LUCAS FERNANDES DE MORAIS VIDOVIX[1]
(coautor)
PAULO ROBSON MARTA DA SILVA[2]
(coautor)
RESUMO: No presente artigo, foram explanadas as características principais do Direito Sistêmico, amparadas nos entendimentos do jurista Sami Storch, a aplicação da constelação familiar, pautada pelo método psicoterapêutico do psicanalista alemão Bert Helling como um mecanismo de solução de conflitos nas relações sociais, e a influência das leis sistêmicas sobre a compreensão holística dos atos humanos com vistas ao alcance da paz no âmbito das relações sociais. Essa pesquisa visou compreender a importância do Direito Sistêmico no tocante à solução de conflitos no campo social. Para tal, realizou-se um amplo estudo bibliográfico exploratório e foram explicitadas as fundamentações de especialistas no ramo do Direito Sistêmico, a fim de alcançar o objetivo central do estudo. Por fim, foram exteriorizadas as considerações finais acerca da temática desenvolvida no presente trabalho e as referências bibliográficas utilizadas no desenvolvimento da temática.
Palavras-chave: Direito Sistêmico. Constelações Familiares. Conflitos Sociais. Leis Sistêmicas.
ABSTRACT: In this article, the main characteristics of Systemic Law were explained, supported by the understandings of the jurist Sami Storch, the application of the family constellation, guided by the psychotherapeutic method of the German psychoanalyst Bert Helling as a mechanism for conflict resolution in social relationships, and the influence of systemic laws on the holistic understanding of human acts with a view to achieving peace in the social relations. This research aimed to understand the importance of Systemic Law regarding the solution of conflicts in the social field. To this end, a broad exploratory bibliographic study was carried out and the ideas of specialists in the field of Systemic Law were explained, in order to achieve the central objective of the study. Finally, the conclusion about the theme developed in the present work and the references used in the development of the theme were externalized.
Keywords: Systemic Law. Family Constellations. Social Conflicts. Systemic Laws.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Direito Sistêmico E Seus Principais Elementos Caracterizadores. 3. Constelação Familiar E Seus Aspectos Conceituais E Estruturais. 4. Ordens Ou Leis Sistêmicas De Bert Hellinger. 5. Considerações Finais. 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Na sociedade moderna, observa-se o desenvolvimento de relações humanas as quais, em virtude de determinados desvios ou desordens, podem gerar conflitos entre os sujeitos. Não raro, tais conflitos são acompanhados de violência física e/ou psicológica, culminando em um processo de desconstrução do sistema em que os sujeitos estão situados.
Nesse cenário, faz-se mister a aplicação do Direito na resolução das controvérsias sociais. Para tal, são utilizadas técnicas que combinam o Direito aos conhecimentos emanados pelas ciências humanas e sociais, como a psicologia, a sociologia, a antropologia, entre outras, as quais norteiam o entendimento dos fatores que permeiam os conflitos do sistema. Busca-se, assim, uma análise mais minuciosa dos padrões comportamentais, vislumbrando-se as necessidades dos sujeitos e estimulando uma solução pacífica do litígio.
Pertinente consubstanciar a importância do direito sistêmico na resolução dos conflitos, visto que ele se fundamenta na utilização inovadora de métodos terapêuticos que permitem que os sujeitos entendam a origem dos conflitos e de determinados comportamentos. Ademais, tais métodos permitem que os sujeitos se liberem de padrões e crenças restritivos e busquem uma nova ordem mais consciente de relações humanas, panorama em que se destacam as leis sistêmicas de Bert Hellinger como reguladoras das relações humanas. Como exemplo dos referidos métodos, pode-se citar as constelações familiares que estão sedimentadas em pilares do direito sistêmico e fornecem ferramentas utilizadas na solução pacífica, incisiva e completa de conflitos sociais.
