, the laws in force on the subject cover the issues relevant to the safety of life and rights, being observed the need for enforcement of rights in this sense by the public authorities.
KEYWORDS: Domestic Violence; Law; Pandemic.
SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 A violência doméstica no Estado do Amazonas e o contexto de pandemia. 2.1 Violência doméstica: aspectos conceituais e tipificação. 2.2 A violência doméstica em tempos de Pandemia no Estado do Amazonas. 2.3 As consequências da violência doméstica na pandemia. 3 Confinamento social e o aumento de Violência doméstica. 3.1 A dificuldade de denúncia da violência doméstica. 3.2 Causas da violência doméstica no Isolamento social. 3.3 Feminicídio na pandemia. 4 A Lei Maria da penha e a lei do feminicídio: os benefícios legais para proteção de mulheres vítimas de violência doméstica. 4.1 O avanço do amparo e dos direitos das mulheres em situação de violência doméstica. 4.2 Os mecanismos jurídicos de proteção no enfrentamento ao aumento da violência doméstica contra a mulher, no âmbito da pandemia. 5 Conclusão. 6 Referências.
1 INTRODUÇÃO
A atual condição de pandemia que até o presente ano assola o mundo, impactou para além da condição de saúde da população, uma vez que foram notadas consequências em diversos âmbitos da sociedade, principalmente em virtude do contexto que foi constituído em virtude das necessidades impostas pelo cenário pandêmico.
Neste sentido, o isolamento social proposto como forma de mitigação dos índices de contaminação entre pessoas pelo vírus SarsCov 2 se constitui não somente como uma estratégia de resguardo da saúde, mas passou a ser observado como um potencializador de questões de violência, considerando tanto o agravamento de casos já instalados na dinâmica familiar quanto agente de origem (VIEIRA; GARCIA; MACIEL, 2020).
Os casos de violência doméstica associados ao isolamento social em razão da pandemia se mostram em crescente desde o início do mês de março, ao passo que os dados oficiais registram uma redução da quantidade de denúncias realizadas aos órgãos competentes, o que é justificado pela impossibilidade de realização da denúncia em razão do contato direto e em confinamento com o agressor.
Neste sentido, a realização do presente estudo se justifica em razão primeiramente da identificação da necessidade de aprofundamento de acadêmicos de direito, como a autora, nas questões sociais e legais acerca da violência doméstica e suas implicações jurídicas, sendo ainda pertinente a motivação adicional diante ao contexto pandêmico vivenciado pela humanidade e que diretamente impactos no aumento destes casos.
Assim, este estudo tem como objetivo geral analisar, sob a ótica legal, os impactos da violência doméstica contra a mulher no decorrer da Pandemia do COVID 19 no Estado do Amazonas. Para tanto foram estipulados como objetivos específicos contextualizar a violência doméstica no Estado do Amazonas, explanar a relação entre o isolamento social e o índice de casos de violência doméstica, e apresentar a Lei Maria da Penha como uma garantia de direitos às vítimas de violência doméstica.
2 A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NO ESTADO DO AMAZONAS E O CONTEXTO DE PANDEMIA
2.1 Violência doméstica: aspectos conceituais e tipificação
Anterior ao aprofundamento necessário para a compreensão do cenário amazonense acerca da violência doméstica e a pandemia, faz-se mister a contextualização conceitual desta violência, bem como o levantamento da tipificação possível da mesma.
De acordo com Alves e Oppel (2021) a compreensão acerca da violência doméstica se baseia inicialmente na violência de gênero, em que casos de agressões nos mais diversos níveis são apresentados contra a mulher, sendo estes casos uma questão cultural enraizada pelo sistema patriarcal, abarcando desde preconceito, humilhações até a intolerância de gênero.
Neste ponto, Porto (2018) complementa que a violência doméstica se caracteriza inicialmente por atos de violência praticados contra a mulher, mais especificamente por pessoas próximas e de seu convívio, ocorrendo no âmbito privado de convivência. Campos (2017) explica ainda que a Lei nº 11.340 (BRASIL, 2006) busca definir a violência doméstica, conforme:
Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;
II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.
Art. 6º A violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos
No que concerne aos tipos de violência doméstica, Fiorotti et al. (2018) apresentam que a mesma não se limita a casos de agressão de ordem física, mas pode ocorrer de outras formas, identificando-se a violência psicológica, patrimonial, sexual e violência moral.
Freitas et al. (2019) explanam que a violência física é caracterizada por aquela que impacta diretamente na integridade física da mulher, com práticas que ofendam o corpo da vítima. De acordo com os autores este tipo de violência se manifesta através de atos que variam desde atos discretos como beliscões e empurrões, e que evoluem para e deferimento de socos e pontapés, alcançando inclusive ocorrências como sufocamentos, enforcamentos e mutilações, por vezes alcançando casos de óbito.
