RESUMO: O presente estudo tem como objetivo analisar a problemática envolvendo a dualidade entre o que teria maior poder em um núcleo social onde preconizam-se “leis” sociais substancialmente defeituosas. Se seria a autoridade que transmite e pressupõe um elo de confiança com aqueles que estão a ela subordinados ou seria a força coercitiva que o direito transmite, entre a análise de aplicação do pluralismo jurídico e as diferenças em núcleos sociais. Além disso, se o contexto de autoridade se aplica tão somente a um indivíduo ou é um conceito expansivo que pode abranger uma comunidade que se organiza conforme seus valores morais e sociais que não estariam teoricamente englobados pelas normas positivadas dentro do ordenamento jurídico.
Palavras-chave: autoridade; núcleo social; força do direito; relativismo cultural; direito de pasárgada.
THE DUALITY BETWEEN THE FORCE OF LAW AND THE AUTHORITIES IN THE DIFFERENT SOCIAL AND CULTURAL CENTERS
ABSTRACT: The present study aims to analyze the problem involving the duality between what would have greater power in a social core where social “laws” are advocated preventing defective ones, would be the authority that transmits and supported a link of trust with those who are in it. subordinates or would be the coercive force that the law transmits, between the analysis of the application of legal pluralism and the differences in social nucleus. In addition, the context of authority applies only to an individual or is an expansive concept that can encompass a community that organizes itself according to its moral and social values that would not be theoretically encompassed by the positive norms within the legal system.
Keywords: authority; social nucleus; force of law; cultural relativism; right of pasárgada.
1 INTRODUÇÃO
Em uma sociedade existem regras positivadas aplicadas a todos que nela estão inseridos; entretanto, o que não se observa no aspecto individual é que a norma não analisa os aspectos das sociedades marginais que não estão efetivamente incluídos no entendimento do homem médio.
Assim, quando se fala em força do direito para uma sociedade marginalizada, nem sempre esta será a regra que terá maior validade em sua concepção factual, dado que, dentro do contexto individual de determinado núcleo social, há leis substancialmente defeituosas, não positivadas em sua maioria, que são impostas por uma autoridade que ali figura nesse papel.
Note-se que não falamos, aqui, de uma autoridade na condição de um agente público do Estado, mas de uma figura que representa um vínculo de autoridade nos núcleos marginalizados, que por promover uma hierarquia social e um elo de confiança com aquela parcela social traz de forma compelida a posição de autoridade.
A autoridade se perfaz, nesse contexto, de forma semelhante aos modelos tirânicos, onde as regras sociais de determinados núcleos são efetivadas pela ameaça da força. Logo, o medo é um fator substancial para que essa autoridade tenha tal posição.
Trazendo à baila o contexto relacionado à força do direito, fica a indagação de onde estaria, para esse núcleo social marginalizado, a coerção do Direito Social Comum (assim denominaremos o direito aplicável à sociedade como um todo), dado que, frente à ameaça imposta pelo medo de uma autoridade singular de um contexto próprio, está mais próximo da sua realidade factual do que o Direito Social Comum.
2 A ORIGEM DE APLICAÇÃO INDIVIDUAL E COLETIVA DA CONDUTA
Para o início dessa análise, vale-se fazer uma sintaxe da característica que a conduta humana pode se perfazer, nota-se que diferentes aspectos de conduta dentro de uma sociedade delimitam como as normas vão se moldar e serem positivadas para a sua efetiva aplicação. Nesse sentido, KELSEN, transmite que:
A referência da conduta de um a outro ou a vários outros indivíduos pode ser individual, como no caso da norma que vincula toda e qualquer pessoa a não matar outra pessoa, ou da norma que obriga o devedor a pagar ao credor determinada soma de dinheiro, ou da norma que a todos obriga a respeitar a propriedade alheia. Essa referência, porém, também pode ter um caráter coletivo. A conduta que é regulada por uma norma que obriga ao serviço militar não é a conduta de um indivíduo em face de outro individuo determinado – como no caso da norma que proíbe o homicídio -, mas a conduta desse individuo em face da comunidade jurídica, isto é, em face de todos os subordinados à ordem jurídica, de todas as pessoas pertencentes à comunidade jurídica.[1]
Nesse sentido, a partir da percepção de que a conduta humana pode ser classificada como individual ou coletiva, analisa-se também a aplicação da norma em seu sentido estrito de forma individual ou coletiva, fazendo uma conexão com o objeto desse estudo, uma vez que, ao analisarmos determinados núcleos sociais, vislumbra-se que há a regra geral devidamente positivada dentro do ordenamento jurídico de aplicação coletiva a todos; entretanto, nem sempre a sua aplicação se perfaz na efetividade das realidades de núcleos sociais marginalizados, pois as regras parecem ter uma aplicação abstrata frente a determinados cenários que se distanciam do que é considerado o padrão tomado pela norma positivada para sua aplicação.