Importante notar que, tendo em vista os fenômenos imprevisíveis produzidos no mundo contemporâneo, as regras jurídicas, em seu aspecto burocratizado e rígido, mostram-se ineficazes em procedimentos de resolução de litígio. Conforme o físico teórico Capra (2006), para se atingir à solução adequada do conflito, deve-se entender a complexa interdependência existente entre os fatores do sistema, o que não ocorre apenas na interpretação de normas.
Sob esse giro, o presente artigo visa compreender a importância do sistêmico no tocante à solução de conflitos no campo social. Para o alcance do objetivo, serão realizadas as seguintes abordagens: - conceituação e importância do Direito Sistêmico; - as especificidades atinentes às constelações familiares; e - leis sistêmicas de Bert Hellinger.
A pesquisa científica consistiu no estudo bibliográfico exploratório, abordando as fundamentações de especialistas no ramo do Direito Sistêmico. Por fim, foram exteriorizadas as considerações finais acerca da temática desenvolvida no presente trabalho e as referências bibliográficas utilizadas na construção da plataforma teórica.
2. DIREITO SISTÊMICO E SEUS PRINCIPAIS ELEMENTOS CARACTERIZADORES
De acordo com Storch (2011), o Direito Sistêmico decorre da “análise do direito sob uma ótica baseada nas ordens superiores que regem as relações humanas, segundo a ciência das constelações sistêmicas desenvolvida pelo terapeuta e filósofo alemão Bert Hellinger”.
O ponto fulcral do Direito Sistêmico se sedimenta na pacificação social e na solução de litígios sociais de forma harmoniosa e equilibrada, consoante sublinhado por Oldoni, Lippmann e Girardi (2018). Nesse compasso, importante gizar a essencialidade do equilíbrio na solução dos conflitos entre as partes. Para Storch (2018), atinge-se o equilíbrio em um caso litigioso quando as leis sistêmicas consubstanciadas na doação e recebimento, no pertencimento e na precedência se encontram em homeostase.
Relevante explicitar que o sistema está em estado de homeostase quando o seu processo de autorregulação se mantém estável, conforme ensinado por Wright e Leahey (2002). Note que há forças internas ou externas ao sistema que podem gerar mudanças em sua estrutura, mas ele se reorganiza, quando o seu funcionamento está adequado, para um novo patamar de equilíbrio. Nesse diapasão está o posicionamento de Bousso (2008).
Conforme Aguiar et al. (2018), o Direito Sistêmico se ancora em uma análise ampla dos fatores envolvendo o litígio, identificando as suas nuances e buscando a sua solução. Nesse giro, Storch (2018) considera que os fatores pertencem ao mesmo sistema, embora possam estar vinculados a outros sistemas como familiares, profissionais, religiosos, entre outros.
Nesse passo, curial elucidar a conceituação de sistema. Segundo Alvarez (1990), estribado nos ensinamentos do biólogo austríaco Karl Ludwig von Bertalanffy, define-se como sistema um conjunto de elementos interdependentes que realizam interações e possuem funções específicas. O autor enfatiza que esses elementos, quando formam uma estrutura sistêmica, encampam um efeito sinérgico em sua funcionalidade, o que não ocorrerá se os aludidos elementos funcionarem independentemente.
Pois bem, para que sejam compreendidos os problemas que se entrelaçam no sistema, deve-se identificar, independentemente dos procedimentos jurídicos, os fatores que provocam a desarmonia ou a desordem no ambiente e culminam no litígio entre as partes.
Contudo, verifica-se que, não incomum, as decisões judiciais fulcradas na interpretação literal do arcabouço jurídico geram um estado de desequilíbrio entre os litigantes. Isso porque o operador do Direito, em regra, não possui uma visão panorâmica do conflito entre as partes e não se aproxima, da forma apropriada, às partes para melhor compreender o caso fático. Storch (2018) menciona fraquezas nesse modelo de solução de conflitos, in verbis:
A tradicional forma de lidar com conflitos no Judiciário já não é vista como a mais eficiente. Uma sentença de mérito, proferida pelo juiz, quase sempre gera inconformismo e não raro desagrada a ambas as partes. Em muitos casos, enseja a interposição de recursos e manobras processuais ou extraprocessuais que dificultam a execução. Como consequência, a pendência tende a se prolongar, gerando custos ao Estado e incerteza e sofrimento para as partes.
