VALDIVINO PASSOS SANTOS[1]
(orientador)
RESUMO: A presente pesquisa versa sobre o julgamento do AgRg no HC 731.648/SC, no qual houve uma mudança considerável acerca dos direitos das detentas gestantes e mães no contexto brasileiro. Estudou-se de que forma o referido julgado trouxe materialização do direito da dignidade da pessoa humana às detentas inseridas no sistema carcerário feminino brasileiro. Realizou-se um aparato geral sobre a situação atual das penitenciárias femininas no Brasil e a violação aos direitos e garantias individuais das presas e de seus filhos. Abordou-se o tratamento legal, doutrinário e jurisprudencial contemporâneo acerca da prisão domiciliar às gestantes ou mães. Por fim, analisou-se especificamente o julgamento do AgRg no HC 731.648/SC pelo STJ, no qual passou a ser prescindível a comprovação da indispensabilidade dos cuidados maternos da detenta para com o filho que tenha até doze anos para a concessão da prisão em regime domiciliar. O método de pesquisa utilizado foi o dedutivo, a metodologia da pesquisa jurídica foi realizada por meio da pesquisa exploratória bibliográfica e documental e a técnica de análise de dados é qualitativa. Percebeu-se que o julgamento do AgRg no HC 731.648/SC pelo STJ se coaduna com as diretrizes sustentadas pelo princípio da dignidade da pessoa humana.
Palavras-chave: Sistema prisional feminino; Dignidade humana; Prisão domiciliar.
ABSTRACT: The present research deals with the judgment of AgRg in HC 731.648/SC, in which there was a considerable change regarding the rights of pregnant women and mothers in the Brazilian context. It was studied how the aforementioned judgment brought materialization of the right of human dignity to the inmates inserted in the Brazilian female prison system. A general apparatus was carried out on the current situation of women's penitentiaries in Brazil and the violation of the individual rights and guarantees of prisoners and their children. The contemporary legal, doctrinal and jurisprudential treatment regarding house arrest for pregnant women or mothers was addressed. Finally, the judgment of AgRg in HC 731.648/SC by the STJ was specifically analyzed, in which proof of the indispensability of the detainee's maternal care for the child who is up to twelve years old for the granting of the prison regime home. The research method used was deductive, the methodology of legal research was carried out through exploratory bibliographic and documentary research and the data analysis technique is qualitative. It was noticed that the judgment of AgRg in HC 731.648/SC by the STJ is consistent with the guidelines supported by the principle of human dignity.
Keywords: female prison system; human dignity; home prison.
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho versa sobre o julgamento do AgRg no HC 731.648/SC, de forma a realizar um estudo sobre como o seu julgamento influi na materialização do princípio da dignidade da pessoa humana previsto nas entrelinhas da Constituição Federal de 1988.
Nessa perspectiva, será verificada a forma como o julgado dispôs sobre a concessão da prisão domiciliar às detentas gestantes ou mães de filhos com até doze anos de idade no que se refere ao alcance do princípio da dignidade humana, e mediante quais requisitos a medida poderá ser deferida.
Portanto, a problemática evidenciada é: o julgamento do AgRg no HC 731.648/SC pelo STJ se coaduna com as diretrizes sustentadas pelo princípio da dignidade da pessoa humana?
A pesquisa se justifica no meio acadêmico devido à demanda que se tem de averiguar a mudança jurídica que o recente julgamento favorece, que é pôr fim à limitação de que somente é devida a concessão de prisão domiciliar à detenta que comprove a necessidade de que seu filho dependa de seus cuidados, exigindo-se que a comunidade acadêmica empreenda esforços para entender o desenvolvimento dos direitos da mulher no Brasil.
Justifica-se, sob outro viés, no meio social, sob dois pontos de vista: a) o dos direitos da mulher, no ponto em que o presente estudo vem destrinchar o amparo à detenta gestante e mãe de filho com até doze anos que tem sido mais abrangente com o passar dos anos; b) o dos direitos da criança e do adolescente, à proporção que o julgamento do referido remédio constitucional amplia a viabilidade de que o absolutamente incapaz cresça e se desenvolva sob o amparo materno.
O objetivo geral da presente abordagem é estudar o AgRg no HC 731.648/SC pelo STJ e compreender a alteração quanto aos direitos da mulher gestante e mãe de filho com até doze anos incompletos, na medida em que passa ser dispensável a comprovação da imprescindibilidade dos cuidados da mãe para que essa passe a cumprir pena ergastulada em regime domiciliar.
Entre os objetivos específicos estão: a) estudar o tratamento legal, doutrinário e jurisprudencial acerca da prisão domiciliar nos tempos atuais, delimitando-se a quais hipóteses se aplica e quais os critérios necessários para o deferimento da conversão da modalidade de prisão; b) elucidar quais argumentos fundamentaram a decisão do HC 731.648/SC pelo STJ; c) investigar de que forma o julgamento do HC 731.648/SC pelo STJ garante a aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana à detenta mulher.