A partir desse pressuposto, de que há uma regra geral que deve ser aplicada coletivamente, mas que pode se distanciar individualmente da conduta de determinado núcleo social, questiona-se sobre qual seria a efetividade da força do direito e sua coerção implícita quando a regra positivada se torna abstrata à realidade individual.
Se o Direito não fosse definido como ordem de coação mas apenas como ordem posta em conformidade com a norma fundamental e esta fosse formulada com o sentido de que as pessoas se devem conduzir, nas condições fixadas pela primeira Constituição histórica, tal como esta mesma Constituição determina, então poderiam existir normas jurídicas desprovidas de sanção, isto é, normas jurídicas que, sob determinados pressupostos, prescrevessem uma determinada conduta humana, sem que uma outra norma estatuísse uma sanção para a hipótese de a primeira não ser respeitada. [2]
Assim, depreende-se que a sanção e a coerção implícita pela norma preconizam a ação de determinada conduta humana – mas, em análise de um núcleo social onde tenhamos uma construção social diferente, a composição da conduta humana seria baseada somente na imposição da coerção da norma jurídica ou da figura de autoridade que ali se estabelece.
3 A DISPOSIÇÃO DA FIGURA DE AUTORIDADE
Para início dessa explanação, é válido trazer uma passagem de SCHAUER, Frederick, em seu livro que cita o experimento realizado pelo psicólogo Stanley Milgram de Yale, qual seja, a conclusão que se toma:
Mas, e o Milgram? De 1963 a 1974, o psicólogo Stanley Milgram, de Yale, conduziu uma série de experimentos agora notórios, nos quais os indivíduos eram instruídos a infligir quantidades crescentes de dor (através de choques elétricos) a várias vítimas, supostamente como parte de um experimento de punição por aprendizados. Na realidade, as vítimas não receberam choque elétrico algum, e o experimento não foi sobre o efeito da punição no aprendizado, mas sobre obediência à autoridade. Os sujeitos, no entanto, cuja maioria seguiu as instruções para infligir dor, não sabiam disso na época. Assim, os experimentos de Milgram foram amplamente citados como suporte à conclusão de que as pessoas obedecerão à autoridade até o ponto de fazerem coisas que de outra forma não fariam e que, de outra forma, achariam inaceitáveis por razões morais ou outras.[3]
A partir dessa explicação, conseguimos definir um aspecto em relação à questão de autoridade, apesar de a norma estabelecer as diretrizes da conduta humana valendo-se de uma coação por meio de sanção para se tornar efetiva, ao mesmo tempo, a figura da autoridade toma um viés de sobreposição de poder, de modo que as pessoas passam a ter determinadas condutas conforme preconiza aquela autoridade onde se estabelece um vínculo de confiança. Note que Schauer ainda traz novamente esse estabelecimento do vínculo de obediência à autoridade com o vínculo de obediência à norma jurídica.
Para nossos presentes propósitos, parece que a lição que podemos tirar dos experimentos de Milgram é que as pessoas farão coisas que uma figura de autoridade lhes disser para fazer, mesmo que seu julgamento “independente -da-autoridade” diga-lhes para não fazer.[4]
A conduta humana é guiada, muitas vezes, pela obediência das pessoas ao que elas entendem dentro do seu contexto social como sendo o mais correto, ainda que pela ordem jurídica seja uma conduta vedada. Há a flexibilização humana quanto ao que é a conduta efetivamente coerente para aquele contexto, fazendo com que a obediência à autoridade independa de sanções, pois aquele que está sendo o patamar de autoridade para determinadas pessoas pode ser um parâmetro para obediência e respeito.[5]
Posso obedecer a meus pais por respeito a eles, mas não ter o mesmo respeito pelo direito. E posso entender que inúmeras tarefas sociais exigem que alguém esteja no comando sem acreditar que o direito seja muitas vezes o melhor candidato para esse papel. De fato, a distância do direito em relação a seus sujeitos pode tornar a obediência jurídica menos provável do que em alguns desses outros exemplos e a distância do direito em relação a seus sujeitos pode tornar mais necessário para o direito ter sanções à sua disposição do que para sargentos, pais, professores, e comandantes de botes salva-vidas. [6]
Por esse distanciamento, do direito positivado em normas jurídicas ao indivíduo, a figura da autoridade toma uma posição, em alguns contextos, de superioridade e de maior valor, pois ela está mais próxima da realidade do indivíduo do que a ordem jurídica, que parte de uma abstração que por vezes pode estar longe da realidade daquele núcleo social.