Concernente à fundamentação jurídica de utilização do Direito Sistêmico, sublinhe-se, por oportuno, o que dispõe a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – CF/88 – (BRASIL, 1988) sobre a temática. Nessa linha, dispõe a referida Constituição em seu art. 1º, inciso III, que a dignidade humana se consagra como um fundamento ímpar do País. Evidencia-se, também, no art. 3º, inciso I, do diploma constitucional que um dos objetivos fundamentais do País se consubstancia na construção de uma sociedade livre, justa e solidária.
Interpretando todo esse contexto constitucional, Souza (2019) pontua que o nosso ordenamento jurídico-constitucional preza pela vida harmoniosa e pacífica em coletividade e pelo desenvolvimento humano. Para o especialista, a utilização de instrumentos alternativos na resolução de conflitos se compatibiliza com as diretrizes insculpidas na CF/88.
A legislação processual civil brasileira, consolidada na Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, nomeada de Código de Processo Civil de 2015 – CPC/15 – (BRASIL, 2015), traz à baila recursos que tendem, de forma humanizada e com o apoio de uma maior gama de profissionais, a uma solução consensual de conflitos. Nessa esteira, estão o arts. 3º e 694 do Código em comento, ipsis litteris:
Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.
§ 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei.
§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.
(...)
Art. 694. Nas ações de família, todos os esforços serão empreendidos para a solução consensual da controvérsia, devendo o juiz dispor do auxílio de profissionais de outras áreas de conhecimento para a mediação e conciliação.
Parágrafo único. A requerimento das partes, o juiz pode determinar a suspensão do processo enquanto os litigantes se submetem a mediação extrajudicial ou a atendimento multidisciplinar. (grifos nossos)
Pertinente consignar que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) considera que as ferramentas consensuais de solução de conflitos, tais como a mediação e a conciliação, são efetivas no alcance da resolução harmoniosa de conflitos e até mesmo em sua prevenção. Denota ainda que os programas que atuam com esse viés gerou uma redução de conflitos tanto na fase de conhecimento quanto na recursal no âmbito judiciário. Devido a isso, o aludido órgão normatizou tais dispositivos na Resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010.
Oldoni, Lippmann e Girardi (2018) salientam que os objetivos da referida Resolução se fundamentam na pacificação social, na prestação de serviços de qualidade relativamente à solução e à prevenção de conflitos e no incentivo aos órgãos judiciais a adotarem instrumentos consensuais.
Nesse contexto, verifica-se a relevância do entendimento panorâmico do sistema em que há um conflito, visto que cada sistema tem a sua peculiaridade em termos de unidades formadoras. Sendo assim e considerando o entendimento lecionado por Aguiar et al. (2018), os advogados, os membros da magistratura, do Ministério Público, entre outros, devem visualizar que pertencem a um mesmo sistema e, por isso, se faz necessária a interação de seus agentes com vistas a compreender os pontos controversos e a resolver exitosamente os litígios.
3. CONSTELAÇÃO FAMILIAR E SEUS ASPECTOS CONCEITUAIS E ESTRUTURAIS
No tocante à constelação familiar, tem-se que o seu fundador foi Anton “Suitbert” Hellinger, conhecido como Bert Hellinger. Consoante Oldoni, Lippmann e Girardi (2018), o especialista Hellinger nasceu em Leimen/Alemanha, no dia 16 de dezembro de 1925; exerceu a função de sacerdote e de missionário dos Zulus; atuou na África do Sul por 16 (dezesseis) anos, exercendo as funções de professor e terapeuta, sobretudo.
