Resumo: O presente artigo tem como finalidade a de estudar a fase preliminar do Juizado Especial Criminal com a composição de danos civis, transação penal e consequências do seu descumprimento. Também tem como objetivo demonstrar o entendimento jurisprudencial descrito na lei.
Palavras-chave: Fase preliminar do Juizado. Composição de danos civis. Representação. Transação penal. Jurisprudência.
Sumário: Introdução. 1. Fase preliminar do Juizado Especial Criminal. 2. Composição de danos civis. 3. Oferecimento de representação. 4. Transação Penal. 4.1. Pressupostos de admissibilidade da transação penal. 4.2. Procedimento para o oferecimento da proposta de transação penal. 4.3. Recusa injustificada de oferecimento da proposta de transação penal. 4.4. Momento para o oferecimento da proposta de transação penal. 4.5. Descumprimento injustificado da transação penal. 4.6. Recurso. 5. Jurisprudência. Conclusão. Referências.
Introdução
O presente artigo tem como finalidade apresentar a fase preliminar do Juizado Especial Criminal.
Será demonstrado o caminho a ser percorrido e as possibilidades e proibições de composição civil de danos, bem como a transação penal.
Nesse viés, serão disponibilizadas as consequências em decorrência do descumprimento da composição civil e da transação penal.
Por conseguinte, haverá a indicação dos recursos possíveis nos casos de homologação ou não da composição civil de danos e transação penal.
Também será demonstrada a divergência sobre determinados assuntos relacionados ao tema.
No mais, serão indicados julgados importantes para a situação em discussão.
1. Fase preliminar do Juizado Especial Criminal
Se comparecer a vítima e o autor do fato e não for possível realizar a imediata audiência preliminar, será designada data nos próximos dias, dando ambos por cientes.
Na ausência do autor ou da vítima, a Secretaria providenciará a sua intimação e, se necessário, a do responsável civil, na forma dos artigos 67 e 68 da Lei nº 9099/95.
Na audiência preliminar, presente o membro do Ministério Público, a vítima e o autor do fato, bem como o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o magistrado esclarecerá sobre a possibilidade de composição dos danos e da aceitação imediata de pena não privativa de liberdade.
Consigne-se que nessa audiência aplica-se o procedimento sumaríssimo e tem como finalidade a conciliação das partes, bem como devem estar presentes o órgão do Ministério Público, o juiz, a vítima e o autor dos fatos.
A conciliação será conduzida pelo juiz ou por conciliador sob sua orientação, nos termos do art. 73 da Lei n° 9.099/95. Tem-se que a conciliação é gênero, do qual são espécies a composição e a transação.
Há a composição civil de danos, que tem natureza civil.
Por conseguinte, há também a transação penal, que consiste no acordo entre o Ministério Público e o autor do fato delituoso. Nessa fase, é proposta a aplicação de pena não privativa de liberdade. Se o autor ou suposto agente aceitar, ficará dispensado dos riscos de uma eventual pena de reclusão ou detenção, que poderia ser aplicada ao final do processo, evitando, ademais, os dissabores de se submeter a um processo penal.
2. Composição dos danos civis
A composição civil dos danos pode ser realizada nas infrações que acarretem prejuízos materiais, morais ou estéticos à vítima.
A celebração do acordo é benéfica ao autor dos fatos, pois a sua homologação, gerará a renúncia ao direito de queixa ou representação e a extinção da punibilidade, se a ação penal for de iniciativa privada ou pública condicionada a representação, nos termos do artigo 107, V, do Código Penal e 74, parágrafo único, da Lei nº 9099/95.
Tem-se que a renúncia ao direito de representação não consta como causa de extinção de punibilidade no artigo 107, do CP, porém, diante do silêncio do Código Penal, o inciso V, deve abranger por interpretação extensiva.
É importante destacar que a renúncia ao direito de queixa proveniente da composição dos danos civis estende-se a coautores e partícipes do fato delituoso, mesmo que eles não estejam presentes na audiência preliminar, com fundamento no princípio da indivisibilidade previsto nos artigos 48 e 49 do Código de Processo Penal.
Vale salientar, que a composição civil dos danos pode ocorrer não só entre o autor do fato e a vítima, mas também entre o representante legal do autor do fato e o ofendido, bem como entre o responsável civil e a vítima, entre o responsável civil e o representante legal do ofendido.