Para que isso seja possível, a presente pesquisa utiliza a metodologia da pesquisa jurídica, por meio da pesquisa exploratória bibliográfica e documental. O método utilizado é o dedutivo e a técnica de análise de dados é qualitativa, com vistas a entender o referido julgado sob a ótica da dignidade da pessoa humana aplicável à mulher.
O presente trabalho está estruturado em três capítulos, o primeiro versando sobre o tratamento legal, doutrinário e jurisprudencial contemporâneo acerca da prisão domiciliar, com o intuito de verificar as hipóteses de cabimento e os critérios para a aplicação da modalidade de cumprimento da pena.
O segundo capítulo tratará especificamente do julgamento do AgRg no HC 731.648/SC pelo STJ, para entender o contexto da decisão de que é prescindível a comprovação da necessidade de cuidados maternos para o deferimento da prisão domiciliar em favor das presas mães de filhos de até doze anos ou que estejam gestantes.
Por fim, o terceiro capítulo se designará a estudar de que forma o julgamento do AgRg no HC 731.648/SC pelo STJ contribui para a evolução dos direitos da mulher no Brasil, garantindo a aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana previsto constitucionalmente, uma das premissas basilares do Estado Democrático Brasileiro.
2 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NA PERSPECTIVA DAS DETENTAS GRÁVIDAS E SEUS FILHOS NO SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO NA ATUALIDADE
Em proêmio, insta frisar que o cumprimento da pena em estabelecimento carcerário é demasiadamente dificultoso quando se trata de detenta grávida ou que tenha filho menor que necessite dos cuidados maternos, representando o sistema prisional feminino um verdadeiro desafio para o Estado brasileiro e as políticas públicas adotadas pelo governo.
O problema enfrentado pela mulher se inicia muito antes de seu encarceramento: o machismo e preconceito que assola a sociedade em geral a reprime desde o momento que inserida no meio social, assumindo posição de elevada vulnerabilidade e exclusão social (LIMA, 2006 apud ANDRADE, 2017, p. 13).
A título de informação, do ano de 2000 até 2016, o número total de mulheres detentas no Brasil cresceu 656%, totalizando em 42.355 mulheres presas, ao passo que o aumento no número de detentos homens aumentou somente 293% no mesmo período (SANTOS; REZENDE, 2020).
Acredita-se que o aumento drástico nesse número se deva à entrada em vigor da Lei 11.343/06, conhecida como Lei de Drogas, ocasião em que o Estado Brasileiro passou a punir mais severamente os crimes que envolvem o tráfico de entorpecentes (BRASIL, [2022d]). Nesse cenário, na esmagadora maioria das vezes a mulher assume papel de coadjuvante em crimes cujos atores muitas vezes são parentes, companheiros ou amigos (MAKKI; SANTOS, 2017 apud ANDRADE, 2017, p. 14).
Apesar do intuito da referida Lei de Drogas ter sido, a priori, punir mais severamente os crimes que envolvam entorpecentes, criou um cenário onde a quantidade de ocorrência dessa espécie de crime continua aumentando significativamente, e a população carcerária feminina se torna paulatinamente mais expressiva.
Nas palavras de Zacarias (2022, não paginado), do total de mulheres presas no território brasileiro, 60% aproximadamente está cumprindo reprimenda em razão de algum crime abrangido pela Lei de Drogas. A despeito de parecer estar havendo maior atuação estatal na punição desses criminosos, o número de tráfico de drogas permanece crescendo gradativamente.
De acordo com o mesmo autor, “dos mais de 700 mil presos brasileiros, quase um terço deles está detido por crimes relacionados a drogas” (ZACARIAS, 2022, não paginado). Ademais, “em 2020 foram registrados números recordes de apreensão de drogas”. (ZACARIAS, 2022, não paginado).
O que se discute, portanto, é se a referida lei foi benéfica sob o ponto de vista da necessidade de controle do tráfico de drogas, ou se na verdade caracterizou um instrumento ineficaz de política criminal. Ou, ainda, se é um bom mecanismo, mas que requer outras políticas públicas aliadas para a consecução de bons resultados (ZACARIAS, 2022).
A pauta do encarceramento feminino ainda é alvo de grande discussão, mormente por envolver questão de gênero, porquanto acredita-se que o tratamento prisional conferido à mulher detenta é praticamente o mesmo conferido ao preso homem. Essa situação resulta no acentuamento da complexidade da ressocialização da presa, por falta de cuidados necessários durante o período em que ergastulada (FRANÇA, 2014 apud SANTOS; REZENDE, 2020).
Essa situação denota a falta de dedicação do aparelho estatal em efetivamente realizar análise sobre as necessidades da mulher presa e, além disso, em garantir a tutela de direitos e garantias individuais, gerando uma série de problemas sociais, dentre os quais cabe ser destacada a falta de amparo à detenta grávida ou a que seja mãe de criança (SANTOS; REZENDE, 2020).