De acordo com Hellinger (2003), a técnica de constelação familiar fundada por Bert Hellinger consiste em um método psicoterapêutico com uma abordagem sistêmica. Tal método analisa as emoções e energias do sujeito e busca compreender os fatores que compõem o sistema familiar em que o sujeito está inserido. A aludida técnica tem como pilares os conhecimentos de Psicologia, Terapia Sistêmica, Psicanálise Familiar e Estrutural, Fenomenologia e Sociologia. Ademais, a referida técnica é empregada tanto na forma endoprocessual em atos conduzidos pelo Poder Judiciário como na extraprocessual por meio da advocacia com enfoque em relações sistêmicas entre as partes.
Importante frisar que o método das constelações familiares compreende um vasto campo do conhecimento humano, sendo aplicado a diversos sistemas de convivência social como adoção, guarda, divórcio, ramos empresariais etc.
Sustenta Duprée (2019, p. 19) que o método da constelação familiar “envolve a análise de comportamentos e percepções de efeitos cujas causas não podem ser medidas fisicamente e, dificilmente podem ser quantificadas, pois cada terapia é única”. Aduz o pesquisador que a constelação familiar não é dotada de caráter científico, visto que os seus efeitos e resultados não são passíveis de previsão e reprodução, estando insculpida na seara fenomenológica.
Vieira (2018) explicita que a técnica em apreço estimula o sujeito a vislumbrar a sua experiência, de modo a focar em aspectos importantes e a olhar para a solução dos problemas. Nessa esteira, relevante expor alguns entendimentos de Tredinnick (2019) sobre a temática. Para o autor, a constelação familiar se estabelece como eficaz quando os atos praticados pelos sujeitos partem de um prisma voluntário, laico, neutro e sigiloso, com a utilização apropriada de métodos terapêuticos pelos profissionais consteladores.
Nesse contexto, Hellinger (2003) ressalta que a metodologia empregada na constelação familiar pode auxiliar as pessoas na identificação de possíveis rotas de solução de litígios, de modo que o sentimento de amor se exteriorize em um fluxo livre no sistema.
Para os especialistas Oldoni, Lippmann e Girardi (2018), a técnica em apreço promove, a partir da reconstrução da árvore genealógica do sujeito, a compreensão dos vínculos entre o sujeito e os diversos fatores do sistema, objetivando a identificação de bloqueios atinentes ao fluxo de amor do sistema em exame e o posterior tratamento deles.
Nesse diapasão, Conforme Carolino e Júnior (2014) reforça que são vários os fatores que se entrelaçam em esferas conflituosas. Isso porque eles podem ter origem física, social, cultural, psicológica e biológica. Nessa senda, para se obter êxito na solução dos conflitos em relações humanas, deve-se desenvolver uma visão holística dos aludidos fatores sob o ponto de vista do pensamento sistêmico. Em face disso, busca-se desenvolver uma conexão entre os sujeitos do sistema, objetivando um entendimento de peculiaridades presentes padrões e comportamentos.
Para Schneider (2013), o uso da referida técnica promove a superação de bloqueios relativamente ao crescimento e ao desenvolvimento da personalidade do sujeito. Superados os bloqueios, o sujeito fica diante de um sistema harmonioso e pacífico sem os emaranhados, os conflitos e as confusões que se estabelecem quando se negam as leis sistêmicas. Ademais, Schneider (2013) afirma que, na técnica, deve-se procurar entender as vinculações dos problemas do sujeito ao sistema em exame, além de identificar a dinâmica de seus relacionamentos no espaço e no tempo, de modo a produzir uma apropriada configuração do sistema.
Vall e Belchior (2019) explicita que a constelação familiar deve ser aplicada em momento anterior à audiência de conciliação ou mediação. Nesse sentido, ela pode ser implementada mediante vivências coletivas. Nelas, os sujeitos são convidados a conhecerem o método, o que estimula os sujeitos a uma melhor compreensão dos problemas a serem solucionados.