Na composição civil dos danos, somente haverá intervenção do Ministério Púbico se houver interesse de incapaz (Art. 178, II, do novo CPC).
Caso ocorra a composição dos danos, o acordo será reduzido a escrito e homologado pelo magistrado por sentença irrecorrível, formando-se um título executivo judicial.
Se o valor do título executivo for de até 40 (quarenta) vezes o maior salário mínimo, a execução pode ser feita no Juizado Especial Cível.
Em havendo o descumprimento do acordo, não há a restituição à vítima do direito de queixa ou representação. Isso porque, não cumprido o acordo, a vítima tem apenas a possibilidade de promover a execução do título executivo judicial.
No que tange a ação penal pública incondicionada, o acordo permite a execução no juízo cível e não acarreta a extinção da punibilidade do agente. Nessa situação, se for descumprido o acordo, será possível o oferecimento de proposta de transação penal ou denúncia.
No mais, se houver a reparação do dano pelo acusado até o recebimento da denúncia, o agente pode ser beneficiado pela causa de diminuição do arrependimento posterior descrita no artigo 16 do Código Penal.
3. Oferecimento de representação
Não sendo aceita a composição dos danos civis, o ofendido poderá exercer, imediatamente, na audiência preliminar o direito de representação verbal, que será reduzido a termo, nos termos do artigo 75, caput, da Lei nº 9099/95.
No procedimento sumaríssimo a representação realizada na delegacia de polícia não gera a abertura de um processo, pois a lei determina que o oferecimento deve ocorrer na audiência preliminar.
Por outro lado, há doutrina em sentido diverso que destaca a desnecessidade de oferecimento de representação apenas em audiência preliminar, na forma do artigo 75, parágrafo único, da Lei nº 9099/95.
Assim segue:
Caso a representação não seja oferecida na audiência preliminar, e desde que ela não tenha sido apresentada anteriormente (v.g., no termo circunstanciado), não há falar em renúncia tácita ao direito de representação, nem tampouco em decadência do direito, o qual poderá ser exercido no prazo previsto em lei (Lei n° 9.099/95, art. 75, parágrafo único). (LIMA, 2019, p. 1496).
Não oferecida a representação, os autos deverão permanecer em cartório, aguardando-se o comparecimento da vítima para exercer seu direito dentro do prazo decadencial. Caso não ocorra o oferecimento da representação dentro do prazo decadencial, deve o juiz declarar extinta a punibilidade, nos termos do art. 107, IV, do CP.
4. Transação penal
A transação penal é um acordo celebrado entre o Ministério Público e o autor do fato, apresentando-se a proposta de pena restritiva de direitos ou multa, desde que não seja o caso de arquivamento dos autos, conforme o artigo 76 da Lei nº 9099/96.
Sendo aceita, não haverá instauração de processo contra o autor do fato.
Apesar de não estar previsto expressamente na lei, é possível o acordo de transação penal entre o querelante e o autor do fato nos crimes de ação penal privada.
Vale observar, que o princípio da obrigatoriedade da ação penal pública é flexibilizado nos casos de infrações de menor potencial ofensivo, pois mesmo estando presentes os elementos para o oferecimento da denúncia, o Ministério Público é obrigado a propor a transação penal, se presentes os requisitos exigidos na lei (discricionariedade regrada).
4.1. Pressupostos de admissibilidade da transação penal
Para propor a transação penal, devem ser preenchidos os pressupostos da transação penal.
São pressupostos:
1) Infração de menor potencial ofensivo: As contravenções penais e crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa. Não será permitida a proposta se for cometida infração penal com violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da súmula nº 536 do STJ.
Se a infração de menor potencial ofensivo for cometida em conexão e/ou continência com outro crime, e se as penas máximas somadas ultrapassarem o limite de 2 (dois) anos, não haverá o julgamento pelo Juizado Especial. Porém, com relação a infração de menor potencial ofensivo é permitida a transação penal e a composição dos danos civis, conforme disposto no artigo 60, parágrafo único, da Lei nº 9099/95.
2) Não ser caso de arquivamento do termo circunstanciado;
3) Não ter sido o autor da infração condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva: Significa que o autor do fato deverá ter sido condenado pela prática de crime em sentença transitada em julgado. Com isso, se a condenação for por pena restritiva de direitos ou multa, não é possível a proposta de transação penal.