Conforme aduz Borges (2005) e Artur (2009) (apud SANTOS; REZENDE, 2020), o estabelecimento prisional não foi idealizado com o intuito de atender às necessidades femininas; pelo contrário, foi projetado, em conjunto com as leis de execução penal, para recepcionar homens, sendo totalmente desprovido de amparo às especificidades inerentes à mulher.
Estudar a evolução do sistema prisional feminino brasileiro requer o reconhecimento de que o movimento feminista foi o maior percursor para a garantia dos direitos femininos, o que exigiu uma reformulação do conceito de gênero, passando a contemplar particularidades de cada sexo (SANTOS; REZENDE, 2020).
Nessa senda, a despeito das conquistas da mulher que se estendem ao âmbito da legislação penal e à execução de pena, suas necessidades físicas, sociais e psicológicas ainda são ignoradas quando o assunto é seu encarceramento (SANTOS; REZENDE, 2020).
Inclusive, como muito bem abordado por Santa Rita (2006 apud SANTOS; REZENDE, 2020), o sistema prisional brasileiro apenas reflete a desigualdade de gênero que caracteriza uma nítida mazela social presente na cultura brasileira, o que é verificado quando se tem sob visão o fato de que homens recebem “kits” higiene do Estado, ao passo que as mulheres sofrem com a falta de absorventes, shampoos e condicionadores, por exemplo.
Até o final do ano de 2017, o Brasil possuía 622 mulheres presas que estavam grávidas ou que são lactantes, sendo 373 grávidas e 249 amamentavam seu filho (BRASIL, 2018, não paginado). A principal dificuldade evidenciada pelas presas é justamente o enfrentamento do cumprimento da pena em situação de extrema solidão, vulnerabilidade e humilhação (GUEDES, 2006 apud SANTOS; REZENDE, 2020).
A Lei nº 13.257 de 2016 veio trazer a possibilidade de a detenta gestante ou mãe de filho com até 12 anos cumprir a pena em regime domiciliar, trazendo ao rol do art. 318 o inciso IV, que trata da gestante, e o inciso V, que trata da mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos (BRASIL, [2022a], não paginado).
Em que pese tal vitória legislativa, a realidade é um certo grau de resistência do juízo da execução em deferir o cumprimento da pena em regime domiciliar pela detenta mãe. Os críticos dessa abordagem garantem que tal possibilidade pode diretamente viabilizar o aumento da prática de crimes por mulheres, pois estariam respaldadas na garantia de que não ficariam presas caso engravidassem (SANTOS; REZENDE, 2020).
No entanto, a realidade encarada pelas recuperandas destoa dessa presunção. Contrariamente, o vínculo e o afeto familiar soam como motivos para que o crime seja evitado pelas mulheres, ou ainda, mesmo que já tenha sido praticado, um motivo idôneo para uma escorreita recuperação. De acordo com Posada (2015,
p. 28-29 apud SANTOS; REZENDE, 2020, p. 589), “o afastamento enfraquece o vínculo entre mães e filhos e compromete a relação com o cuidado destes.”
Nesse espeque, é imprescindível que os estabelecimentos prisionais e o sistema carcerário femininos brasileiros devam passar por uma reestruturação institucional, com o intuito de que os direitos e garantias tanto da mulher presa quanto de seu filho sejam resguardados. Além disso, para que a finalidade da pena, que é a ressocialização, conforme seu caráter preventivo (NUCCI, 2019, p. 351), seja alcançada de maneira idônea.
3 O TRATAMENTO LEGAL, DOUTRINÁRIO E JURISPRUDENCIAL CONTEMPORÂNEO ACERCA DA PRISÃO DOMICILIAR ÀS GESTANTES OU MÃES: hipóteses de viabilidade e critérios para a aplicação da modalidade
A prisão domiciliar está expressamente prevista no Código do Processo Penal a partir do art. 317, e pode ser caracterizada como o a substituição da prisão preventiva consistente no “recolhimento do indiciado ou do acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial.” (BRASIL, [2022a], não paginado).
Consoante leitura do art. 318, a referida conversão poderá ser cogitada quando o indiciado ou acusado se tratar de agente maior de 80 anos; se for ou estiver extremamente debilitado por motivo de doença grave; se a manutenção nos interiores do estabelecimento prisional inviabilizar os cuidados de pessoa menor de 6 anos ou portadora de deficiência; se for agente gestante; se for mulher com filho de até 12 anos de idade incompletos; ou se for homem, em se tratando de único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos (CAPEZ, 2022, p. 652-653).
Insta ressaltar que a prisão domiciliar é uma alternativa para cumprimento de prisão preventiva, ou seja, a espécie de prisão provisória de natureza cautelar que antecede a sentença e que pode ser decretada a qualquer momento até sua prolação, desde que presentes seus requisitos e pressupostos autorizadores (CAPEZ, 2022, p. 633).