Por meio do método de constelações familiares, Vall e Belchior (2019) constataram que os sujeitos compreendem uma maior amplitude dos fatores que permeiam o sistema em análise. Sob esse giro, vislumbra-se que tal conhecimento transcende o campo jurídico proporcionado pelos órgãos judiciais, por exemplo.
Evidencia Storch (2017) que as soluções produzidas por meio das constelações familiares devem ser profundas e duradouras, abrangendo todo o sistema em exame, de modo a analisar as mais profundas raízes dos conflitos e a garantir o desenvolvimento saudável dos sujeitos. Para isso, o autor afirma que a solução sistêmica necessita abranger toda a origem familiar do indivíduo.
Nesse passo, pontuam Silva e Junior (2020) que o jurista Storch realizou algumas adaptações nos mecanismos consensuais de solução de conflitos na Vara de Família de Itabuna/Bahia/BA, além de ter ministrado palestras vivenciais, convidando partes envolvidas em processos litigiosos para participarem de suas metodologias acerca das constelações familiares.
Sendo assim, vale gizar que a constelação familiar visa à pacificação social, visto que a sua técnica se volta a um prisma que promove o desdobramento e a compreensão dos fatores que culminam nos litígios. Note-se que a aplicação pura da hermenêutica jurídica pode não ser suficiente para resolver determinados conflitos que exijam uma maior interpretação da ambiência em que as partes estão imersas. Por isso, constata-se, na maioria das vezes, a ineficiência do Poder Judiciário quando atua, distante das partes, em suas linhas procedimentais rígidas.
No âmbito do Poder Judiciário, os operadores do Direito devem buscar a aproximação das partes com o fito de solução dos conflitos, encampando um aspecto mais humanizado à seara processual. Ademais, devem gerar nos sujeitos envolvidos o sentimento de que será escutado e compreendido e não julgado. Nesse ínterim, as partes conseguem entender, com uma maior clareza, a problemática em que estão inseridas e as suas responsabilidades. Vale evidenciar que o método objetiva, também, uma maior celeridade na resolução das demandas conflituosas, a qual está ancorada nos pilares da justiça e do consensualismo.
Relevante, por oportuno, mencionar que, no Brasil, os Tribunais de Justiça de 21 (vinte e um) Estados brasileiros utilizam, em alguma proporção, os ensinamentos pautados na técnica psicoterapêutica de constelação familiar para a solução de conflitos (VALADARES, 2020).
Assente-se que no processo devem ser resolvidas as questões de direito, enquanto as questões emocionais e conflitos inconscientes devem ser trabalhadas, de forma ativa e com ajuda de profissionais de outras áreas, caso seja necessário, mediante a técnica de constelações familiares. Para Storch (2011), a teoria sistêmica consigna a aplicação em casos conflituosos de conhecimentos jurídicos associados a técnicas terapêuticas, sendo respeitados os valores e princípios consolidados no sistema.
4. ORDENS OU LEIS SISTÊMICAS DE BERT HELLINGER
Oldoni, Lippmann e Girardi (2018) obtemperam que o método de constelação familiar plasmado por Bert Hellinger possui três ordens ou leis, nomeadas de ordens de amor, que devem ser observadas para que haja equilíbrio no sistema familiar. Tais ordens de amor ou leis sistêmicas coordenam as relações entre os sujeitos e norteiam os operadores do Direito a possuírem uma maior sensibilidade para o entendimento dos fatores que permeiam o sistema em casos litigiosos.
Cumpre esclarecer que as leis sistêmicas de Helliger foram baseadas em experiências vividas pelo especialista quando observava as relações sociais dos Zulus (povo do sul da África). Por conseguinte, possuem raízes empíricas, não estando vinculadas à racionalidade ou à moral. Nessa linha, constatou o especialista que, quando ocorria algum descumprimento das leis sistêmicas pelos sujeitos da comunidade, surgiam emaranhamentos ou desordens. Outrossim, observou que, quando o sujeito materializasse condutas que fossem no mesmo sentido axiológico do grupo ou sistema familiar em que convivia, ele se sentia mais seguro com os seus valores e princípios e, psicologicamente, mais tranquilo.
