RESUMO: O presente trabalho visa traçar críticas e propostas de reforma à execução antecipada da pena nas decisões condenatórias em face de crimes dolosos contra a vida e crimes conexos, ou seja, decisões exaradas pelo Plenário do Tribunal do Júri. Ademais, o trabalho também visa à adequação do rito do Júri aos pressupostos de um processo penal democrático, além de robustecer o estado de inocência dos acusados. Serão analisados pontos importantes, como: a possível fragilidade do julgamento em razão do desconhecimento técnico dos jurados para o fim de veredicto condenatório; a insegurança de se permitir uma execução antecipada da pena no bojo de um procedimento que vigora o sistema da íntima convicção (sem necessitar de motivação para as suas decisões judiciais). Em seguida, traremos algumas propostas de reforma, ressaltando a necessidade de revisões ao rito do Tribunal do Júri, visando restabelecer sua função histórica de garantia individual e coletiva.
Palavras – chave: Tribunal do Júri; Juízes leigos; Execução antecipada da pena; Presunção de inocência; Trânsito em julgado; Aspectos Controvertidos.
ABSTRACT: The present work aims to outline criticisms and proposals for reform to the early execution of the sentence in sentencing decisions in the face of intentional crimes against life and related crimes, that is, decisions issued by the Plenary of the Jury Court. In addition, the work also aims to adapt the Jury rite to the assumptions of a democratic criminal process, in addition to strengthening the state of innocence of the accused. Important points will be analyzed, such as: the possible fragility of the trial due to the technical ignorance of the jurors for the purpose of a condemnatory verdict; the insecurity of allowing an early execution of the sentence in the midst of a procedure that prevails the system of intimate conviction (without needing motivation for its judicial decisions). Next, we will bring some reform proposals, highlighting the need for revisions to the Jury Court rite, aiming to reestablish its historical function of individual and collective guarantee.
Keywords: Jury court; Lay judges; Provisional execution of the sentence; presumption of innocence; Res judicata; Controversial Aspects.
INTRODUÇÃO
Diante de uma análise histórica, verifica-se que o instituto do Tribunal do Júri, presente na Constituição Federal, em seu artigo 5º, XXXVIII, que tem como alicerce o julgamento de crimes dolosos contra vida e os respectivos crimes conexos por pessoas leigas, não necessariamente com conhecimento técnico jurídico, visto que o legislador optou por democratizar ainda mais o sistema de justiça introduzindo pessoas do povo para julgar os seus pares quanto à proteção do bem jurídico mais caro para a humanidade - a vida - fundamenta-se. Esse cenário se desenhou, notadamente, na época da revolução francesa.
Com base nisso, a participação do povo, sem instrução jurídica, foi importante para democratização e a inclusão no sistema jurídico de pessoas que por muito tempo foram colocadas à margem das decisões jurídicas estatais mais relevantes. Agora, “dar voz ao povo” se concretiza ainda mais perante o sistema de justiça.
Ao longo dos anos, apesar de os direitos, em alguns marcos históricos, terem sido retirados por governos autoritários ou travestidos de uma democracia sólida, o Tribunal de Júri se mostra uma faceta importante no processo penal democrático, notadamente quanto à sua instituição no Brasil e suas influências ocidentais-europeias.
Ocorre que, diante de uma nova onda autoritária e de crescente descarte de direitos, vê-se a fragilidade das regras procedimentais, que foram alteradas recentemente por meio da inclusão do famigerado Pacote Anticrime (Lei de nº 13.964/19), surgindo a partir de um debate e de uma ideia de recrudescimento da resposta penal frente aos crimes com mais apelo pela sociedade. Esse movimento pode ser explicado por meio de diversos argumentos, mas, principalmente, diante do descrédito da população frente à incapacidade do nosso sistema penal de resolver as celeumas criminais.
Expande-se a discussão acerca da possibilidade ou não da execução antecipada da pena nos crimes dolosos contra a vida, ou seja, os crimes processados perante o Tribunal do Júri, especialmente diante da criação de uma nova normativa que autoriza que o Juiz Presidente determine o cumprimento imediato da execução da pena após a leitura do veredicto em plenário, ou seja, o sujeito poderá sair da Sessão de Julgamento diretamente para o cárcere, mesmo se houver a interposição de recurso, ou até mesmo se este recurso estiver fundamentado na impugnação da decisão contrária à prova dos autos.
Não se perde de vista que a nova legislação trouxe a possibilidade de se garantir efeito suspensivo à decisão impugnada, mas isso não retira o afronta a diversos preceitos constitucionais, infraconstitucionais e de tratados internacionais, inclusive, diplomas legais que o Brasil assumiu o compromisso de aderir e respeitar. A regra geral sobre a liberdade foi afastada, afetando diretamente a presunção de inocência e de forma indireta o princípio do in dubio pro reo, além de outros preceitos basilares do estado democrático de direito.
Dessa forma, questiona-se: a possibilidade da execução antecipada da pena no rito especial do Tribunal do Júri possui compatibilidade com o ordenamento jurídico? O que fazer para evitar a fragilidade do nosso sistema?
Diante desses questionamentos, o cenário atual do Tribunal do Júri na justiça criminal brasileira intenta que busquemos novos horizontes, além de encontrar soluções para evitar a banalização dos instrumentos e princípios que norteiam e representam o processo penal democrático.
1 - EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO TRIBUNAL DO JÚRI NO BRASIL
Há certa imprecisão doutrinária acerca do surgimento do Tribunal do Júri no ordenamento jurídico internacional, advindo daí diversos questionamentos[1]. Todavia, no que tange ao ordenamento pátrio, observa-se, sem dúvidas, que a criação do Tribunal Popular tem conexão intensa com as profundas mudanças de cunho liberal ocorridas em solo Português, na 1ª (primeira) metade do século XIX. A Revolução Liberal do Porto, eclodida em 24 de agosto de 1820, cujo objetivo era a criação de uma Assembleia Constituinte. A modificação promovida foi essencial para a ascensão ao nível constitucional de um tribunal formado por juízes leigos, livres e independentes da monarquia, ideário que há muito tempo influenciava os julgamentos em Portugal.[2]
Diante dessa premissa, o então Príncipe D. Pedro I, diante do ato datado de 18/06/1822, antecedendo à própria independência do Brasil, instituiu o Tribunal de Juízes de Fato com o fim de julgar os crimes de abuso de liberdade de imprensa, formado por 24 (vinte e quatro) juízes, nomeados pelo Corregedor do Crime da Corte e Casa, tendo como requisitos intangíveis: ser homem bom, honrado, inteligente e patriota, pressupostos demasiadamente subjetivos, que não levavam ao ordenamento a segurança jurídica necessária. De outro lado, em razão desse ato, o único recurso contra as decisões deste Tribunal era dirigido ao próprio Príncipe Regente.[3]
Em seguida, com a crescente insatisfação frente ao Imperador, reverberando-se uma forte oposição, promulgou-se a Constituição Imperial, em 1824, constando em seu conteúdo a exigência de que o Poder Judicial seria independente e composto de juízes e de jurados (integrantes leigos), com competência para causas cíveis e penais.
Em 20 de setembro de 1830, emergiu a lei que tratava do abuso da liberdade de imprensa, organizando o Tribunal do Júri e, seguindo o modelo inglês, dividindo o Conselho de Jurados em duas espécies. Em primeiro, havia o Júri de Acusação, tendo como objetivo julgar a admissibilidade da persecução penal, aferindo a adequação da peça acusatória quanto ao ordenamento jurídico; e após essa análise prévia, o Júri de Sentença/Julgamento, ao qual tinha como objetivo decidir se o acusado era ou não culpado pelos atos supostamente praticados.
Nesse contexto histórico, mais precisamente no Período Regencial, em 1832, surgiu o Código de Processo Criminal, que manteve a existência dos 2 (dois) Conselhos de Jurados. No entanto, restringiu-se a competência dos juízes de direito, limitando sua atividade à presidência da sessão, orientação dos jurados e à aplicação das penas, permitindo maior autonomia aos juízes de fato, ideário que pode ser observado até os dias de hoje.[4]
Diante dessa modificação, os jurados deveriam ser escolhidos entre cidadãos eleitores e probos, com reconhecido bom senso. Ocorre que, em razão do cenário econômico da época e das ideias culturais, os únicos possíveis jurados eram integrantes das classes sociais mais abastadas, que, portanto, levavam ao papel de julgador – Conselho de Sentença - apenas sujeitos que possuíam situação financeira que não representava a maioria da população naquele momento histórico.
A partir disso, podemos observar a ausência de democratização no conjunto de jurados, ainda longe da ideia de que o júri deve ser centrado na heterogeneidade de seus componentes, concepção que permite ao julgamento visões de mundo diferentes, permitindo um julgamento com maior lucidez e capacidade de espelhar os anseios da população.
Muito embora havia esse problema, foi guiado ao procedimento do Tribunal do Júri requisitos impeditivos que buscavam levar ao Conselho de Sentença imparcialidade, como é o caso de proibição de ascendentes, descendentes, sogro, genro, irmãos e cunhados participarem da mesma Sessão Plenária. Ademais, os jurados que integravam o Júri de Acusação não podiam participar do Júri de Sentença/Julgamento.