Especificadamente no caso objeto de análise da presente pesquisa, isto é, em se tratando de detenta gestante ou com filho com até 12 anos incompletos, há de se ressaltar que existem requisitos cumulativos trazidos pela Lei nº 13.769/18, que incorporou ao texto do CPP o art. 318-A, dispondo que a substituição só será possível se o crime cometido não tenha sido com violência ou grave ameaça à vitima e se a vítima do crime não tenha sido seu filho ou dependente (BRASIL, [2022a]).
Atualmente, a prisão domiciliar tem tido aplicação limitada no âmbito do processo penal, pois cada vez mais os órgãos julgadores estão mais criteriosos para seu deferimento. Em regra, a modalidade é autorizada, mediante o preenchimento dos requisitos acima dispostos, à indiciada ou à acusada (CAPEZ, 2022).
Entretanto, não se pode olvidar que efetivamente houve um avanço legislativo e institucional na possibilidade do cumprimento da prisão preventiva em estabelecimento domiciliar por mulheres. Pela primeira vez foi reconhecida a possibilidade no julgamento do Habeas Corpus Coletivo 143.641,
O relator, ministro Sebastião Reis Júnior, lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do HC Coletivo 143.641, concedeu o regime domiciliar às gestantes e mães de crianças pequenas ou com deficiência que estivessem em prisão preventiva, excetuados os casos de crimes violentos ou cometidos contra os descendentes. (BRASIL, 2022b, não paginado).
Segundo Ferreira (2020, p. 388),
O Habeas Corpus coletivo, que foi impetrado pelos membros do Coletivo de Advogados em Direitos Humanos (CADH) em favor de todas as mulheres presas preventivamente e que ostentassem a condição de gestantes, puérperas ou mães de filhos sob sua responsabilidade, teve como resultado uma decisão considerada histórica, que concedeu a substituição da prisão preventiva pela domiciliar para todas as mulheres no país que estivessem nessa condição
Em que pesem os limitados cenários para aplicação da modalidade, a jurisprudência brasileira já tem estendido a conversão do cumprimento de pena privativa de liberdade definitiva em estabelecimento carcerário para o regime domiciliar, como foi a ocasião do julgamento do RHC 145.931 pelo STJ:
RECURSO EM HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. EXECUÇÃO DE PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE DE 9 ANOS DE RECLUSÃO. REGIME INICIAL FECHADO. CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DOS CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PRETENSÃO DE CONCESSÃO DE PRISÃO DOMICILIAR. PACIENTE GENITORA DE CRIANÇAS DE 6 E 2 ANOS DE IDADE. POSSIBILIDADE. CARACTERIZADA INEFICIÊNCIA ESTATAL EM DISPONIBILIZAR VAGA À RECORRENTE EM ESTABELECIMENTO PRISIONAL PRÓPRIO E ADEQUADO À SUA CONDIÇÃO PESSOAL, DOTADOS DE ASSISTÊNCIA MÉDICA PRÉ-NATAL E PÓS-PARTO, BERÇÁRIOS E CRECHES. ARTS. 82, § 1º, E 83, § 2º, DA LEP. PRESÍDIO FEMININO MAIS PRÓXIMOS DISTANTE 230 KM DA RESIDÊNCIA. CONVIVÊNCIA E AMAMENTAÇÃO IMPOSSIBILITADA. PROTEÇÃO INTEGRAL À CRIANÇA. PRIORIDADE. [...] RECURSO PROVIDO.
1. A Suprema Corte, no julgamento do HC Coletivo n. 143.641/SP, concedeu a ordem para determinar a substituição da prisão preventiva pela domiciliar [...] de todas as mulheres presas, gestantes, puérperas ou mães de crianças e deficientes, [...] excetuados os casos de crimes praticados por elas mediante violência ou grave ameaça, contra seus descendentes ou, ainda, em situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas (HC n. 143.641/SP, Ministro Ricardo Lewandowski, Segunda Turma do STF, DJe 9/10/2018). Precedentes do STJ no mesmo sentido.
[...]
3. No entanto, a execução de condenação definitiva em prisão domiciliar, em regra, somente é admitida ao reeducando do regime aberto, desde que seja maior de 70 anos, portador de doença grave, ou mulher gestante ou mãe de menor ou deficiente físico ou mental (art. 117 da LEP). Porém, excepcionalmente, se admite a concessão do benefício às presas dos regimes fechado e semiaberto quando verificado pelo juízo da execução penal, no caso concreto - em juízo de ponderação entre o direito à segurança pública e a aplicação dos princípios da proteção integral da criança e da pessoa com deficiência -, que tal medida seja proporcional, adequada e necessária e que a presença da mãe seja imprescindível para os cuidados da criança ou pessoa com deficiência, salvo se a periculosidade e as condições pessoais da reeducanda indiquem que o benefício não atenda os melhores interesses da criança ou pessoa com deficiência.
4. Outrossim, a jurisprudência desta Corte tem se orientado no sentido de que deve ser dada uma interpretação extensiva tanto ao julgado proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus coletivo n. 143.641, que somente tratava de prisão preventiva de mulheres gestantes ou mães de crianças de até 12 anos, quanto ao art. 318-A do Código de Processo Penal, para autorizar também a concessão de prisão domiciliar às rés em execução provisória ou definitiva da pena, ainda que em regime fechado (Rcl n. 40.676/SP, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, DJe 1º/12/2020).