Há divergência na doutrina quanto a possibilidade de aplicação da transação quando o trânsito em julgado da sentença tenha ocorrido após a prática do crime, mas antes da audiência preliminar.
Caso o trânsito em julgado da sentença condenatória à pena privativa de liberdade tenha ocorrido após a prática da infração de menor potencial ofensivo, mas antes da audiência preliminar, há quem entenda que é possível a transação, já que o juiz deve levar em conta as circunstâncias objetivas e subjetivas no momento em que o fato delituoso foi praticado, e não na data designada para a audiência preliminar. Prevalece, porém, o entendimento de que a lei não se utilizou do termo reincidência exatamente para impedir a transação em tais situações, vez que, apesar de não reincidente, fica evidente que a proposta de transação é incompatível com as finalidades da intervenção penal em sujeito com condenação definitiva à pena privativa de liberdade. Portanto, a condenação definitiva pela prática de crime à pena privativa de liberdade, ainda que posterior ao fato delituoso, impede a transação. (LIMA, 2019, p. 1499)
4) Não ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de 5 (cinco) anos, pela transação penal;
5) Antecedentes, conduta social, personalidade do agente, bem como os motivos e circunstâncias do delito favoráveis ao agente;
6) Crimes de ação penal pública condicionada à representação, de ação penal pública incondicionada e de ação penal privada: Se a ação for pública deve ser apresentada a proposta pelo Ministério Público. Por outro lado se a ação penal for privada deve ser oferecida a proposta pelo querelante.
7) Não ter ocorrido a composição civil de danos no caso de ação penal privada ou condicionada à representação;
No caso de crimes ambientais há também a necessidade de prévia composição do dano ambiental, salvo em caso de comprovada impossibilidade, na forma do artigo 27 da Lei n° 9.605/98, se for infração de menor potencial ofensivo.
4.2. Procedimento para o oferecimento da proposta de transação penal
Presentes os requisitos que autorizam a transação penal, será oferecida proposta pelo Ministério Público ou querelante.
Convém destacar que se houver composição dos danos civis na ação penal pública condicionada a representação ou privada, não poderá ocorrer o oferecimento da proposta de transação porque houve a extinção da punibilidade do agente, como já previsto anteriormente.
Não há nesse momento assistente de acusação, uma vez que não há processo.
No mais, a transação penal pode ser oferecida de forma oral ou por escrito. Se houver concurso de agentes, é possível que a proposta de transação penal seja apresentada a um ou alguns coautores ou participes.
Em seguida, a proposta será apreciada pelo autor do fato e seu defensor. Logo após, haverá a aceitação ou não da proposta e a análise pelo juiz competente.
Há necessidade da presença de defesa técnica na audiência preliminar de apresentação de proposta de transação penal, sob pena de nulidade absoluta da decisão homologatória do acordo,
Não se aplica a Súmula 705 do STF se ocorrer divergência entre o autor da infração penal e o seu defensor, pois nesse caso deve prevalecer a vontade do autor do fato.
O magistrado pode rejeitar a homologação da proposta se não estiver de acordo com a lei. A decisão que homologa não gera reincidência, declaração de culpabilidade, nem efeitos civis e administrativos.
Não há consenso na doutrina acerca de sua natureza jurídica. Há quem entenda que se trata de decisão constitutiva, ou mesmo condenatória imprópria, uma vez que impõe obrigação ao autor do fato de cumprir uma sanção penal, embora não reconheça sua culpabilidade, nem produza os efeitos secundários de uma sentença condenatória.285 Prevalece, todavia, o entendimento de que tal decisão tem natureza declaratória. (LIMA, 2019, p. 1501).
O artigo 91 do Código Penal que trata de efeitos extrapenais, não será aplicável à homologação da transação penal, pois não se trata de decisão condenatória, mas sim homologatória.
Segue o entendimento jurisprudencial:
As consequências jurídicas extrapenais previstas no art. 91 do Código Penal são decorrentes de sentença condenatória. Tal não ocorre, portanto, quando há transação penal, cuja sentença tem natureza meramente homologatória, sem qualquer juízo sobre a responsabilidade criminal do aceitante. As consequências geradas pela transação penal são essencialmente aquelas estipuladas por modo consensual no respectivo instrumento de acordo.
(BRASIL, 2015).
A homologação da transação penal só terá o efeito de impedir novo benefício dentro do prazo de cinco anos, na forma do artigo 76 da lei em questão.