Quanto ao procedimento adotado no Júri de Acusação, 1ª (primeira) fase, o Conselho de Sentença respondia à indagação: “Há neste processo suficiente esclarecimento sobre o crime e seu autor, para proceder à acusação?”. Sendo a acusação recebida, o acusador deveria oferecer o libelo em 24 (vinte e quatro) horas. Se a resposta fosse negativa, havia conferência da decisão, sendo realizada nova instrução, na qual o conselho deliberava sobre a procedência ou não da acusação.[5]
Já no Júri de Sentença/Julgamento, eram necessários 2/3 (dois terços) dos votos para condenar o acusado e, para aplicação da pena de morte, era necessária a unanimidade de votos. Não havia incomunicabilidade entre eles, de modo que se reuniam na sala secreta e debatiam livremente sobre os fatos, respondendo os quesitos logo em seguida, o que hoje podemos observar como flagrante violação à incomunicabilidade dos jurados, afrontando o princípio da íntima convicção.
Reporta-se imprescindível alertar que em 12/04/1834, editou-se o “Ato Adicional”, que alterou a Constituição e, indiretamente a instituição do Júri, visto que foram criadas Assembleias Provinciais para legislar sobre a organização judiciária.[6]
Ainda, pela Lei 261 e pelo Regulamento 120, nos anos de 1841 e 1842, foi extinto o Júri de Acusação, sendo a formação de culpa e a sentença de pronúncia atribuídas às autoridades policiais criadas – delegados e subdelegados. A competência também foi modificada, pois foram retirados diversos crimes de sua alçada.
No que tange aos jurados leigos, houve a criação de condições para o exercício fiel da função, sendo necessário, além de ser eleitor, saber ler e escrever e possuir um rendimento anual consideravelmente alto. Ainda, insta salientar que foi implementada a regra da incomunicabilidade entre os jurados, sendo expressamente vedado o debate sobre os fatos antes da quesitação, privilegiando-se a íntima convicção.
Diante dessas inúmeras modificações, surgiu a necessidade de implementação de hipóteses diferentes para a interposição do recurso de apelação das decisões do Conselho de Sentença. Daí surgiu o exemplo que está presente até hoje no Código de Processo Penal Brasileiro: apelação contra a decisão dos jurados que contraria as provas dos autos, a chamada apelação ex officio, cabível quando o juiz de direito entendia que a decisão contrariava evidências resultantes de provas que perante ele foram produzidas. Se o órgão revisor desse provimento ao recurso, determinava a submissão da causa a novo julgamento, sendo vedada tanto a inclusão dos jurados que participaram do julgamento anterior, quanto do juiz de direito que se manifestou contra a decisão dos juízes leigos.
A proclamação da República, em 1889, gerou a edição da Constituição de 24/02/1891, em cujo processo legislativo se discutiu a supressão ou manutenção do respectivo Tribunal. A questão chegou até o Supremo Tribunal Federal (STF) que, se pronunciou delimitando os contornos da instituição do Júri, de forma que o texto constitucional o levou à Seção II, do título IV, que tratava das “declarações de direitos”, sendo assim, pela primeira vez, reconhecido como um direito ou garantia individual,
Avançando, a Carta Constitucional de 1934, durante a “Era Vargas”, expôs que a instituição do Júri seria mantida com a organização e as atribuições que lhe desse a lei, porém foi retirado novamente do rol de direitos e garantias individuais para compor a estruturação do Poder Judiciário.
Nessa época, devido à unidade de federação adotada, cada unidade federativa elaborava as suas próprias leis processuais, de forma que a competência e o rito processual do Júri não encontravam uniformidade no Brasil.
Dentro desse mesmo contexto da presidência de Getúlio Vargas, a Constituição de 1937, “Constituição da Polaca”, outorgada após a dissolução da Câmara e do Senado Federal, silenciou a respeito do Tribunal do Júri. Com isso, o governo nomeou uma comissão para elaborar uma nova lei sobre o respectivo Tribunal, cujo trabalho resultou no Decreto-Lei 167, de 1938. O referido decreto trouxe novo cenário jurídico ao país, renascendo o Júri na lei ordinária.[7]
Cumpre ressaltar que este Decreto deu aos Tribunais de Apelação a possibilidade de reformar as decisões do Júri, tendo em vista a sua disposição:
Art. 96. Si, apreciando livremente as provas produzidas, quer no sumário de culpa, quer no plenário de julgamento, o Tribunal de Apelação se convencer de que a decisão do júri nenhum apôio encontra nos autos, dará provimento à apelação, para aplicar a pena justa, ou absolver o réu, conforme caso.
Sob a vigência desse ato normativo, o Tribunal do Júri tinha competência para julgar os crimes de homicídio, infanticídio, induzimento ao suicídio, duelo com morte e latrocínio. Insta salientar que nos crimes de homicídio cometido por motivo fútil ou com meio cruel, a atuação do Júri podia resultar na pena de morte.
Após a 2ª (Segunda) Guerra Mundial, motivada pelo trauma aos regimes totalitários e antidemocráticos, a Constituição de 1946 reconheceu, pela primeira vez, expressamente, a instituição do Júri entre os direitos e garantias fundamentais, senão vejamos:
Art. 141 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
§ 28 - E mantida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, contanto que seja sempre ímpar o número dos seus membros e garantido o sigilo das votações, a plenitude da defesa do réu e a soberania dos veredictos. Será obrigatoriamente da sua competência o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. (Grifos nossos)
Com relação a nova Carta Magna, foi restabelecida a unidade federal legislativa, subtraindo a competência dos Estados para legislar sobre o Tribunal do Júri.
Ademais, há a implementação da apelação quando a decisão dos jurados fosse manifestamente contrária à prova dos autos, dando ao tribunal a possibilidade de anular a decisão dos jurados, ensejando, assim, novo julgamento pelo Júri, que teria outra composição, o que poderia ocorrer somente uma vez.
Em seguida, pode-se observar a Constituição de 1967, durante o Regime Militar, que ratificou tanto o Júri quanto à soberania de seus veredictos. Entretanto, em 1969 se procedeu a uma revisão da Constituição devido à outorga da Emenda Constitucional 01, ocasião na qual a soberania dos veredictos foi novamente retirada da Carta Magna.
Embora tenha retirado a soberania dos veredictos do texto constitucional, a doutrina e a jurisprudência não alteraram o entendimento de que a exigência ainda se mantinha no ordenamento jurídico pátrio.
Nesse embalo, foi promulgada, em 1988, a famigerada Constituição Cidadão, que devolveu ao Tribunal do Júri a sua identidade plena, reconhecendo-o como manifestação da soberania popular. A grande inovação trazida pela Carta Popular, foi a atribuição do status de garantia fundamental do indivíduo, o que a consolida como cláusula pétrea (também chamada de cláusula de perpetuidade), já que o Tribunal do Júri foi incluído no rol de direitos fundamentais do artigo 5º, o qual trata de direitos e de deveres individuais e coletivos e não mais presente no rol dos órgãos do Poder Judiciário, agora presente no artigo 92[8].
Com base nesse ideário, apontar que o Tribunal do Júri está incluído na Constituição Federal como cláusula pétrea significa dizer que este órgão colegiado não pode ser abolido pelo Poder Constituinte Derivado Reformador, por meio de Emendas à Constituição, até mesmo pelo Constituinte Originário, na percepção da proibição do retrocesso (efeito cliquet ou evolução reacionária), ou seja, é a vedação da eliminação da concretização já alcançada na proteção de algum direito fundamental, admitindo-se, somente, aprimoramentos e acréscimos.
Portanto, o Tribunal do Júri, atualmente, é órgão de natureza constitucional, dotada de competência mínima para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, exercendo uma jurisdição popular, com princípios e regras jurídicas inerentes às suas peculiaridades, sujeito a um regime constitucional único, o que o distingue dos órgãos do Poder Judiciário, sendo uma instituição prevalente no fortalecimento da democratização do sistema justiça, dando voz aos cidadãos, que poderão julgar baseado em suas íntimas convicções, tendo como alicerces os seus ideários, buscando-se sempre a heterogeneidade e a pluralidade de pensamentos.
2 - ORGANIZAÇÃO DO JÚRI BRASILEIRO
Conforme dito no capítulo anterior, o Tribunal do Júri, atualmente, possui competência para julgar os crimes dolosos contra a vida e seus respectivos crimes conexos, sendo inserido no rol de direitos e garantias individuais, no artigo 5º da Constituição Federal.[9]
Frise-se que se estabeleceu ao Júri um piso constitucional de atuação e não um rol taxativo. A Carta Magna prevê, no seu art. 5°, inciso XXXVIII, uma regra inafastável. Segundo esse dispositivo, é do referido Tribunal a delimitação do Poder Jurisdicional para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, tentados ou consumados.