5. Essa possibilidade, concessão de prisão domiciliar regulada no art. 117 da LEP, em qualquer momento do cumprimento da pena, ainda que em regime fechado, desde que excepcionalidade do caso concreto imponha, tem sido reconhecida por esta Corte Superior. Precedentes das Turmas da Terceira Seção.
6. Também a Suprema Corte tem admitido, em situações absolutamente excepcionais, a concessão de prisão domiciliar a regimes mais severos de execução penal, a exemplo das ordens implementadas nas hipóteses em que o condenado estiver acometido de doença grave, a demandar tratamento específico, incompatível com o cárcere ou impassível de ser oferecido pelo Estado (AgR na AP n. 996, Ministro Edson Fachin, Segunda Turma, DJe 29/9/2020).
7. In casu, verifica-se que a recorrente se enquadra nos termos definidos no HC Coletivo n. 143.641/SP, isto é, mulher em vias de ser presa, mãe de criança de 6 e 2 anos de idade (fl. 20), não sendo caso de crimes praticados por ela mediante violência ou grave ameaça contra seus descendentes.
[..]
9. Recurso em habeas corpus provido, confirmando-se a liminar, para permitir que a recorrente possa cumprir pena em regime domiciliar, com monitoração eletrônica, sem prejuízo da fixação de outras medidas cautelares, a critério do Juízo a quo, a serem implementadas pelo Juízo da Execução penal competente [...]. (BRASIL, 2022e, p. 1-3).
No caso concreto, a sentenciada havia sido condenada à pena de reclusão de nove anos por tráfico de drogas e associação para o tráfico. Contudo, em razão de ser indispensável aos cuidados de seus dois filhos menores, um de dois e outro de seis anos, e levando-se em consideração que as crianças residiam a 230 quilômetros do presídio feminino mais próximo, o contato entre mãe e filhos restou impossibilitado, razão pela qual deferiu-se o regime domiciliar (BRASIL, 2022b).
Para que seja autorizado o regime domiciliar, porém, a pena imposta não pode estar sendo cumprida em regime fechado ou semiaberto, apenas no regime aberto (BRASIL, 2022b), a teor do que trata o art. 117 da Lei de Execuções Penais (LEP):
Art. 117. Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de: I - condenado maior de 70 (setenta) anos; II - condenado acometido de doença grave; III - condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental; IV - condenada gestante (BRASIL, [2022f], não paginado).
A despeito do mandamento legal, orienta o Min. Sebastião Reis Júnior que a conversão será concedida de maneira excepcional quando observado, a partir do caso concreto, que a medida seja adequada visando o interesse do menor, sendo imprescindível sua adoção para os cuidados com a criança, devendo-se ponderar dois valores: o direito à segurança pública e, em contrapartida, a proteção integral da criança (BRASIL, 2022b, não paginado).
Portanto, o que se observa é que a viabilidade do benefício será analisada caso a caso, pois em se tratando de reeducanda com alto grau de periculosidade e dotada de condições pessoais desfavoráveis, portanto desvirtuando-se do objetivo da prisão domiciliar e desatendendo aos interesses do nascituro ou do filho menor, o indeferimento da conversão será a medida que se impõe (BRASIL, 2022b).
Outra condição hábil a desautorizar a manutenção do regime domiciliar é em caso de desobediência pela reeducanda às regras impostas pelo juízo da execução, mesmo que tenha preenchido, em tese, os requisitos para o cumprimento da pena em estabelecimento domiciliar, como é o caso do julgamento do HC 488826/PR pelo STJ:
HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. PRISÃO DOMICILIAR. ACUSADA MÃE DE MENOR DE 12 ANOS. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL. DESCUMPRIMENTO REITERADO DAS CONDIÇÕES IMPOSTAS PARA A SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA POR DOMICILIAR. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. NÃO OCORRÊNCIA. ORDEM DENEGADA.
[...]
2. Ainda que a paciente seja mãe de filho menor de 12 anos, a substituição da prisão preventiva pela domiciliar foi negada com fundamento em situação excepcional, nos termos do HC n. 143.641/SP, evidenciada no fato de que a ré vem reiteradamente descumprindo as condições impostas durante a audiência de custódia (mov. 27.1), quais sejam, prisão domiciliar mediante monitoração eletrônica, não havendo manifesta ilegalidade.
3. Habeas corpus denegado. (BRASIL, 2019, não paginado).
Depara-se, à vista do exposto, com um complexo dualismo: garantir às mulheres que se encontram em situação de vulnerabilidade social o cumprimento de suas penas em regime domiciliar ou garantir a ordem pública e a paz social mantendo-as em cárcere para o cumprimento da reprimenda e efetivação do processo de reinserção social?