Consoante Bert Hellinger (2003), as leis sistêmicas são: - a Lei do Pertencimento; - Lei da Precedência; e - Lei do Equilíbrio. Passa-se a expô-las, brevemente.
Hellinger destaca que, na Lei do Pertencimento, o sujeito deve ter o direito de pertencer ao seu sistema familiar, de acordo com as suas regras e crenças. Independentemente de o sujeito se referir a uma pessoa doente, idosa ou falecida, deve ter a sua identidade reconhecida e incluída no grupo a que está vinculado. O especialista explicita que o sujeito deve estar comprometido com as suas obrigações coletivas, além de estar a serviço do grupo, consciente ou inconscientemente. Realça que a consciência do sujeito fica mais tranquila quando realiza atos, de forma harmônica, no sistema a que pertence, o que culmina em sentimentos de segurança e pertencimento aos sujeitos.
No tocante à Lei da Precedência, o seu cerne está no fato de que os sujeitos mais velhos devem prevalecer sobre aos mais novos, estabelecendo-se, destarte, uma hierarquia entre os familiares. Nessa linha, os membros mais velhos exercem direitos sobre os mais novos, uma vez que aqueles se situam em um patamar de hierarquia superior a estes. Em suma, cada membro está localizado em um ponto do sistema familiar. Ademais, Hellinger salienta que, quando o membro da família materializa as suas atitudes com gratidão e respeito aos ascendentes, o sistema familiar tende a evoluir. Por outro lado, consoante Oldoni, Lippmann e Girardi (2018), caso a precedência seja violada e a hierarquia não seja respeitada, o sistema sofre disfunções, o que provoca desordens nele.
Já a Lei do Equilíbrio dispõe que os atos de dar e de receber devem ser equilibrados nas relações humanas. Isso se justifica pelo fato de que o sujeito que doa amor recebe amor, estimulando a harmonia entre os sujeitos do sistema. Vale pontuar, entretanto, que, na relação entre pais e filhos, há uma maior doação de sentimentos dos pais no sentido dos filhos, o que excepciona a referida Lei, conforme ensinam Hellinger e Hövel (2006). Sob essa esfera, incumbe aos filhos serem gratos pela vida e reconhecerem todo o esforço de seus pais.
Consoante Oldoni, Lippmann e Girardi (2018), Hellinger visualiza o indivíduo como parte de um sistema familiar, estando conectado a ele, e que esse sistema é organizado por leis, nomeadas de ordens de amor.
Por derradeiro, as leis sistêmicas demonstram que os sentimentos vividos por um membro do grupo interferem em todo o sistema. Nesse contexto, o membro de um grupo deve respeitar e seguir os valores insculpidos no âmago do sistema, no qual está inserido, e deve buscar a reciprocidade e a solidariedade nas relações sociais, estimulando o equilíbrio e a sintonia em suas ações, e entender o espaço em que se situa, de modo a evitar conflitos na estrutura de ordens do sistema.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho visou mostrar a importância do Direito Sistêmico como campo do conhecimento humano para a resolução consensual de conflitos existentes nas relações sociais. Além disso, realizou-se um estudo abrangente acerca da abordagem sistêmica com vistas ao entendimento particularizado e incisivo dos fatores do sistema.
Discutiu-se a necessidade de maior aplicação de mecanismos de solução pacífica, neutra e justa de conflitos, com destaque para a técnica de constelação familiar sistêmica fundada pelo Bert Hellinger.