Essa competência é considerada como "mínima", pois a CF/88 asseverou a competência para julgamento de tais delitos, não havendo proibição da ampliação do rol dos crimes que serão apreciados pelo Tribunal do Júri por via de norma infraconstitucional. Nesse sentido, é plenamente possível, a título exemplificativo, uma lei federal atribuir ao Tribunal do Júri a competência para julgamento de crimes patrimoniais.
Portanto, embora não possa ser diminuída, por ser cláusula pétrea, pode ser largueada pela legislação ordinária de forma que outros crimes, relacionados a outros bens jurídicos, venham a ser julgados pelo Tribunal Popular, de forma independente. [10]
2.1 Noções Introdutórias
O Tribunal do Júri é um órgão do Poder Judiciário de 1ª instância, atuante na Justiça Estadual ou Federal, ressaltando-se que não existe na Justiça Militar ou Eleitoral, tendo em vista a vedação constitucional.
O Poder Constituinte não tratou do tribunal do júri como órgão do Poder Judiciário no artigo 92, tendo em vista que foi deslocado para o rol dos direitos fundamentais da CF/88, presente no artigo 5º, objetivando, como já dito outrora, assegurar o seu papel democrático, além de fincá-lo como cláusula pétrea, não podendo ser extinto, nem mesmo através de emenda constitucional ou através de uma nova constituinte.
O Tribunal do Júri, no âmbito federal, será competente quando houver hipótese de violação ao preceito do artigo 109, inciso IV da CF/88[11]. Portanto, quando as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções, o crime doloso contra a vida será processado no âmbito federal. A ilustração dessa temática está vinculada aos crimes dolosos contra a vida perpetrados em face de funcionário público federal, delito cometido em razão de sua função[12].
Ademais, o Júri é conhecido por ter como características marcantes: ser um órgão colegiado e heterogêneo. É formado pelo juiz-presidente togado e mais 25 (vinte e cinco) jurados, sendo que 7 (sete) dos quais irão compor o Conselho de Sentença a fim de julgar, no mínimo, os crimes dolosos contra a vida.
Além disso, é temporário, visto que é formado transitoriamente para determinadas sessões, e ao fim, é dissolvido.
O Tribunal do Júri é dotado de soberania quanto às suas decisões/veredictos, tomado com base o sistema da íntima convicção, de forma sigilosa, tendo em vista que os jurados não precisam fundamentar a sua decisão, muito em razão do afastamento da exigência de que os jurados sejam formados em Direito.
2.2 Da competência do Tribunal do Júri
É imperioso ressaltar que há muito tempo se afirmava, de forma acertada, que o Tribunal do Júri tinha competência para julgamento dos crimes contra a vida, presentes no Capítulo I, do Título I do Código Penal Brasileiro, quando praticados na modalidade dolosa.
Todavia, o legislador, no ano de 2019, por meio da Lei de nº 13.968/2019, inseriu no artigo 122, a “prática de induzimento, instigação a alguém para que pratique automutilação ou prestar-lhe auxílio material para que o faça”, crime que busca preservar essencialmente a integridade pessoal, que é tradicionalmente localizado no artigo 129 do Código Penal. Portanto, mesmo diante de diversas críticas à inclusão do referido delito no rol dos crimes dolosos contra à vida, e mesmo que dentro do Título I, Capítulo I, o supracitado crime é de competência do Juízo Criminal Comum, visto que não corresponde ao mandado constitucional explícito e, portanto, não encontra fundamento no texto infraconstitucional subjetivo.[13]
2.3 Competência Territorial do Júri
Três são as perspectivas para se estabelecer o local do crime: a) teoria da atividade, segundo a qual o lugar do crime é aquele em que se deu a ação ou omissão, não importando em que local ocorreu o resultado; b) teoria do resultado, que informa que o local da infração é aquele onde se produziu o resultado, não interessando onde se deu a conduta do agente; e c) teoria da ubiquidade, a qual define como local da infração tanto aquele onde se deu a conduta quanto aquele onde se produziu o resultado.
A respeito do delineamento da competência do Tribunal do Júri é definida de acordo com as regras gerais de competência previstas na legislação pátria. Anota-se que a regra geral do processo penal brasileiro é de que a competência para processamento dos crimes é a do local onde crime se consumou ou, no caso de tentativa, o último ato de consumação infração penal, sendo, portanto, aplicada a teoria do resultado.
De forma diversa, segundo a doutrina e a jurisprudência pátrias, quando o resultado morte se verifica em local diferente daquele que ocorre a conduta do agente (crimes plurilocais), a competência para processar o crime doloso contra a vida possui regramento específico, tratando-se competente o local da infração penal, ou seja, é competente para processar e julgar o crime o juízo do local em que ocorreu o fato delituoso, aplicando-se, a teoria da atividade[14]. Argumenta-se aqui, que a escolha do legislador pela teoria da atividade tem como objetivo privilegiar a verdade real, facilitando-se a colheita de prova, bem como a garantia de uma efetiva resposta à sociedade do local em que o crime foi executado, eis que naturalmente mais interessada na sua punição.
Nesse sentido, temos a doutrina de Guilherme Nucci:
“(...) é justamente no local da ação que se encontram as melhores provas (testemunhas, perícia etc.), pouco interessando onde se dá a morte da vítima. Para efeito de condução de uma mais apurada fase probatória, não teria cabimento desprezar-se o foro do lugar onde a ação desenvolveu-se somente para acolher a teoria do resultado. Exemplo de ilogicidade seria o autor ter dado vários tiros ou produzido toda a série de atos executórios para ceifar a vida de alguém em determinada cidade, mas, unicamente pelo fato da vítima ter-se tratado em hospital de Comarca diversa, onde faleceu, deslocar-se o foro competente para esta última. As provas teriam que ser coletadas por precatória, o que empobreceria a formação do convencimento do juiz.” (Código de Processo Penal Comentado. 8ª ed., São Paulo: RT, 2008, p. 210).
Esse também é o entendimento pacífico nos Tribunais Superiores, ratificando a ideia de que se deve utilizar a teoria da atividade, em razão das peculiaridades do procedimento dos crimes dolosos contra a vida, como se verifica a seguir:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO. COMPETÊNCIA TERRITORIAL. LOCAL DA PRÁTICA DOS ATOS EXECUTÓRIOS. OPÇÃO PELA TEORIA DA AÇÃO. FLEXIBILIZAÇÃO PERMITIDA. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA. DISTRIBUIÇÃO, A CARGO DA DEFESA, DE CARTA PRECATÓRIA PARA OITIVA DE TESTEMUNHA. ILEGALIDADE NÃO VERIFICADA. DESMEMBRAMENTO DA AÇÃO PENAL. POSSIBILIDADE. CORRÉ DENUNCIADA POR CRIME NÃO DOLOSO CONTRA A VIDA. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO. RECURSO DESPROVIDO.
I - Como regra, a fixação da competência territorial segue a teoria do resultado, sendo determinante o lugar da consumação da infração, ou do último ato executório, nas hipóteses de tentativa (art. 70 do CPP), tendo como critério subsidiário o domicílio do réu (CPP, art. 72). Em hipóteses excepcionais se admite a fixação da competência do local de atos de execução para a facilitação de coleta de provas, a fim de se prestigiar a busca da verdade real.
(...)
III - A prática dos atos executórios, e a facilidade na colheita das provas para a adequada apuração dos fatos, autoriza, no caso concreto, a flexibilização da teoria do resultado a fim de definir-se a competência para o julgamento do crime contra a vida na comarca de Jales/SP, com o objetivo da busca da verdade real. (nossos grifos)
(STJ, Recurso em Habeas Corpus 103.972/SP, 5ª Turma, Data do Julgamento: 27/11/2018; Data da Publicação/Fonte DJe: 03/12/2018).
Por outro lado, a competência territorial é relativa e, com isso, pode ser prorrogada em razão da conexão ou da continência.
Com isso, pela leitura do art. 78, inciso I do CPP[15], na determinação da competência por conexão ou continência, havendo concurso entre a competência do Júri e a de outro órgão de jurisdição comum, prevalecerá a competência daquele.
Ainda, insta salientar que, em caso de desclassificação do delito pelos jurados, na 2ª (segunda) fase do tribunal do júri - Judicium Causae, o crime conexo, mesmo que não seja doloso contra a vida, continuará sendo julgado pelo juiz presidente do Tribunal do Júri.
Nota-se, porém, uma exceção à regra: o desaforamento. É entendido como o ato processual restrito aos procedimentos do Tribunal do Júri, capaz de ensejar o deslocamento da competência para um foro alheio ao do crime, de acordo com o art. 427 do CPP[16]. Segundo Victor Eduardo Gonçalves (2012, p. 226), o deslocamento é:
“É tirar o processo do foro em que está para mandá-lo a outro. Trata-se, pois, do deslocamento do processo de um foro para outro, admitido no Processo Penal em quatro hipóteses: por interesse da ordem pública; em razão de dúvida sobre a imparcialidade do júri; em razão de dúvida sobre a segurança pessoal do réu; não realização do julgamento, no período de seis meses a contar da preclusão da pronúncia, em virtude de comprovado excesso de serviço. Por ser medida excepcional, só terá lugar quando houver prova segura da existência de um dos motivos que o justificam”
Assim, é possível o deslocamento da competência territorial do Júri, quando houver necessidade por interesse da ordem pública, quando existir dúvida sobre a imparcialidade dos jurados ou quando for necessário à segurança pessoal do acusado.