Não se pode olvidar que o estabelecimento prisional não é ambiente favorável ao desenvolvimento da família e criação dos filhos pela mulher, mormente por ser um lugar onde direitos e garantias fundamentais constitucionalmente previstos são nitidamente violados.
Portanto, esse cenário gera deficiência estrutural do sistema, fazendo com que mulheres, grávidas, mães e seus filhos permaneçam em situação extremamente degradante e desprovidos de cuidados médicos, hospitalares, psicológicos indispensáveis.
Percebe-se também que há notória falha estatal em não contar com estabelecimentos prisionais femininos com equipe técnica especializada e cuidados em geral para mulheres, sobretudo às gestantes e às que possuem filhos menores. O ideal seria que existissem tais ambientes com médicos, creches e berçários, o que frusta a previsão normativa do art. 82, § 1º, e art. 83, § 2º, da LEP (BRASIL, 2022b).
Tomando por base que o Estado não dispõe de estabelecimento idôneo para o desenvolvimento da família pela mulher, e ao mesmo tempo, considerando que a pena deva ser cumprida por todos os condenados, indistintamente, cabe à técnica do juízo da execução alinhar a melhor forma de cumprimento da pena pela mulher, atentando-se às particularidades e condições de cada situação fática e sopesando valores reputados imprescindíveis.
4 O JULGAMENTO DO AGRG NO HC 731.648/SC PELO STJ E A GARANTIA DOS DIREITOS DA DETENTA MULHER: uma concretização do princípio da dignidade da pessoa humana
Em agosto do ano de 2022 foi julgado o AgRg no HC 731.648/SC pela Quinta Turma do STJ, no qual restou sedimentado o entendimento de que deve haver a concessão de prisão domiciliar às detentas com filhos de até 12 anos, independentemente da comprovação da necessidade dos cuidados maternos, que é legalmente presumida (BRASIL 2022g). Confira-se o teor da ementa:
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. PRISÃO DOMICILIAR. ART. 318, V, DO CPP. MÃE COM FILHOS DE ATÉ 12 ANOS INCOMPLETOS. CRIME SEM VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA. NÃO COMETIMENTO CONTRA OS PRÓPRIOS FILHOS. IMPRESCINDIBILIDADE DE CUIDADOS MATERNOS PRESUMIDA. EXECUÇÃO DEFINITIVA DA PENA. ART. 117 DA LEP. REGIME SEMIABERTO. HC COLETIVO N. 143.641/SP DO STF. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS. FLAGRANTE ILEGALIDADE CONFIGURADA. AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
1. Por razões humanitárias e para proteção integral da criança, é cabível a concessão de prisão domiciliar a genitoras de menores de até 12 anos incompletos, nos termos do art. 318, V, do CPP, desde que (a) não se trate de crime cometido com violência ou grave ameaça, (b) não tenha sido praticado contra os próprios filhos e (c) não esteja presente situação excepcional a contraindicar a medida.
2. Conforme art. 318, V, do CPP, a concessão de prisão domiciliar às genitoras de menores de até 12 anos incompletos não está condicionada à comprovação da imprescindibilidade dos cuidados maternos, que é legalmente presumida.
3. É possível a extensão do benefício de prisão-albergue domiciliar às sentenciadas gestantes e mães de menores de até 12 anos, ainda que em regime semiaberto ou fechado, nos termos dos arts. 318, V, do CPP e 117, III, da LEP, desde que presentes os requisitos legais.
4. Agravo regimental provido para conceder a ordem de ofício. (BRASIL, 2022g, não paginado).
Importante mencionar que as instâncias inferiores haviam negado a prisão domiciliar à requerente, sob o argumento de que ela não teria comprovado ser indispensável ao cuidado de seus três filhos menores de 12 anos. Inclusive, o próprio STJ, na ocasião do julgamento do HC também indeferiu o pedido, sendo necessária a interposição de agravo regimental para impugnar a decisão (BRASIL, 2022c).
De acordo com o entendimento do ministro João Otávio de Noronha, é perfeitamente cabível a referida substituição, ou seja, da prisão em regime semiaberto para a prisão albergue domiciliar nos casos em que a detenta seja mãe de filho(s) com até doze anos de idade incompletos, desde que não tenham eles como vítima; que não tenha sido empregada violência ou grave ameaça na conduta delituosa; e, ainda, que não haja alguma condição especial que impossibilite o deferimento da medida (BRASIL, 2022c).
E mais além, é possível ainda haver a concessão da prisão domiciliar em se tratando de detenta condenada ao regime fechado ou semiaberto, desde que preenchidos os requisitos legais (BRASIL, 2022c). A referida alteração promoveu um avanço na proteção à dignidade humana da mulher, que constantemente tem seus direitos violados na ocasião do recolhimento ao estabelecimento prisional.