Já a violência psicológica é apresentada por Lima et al. (2020) como o tipo de agressão doméstica que não atinge o corpo da vítima mas que ocasiona danos profundos na saúde mental e emocional da mesma, causando inseguranças, ansiedade, depressão, entre outros. Complementam que a violência doméstica do tipo psicológica se manifesta através de humilhações, xingamentos, chantagens, perseguição, entre outros.
A violência patrimonial, segundo Ximenes, Cavalcanti e Costa (2021), se constitui em atos agressivos através do controle da sobrevivência da vítima com o controle de bens que esta tenha direito. Esclarecem também que a violência doméstica patrimonial pode ser materializada com o controle de recursos econômicos básicos, a retenção de documentos pessoais e daqueles que comprovem a posse de bens, bem como causar danos a bens particulares da mulher.
Gaspar e Pereira (2018) explicam que a violência sexual se dá por ações agressivas relacionadas a sexualidade da mulher, com a tentativa ou consumação de ato sexual indesejado, bem como insinuações, comércio, privação ou ainda imposições, atingindo ainda repressão, proibição ou coerção para uso de meios contraceptivos, bem como imposição para o aborto. E por fim, a violência moral é identificada pelos autores como aquela que visa atingir a integridade moral da mulher, inferindo consequências a sua condição enquanto cidadão, levantando calúnias e difamações.
2.2 A violência doméstica em tempos de pandemia no Estado do Amazonas
No que tange ao processo de conhecimento sobre a violência doméstica no Amazonas na pandemia é salutar a identificação inicial dos dados mais atualizados sobre os casos de violência contra a mulher no estado.
De acordo com Atlas da Violência do ano de 2021 (IPEA, 2021) anterior ao cenário de pandemia, o estado do Amazonas registrou cerca de 68.331 casos de violência em que mulheres se apresentaram como vítimas somente no ano de 2019, o que demanda um aumento de cerca de 20% em relação ao ano anterior. Ainda de acordo com os dados oficiais do estado, no mesmo ano os casos identificados como violência doméstica, em conformidade com o preconizado pela lei, foram registrados 15.199 ocorrências neste sentido.
O Atlas da Violência do ano de 2021 (IPEA, 2021) apresentou os dados de homicídios com vítimas mulheres no estado do Amazonas em 2019, sendo registrados 118 casos desta ocorrência, com uma taxa de 5,7 casos para cada 1000 mulheres no referido ano. Ainda de acordo com a mesma publicação, no ano de 2019 o Estado do Amazonas configurou entre as três principais unidades federativas com maior número de casos no país.
No que concerne aos municípios específicos do Estado do Amazonas no ano de 2019, as cinco localidades mais expressivas em relação a tendência de crescimento de homicídios de mulheres são a capital, Manaus, seguida de Coari, Eirunepé, Boca do Acre e Iranduba (IPEA, 2021).
Os dados oficiais pertinentes à violência doméstica no cenário pandêmico desde o ano de 2020 ainda não são de conhecimento público de forma sistematizada por publicações das secretarias de segurança, sendo pertinente o esclarecimento de achados originados de registros de ocorrências das delegacias especializadas.
De acordo com dados preliminares colhidos junto as secretarias de segurança pública, no ano de 2020, foram notificados 25.132 casos, com fatos relacionados a injúria, ameaça, lesão corporal e perturbação da tranquilidade. No que tange aos processos judiciais que tratavam de violência doméstica no ano de 2020, sendo efetivado um total de 18.972 processos na justiça estadual (MENDONÇA, 2021).
2.3 As consequências da violência doméstica na pandemia
O cenário de pandemia atinge diretamente a mulher vítima de violência doméstica sob diversas circunstâncias, sendo possível destacar a necessidade de maior convivência com o agressor em razão do confinamento proposto como medida de proteção, a dificuldade de realização da denúncia, a dependência econômica piorada em razão da pandemia, a redução dos serviços assistenciais, entre outros.
De acordo com Oliveira et al. (2020), em consideração a necessidade de cumprimento das medidas de segurança sanitária, o isolamento social influenciou negativamente nos casos de violência doméstica uma vez que potencializou os riscos de ocorrências, pois a convivência entre vítima e agressor se tornou ainda mais próxima, pois o trabalho sendo realizado no contexto domiciliar e as regras de locomoção restritas colocaram ambos no mesmo espaço por mais tempo.