Existe ainda, a possibilidade de prorrogação do foro por demora no julgamento. O art. 428[17], do mesmo diploma processual, dispõe que o desaforamento poderá ser determinado em razão do comprovado excesso de serviço, se o julgamento não puder ser realizado no prazo de 6 (seis) meses, contado da preclusão da decisão de pronúncia. Neste caso, antes do Tribunal determiná-lo, devem ser ouvidos o juiz presidente e a parte contrária.
2.4 Fases do Júri
O procedimento previsto para os crimes dolosos contra a vida é bifásico ou escalonado.
A 1ª (primeira) fase do rito, a Judicium Accusationis, agora chamada de instrução preliminar, inicia-se com a denúncia apresentada pelo membro do Parquet (ou assistente de acusação, nas hipóteses legais) e encerra-se com a decisão de pronúncia. Já a segunda fase do tribunal do júri, chamada de Judicium Causae, parte da decisão de pronúncia e termina com a sentença prolatada pelo Juiz Presidente, tendo por base a decisão final do Conselho de Sentença.
2.4.1 Judicium Accusationis/Sumário de Culpa
A 1ª (primeira) fase tem o condão de apurar a existência mínima de indícios de autoria e a existência de materialidade. A meta essencial dessa etapa é impedir que o sujeito seja levado ao Conselho de Sentença sem que haja um lastro probatório mínimo que viabilize um julgamento. Sua finalidade é, portanto, exclusivamente processual.
Tem como marco inicial o oferecimento da peça acusatória, podendo o juiz aceitar ou rejeitá-la, de acordo com o Código de Processo Penal.
Com o recebimento da denúncia, o magistrado togado ordenará a citação do acusado para oferecer resposta à acusação no prazo de 10 (dez) dias.
Nessa peça defensiva, o acusado poderá arguir preliminares, oferecer documentos, especificar as provas pretendidas e arrolar até no máximo 8 (oito) testemunhas. Ainda, deverá requerer as diligências que entender cabíveis, sob pena de preclusão temporal, não lhe sendo mais lícito fazê-lo.
Em seguida, o juiz ouvirá o Presentante do Ministério Público, a respeito das preliminares e dos documentos, ocasião na qual o Parquet representará pela Audiência de Instrução e Julgamento (AIJ). Com isso, o juiz marcará dia e hora para a realização da audiência, em que será realizada a inquirição das testemunhas.
Com o início da AIJ, toma-se, em primeiro lugar, as declarações do ofendido (se possível). Depois, proceder-se-á a inquirição das testemunhas, de acusação e de defesa, nesta ordem. Se for necessário, ocorrerão os esclarecimentos dos peritos e as acareações, em caso de depoimentos conflitantes.
Ao final, será realizado o interrogatório do acusado, podendo, entretanto, optar por permanecer em silêncio a respeito dos fatos. O interrogatório é considerado meio de defesa e é ato personalíssimo, pois somente o próprio réu pode ser interrogado, não sendo admitida qualquer representação.
Dado o fim do interrogatório e demais diligências, abre-se a oportunidade para que haja as alegações finais, as quais deverão, em regra, serem orais. Trata-se do último ato processual em que as partes manifestam-se em audiência, devendo abordar todas as questões jurídicas e fáticas, procurando demonstrar o acerto de suas teses. É nela, que tanto a acusação quanto à defesa devem arguir todas as nulidades sanáveis que existirem nos autos.
Ao final da primeira fase, o juiz competente poderá decidir da seguinte forma: absolvendo sumariamente o réu, nos termos do art. 415 do CPP[18], pronunciando, impronunciando ou desclassificando o delito.
A decisão de absolvição sumária ocorre quando o magistrado julga o mérito dando fim à pretensão punitiva do estado, consequentemente, favorecendo o réu.
Já a decisão de pronúncia, é aquela que reconhece a admissibilidade da acusação feita pelo Ministério Público, declarando a necessidade do réu se submeter a julgamento pelo Plenário do Júri, quando o magistrado entende estarem presentes indícios de autoria e prova de materialidade. Com base nisso, o magistrado não pode adentrar no mérito da causa, sob pena de quebra da imparcialidade.
Como a decisão de pronúncia é prolatada no curso do processo, ao final da primeira fase do rito bifásico, possui natureza jurídica de decisão interlocutória mista não terminativa, eis que não encerra o processo, somente uma fase do procedimento[19].
A lei exige dois requisitos indispensáveis para a prolatação da decisão de pronúncia: materialidade do fato e indícios suficientes de autoria ou de participação. Essa existência do crime pode ser comprovada não só pela materialidade atestada no laudo de exame cadavérico, mas também por qualquer meio idôneo de prova admitida no direito.
Nesse diapasão, é possível, inclusive, que haja processo e consequentemente, julgamento do acusado mesmo que não seja encontrado o corpo da vítima (materialidade do crime). Isso porque, embora possa não haver prova técnica da morte da vítima, é possível se comprovar a materialidade por outros meios idôneos de prova, eis que o sistema de provas adotado é o do livre convencimento.
A decisão de pronúncia, como é sabido, tem somente por admissível a acusação, sem sobre ela projetar um definitivo juízo de mérito.[20] Cabe ao Juiz, ao proferi-la, exatamente por que razão, abster-se de qualquer manifestação quanto ao mérito da acusação, limitando-se a apreciar os indícios suficientes da autoria e da participação, e materialidade, consubstanciando-se em juízo fundado em probabilidade e não em juízo de certeza exigido para a prolação de juízo condenatório.
Nessa decisão, impera o princípio do in dubio pro societate[21], princípio amplamente criticado pela doutrina especializada, visto que o seu regramento utiliza a dúvida em face do acusado, privilegiando, supostamente, a sociedade, enviando o acusado para o Plenário do Júri.
Recentemente, o próprio Pretório Excelso, por meio do Ministro Gilmar Mendes, sustentou críticas a respeito da utilização do princípio do in dubio pro societate, no ARE 1.067.392/CE (publicado em 17/11/2020). Muito embora não tenha abandonado a aplicação do princípio do in dubio pro societate na decisão de pronúncia, o STF aponta que se deve adotar a teoria racionalista da prova, na qual não deve haver critérios de valoração das provas rigidamente definidos na lei, no entanto, por outro lado, o juízo sobre os fatos deve ser pautado por critérios de lógica e racionalidade, podendo ser controlado em âmbito recursal ordinário. Para a pronúncia, não se exige uma certeza além da dúvida razoável, necessária para a condenação. Contudo, a submissão de um acusado ao julgamento pelo Tribunal do Júri pressupõe a existência de um lastro probatório consistente no sentido da tese acusatória. Ou seja, requer-se um standard probatório um pouco inferior, mas ainda assim dependente de uma preponderância de provas incriminatórias.
Utilizando uma linha crítica, Aury Lopes Jr., que compõe parte da doutrina avessa ao princípio do in dubio pro societate, leciona que não se pode admitir que juízes pactuem com acusações infundadas, escondendo-se atrás de um princípio não recepcionado pela Constituição para, burocraticamente, pronunciar réus, os levando ao Tribunal do Júri.[22]
Além da decisão de absolvição sumária e pronúncia, há a decisão de impronúncia, utilizada quando não há provas de materialidade ou indícios suficientes de autoria/participação delitiva.
Com a impronúncia, enquanto não extinta a punibilidade, a ação poderá ser proposta novamente pelo Parquet, desde que haja prova nova. Trata-se de prova que já existia e não foi apresentada em momento oportuno, ou de provas que surgiram após o encerramento do processo com a decisão de impronúncia.
Sob este prisma, cabe trazer a crítica de Paulo Rangel à decisão de impronúncia.
A decisão de impronúncia não é nada. O indivíduo não está absolvido nem condenado, e pior: nem vai a júri. Se solicitar sua folha de antecedentes, consta o processo “arquivado” pela decisão de impronúncia, mas sem julgamento de mérito. Se precisar de folha de antecedentes sem anotações, não o terá: não obstante o Estado dizer que não há os menores indícios de que ele seja o autor do fato, mas não o absolveu.[23]
Por fim, há decisão de desclassificação, que ocorre quando o juiz presidente, com base no exame da prova dos autos, entende que o crime descrito na denúncia não é doloso contra a vida, ocasião na qual remete os autos ao juiz singular, à disposição do qual ficará o acusado custodiado.
O magistrado deve perceber que a desclassificação ocorrida na 1ª (primeira) fase desnatura o crime doloso contra a vida, dando-lhe nova ou verdadeira feição. Os jurados não podem se reunir para apreciar um crime que não seja de sua competência constitucional, salvo quando houver conexão entre o crime doloso contra a vida e crime de outra natureza.