No mais, caso a proposta de transação penal não seja aceita pelo acusado e defensor, o membro do Ministério Público ou o ofendido apresentará a denúncia oralmente.
4.3. Recusa injustificada de oferecimento da proposta de transação penal
O magistrado não pode conceder, de ofício, a transação penal, uma vez que se trata de legitimidade do Ministério Público ou do querelante e é direito público subjetivo do autor do fato delituoso.
Se o Ministério Público recusar a transação penal aplica-se o artigo 28 do CPP. Em ocorrendo a recusa por parte do querelante, deve ser obedecida a vontade desse, pois não se aplica o artigo 28 do CPP.
4.4. Momento para o oferecimento da proposta de transação penal
Em regra, o momento correto para o oferecimento da proposta de transação penal é antes do recebimento da denúncia. Porém, também é possível após o recebimento da peça acusatória se ocorrer nova capitulação da infração admitindo a transação penal.
É válido mencionar que a proposta de transação penal pode ser feita pelo juízo comum ou juiz presidente do tribunal do júri, nos termos do artigo 383, parágrafo 2º E 492, parágrafo 1º, do CPP.
Destarte, diante da nova redação do CPP, fica claro que a circunstância de o processo já estar em andamento não se apresenta como óbice à efetivação dos institutos consensuais do processo. Nessa linha, como destaca Badaró, “embora a transação penal seja, normalmente, realizada antes do início do processo, não há óbice à sua realização com o processo em curso. No próprio procedimento sumaríssimo há expressa previsão de possibilidade de transação penal após o oferecimento da denúncia (Lei n° 9.099/95, art. 79)”. (LIMA, 2019, p. 1504)
4.5. Descumprimento injustificado da transação penal
Na transação penal somente haverá a interrupção do prazo prescricional se houver o descumprimento da proposta e for oferecida denúncia. Perceba-se que é diferente da suspensão condiciona do processo que suspende o prazo prescricional durante a suspensão. Na transação penal não haverá a suspensão do prazo prescricional, conforme entendimento jurisprudencial.
PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. LESÃO CORPORAL NO TRÂNSITO. TRANSAÇÃO PENAL. ACORDO CELEBRADO. DESCUMPRIMENTO PARCIAL. DENÚNCIA OFERECIDA. PRAZO PRESCRICIONAL QUE NÃO SE SUSPENDE. RECURSO PROVIDO. 1. Conforme orientação desta Corte, as causas suspensivas da prescrição demandam expressa previsão legal" (AgRg no REsp n. 1.371.909/SC, relator Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 23/8/2018, DJe de 3/9/2018). 2. Durante o prazo de cumprimento das condições impostas em acordo de transação penal (art. 76 da Lei n. 9.099/1995) não há, em razão da ausência de previsão legal, a suspensão do curso do prazo prescricional. 3. No caso, embora o prazo prescricional seja de 8 anos, entre a data do fato e a denúncia passaram-se mais de 10 anos, o que evidencia o advento da prescrição da pretensão punitiva. 4. Recurso provido. (RHC n. 80.148/CE, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 1/10/2019, DJe de 4/10/2019.). (CAVALCANTE, 2019).
Quanto a pena de multa, se o réu não pagar a multa aplicada em virtude da transação penal, deve ser feita a execução penal, na forma do art. 51 do Código Penal, não sendo admissível o oferecimento de denúncia ou a conversão em pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos.
Quanto a pena restritiva de direitos deverá ocorrer a remessa dos autos ao Ministério Público (ou ao querelante), para que seja permitida a instauração de inquérito policial ou a denúncia em desfavor do acusado, na forma da súmula vinculante nº 35 do STF. Isso porque a decisão que homologa a transação penal não faz coisa julgada material.
Dessa forma, não há mais discussão a respeito do ato a ser realizado quando houver o descumprimento da transação penal no que tange a pena restritiva de direitos.
4.6. Recurso
Da decisão que homologa a transação penal cabe o recurso de apelação, de acordo com o art. 76, § 5o, da Lei n° 9.099/95.
Por outro lado, da decisão que rejeita o acordo de homologação de transação penal não há disposição expressa na lei sobre o assunto, porém aplica-se subsidiariamente o artigo 593, II, do CPP, razão pela qual também cabe o recurso de apelação.