Sob o enfoque da evolução dos documentos internacionais que já versaram sobre os direitos da detenta mulher, tem-se as Regras das Nações Unidas para o Tratamento de Mulheres Presas e Medidas não Privativas de Liberdade para Mulheres Infratoras (Regras de Bangkok), criadas em 2010 (BRASIL, 2016 apud FERREIRA, 2020, p. 391), sendo o primeiro regramento que dispôs de alguma forma a necessidade da segregação sexual binária “masculino” e “feminino”.
Insta ressaltar que uma das disposições continas nas Regras de Bangkok é a indispensabilidade do tratamento equitativo entre os gêneros na hipótese de encarceramento, consubstanciado no princípio da não discriminação, “considerando as necessidades específicas das mulheres, reconhecendo que é necessário um tratamento igual, mas diferenciado.” (CERNEKA, 2012, p. 18 apud FERREIRA, 2020, p. 391).
É com base nas Regras de Bangkok que o as nações tem se preocupado paulatinamente com as detentas mães e seus respectivos filhos, priorizando alternativas diversas ao encarceramento preventivo, como é caso da prisão domiciliar. Contudo, não se pode olvidar que sempre é necessária a observância de outros valores como a segurança pública e a paz social, na ocasião do deferimento de tais medidas (FERREIRA, 2020, p. 391). Dessa forma, “A criação pela ONU de um documento internacional preocupado com as questões que permeiam a prisão feminina é mais um passo no reconhecimento internacional, em âmbito global, dos direitos das mulheres como direitos humanos.” (FERREIRA, 2020, p. 391).
Uma importante consideração feita por Ferreira (2020, p. 393) acerca dos direitos humanos aplicáveis às mulheres presas ao longo do tempo é que devido à universalização de tais direitos, alguns ganham especial atenção, e outros como o estupro e a violência contra a presa acabam ficando suprimidos.
Tanto é que nos documentos internacionais que versam sobre os direitos dos presos, são listados de maneira abstrata, e algumas demandas das mulheres restam desatendidas por poucos desses atingirem as presas, havendo previsão apenas de necessidades básicas como “espaços específicos para gestantes” e o “provimento de atendimento ginecológico.” (FERREIRA, 2020, p. 393).
As Regras de Bangkok puderam ser observadas nitidamente, de maneira inédita, na ocasião do julgamento do HC nº 143.641 SP pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que concedeu a todas as mulheres presas a possibilidade de conversão de suas prisões à modalidade domiciliar, mediante o preenchimento de requisitos (FERREIRA, 2020, p. 396).
O que havia sido observado até o mês de outubro de 2022, quando julgado o AgRg no HC 731.648/SC foi certa resistência pelos juízes e Tribunais em aplicarem os direitos subjetivos das detentas gestantes e mães, denotando “pouca efetividade em promover mudanças no cenário do encarceramento de mulheres.” (FERREIRA, 2020, p. 397):
Observando um conjunto de decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no ano seguinte à decisão do STF, foi possível perceber a relutância dos Ministros em aplicar as determinações da Corte Constitucional e, consequentemente, da própria lei e normativas internacionais. (FERREIRA, 2020, p. 397).
Felizmente, o julgamento do AgRg no HC 731.648/SC pelo STJ demonstrou maior capacidade de interpretação teleológica do órgão julgador perante à norma, superando a mera subsunção da lei ao caso concreto sem qualquer sensibilidade na efetivação da tutela jurisdicional.
É indispensável, portanto, que os julgados no que dizem respeito ao direito da detenta mãe sejam embasados para além da mera checagem de requisitos formais. Reputa-se imperiosa, entretanto, a conduta de analisar, a cada caso concreto, marcadores de gênero, raça, classe, nacionalidade etc., e verificar de que forma influem na realidade daquela detenta (FERREIRA, 2020, p. 397).
O contrário disso é impossibilitar o acesso à justiça e massacrar o direito fundamental da dignidade da pessoa humana. Nesse espeque, “o judiciário deve interpretar a norma a partir da realidade das mulheres presas, romper as barreiras estigmatizadoras, aplicando efetivamente o direito à não discriminação” (FERREIRA, 2020, p. 397).
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O tema da dignidade da detenta mãe de criança ou adolescente, e ainda da gestante recolhida ao estabelecimento prisional é um tema extremamente complexo do ponto de vista social e que não tem o acolhimento pelo Poder Público de maneira satisfatória.
A vontade de destrinchar o presente tema surgiu da necessidade de se abordar no estudo da ciência jurídica o tema da dignidade da pessoa humana sob o viés dos direitos da mulher, para que o Direito cumpra seu papel, que é acompanhar as problemáticas vivenciadas pela sociedade e fornecer amparo.
E mais além, o presente trabalho partiu das premissas da dignidade da pessoa humana para estudar o julgado do AgRg no HC 731.648/SC, que constituiu uma vitória ao caminho trilhado pelos direitos da mulher gestante encarcerada.
Conforme restou demonstrado, a problemática da falta de amparo à mulher, que resulta na ofensa à sua dignidade, caracteriza uma nítida mazela social vivenciada no Estado brasileiro, e que isso apenas reflete um problema superior oriundo da cultura brasileira, que é a desigualdade de gênero.