Caso a decisão do magistrado seja pela pronúncia do acusado, põe-se fim à fase do juízo de admissibilidade e inicia-se a fase do juízo de mérito.
2.4.2 Judicium Causae/Juízo da Causa
Antes da reforma ao CPP, proporcionada pela Lei nº 11.689/08, determinava-se que passada em julgado a decisão de pronúncia, o escrivão deveria dar vista dos autos ao Ministério Público, pelo prazo de 5 (cinco) dias, para oferecer o libelo acusatório: peça exclusiva do Tribunal do Júri, de abertura do judicium causae, vinculada à pronúncia, que continha a exposição articulada do fato criminoso.
Após o advento da referida lei, pôs-se fim à figura do libelo. De acordo com a nova diretriz legal, preclusa a decisão de pronúncia, inicia-se a fase das provas a serem produzidas na sessão plenária.
De acordo com o artigo 422 do CPP, o juiz presidente determinará a intimação do Parquet e da defesa para, no prazo de 5 (cinco) dias, apresentarem o rol de testemunhas, oportunidade em que poderão juntar documentos e requerer diligências.
Com isso, o processo se encontra apto a ser preparado para entrar na fase de julgamento no plenário, devendo então, receber decisão saneadora, com relatório sucinto do processo e com a consequente designação de data para julgamento.
Pode-se dividir a sessão de julgamento em sete etapas: instalação, instrução, debates orais, formulação de quesitos, votação, sentença e lavratura da ata do julgamento.
Quanto à instalação, de acordo com o artigo 453 do CPP, o tempo e o local das reuniões do Júri serão ditados pela lei de organização judiciária local. Portanto, pode variar de Estado para Estado.
Até a abertura da sessão, o magistrado irá analisar e decidir sobre os pedidos de adiamento, se houver, e as justificações de não comparecimento, que deverão ser comunicados de antemão, salvo motivo de força maior.
Se o membro do Ministério Público não comparecer, injustificadamente, o fato será comunicado imediatamente ao Procurador- Geral de Justiça (PGJ) com a data designada para a nova sessão.
Já o adiamento por falta do advogado do acusado, somente ocorrerá, segundo a lei, se o acusado não constituir outro defensor. Se a falta se der injustificadamente, o fato será imediatamente comunicado ao Presidente da Seccional da OAB, com a data designada para a nova sessão. Todavia, se o não comparecimento se der por escusa legítima, o julgamento será adiado somente uma vez, devendo o juiz intimar, agora, a Defensoria Pública para a nova data.
Outro caso de adiamento da sessão é o não comparecimento do acusado preso, salvo se houver pedido de dispensa de sua presença assinado pelo mesmo e por seu defensor. Isso só ocorre no caso de réu preso, se for solto, a sessão continuará, tendo em vista que o acusado está abrindo mão do day in court.
Nesse sentido, a regra é que a ausência do réu não ilide o julgamento, salvo se houver algum vício na sua intimação.
Antes da constituição do Conselho de Sentença, as testemunhas serão levadas para sala em apartado, onde não possam ouvir os seus depoimentos. Tomada essa medida, inicia-se, efetivamente, o sorteio dos jurados.
Para a sessão ocorrer devem estar presentes, no mínimo, 15 (quinze) jurados, sob pena de nulidade do ato. Não havendo esta quantidade, proceder-se-á ao sorteio de tantos suplentes quanto necessários, designando-se nova data para a sessão do Júri, sendo os nomes dos suplentes consignados em ata.
Estando presentes a quantidade mínima de jurados e definido o objeto de apreciação, proceder-se-á o sorteio. Antes, porém, o magistrado esclarecerá aos jurados sobre os impedimentos, suspeição e as incompatibilidades, explicando-os que, uma vez sorteados, não poderão se comunicar entre si nem com outrem, sendo que a incomunicabilidade será certificada nos autos pelos oficiais de justiça.
No momento do sorteio, poderá haver recusas quanto à escolha dos jurados. A defesa, e depois dela, o Ministério Público, poderão recusar imotivadamente até 3 (três) jurados. Além das recusas imotivadas, as partes poderão se insurgir contra os jurados sorteados, de maneira ilimitada, alegando impedimento, suspeição ou incompatibilidade, os quais serão decididos pelo juiz presidente.
Assim, passa-se imediatamente para a fase de instrução, que se inicia com a distribuição para cada jurado da cópia da pronúncia e, se for o caso, das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação e a cópia do relatório do processo.
Durante a instrução no plenário, serão inquiridos o ofendido, se possível, e as testemunhas arroladas, podendo, inclusive, os jurados formularem perguntas, as quais serão lidas pelo magistrado. As partes e os jurados poderão, ainda, requerer acareações, reconhecimento de pessoas e coisas e esclarecimento dos peritos.
Após a produção de provas em plenário, será interrogado o réu, momento em que poderão ser formuladas perguntas pelas partes, diretamente, e pelos jurados, por intermédio do juiz presidente.
Com isso, iniciam-se os debates orais, começando pelo Ministério Público e, após, a Defesa, por uma hora e meia para cada um, cabendo o direito à réplica e à tréplica.
Em relação ao manejo das provas durante os debates, cumpre ressaltar que é vedada a leitura de documentos ou qualquer exibição, cujo conteúdo versar sobre a matéria analisada pelos jurados, que não tiverem sido juntados aos autos com a antecedência mínima de três dias, sendo cientificada da juntada a outra parte.
Nessa esteira, durante os debates, as partes não poderão fazer menção: à decisão de pronúncia, às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento que beneficie ou prejudique o acusado, ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento, em seu prejuízo.
Com o fim dos debates, o julgamento caminha para a deliberação dos jurados, com a consequente prolatação do veredicto. Antes da votação, o Juiz Presidente deve indagar aos jurados se necessitam de outros esclarecimentos.
Incumbe ao Conselho de Sentença decidir sobre a matéria de fato e se o acusado deverá ser absolvido.
Para tanto, serão formulados quesitos pelo magistrado, que serão respondidos pelos jurados, atinentes à materialidade do fato, à autoria ou participação, à absolvição do acusado, à existência de causa de diminuição ou de aumento de pena, à existência de qualificadora, além de, eventualmente outros quesitos considerados importantes, como exemplo a desclassificação do crime, a ocorrência do crime na forma tentada, entre outros.
As decisões do Tribunal do Júri serão tomadas por maioria de votos. A resposta negativa de mais de 3 (três) jurados sobre os quesitos de materialidade do fato e de autoria, implica na absolvição do acusado.
Da votação poderão surgir os seguintes resultados: a desclassificação para outro crime sem ser doloso contra a vida, a absolvição ou a condenação.
No caso da desclassificação, continua sendo competência do Juiz Presidente do Tribunal do Júri proferir a sentença, em razão da perpetuação da jurisdição.
Ocorrendo a absolvição, o juiz mandará colocar em liberdade o acusado preso ou, se por outro motivo não estiver preso, revogará as medidas restritivas provisoriamente decretadas e imporá, se for o caso, a medida de segurança cabível.
No caso de condenação, fixará a pena-base, considerando as circunstâncias atenuantes e agravantes, e as alegações das partes, imporá os aumentos e diminuições de pena e determinará o jornal em que será publicada a sentença.
Elaborada a sentença, esta deverá ser lida em plenário antes de encerrar a sessão. Ao final da mesma, o escrivão lavrará a ata dos trabalhos, que deverá ser assinada pelo juiz presidente e pelas partes. Lida a sentença, será declarado o encerramento da sessão.[24]
Portanto, conclui-se o procedimento do Júri, englobando as fases do judicium accusationis e do judicium causae
3 - ANÁLISE CRÍTICA À ANTECIPAÇÃO DA EXECUÇÃO IMEDIATA DA PENA NA DECISÃO CONDENATÓRIA DO TRIBUNAL DO JÚRI
Apresentado um breve percurso histórico sobre o surgimento do Tribunal do Júri e seus aspectos processuais de funcionamento no Brasil, faz-se necessária agora uma análise crítica com relação ao ponto central deste trabalho, qual seja: a execução antecipada da pena quanto às decisões condenatórias provisórias decorrentes do Tribunal do Júri.
A grande crítica ao entendimento perpassa pela utilização, há tempos, de alguns julgados no sentido de permitir a execução antecipada da pena, contribuindo para a alteração da legislação processual penal (inserção trazida pelo Pacote Anticrime), permitindo a execução antecipada da pena no Júri em determinados casos, que serão abordados a seguir.
3.1 Críticas gerais à execução antecipada da pena do Júri
O Tribunal do Júri, como já apontado nesta monografia, é uma instituição que foi incorporada ao direito pátrio tendo grande influência de ordenamentos jurídicos estrangeiros, notadamente aos institutos presentes nos sistemas europeus. Ademais, verifica-se que o Júri possui assento na atual Constituição Federal no artigo 5º, XXXVIII, com competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida e seus respectivos crimes conexos. Nesse sentido, o Tribunal do Júri trata de uma garantia do acusado e da sociedade, buscando-se proteger o bem jurídico mais caro penalmente, que é a vida humana.