Este recurso no âmbito do Juizado Especial Criminal tem o prazo para interposição e razões de dez dias por meio de petição escrita e será julgado por um turma de três juízes em exercício no primeiro grau de jurisdição.
5. Jurisprudência a respeito do tema tratado
A falta de confissão na fase investigatória não gera a impossibilidade de apresentação de proposta de transação penal.
Segue o julgado:
HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. PODER-DEVER DO MINISTÉRIO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE CONFISSÃO NO INQUÉRITO POLICIAL. NÃO IMPEDIMENTO. REMESSA DOS AUTOS À PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA. INTELIGÊNCIA DO ART. 28-A, § 14, DO CPP. NECESSIDADE. ORDEM CONCEDIDA. 1. O acordo de não persecução penal, de modo semelhante ao que ocorre com a transação penal ou com a suspensão condicional do processo, introduziu, no sistema processual, mais uma forma de justiça penal negociada. Se, por um lado, não se trata de direito subjetivo do réu, por outro, também não é mera faculdade a ser exercida ao alvedrio do Parquet. O ANPP é um poder-dever do Ministério Público, negócio jurídico pré-processual entre o órgão (consoante sua discricionariedade regrada) e o averiguado, com o fim de evitar a judicialização criminal, e que culmina na assunção de obrigações por ajuste voluntário entre os envolvidos. Como poder-dever, portanto, observa o princípio da supremacia do interesse-público - consistente na criação de mais um instituto despenalizador em prol da otimização do sistema de justiça criminal - e não pode ser renunciado, tampouco deixar de ser exercido sem fundamentação idônea, pautada pelas balizas legais estabelecidas no art. 28-A do CPP. 2. A ausência de confissão, como requisito objetivo, ao menos em tese, pode ser aferida pelo Juiz de direito para negar a remessa dos autos à PGJ nos termos do art. 28, § 14, do CPP. Todavia, ao exigir a existência de confissão formal e circunstanciada do crime, o novel art. 28-A do CPP não impõe que tal ato ocorra necessariamente no inquérito, sobretudo quando não consta que o acusado - o qual estava desacompanhado de defesa técnica e ficou em silêncio ao ser interrogado perante a autoridade policial - haja sido informado sobre a possibilidade de celebrar a avença com o Parquet caso admitisse a prática da conduta apurada. 3. Não há como simplesmente considerar ausente o requisito objetivo da confissão sem que, no mínimo, o investigado tenha ciência sobre a existência do novo instituto legal (ANPP) e possa, uma vez equilibrada a assimetria técnico-informacional, refletir sobre o custo-benefício da proposta, razão pela qual ?o fato de o investigado não ter confessado na fase investigatória, obviamente, não quer significar o descabimento do acordo de não persecução? (CABRAL, Rodrigo Leite Ferreira. Manual do Acordo de Não Persecução Penal à luz da Lei 13.963/2019 (Pacote Anticrime). Salvador: JusPodivm, 2020, p. 112). 4. É também nessa linha o Enunciado n. 13, aprovado durante a I Jornada de Direito Penal e Processo Penal do CJF/STJ: ?A inexistência de confissão do investigado antes da formação da opinio delicti do Ministério Público não pode ser interpretada como desinteresse em entabular eventual acordo de não persecução penal?.5. A exigência de que a confissão ocorra no inquérito para que o Ministério Público ofereça o acordo de não persecução penal traz, ainda, alguns inconvenientes que evidenciam a impossibilidade de se obrigar que ela aconteça necessariamente naquele momento. Deveras, além de, na enorme maioria dos casos, o investigado ser ouvido pela autoridade policial sem a presença de defesa técnica e sem que tenha conhecimento sobre a existência do benefício legal, não há como ele saber, já naquela oportunidade, se o representante do Ministério Público efetivamente oferecerá a proposta de ANPP ao receber o inquérito relatado. Isso poderia levar a uma autoincriminação antecipada realizada apenas com base na esperança de ser agraciado com o acordo, o qual poderá não ser oferecido pela ausência, por exemplo, de requisitos subjetivos a serem avaliados pelo membro do Parquet.