Observou-se também que hoje os estabelecimentos carcerários não contam com estrutura e recursos suficientes à contemplação das necessidades básicas da mulher, e principalmente, da mulher mãe ou gestante, e que esse grupo recebe praticamente o mesmo tratamento que é direcionado aos detentos homens.
Essa situação repercute na falha da materialização do intuito da pena, que é a ressocialização, caracterizando através da falta de cuidados à detenta mãe, além de prejuízos à criação e desenvolvimento de seu(s) filho(s), uma série de traumas para si mesma.
Observou-se que a prisão domiciliar, disposta no art. 317 do CPP tem aplicação muito limitada, e somente será deferida em situações extremas, quando o caso concreto se tratar de prisão preventiva. Na hipótese de mulher gestante, notou-se que a substituição só será possível se o crime cometido não tenha sido com violência ou grave ameaça à vítima e se a vítima do crime não tenha sido seu filho ou dependente.
Contudo, a teor do mandamento legal, observou-se que excepcionalmente Tribunais tem entendido pela conversão do cumprimento da pena em estabelecimento prisional ao cumprimento da pena em domicílio, em casos de condenação definitiva, desde que preenchidos requisitos específicos.
Ademais, observa-se maleabilidade do Poder Judiciário também no que se refere à viabilidade de conversão nas hipóteses de presas condenadas a regime fechado ou semiaberto, situação que traduz a ausência de mero juízo de subsunção pelos Tribunais, que passaram a se tornar mais flexíveis para atender a valores maiores.
Contudo, restou definido que a solução à problemática da ausência de estrutura adequada às mulheres gestantes nos estabelecimentos prisionais não é a concessão desenfreada da conversão para a prisão em regime domiciliar, até porque muitas vezes as condições pessoais da detenta representarão um óbice à autorização do regime.
Finalmente, foi abordado o julgamento do AgRg no HC 731.648/SC pelo STJ e a garantia dos direitos da detenta mulher como mecanismo de concretização do princípio constitucional da dignidade humana, ocasião em que se verificou que o julgado supra passou a reputar como direito subjetivo da detenta a concessão da prisão domiciliar quando tiver filho menor de doze anos, não necessitando comprovar a indispensabilidade do cuidado materno.
O presente trabalhou abordou fielmente a problemática suscitada inicialmente, que é “o julgamento do AgRg no HC 731.648/SC pelo STJ se coaduna com as diretrizes sustentadas pelo princípio da dignidade da pessoa humana?”, chegando à afirmação de que o referido julgado foi uma vitória para os direitos das mulheres no Brasil, pois reafirmou direitos básicos e, sobretudo, garantiu a dignidade da mulher e de seus filhos.
Além disso, foi contemplado o objetivo geral da pesquisa, que é o de estudar o AgRg no HC 731.648/SC pelo STJ e compreender a alteração quanto aos direitos da mulher gestante e mãe de filho com até doze anos incompletos.
Nessa perspectiva, os objetivos específicos também foram alcançados, pois foi efetuado estudo sobre o tratamento legal, doutrinário e jurisprudencial da detenta presa e as hipóteses de prisão domiciliar contemporaneamente, bem como quais os requisitos para a concessão.
Ademais, foram elucidados os argumentos que fundamentaram a decisão do HC 731.648/SC pelo STJ. Por fim, foi investigado de que forma o aludido julgamento pelo STJ garantiu a materialização do princípio da dignidade da pessoa humana à detenta mulher e ao(s) seu(s) filho(s).
A pesquisa em evidência reputa-se de grande importância quando observada sob o viés dos direitos da mulher, sem excluir os do nascituro, da criança e do adolescente, porquanto necessária para avaliar de que modo os direitos fundamentais desses grupos estão sendo garantidos pelo Estado Brasileiro.
Além disso, aumentando-se a discussão sobre temas como esse, de extrema importância, contudo, de pouca abordagem, consequentemente vai se tornando mais exigível dos órgãos públicos providências para a minimização dos problemas enfrentados pelas mulheres no triste cenário do sistema prisional feminino.
REFERÊNCIAS
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[1] Mestre em Direito. Professor da Faculdade de Ciências Jurídicas de Paraíso do Tocantins (FCJP).
Graduanda do curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas de Paraíso do Tocantins (FCJP).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AMORIM, Amanda de Sousa. O princípio da dignidade da pessoa humana durante a gravidez e a maternidade no sistema carcerário feminino brasileiro após o julgamento do AgRg no HC 731.648/SC PELO STJ: alterações nos requisitos para a concessão de regime domiciliar Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 out 2022, 04:20. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/59574/o-princpio-da-dignidade-da-pessoa-humana-durante-a-gravidez-e-a-maternidade-no-sistema-carcerrio-feminino-brasileiro-aps-o-julgamento-do-agrg-no-hc-731-648-sc-pelo-stj-alteraes-nos-requisitos-para-a-concesso-de-regime-domiciliar. Acesso em: 23 dez 2024.
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