Na legislação processual penal, o procedimento específico quanto ao Júri está previsto nos artigos 406 ao 497, sendo que a Lei 13.964/2019 (famigerado Pacote Anti Crime) alterou substancialmente o artigo 492 e seus respectivos parágrafos, conferindo nova redação à alínea “e”, do inciso I, com a previsão de que em caso de condenação pelo Tribunal do Júri, quando for aplicada pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão, a regra será a execução “provisória”[25] das penas, com expedição do mandado de prisão, se for o caso, sem prejuízo do conhecimento de recursos que vierem a ser interpostos.
Por outro lado, não podemos deixar de anotar a disposição prevista no §4º do artigo 492[26], que menciona que o recurso de apelação interposto nos casos de condenação igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão não terá efeito suspensivo, prevendo igualmente, no §5º do artigo 492 do CPP[27], a possibilidade de concessão do efeito suspensivo em situações excepcionais, desde que o recurso preencha cumulativamente: não tenha propósito meramente protelatório e levante questão substancial e que possa resultar em absolvição, anulação da sentença, novo julgamento ou redução da pena para patamar inferior a 15 (quinze) anos de reclusão.
Entretanto, mesmo com a possibilidade de concessão do efeito suspensivo, sendo uma disposição coerente com o que se vê no caput do artigo 492, não nos parece adequado afastar a regra geral de que o recurso de apelação possui efeito suspensivo, notadamente quanto à banalização do princípio constitucional da presunção de inocência e do devido processo legal, que serão abordados com mais verticalidade no próximo tópico.
3.2 Da constitucionalidade do artigo 283 do CPP e consequente inconstitucionalidade e inconvencionalidade da execução antecipada da pena - ADC’s 43, 44 e 54.
O STF decidiu, em votação apertada (6×5), que a execução antecipada da pena privativa de liberdade contraria os preceitos presentes na CF/88, notadamente quanto à presunção de inocência e a necessidade de aguardar o trânsito em julgado (fim de todos os recursos cabíveis) para que haja a execução da pena.
Entretanto, deve-se apontar que essa decisão não apreciou especificamente o tema da execução antecipada da pena em relação às decisões decorrentes do Tribunal do Júri, porém é um entendimento importante para se utilizar como paradigma com relação às decisões prolatadas no procedimento relativo aos crimes dolosos contra a vida e crimes conexos, até mesmo para não se privilegiar comportamentos contraditórios por parte dos Tribunais Superiores.
Ainda, importa realçar que antes mesmo do julgamento das ações declaratórias de constitucionalidade de nº 43, 44 e 54, havia precedente da 1ª (primeira) Turma do STF (HC 118.770, com publicação de 07/03/2017)[28], de relatoria de Luís Roberto Barroso, que possui posição tradicional de acordo com a possibilidade de execução antecipada da pena, ou seja, no sentido de que a prisão de réu condenado por decisão do Tribunal do Júri, ainda que sujeita a recurso, não viola o princípio constitucional da presunção de inocência ou não-culpabilidade.
No entanto, vale constar que a 2ª Turma do STF, após a decisão da 1ª Turma, manifestou-se sobre o tema, no julgamento do HC de n.º 163.814, em 19/11/2019, publicado no Informativo 960. Aponta, diferente da 1ª Turma, que não é possível a execução antecipada da pena, mesmo em caso de condenações pelo Tribunal do Júri. Vale ainda lembrar que a questão não foi decidida pelo plenário do STF, nem em sede de processo objetivo, mas no bojo de processo subjetivo (habeas corpus). Ratificando esse último entendimento do STF, o Tribunal da Cidadania também se manifestou pela impossibilidade da execução antecipada da pena, conforme decidido no HC de n.º 540.578, de relatoria do brilhante Ministro Jorge Mussi.
Portanto, verifica-se que a alteração legislativa promovida pelo Pacote Anticrime é uma verdadeira reação legislativa ao entendimento mais recente do Pretório Excelso, uma vez que, muito embora possua alicerce no entendimento de determinados ministros do STF, choca-se com o entendimento da maioria da jurisprudência, visto que abre mão do princípio basilar da presunção de inocência, permitindo que por meio de decisão de 1ª instância se execute antecipadamente a pena, levantando o manto da presunção de inocência, subvertendo o entendimento consolidado nas ações objetivas de constitucionalidade. Utiliza-se, portanto, data maxima venia, a soberania dos veredictos de forma equivocada, como um escudo punitivista para possibilitar a execução imediata da pena.
3.3 Da violação ao estado de inocência e ao duplo grau de jurisdição e a interpretação equivocada da soberania dos veredictos em detrimento do estado de inocência.
A possibilidade de execução antecipada da pena no Tribunal do Júri autoriza a possibilidade de que um órgão de 1º (primeiro) grau - embora colegiado – estipule o cumprimento imediato de pena de uma pessoa, subvertendo a lógica já apurada pelo STF.
A primeira vista, tal entendimento desconstrói à máxima do estado de inocência, direito fundamental presente na Constituição Federal[29] e na Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH)[30].
Vale instar que a presunção de inocência também está presente em diversos diplomas normativos globais, tais como: Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, aprovada pela Assembleia Nacional francesa, em 1798[31]; Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU (DUDH)[32]; Convenção Europeia de Direitos Humanos[33]; Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP)[34]; e notadamente, como já apontado, na (CADH).
Além disso, a execução antecipada da pena também afronta o princípio do duplo grau de jurisdição, que está implicitamente prevista na Constituição Pátria de 1998, no artigo 5º, inciso LV[35]. Muito embora não haja previsão legal expressa na Carta Magna, há previsão do referido princípio na CADH, no artigo 8º, item 2, alínea H[36], bem como na DUDH[37].
Portanto, por não ser uma decisão irrecorrível, podendo ser impugnada por meio do recurso de apelação, verifica-se que, mesmo diante de uma decisão colegiada, podemos estar diante de uma condenação injusta, tal ideia de fragilidade das decisões exaradas por juízes leigos está presente no artigo 593, inciso III, alínea “d” do CPP, que preleciona: “Art. 593. Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias: III - das decisões do Tribunal do Júri, quando: d) for a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos.”. Essa disposição não é por acaso, não estando presente em mais nenhum procedimento no CPP, muito menos nas leis extravagantes.
Logo, permitir que um sujeito condenado pelo Plenário do Júri tenha a pena executada imediatamente, trata, não só de violação aos direitos fundamentais do acusado, como também de afronta a toda à sociedade, que pode se deparar com um cumprimento antecipado de pena durante anos, visto que o recurso impugnativo da decisão condenatória pode levar décadas para ser apreciado.
A esse fato se soma outra problemática: e se o acusado for absolvido pelo Tribunal de Justiça/Tribunal Regional Federal anos após o início do cumprimento antecipado da pena? O que fazer?
A princípio surgem 2 (duas) alternativas que são taxativamente renegadas pelos Tribunais Superiores. A primeira seria utilizar o tempo de cumprimento antecipado de pena aos eventuais crimes cometidos posteriormente, o que significa dizer que estaríamos diante da “detração da pena”. A ideia não é aceita pelo STJ, que leciona:
A Turma reiterou o entendimento de que se admite a detração por prisão ocorrida em outro processo, desde que o crime pelo qual o sentenciado cumpre pena tenha sido praticado anteriormente à prisão cautelar proferida no processo do qual não resultou condenação. Contudo, nega-se a detração do tempo de recolhimento quando o crime é praticado posteriormente à prisão provisória, para que o criminoso não se encoraje a praticar novos delitos, como se tivesse a seu favor um crédito de pena cumprida. (REsp 687.428-RS, DJ 5/3/2007. HC 155.049-RS, Rel. Min. Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ-SP), julgado em 1º/3/2011).[38]
A 2ª (segunda) alternativa perpassa pela possibilidade de conceder ao acusado uma indenização pelo tempo que cumpriu a pena antecipadamente que não foi ratificada pela 2ª instância. Se for aplicar, por analogia, a jurisprudência atual sobre prisão preventiva, o que os Tribunais afirmam é que se a pessoa foi presa preventivamente e depois, ao final, restou absolvida, ela não terá direito, em regra, à indenização por danos morais, salvo situações excepcionais, conforme se vê a seguir:
(...) O dano moral resultante de prisão preventiva e da subsequente sujeição à ação penal não é indenizável, ainda que posteriormente o réu seja absolvido por falta de provas. Em casos dessa natureza, ao contrário do que alegam as razões do agravo regimental, a responsabilidade do Estado não é objetiva, dependendo da prova de que seus agentes (policiais, membros do Ministério Público e juiz) agiram com abuso de autoridade. (...) STJ. 1ª Turma. AgRg no AREsp 182.241/MS, Rel. Min. Ari Pargendler, julgado em 20/02/2014.
Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Responsabilidade civil do Estado. Prisões cautelares determinadas no curso de regular processo criminal. Posterior absolvição do réu pelo júri popular. Dever de indenizar. Reexame de fatos e provas. Impossibilidade. Ato judicial regular. Indenização. Descabimento. Precedentes.