6. No caso, porque foi negada a remessa dos autos à Procuradoria-Geral de Justiça (art. 28-A, § 14, do CPP) pela mera ausência de confissão do réu no inquérito, oportunidade em que ele estava desacompanhado de defesa técnica, ficou em silêncio e não tinha conhecimento sobre a possibilidade de eventualmente vir a receber a proposta de acordo, a concessão da ordem é medida que se impõe. 7. Ordem concedida, para anular a decisão que recusou a remessa dos autos à Procuradoria Geral de Justiça - bem como todos os atos processuais a ela posteriores - e determinar que os autos sejam remetidos à instância revisora do Ministério Público nos termos do art. 28-A, § 14, do CPP e a tramitação do processo fique suspensa até a apreciação da matéria pela referida instituição.
(HC n. 657.165/RJ, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 9/8/2022, DJe de 18/8/2022.). (CAVALCANTE, 2022)
Há divergência na jurisprudência se a concessão do benefício de transação penal, impede ou não, a impetração de habeas corpus em que se busca o trancamento da ação penal.
A concessão do benefício da transação penal impede a impetração de habeas corpus em que se busca o trancamento da ação penal? Com a celebração da transação penal, o habeas corpus que estava pendente fica prejudicado ou o TJ deverá julgá-lo mesmo assim? • STJ: SIM. Fica prejudicado. A concessão do benefício da transação penal impede a impetração de habeas corpus em que se busca o trancamento da ação penal. STJ. 6ª Turma. HC 495148-DF, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado em 24/09/2019 (Info 657).
• STF: NÃO. Não impede e o TJ deverá julgar o mérito do habeas corpus. A realização de acordo de transação penal não enseja a perda de objeto de habeas corpus anteriormente impetrado.
A aceitação do acordo de transação penal não impede o exame de habeas corpus para questionar a legitimidade da persecução penal. Embora o sistema negocial possa trazer aprimoramentos positivos em casos de delitos de menor gravidade, a barganha no processo penal pode levar a riscos consideráveis aos direitos fundamentais do acusado. Assim, o controle judicial é fundamental para a proteção efetiva dos direitos fundamentais do imputado e para evitar possíveis abusos que comprometam a decisão voluntária de aceitar a transação. Não há qualquer disposição em lei que imponha a desistência de recursos ou ações em andamento ou determine a renúncia ao direito de acesso à Justiça. (BRASIL, 2019).
Assim, o STJ assevera a concessão do benefício de transação penal impede a impetração de habeas corpus em que se busca o trancamento da ação penal. Por outro lado, o STF entende que a concessão de transação penal não gera qualquer impedimento a impetração com esta finalidade.
Conclusão
Denota-se que foi explanada a fase preliminar do Juizado Especial Criminal.
Foram demonstrados os requisitos para a concessão de composição civil de danos e a transação penal.
Também foram disponibilizadas as consequências em decorrência do descumprimento dos institutos discutidos.
Por conseguinte, verifica-se que no caso de transação penal é cabível o recurso de apelação. Já quanto a composição civil de danos, a decisão é irrecorrível.
Por fim, foram apresentados julgados e divergências sobre os assuntos tratados nesse artigo.
No mais, serão indicados julgados importantes para a situação em discussão.
Referências
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. 2ª Turma. HC 176785/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 17/12/2019 (Info 964). Distrito Federal. https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2020/02/info-964-stf.pdf. Acesso em 26 de outubro de 2022.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Plenário. RE 795567/PR, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 28/5/2015 (Info 787). Distrito Federal. <https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2015/06/info-787-stf.pdf>. Acesso em 26 de outubro de 2022.
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Durante o prazo de cumprimento das condições impostas em acordo de transação penal (art. 76 da Lei n. 9.099/1995) não há, em razão da ausência de previsão legal, a suspensão do curso do prazo prescricional. 2019. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/402cac3dacf2ef35050ca72743ae6ca7>.Acesso em 26 de outubro de 2022.
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Falta de confissão no inquérito não impede acordo de persecução penal. 2022. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/70803c1acb1ee113c07ec6bddc4929bd>. Acesso em 26 de outubro de 2022.
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único – 7ª ed. rev ampliada e atualizada – Salvador: Ed. JusPodvim 2019.
Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Ivaiporã-PR – UNIVALE. Pós-graduada em Direito Constitucional. Advogada.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NOGUEIRA, Daiane Maziero. Peculiaridades da fase preliminar do Juizado Especial Criminal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 jan 2023, 04:21. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/60875/peculiaridades-da-fase-preliminar-do-juizado-especial-criminal. Acesso em: 23 dez 2024.
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