Evidenciou-se a importância das leis ou ordens sistêmicas na sustentação e manutenção do sistema, sobretudo o familiar. Consignou-se que o cerne delas se fundamenta em valores e princípios pautados em reciprocidade, solidariedade, respeito, lealdade e autoconhecimento da posição do membro no sistema.
Anote-se que, conforme os especialistas referenciados na presente pesquisa, a constelação familiar sistêmica se caracteriza por ser uma ferramenta altamente relevante para a compreensão da origem dos conflitos sociais. Por meio da aplicação da aludida técnica em ambientes endoprocessuais e extraprocessuais, constatou-se que os sujeitos assumem a sua responsabilidade por determinados fatores ou variações do sistema e fazem concessões recíprocas, ocupando-se o seu devido lugar no caso fático, a fim de que seja alcançada uma estrutura sistêmica harmoniosa.
Por derradeiro, mister evidenciar que o método da constelação familiar possibilita uma maior celeridade na resolução de situações conflituosas, uma vez que se trata de um instrumento consensual sem as linhas burocráticas jurídicas, além de promover um cenário processual cada vez mais humanizado e compreensivo, sob o prisma social.
6. REFERÊNCIAS
ALVAREZ, Maria Esmeralda Ballestero. Organização, sistemas e métodos. São Paulo: McGraw-Hill, 1990. v.1.
AGUIAR, Ana Cecília Bezerra de et al. Direito Sistêmico: o despertar para uma nova consciência jurídica. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2018.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 20 mar. 2021.
BRASIL, Código de Processo Civil. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 20 mar. 2021.
BOUSSO, Regina Szylit. A teoria dos sistemas familiares como referencial para pesquisas com famílias que experienciam a doença e a morte. Revista Mineira de Enfermagem. 2008. Disponível em: <http://www.reme.org.br/artigo/detalhes/266>. Acesso em: 4 abr. 2021.
CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. 26 ed. São Paulo: Cultrix, 2006.
CAROLINO, Hugo; JÚNIOR, Cícero. Direito holístico e a possibilidade de um novo paradigma para a nova ordem mundial: uma nova visão para a vida humana. 2014. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/33627/direito-holistico-e-a-possibilidade-de-um-novo-paradigma-para-a-nova-ordem-mundial-uma-nova-visao-para-a-vida-humana>. Acesso em: 14 mar. 2021.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ. Resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010. Dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário. Brasília/DF: 2010. Disponível em: <https://atos.cnj.jus.br/files/resolucao_comp_125_29112010_19082019150021.pdf>. Acesso em: 27 mar. 2021.
DUPRÉE, Ulrich E. Ho’ oponopono e as constelações familiares para relacionamentos, amor e perdão. São Paulo: Cutrix, 2019.
HELLINGER, Bert. Ordens do amor: um guia para o trabalho com Constelações Familiares. 12 ed. São Paulo: Cultrix, 2003.
HELLINGER, Bert; HÖVEL, Gabriele Ten. Um lugar para os excluídos: conversas sobre os caminhos de uma vida. 1 ed. Patos de Minas: Atman, 2006.
WRIGHT, Lorraine M.; LEAHEY, Maureen. Enfermeiras e famílias. Um guia para a avaliação e intervenção na família. 3. ed. São Paulo: Roca, 2002.
OLDONI, Fabiano; LIPPMANN, Márcia Sarubbi; GIRARDI, Maria Fernanda Gugelmin. Direito Sistêmico: aplicação das leis sistêmicas de Bert Hellinger ao Direito de Família e ao Direito Penal. 2 ed. Joinville: Manuscritos, 2018.
SCHNEIDER, Jakob Robert. A prática das Constelações Familiares. Tradução de Newton A. Queiroz Patos de Minas: Atman, 2013.
SILVA, Mário Augusto Paixão da; JUNIOR, Nelson Saule. O Direito Sistêmico no âmbito da Educação Jurídica – Uma análise da aplicabilidade da técnica de Constelação Familiar Sistêmica como meio de resolução de conflitos. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Disponível em: <https://www.nucleodoconhecimento.com.br/lei/direito-sistemico>. Acesso em: 20 mar. 2021.