Outro ponto destacado neste sentido, é apresentado por Sousa, Santos e Antonetti (2021) através da dificuldade de acesso aos canais de denúncia, uma vez que o constante monitoramento do agressor junto as possibilidades de contato externo para reclamação das agressões, bem como as impossibilidades de acesso as redes de apoio, seja as famílias ou as institucionais, contribuíram neste sentido.
Também é necessário citar que por se tratar de um contexto em que os recursos financeiros e econômicos por vezes se mostram escassos, a violência doméstica ganha mais espaço quando se trata da dependência econômica em muitas vezes já instalada, e que é potencializada neste sentido, o que impede ainda mais de buscar auxílio (SOUZA et al., 2021).
Gomes (2020) elucida que a pandemia escancarou as diferenças de gênero, uma vez que fomentaram as diferenças sociais e econômicas entre homens e mulheres, sendo necessário frisar que muitos casos de homicídios se instalam neste contexto.
3 CONFINAMENTO SOCIAL E O AUMENTO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
3.1 A dificuldade de denúncia da violência doméstica
A questão da violência doméstica apresenta uma série de aspectos que direcionam a importância da discussão sobre a mesma, sendo possível destacar destas estes a dificuldade de denunciar as ocorrências de violência doméstica, bem como as causas que determinam esta complicação.
Segundo Grossi et al. (2020), uma das vertentes apresentadas como empecilhos para que a vítima efetive a denúncia de violência doméstica, é o relato constante de possibilidades de aumento da quantidade e piora dos meios de agressão, uma vez que é fato que, diante a acusação de violência, o agressor passe a tomar como postura de defesa ações de ordem ainda mais violenta, podendo ainda mudar o tipo de violência exercida.
Sousa e Silva (2019) apresentam ainda a falta de uma rede de apoio que compreenda as vulnerabilidades inerentes à vítima, seja sob a perspectiva familiar, comunitária, social ou ainda institucional, pois muitas das mulheres que sofrem violência doméstica não efetivam denúncias contra os agressores em razão da dependência econômica com os mesmos, sendo ainda notada a falta de estrutura para moradia e subsistência dos filhos.
Sob o viés psicológico e emocional, Goes (2019) apresenta ainda que a vergonha inerente a vítima de violência doméstica se destaca como uma das justificativas acerca da não denúncia das ocorrências, uma vez que a mulher sente-se humilhada e com receio do julgamento externo sobre sua condição, alegando por vezes o conhecimento do potencial de preconceito que pode sofrer, optando então por não denunciar o agressor.
3.2 Causas da violência doméstica no isolamento social
No que tange ao levantamento das possíveis causas relacionadas à violência doméstica no contexto de isolamento social, é importante destacar que as mesmas causas identificadas anterior ao momento pandêmico se mostram mais destacadas, sendo então apresentadas pelo uso de drogas e álcool, questões de ordem financeira, recusa ao ato sexual, ciúmes, gravidez, entre outros.
Em relação as questões econômicas, Carvalho e Oliveira (2017) elucidam ser possível destacar as causas da violência doméstica como as dificuldades econômicas de manutenção da família, bem como o desemprego, além das complicações provenientes de mudanças nos meios de trabalho, sendo estas questões exacerbadas no momento da pandemia.
Outro ponto comumente relacionado entre as causas da violência doméstica é apresentado por Rosa (2017) através do uso de entorpecentes associados as ocorrências, uma vez que quando o agressor é usuário de drogas ou ainda de álcool, com o potencializador maior da pandemia em tela, os casos de violência contra mulher se mostram ainda maiores.
Acosta et al. (2018) citam ainda questões de ordem de relacionamento que incidem nas ocorrências de violência doméstica, como por exemplo as relações sexuais, mais precisamente quando se trata da recusa da mulher em estabelecer atos sexuais com o agressor, o que pode ser um agente motivador para as agressões.
Singulano e Teixeira (2020) explicam ainda que o ciúmes também é identificado como uma das causas da violência doméstica diante da insegurança do agressor sobre supostas traições. Segundo Nascimento et al. (2021) ocorrências de gravidez também se destacam como possíveis justificativas para atos de violência doméstica.
No contexto pandêmico a intensidade do momento é ainda mais oferecida em se tratando dos casos de violência doméstica, sendo apresentadas para além das causas anteriores as questões de insegurança sobre o futuro, problemas de convivência que se originam ou se agravam, ou ainda questões de contradições nos pontos de vista acerca do cumprimento de medidas de segurança (FARIAS et al., 2021).