1. O Tribunal de Justiça concluiu, com base nos fatos e nas provas dos autos, que não restaram demonstrados, na origem, os pressupostos necessários à configuração da responsabilidade extracontratual do Estado, haja vista que o processo criminal e as prisões temporária e preventiva a que foi submetido o ora agravante foram regulares e se justificaram pelas circunstâncias fáticas do caso concreto, não caracterizando erro judiciário a posterior absolvição do réu pelo júri popular. Incidência da Súmula nº 279/STF.
2. A jurisprudência da Corte firmou-se no sentido de que, salvo nas hipóteses de erro judiciário e de prisão além do tempo fixado na sentença - previstas no art. 5º, inciso LXXV, da Constituição Federal -, bem como nos casos previstos em lei, a regra é a de que o art. 37, § 6º, da Constituição não se aplica aos atos jurisdicionais quando emanados de forma regular e para o fiel cumprimento do ordenamento jurídico. 3. Agravo regimental não provido. STF. 1ª Turma. ARE 770931 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 19/08/2014.
Ademais, observa-se que um dos argumentos mais utilizados para sedimentar a alteração legislativa que permitiu a execução antecipada nas condenações com pena privativa de liberdade igual ou superior a 15 (quinze) anos é de que a decisão dos jurados está acobertada pelo manto da soberania dos veredictos, que significa, segundo Fernando Capez, a impossibilidade de o tribunal técnico modificar a decisão dos jurados pelo mérito. Afirma, ainda, que é um princípio relativo, haja vista que no caso da apelação das decisões do Júri pelo mérito, se entender que a decisão dos jurados afrontou manifestamente a prova dos autos, o Tribunal pode anular o julgamento e determinar a realização de um novo[39].
Todavia, tal entendimento demonstra total incompatibilidade com o processo penal democrático, visto que realiza uma interpretação equivocada do dispositivo, que está enraizado no art. 5º, inc. XXXVIII, CF/88, sendo, na verdade, uma garantia constitucional imposta em favor do réu para assegurar o julgamento deste pelos seus pares. Dito de outra forma, a soberania do julgamento pelo Júri, assim como o instituto do trânsito em julgado, é uma garantia individual do réu e está a serviço dele e não contra ele, diferente de como alguns doutrinadores tentam pregar.
Assim sendo, a soberania dos veredictos não é um privilégio, mas sim um fundamento de garantismo de direitos, que não pode ser travestido de argumento de autoridade para prejudicar o acusado, notadamente quanto à possibilidade ou não da execução cautelar da pena, não havendo arcabouço sustentar que o bem jurídico protegido (vida humana) permitiria que a execução antecipada da pena fosse permitida excepcionalmente no rito especial do Júri.
4. CONCLUSÃO
Por todo exposto, após esmiuçar a construção histórica do Tribunal do Júri, além de trazer as características, apresentar todo o procedimento e apontar críticas, chega-se à conclusão acerca da inconstitucionalidade e da inconvencionalidade da execução antecipada das decisões condenatórias advindas do Tribunal do Júri.
Inobstante as várias críticas apontadas, importa reconhecer a consolidação do Tribunal do Júri como um mecanismo de resposta à demanda da participação popular na Justiça Criminal. Todavia, por se tratar de corpo leigo de jurados, verifica-se a maior possibilidade de influência da opinião popular. Pode-se, assim, afetar o julgamento que prima pela imparcialidade, de forma que alguns doutrinadores, inclusive, sustentam o fim do rito como é hoje, conforme aponta, por exemplo, Aury Lopes Júnior em um dos seus argumentos para a reforma do procedimento dos crimes dolosos contra a vida:
“O golpe fatal no júri está na absoluta falta de motivação do ato decisório. A motivação serve para o controle da racionalidade da decisão judicial. O mais importante é explicar o porquê da decisão, o que o levou a tal conclusão sobre a autoria e materialidade. A motivação sobre a matéria fática demonstra o saber que legitima o poder, pois a pena somente pode ser imposta a quem – racionalmente – pode ser considerado autor do fato criminoso imputado. Essa qualidade na aquisição do saber é condição essencial para legitimidade do atuar jurisdicional. A decisão dos jurados é absolutamente ilegítima porque carecedora de motivação. Não há a menor justificação (fundamentação) para seus atos. Trata-se de puro arbítrio, no mais absoluto predomínio do poder sobre a razão, absolutamente incompatível com o nível de evolução civilizatória do processo penal, pois poder sem razão é prepotência. A situação é ainda mais grave se considerarmos que a liberdade de convencimento (imotivado) é tão ampla que permite o julgamento a partir de elementos que não estão no processo. A “íntima convicção”, despida de qualquer fundamentação, permite a imensa monstruosidade jurídica de ser julgado a partir de qualquer elemento. Isso significa um retrocesso ao Direito Penal do autor, ao julgamento pela “cara”, cor, opção sexual, religião, posição socioeconômica, aparência física, postura do réu durante o julgamento ou mesmo antes do julgamento, enfim, é imensurável o campo sobre o qual pode recair o juízo de (des)valor que o jurado faz em relação ao réu. E, tudo isso, sem qualquer fundamentação. Enfim, é o decisionismo (anti-democrático) levado ao extremo, a uma dimensão absolutamente inadmissível.”
A discussão da reforma do rito júri recrudesce ainda mais a importância do estudo da execução antecipada da pena decorrente das decisões tomadas pelo corpo de jurados formado na Sessão Plenária de Julgamento. Revisitar essa temática nos causa preocupação, tendo em vista o cenário político-histórico que vivemos. O desrespeito às garantias individuais e coletivas virou uma tônica, que, no caso, é exemplificada por um dos princípios mais caros para a nossa democracia: a presunção de inocência.
Portanto, não podemos perder de vista as bases que possibilitaram a construção da presunção de inocência, que é um princípio de elevado potencial político e jurídico, o qual revela a opção ideológica do processo penal democrático que se tem, tendo em vista que está umbilicalmente vinculado com a adoção de um sistema processual penal acusatório, afastando-se o sistema inquisitório. A sua concretização se revela como verdadeira regra de tratamento, como carga probatória e na máxima do in dubio pro reo, que nem mesmo a alteração legislativa infraconstitucional pode afastar.
Com base nisso, observamos a flagrante inconstitucionalidade dos dispositivos presente no artigo 492, §§§ 4º, 5º e 6º, que subvertem a dinâmica processual aqui destrinchada, conflitando com a presunção de inocência e com o devido processo legal, além de também entrar em choque com diversas dispositivos internacionais em que o Brasil ratificou, depositou e promulgou, como é o caso da CADH, que possui caráter supralegal, levando a conclusão de que os dispositivos também estão maculados com a pecha de inconvencionalidade.
Observa-se como uma luz no fim do túnel, o STJ vem decidindo pela inaplicabilidade da antecipação automática da pena aplicada em Plenário, quando o réu respondeu ao processo em liberdade, até o trânsito em julgado da condenação, enquanto o STF não concluir o julgamento sobre as hipóteses de execução antecipada de pena por condenação no Tribunal do Júri, como se observa no (HC nº 649.103 - ES (2021/0062503-0), Relatoria Antônio Saldanha Palheiro).
Logo, diante das conclusões aqui mencionadas, é importante que o STF se debruce o mais rápido possível acerca da constitucionalidade, convencionalidade e legalidade dos dispositivos acima apontados, visto que a possibilidade de execução antecipada da pena diante do julgamento de um colegiado de 1º grau distorce não só as regras básicas do direito processual penal democrático, como também abre caminho para modificações legislativas que irão relativizar ainda mais direitos que há muito tempo foram conquistas por incansáveis lutas.
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[1] MAXIMILIANO, Carlos aponta: “as origens do instituto, são tão vagas e indefinidas, que se perdem na noite dos tempos”.
[2] FAUSTO, Antônio Simon Bruno Franchetto. História, Criminologia e Teatro no Tribunal do Júri. 2016. Monografia. Disponível em: <http://www.maxwell.vrap.puc-rio.br/27878/27878.PDF>. Acesso em: 5 abr. 2019.
[3] JOSÉ DOS REIS, Wanderlei. Tribunal do Júri: implicações da Lei 11.689/08. ed. Juruá, 2015, p.79.
[4] JOSÉ DOS REIS, Wanderlei. Op. cit., p.81.
[5] JOSÉ DOS REIS, Wanderlei. Op. cit., p.82
[6] JOSÉ DOS REIS, Wanderlei. Tribunal do Júri: implicações da Lei 11.689/08. ed. Juruá, 2015, p.83.