SOUZA, Plínio de. Por que ser um constelador familiar? Ápice Desenvolvimento. São Paulo, 2019. Disponível em: <https://www.apicedesenvolve.com.br/constelacao-familiar/por-que-ser-um-constelador-familiar/>. Acesso em: 2 abr. 2021.
STORCH, Sami. O que é Direito Sistêmico? 2011. Disponível em: <http://direitosistemico.wordperss.com/201011/29/o-que-direito-sistemico/>. Acesso em: 27 mar. 2021.
STORCH, Sami. Consultor Jurídico: Direito sistêmico é uma luz no campo dos meios adequados de solução de conflitos. 2018. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2018-jun 20/sami-storch-direito-sistemico-euma-luz-solucao-conflitos>. Acesso em: 25 mar. 2021.
STORCH, Sami. Artigo descreve modelo original de prática de Constelações na Justiça e aplicabilidade do Direito Sistêmico. 2017. Disponível em: https://direitosistemico.wordpress.com/2017/09/22/artigo-descreve-modelo-original-de-pratica-de-constelaçoes-na-justica-e-aplicabilidade-do-direito-sistemico/. Acesso em: 27 mar. 2021.
TREDINNICK, André Felipe Alves da Costa. A Justiça que adoece e a que cura: os sistemas de Justiça Restaurativa e convencional na determinação social do processo saúde-doença. 2019. Dissertação (Mestrado profissional em Justiça e Saúde). Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Rio de Janeiro, 2019.
VALADARES, Gilson Coelho. Constelação familiar no poder judiciário brasileiro: humanização do Direito e ampliação da cidadania nos tribunais de justiça multiportas. 2020. Dissertação (Mestrado profissional e interdisciplinar em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos). Universidade Federal do Tocantins, Palmas, 2020.
VALL, Janaina; BELCHIOR, Germana Parente Neiva. Justiça Restaurativa mediante Constelações Sistêmicas: relato de experiência de uma Vara de execução penal da cidade de Fortaleza. In: LIPPMANN, Marcia Sarubbi (org.). Direito Sistêmico: a serviço da cultura de paz. 1 ed. Joinville: Manuscritos, 2019.
VIEIRA, Adhara Campos. A Constelação sistêmica no Judiciário. 2 ed. Belo Horizonte: D'Plácido, 2018.
[1] Bacharel em Engenharia Civil pela Universidade Federal do Tocantins (UFT). Bacharelando do curso de Direito pela Universidade Estadual do Tocantins (UNITINS) em Palmas/TO. Servidor Público efetivo do Município de Porto Nacional. E-mail: [email protected]
[2] Bacharel em Gestão em Agronegócio pelo Instituto Federal do Tocantins (IFTO). Bacharelando em Direito pela Universidade Estadual do Tocantins (UNITINS) em Palmas/TO. 2º Sargento da Polícia Militar do Estado do Tocantins. Exerce atribuições de Operador Aerotático. E-mail: [email protected]
Bacharel em Direito pela Universidade Estadual do Tocantins (UNITINS) em Palmas/TO. Bacharel em Engenharia de Alimentos pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Especialista em Direito Tributário pela Escola Nacional de Administração Pública (ENAP). Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil (RFB).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Rônison Aparecido dos. Direito sistêmico e seus desdobramentos sob a perspectiva das constelações familiares Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 ago 2022, 04:48. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/58999/direito-sistmico-e-seus-desdobramentos-sob-a-perspectiva-das-constelaes-familiares. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: MATEUS DANTAS DE CARVALHO
Por: LEONARDO RODRIGUES ARRUDA COELHO
Por: Marco Aurelio Nascimento Amado
Por: Marcos Antonio Duarte Silva
Por: RODRIGO KSZAN FRANCISCO
Precisa estar logado para fazer comentários.