3.3 Feminicídio na pandemia
O feminicídio é definido por Souza (2018) como a ocorrência de um homicídio em que a vítima é uma mulher, tendo como motivação o fato do gênero da mesma, sendo então defendido como uma segurança aos direitos da mulher, considerando principalmente o elevado número de ocorrências do mesmo.
De acordo com Estefan (2018),
Temos que o femicídio é o genus, compreendendo qualquer homicídio que tenha uma mulher como vítima, ainda que motivado por questões absolutamente alheias ao seu gênero, e o feminicídio, espécie, designativo da supressão da vida de mulheres decorrente de questões de gênero ou, na expressão adotada pelo nosso Código, por razões da condição de sexo feminino (p. 134).
Segundo Mesquita (2018) é imprescindível que a compreensão do feminicídio se constrói em bases que consideram que a mulher é inferior, e que tal homicídio ocorre com bases na misoginia, ou seja, se estabelece como uma resposta ao sentimento de ódio contra as mulheres. Turatto e Silva (2022) complementam que tal crime é uma conquista considerável da sociedade em razão dos números exorbitantes de mortes criminais relacionadas ao gênero em tela.
Em se tratando da pandemia, as notificações de feminicídio, a exemplo das ocorrências de violência doméstica, foram notificados aumentos cada vez mais expressivos, sendo notado, somente o primeiro semestre das medidas de confinamento e isolamento social, um aumento de mais de 22% das ocorrências desta natureza em todo o país, destacando-se os estados do Acre, Mato Grosso, Rio Grande do Norte e São Paulo (FBSP, 2020).
4 A LEI MARIA DA PENHA E A LEI DO FEMINICÍDIO: OS BENEFÍCIOS LEGAIS PARA PROTEÇÃO DE MULHERES VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
4.1 O avanço do amparo e dos direitos das mulheres em situação de violência doméstica
O reconhecimento dos direitos da mulher perpassa invariavelmente pela identificação da importância da instituição de bases legais que preconizam o enfrentamento da violência contra estas, sendo de suma necessidade a apresentação da Lei 11.340 de 2006 (BRASIL, 2006) e a Lei 13.104 de 2015 (BRASIL, 2015), as quais se apresentam como avanços significativos na implementação de direitos destas mulheres.
A Lei 11.340 de 2006 (BRASIL, 2006), popularmente reconhecida como a Lei Maria da Penha, é identificada em nível internacional como uma política de garantia de direitos bastante significativa, uma vez que:
Art. 1º Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.
Marques, Erthal e Girianelli (2020) elucidam que tal normativa se constitui em um avanço notório quando se trata das especificações acerca da violência contra a mulher, uma vez que vai além dos determinantes encontrados pelos estudos na área, pois efetivamente conceitua a violência doméstica, tipifica e apresenta medidas a serem tomadas quando se trata de tais ocorrências. Campos e Gianezini (2019) complementam ainda que esta lei, ao determinar tais aspectos aponta para a importância da temática, sendo salutar ainda a indicação de seu caráter global.
De acordo com Espínola (2018) é importante destacar a globalidade de atendimento desta legislação uma vez que a mesma padroniza todo percurso a ser seguido quando das ocorrências, sendo esta propositura uma importante intervenção quando se trata da relevância do atendimento as vítimas de violência. Marciano et al., (2019) afirma ainda que tal lei deve ser destacada diante sua relevância para a proteção da mulher vítima de violência, uma vez que apresenta as medidas protetivas a serem adotadas bem como os serviços de acolhimento.
Bianchini (2018), ao analisar os entremeios da Lei Maria da Penha, afirma que a mesma se destaca também pela iniciativa em atender tais demandas de forma a efetivamente auxiliar no processo de reconhecimento da violência contra a mulher, da mesma forma que assegura atendimento de forma integral. Elucidam que o corpo de lei se mostra claro e determinante, sendo necessária atuação direta dos órgãos competentes na sua aplicação.
Outra legislatura competente aos avanços legais sobre a defesa e proteção dos direitos da mulher vítima de violência, é a Lei 13.104 de 09 de março de 2015 (BRASIL, 2015), popularmente reconhecida como a Lei do Feminicídio, a qual é um instrumento que apresenta o crime de homicídio contra a mulher em razão do seu gênero, como uma qualificadora.
Rochman (2020) esclarece que tal legislação se mostra relevante não somente por atender aos crimes contra a vida da mulher, mas principalmente por se adequar aos casos em que os mesmos ocorrem em razão do gênero da vítima, uma vez que tais ocorrências se destacam pela misoginia comum aos casos aplicados. Pereira e Miranda (2019) afirmam que é importante destacar que esta legislatura atende toda dinâmica relacionada aos crimes contra a mulher, pois compreende a mesma como vítima de violência doméstica também.