[7] A Constituição Brasileira de 1937 (conhecida como Polaca), outorgada pelo presidente Getúlio Vargas em 10 de novembro de 1937, mesmo dia em que implanta a ditadura do Estado Novo, é a quarta Constituição do Brasil e a terceira da república, de conteúdo pretensamente democrático. Será, no entanto, uma carta política eminentemente outorgada mantenedora das condições de poder do presidente Getúlio Vargas. A Constituição de 1937, que recebeu apelido de “Polaca” por ter sido inspirada no modelo semifascista polonês, era extremamente autoritária e concedia ao governo poderes praticamente ilimitados. Foi redigida pelo jurista Francisco Campos, ministro da Justiça do novo regime, e obteve a aprovação prévia de Vargas e do ministro da Guerra, general Eurico Gaspar Dutra. (WIKIPEDIA: Constituição Polaca. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Constitui%C3%A7%C3%A3o_brasileira_de_1937>. Acesso em 5 abr. 2019)
[8] Art. 92 da CF/88: “São órgãos do Poder Judiciário: I - o Supremo Tribunal Federal; I-A o Conselho Nacional de Justiça; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) II - o Superior Tribunal de Justiça; II-A - o Tribunal Superior do Trabalho; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 92, de 2016) III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais; IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho; V - os Tribunais e Juízes Eleitorais; VI - os Tribunais e Juízes Militares; VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.”
[9] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXXVIII - e reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:
a) a plenitude de defesa;
b) o sigilo das votações;
c) a soberania dos veredictos;
d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;
[10] Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.
[11] Artigo 109, IV da CF/88: “os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;
[12] Vale ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já afastou, diversas vezes, a competência da Justiça Federal para o processamento de delitos cometidos por agentes federais, que não estavam ligados diretamente com a função desempenhada, como é o caso do policial federal que, numa briga de trânsito, a caminho de seu trabalho, disparou arma de fogo em face de outro condutor de veículo automotor (matando-o) e feriu outras duas pessoas (RESE 0001224-85.2018.4.01.4200/RR, j. 25/06/2019)
[13] MASSON, Cleber: “O crime previsto no artigo 122, CP, é de ação penal pública incondicionada em todas as suas formas (inteligência do artigo 100, CP). Como visto, com a inclusão indevida da automutilação em um crime doloso contra a vida ao invés de alocar tal conduta no crime de lesão corporal, surge uma alteração na competência para o processo e julgamento das figuras do artigo 122, CP.”. Manifestação presente no site: https://meusitejuridico.editorajuspodivm.com.br/2020/01/16/induzimento-instigacao-e-auxilio-ao-suicidio-ou-automutilacao-nova-redacao-dada-pela-lei-13-96819-ao-artigo-122-codigo-penal/
[14] Trata-se aqui de aplicação da Teoria do Esboço do Resultado, que significa: nos casos de crimes plurilocais, infrações penais em que a ação e o resultado ocorrem em lugares diversos, porém ambos dentro do território nacional, o artigo 70 estipula que a competência deve ser regida pelo lugar em que se produziu o resultado. Todavia, de acordo com o princípio do esboço do resultado, nesses casos de crimes plurilocais, a competência em razão do lugar deve ser determinada não pelo local em que ocorreu o resultado, mas sim pelo local em que a conduta foi praticada, pois facilitaria a produção de prova e o efeito intimidatória da pena seria potencializado.
[15] Art. 78, I, do CPP: Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas as seguintes regras: (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948) I - no concurso entre a competência do júri e a de outro órgão da jurisdição comum, prevalecerá a competência do júri; (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)
[16] Art. 427. Se o interesse da ordem pública o reclamar ou houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou a segurança pessoal do acusado, o Tribunal, a requerimento do Ministério Público, do assistente, do querelante ou do acusado ou mediante representação do juiz competente, poderá determinar o desaforamento do julgamento para outra comarca da mesma região, onde não existam aqueles motivos, preferindo-se as mais próximas. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).
[17] Art. 428. O desaforamento também poderá ser determinado, em razão do comprovado excesso de serviço, ouvidos o juiz presidente e a parte contrária, se o julgamento não puder ser realizado no prazo de 6 (seis) meses, contado do trânsito em julgado da decisão de pronúncia. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)
[18] Art. 415 do CPP: “O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando: I – provada a inexistência do fato; II – provado não ser ele autor ou partícipe do fato; III – o fato não constituir infração penal; IV – demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime. Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV do caput deste artigo ao caso de inimputabilidade prevista no caput do art. 26 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, salvo quando esta for a única tese defensiva.
[19] TUBENCHLAK, James. Tribunal do Júri: Contradições e Soluções.ed. Saraiva, 1997, p.66.
[20] Art. 413, §1º. Op. cit.
[21] LUZ, Jefferson Freitas. O procedimento do júri e o “principio” in dúbio pro societate. 2019. Disponível em: <http://canalcienciascriminais.com.br/o-procedimento-do-juri-societate >. Acesso em: 13 maio. 2019.
[22] LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. ed. Saraiva, 12ª edição, p. 792.
[23] RANGEL, Paulo. Tribunal do Júri – visão linguística, histórica, social e jurídica. ed. Atlas, 5ª edição, p.162.
[24] Art. 493. A sentença será lida em plenário pelo presidente antes de encerrada a sessão de instrução e julgamento.
[25] A palavra “provisória” está escrita entre as aspas, tendo em vista que, muito embora o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça utilizem essa expressão, há doutrina que aponta que o correto seria a utilização da expressão “execução antecipada das penas”. Com base nesse entendimento, Rodrigo Roig ensina: “Em diversos casos a pessoa presa possui contra si uma condenação ainda não definitiva e, em razão do decurso de lapso temporal e de bom comportamento carcerário, já possui algum dos direitos da execução penal (ex.: progressão de regime, livramento condicional e etc.). Para estes, deve-se aplicar a execução provisória da pena (com a interpretação do art. 105 à luz do parágrafo único do art. 2º da própria LEP), de modo que possam requerer seus direitos junto ao juízo encarregado da execução. Importante salientar, nesse sentido, que a execução provisória da pena para beneficiar réus presos não se confunde com a expedição de mandado de prisão e guia de recolhimento, antes do trânsito em julgado, em desfavor daqueles réus que se encontram soltos durante o processo (também chamada pela jurisprudência de “execução provisória da pena”). Esta última – que teria como melhor nomenclatura execução antecipada de pena – ofende o princípio da presunção de inocência, sendo inadmissível (STF, HC 84.078/MG; STJ, HC 268.124/SP, 6ª T., j. 11-6-2013).” Nossos Grifos.
[26] “art. 492, §4º do CPP: A apelação interposta contra decisão condenatória do Tribunal do Júri a uma pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão não terá efeito suspensivo.”.
[27] § 5º Excepcionalmente, poderá o tribunal atribuir efeito suspensivo à apelação de que trata o § 4º deste artigo, quando verificado cumulativamente que o recurso: I - não tem propósito meramente protelatório; e II - levanta questão substancial e que pode resultar em absolvição, anulação da sentença, novo julgamento ou redução da pena para patamar inferior a 15 (quinze) anos de reclusão.”
[28] Um dos argumentos centrais de Luís Roberto Barroso é alicerçado na impossibilidade de a segunda instância (TJ’s e TRF’s) de apreciar o mérito do julgamento, salvo em casos excepcionais. Ademais, afirma que a plenitude de defesa é algo que não se repete nas fases recursais.
[29] Art. 5º, LVII da CF/88- ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;
[30] CADH, art. 8.2: Toda pessoa de direito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove a sua culpa.
[31] “9º Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei”.
[32] “XI.1 Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”.
[33] “6.2 Qualquer pessoa acusada de uma infracção presume-se inocente enquanto a sua culpabilidade não tiver sido legalmente provada”.
[34] “Art. 14.2 Qualquer pessoa acusada de infracção penal é de direito presumida inocente até que a sua culpabilidade tenha sido legalmente estabelecida”.
[35] Art. 5º [...] da CF/88: “LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”.
[36] Art. 8º, 2º, h: “Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: h. direito de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior.”.
[37] XI.1:” Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público, no qual tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias a sua defesa.”.
[38] Pontua-se que a Defensoria Pública, tradicionalmente, defende que a detração da pena também serve para as prisões processuais de crimes realizados posteriormente ao crime da execução penal, sob os argumentos: A absolvição ou a extinção da punibilidade deverá ser utilizada como uma forma de indenizar o apenado pelo erro judiciário, como é o caso de preso por tempo superior a sua condenação; É possível que haja compensação, tendo em vista que está em jogo o mesmo bem jurídico: a liberdade individual; Subsidiariamente, deve-se aplicar o fato como atenuante genérica ou inominada no artigo 66 do Código Penal.
[39] CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 535.
Advogado. Pós-graduado em Direito Público pela Universidade Cândido Mendes. Pós-graduado em Direitos Humanos pela Faculdade CERS.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CARDOSO, LUIS PAULO ROCHA. Tribunal do Júri: da (in)constitucionalidade e da (in)convencionalidade da execução antecipada da pena Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 ago 2022, 04:32. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/59033/tribunal-do-jri-da-in-constitucionalidade-e-da-in-convencionalidade-da-execuo-antecipada-da-pena. Acesso em: 25 dez 2024.
Por: Nathalia Sousa França
Por: RODRIGO PRESTES POLETTO
Por: LEONARDO RODRIGUES ARRUDA COELHO
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
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