A referida legislação apresenta ainda as questões incriminatórias e a qualificadora em caso de condenação, conforme:
§ 7º A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado:
I - durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto;
II - contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência;
III - na presença de descendente ou de ascendente da vítima.” (NR) (BRASIL, 2015).
Iasulaitis e La Scalea (2021) analisam ainda que tal lei é de suma importância como uma garantia de direitos para as mulheres uma vez que estabelecem maior gravidade nestes casos e atendem as especificidades da compreensão de que foram executadas contra mulheres, e consideram toda a condição das mesmas.
4.2 Os mecanismos jurídicos de proteção no enfrentamento ao aumento da violência doméstica contra a mulher, no âmbito da pandemia.
Diante do contexto de pandemia, é salutar a compreensão acerca dos mecanismos de proteção a mulher em situação de violência doméstica sob a perspectiva jurídica, sendo salutar o entendimento que não houve alteração na constituição dos mesmos em razão do âmbito pandêmico, sendo então os mesmos apresentados em qualquer situação.
Além dos mecanismos legais apresentados anteriormente, com a efetivação de crimes como a violência doméstica e feminicídio, Coimbra, Ricciardi e Levy (2018) apresentam que a Lei Maria da Penha estabelece as Medidas Protetivas de Urgência, as quais são identificadas como determinações que obrigam o agressor ao afastamento da vítima, como uma forma de resguardar a mesma.
Segundo o artigo 22 da Lei Maria da Penha, da Seção II:
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003 ;
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;
IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
VI – comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação; e
VII – acompanhamento psicossocial do agressor, por meio de atendimento individual e/ou em grupo de apoio.
§ 1º As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público (BRASIL, 2006).
De acordo com Pereira e Hazar (2018), as Medidas Protetivas não são atribuídas somente ao agressor como forma de obrigar o mesmo, mas também possuem um caráter de proteção à mulher por tratarem, se acordo com Seção III, das Medidas de Proteção de Urgência à Ofendida, conforme:
Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;
II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;
III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;
IV - determinar a separação de corpos.
V - determinar a matrícula dos dependentes da ofendida em instituição de educação básica mais próxima do seu domicílio, ou a transferência deles para essa instituição, independentemente da existência de vaga.
Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre outras:
I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;
II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial;
III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;
IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida (BRASIL, 2006).
Carvalho e Rezende (2022) esclarecem que as mediadas protetivas devem ser compreendidas como medidas urgentes e de grande valia quando se trata do resguardo da vida e dos direitos da mulher em condição de violência, sendo de suma importância que o poder público efetive meios de proteção as mesmas.
5 CONCLUSÃO
Este trabalho foi desenvolvido a partir de uma pesquisa bibliográfica tendo como referência o tema no Estado do Amazonas, objeto centrado na citada pesquisa, buscando informações das ocorrências contra mulheres em tempo de pandemia, fazendo desta forma uma análise do acréscimo dos casos de violência doméstica.
Através da avaliação dos impactos notados em casos de violência doméstica em detrimento da mulher, contextualizando o âmbito da pandemia, aponta invariavelmente para a necessidade de aprofundamento em questões diversas que estejam ligadas à temática.
Inicialmente a pesquisa indicou uma série de fatores que estão relacionados a violência doméstica, sendo importante destacar as possíveis causas e os tipos de violência que ocorrem, vinculando tais questões ao contexto de pandemia, o que percebeu-se ser um agente potencializador da violência doméstica, ou ainda fatos que subsidiam a origem destas ocorrências.
Outro achado pertinente foi o potencial de atendimento legal e jurídico das legislações pertinentes já em vigência no país, as quais se adequam de forma integral as possibilidades de violência doméstica quando atreladas à pandemia, o que auxilia as vítimas no processo de segurança de vida e de direitos.
Assim, diante dos fatos evidenciados pela pesquisa é salutar a conclusão que os impactos causados pela violência domésticas às mulheres no contexto da pandemia são diversos, e que cabe ao poder público, seja pelo Estado ou entidades judiciárias a busca da paz social, solucionando desta forma tais demandas.
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Graduanda do Curso de Direito do Centro Universitário Fametro. E-mail: [email protected]
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VASCONCELOS, Pollyana Evelyn Guimarães. Impactos da violência doméstica contra a mulher no seio familiar no decorrer da pandemia do covid 19 no Estado do Amazonas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 maio 2022, 04:24. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/58425/impactos-da-violncia-domstica-contra-a-mulher-no-seio-familiar-no-decorrer-da-pandemia-do-covid-19-no-estado-do-amazonas. Acesso em: 28 dez 2024.
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