4 O PLURALISMO JURÍDICO
Ante a exposição até então apresentada, salienta-se, através do estudo de Boaventura de Sousa Santos[7], o Direito de Pasárgada, que traz muito a concepção de que o direito comum, positivado no ordenamento jurídico, não se assemelha a algumas realidades, justamente em caso do estudo promovido aqui apresentar a figura da autoridade – como, em alguns aspectos, uma silhueta do pluralismo jurídico.
Depreende-se que o direito, apesar de ser um composto normativo que tem a pretensão de ser único, abarca uma relação jurídica fora do escopo do direito estatal positivado. Há, assim, esse pluralismo jurídico, entendendo-se a presença de outro sistema jurídico em funcionamento dentro da mesma localização geográfica, mas que não é o direito estatal positivado e institucionalizado.
Parece claro que o esforço do pluralismo está voltado para a edificação de um espaço social de mediação que se contraponha aos extremos da fragmentação atomista e da ingerência desmensurada do Estado. Desse modo, como prevalência de corpos sociais intermediá- rios, o pluralismo tem sempre sua luta articulada contra o “estatismo” e o “individualismo”. Ainda que o pluralismo possa aproximar-se do individualismo, porquanto implica o direito particular à autonomia e à diferença, ambos não se confundem. Diferentemente do individua- lismo, a dimensão pluralista não se limita a conclamar à realização estritamente particular de cada um, mas sim à particularidade de cada um com uma diferença.[8]
Em “o Direito de Pasárgada”, Boaventura de Sousa Santos salienta o estudo realizado em uma comunidade no Rio de Janeiro, onde, por questões de confidencialidade, a comunidade foi denominada como Pasárgada.
Durante esse estudo, contempla-se a análise rica das diferenças estruturais do direito, que é o que rege as relações dentro desse núcleo social; um direito paralelo interno, diferente do que Boaventura chama de direito estatal, que é o direito institucionalizado, que comumente conhecemos. Nesse sentido, ele transmite que:
Conclui-se que, à luz do conhecimento antropológico e sociológico do direito, resulta com segurança que as diferenças verificadas entre o direito de Pasárgada e o direito estatal são expressão de variações significativas entre os fatores (ou variáveis complexas) analisados, as quais se podem formular, em termo de correlação, da seguinte forma: A amplitude do espaço retórico do discurso jurídico varia na razão inversa do nível de institucionalização da função jurídica e do poder dos instrumentos de coerção a serviço da produção jurídica. Esta formulação da covariação múltipla entre fatores pressupõe, por um lado, a possibilidade de mediação rigorosa dos valores relativos de cada um deles e, por outro, a determinação das relações internas entre os fatores que na estrutura das correlações funcionam como variáveis independentes (o nível de institucionalização da função jurídica e o poder dos instrumentos de coerção).[9]
Dentro desse contexto, no estudo de Boaventura, o resultado dessa ordem jurídica paralela exprime-se na reunião de membros fazendo uma associação para dirimir conflitos de ordem interna, que não envolvam matéria de ordem criminal, por uma questão de exposição ao Estado e a possível pretensão de ser ilegalizada, mas seria o meio pelo qual a comunidade de Pasárgada faria uso para dirimir seus conflitos relacionados à sua ocupação territorial e outras questões de relações jurídicas com outros habitantes, mas novamente fora do escopo criminal.[10]
Há ainda que se pontuar a relação de antagonismo entre essa associação e a autoridade policial, onde há um esforço da comunidade em se abster do contato com a polícia, utilizando um contato necessário entre essa autoridade da associação e a polícia sem haver uma colaboração mútua de ações efetivas.[11]
Através de toda essa análise que o estudo de Boaventura proporcionou, vemos em um caso fático, onde efetivamente a ordem jurídica positivada não tem efetividade de aplicação, pois não consegue resolver os conflitos dessa comunidade interna de forma eficaz e que não faça a alienação do direito do indivíduo. Para tanto, o questionamento inicial desse estudo se desdobra: seria autoridade só uma figura insígnia de um indivíduo, ou poderia ser um conjunto de construções sociais e morais de um determinado núcleo social que traga efetividade àquela comunidade que teoricamente estaria sujeita a essa ordem jurídica paralela?
Pode ser possível, sim, ter uma desconexão da expressão de autoridade de um indivíduo e trazer à sua constituição uma simbiose de determinações morais, culturais e de um direito paralelo interno que convalida a existência do pluralismo jurídico em diferentes espectros.
Uma vez que entendamos que as pessoas realmente se comportam moral e altruisticamente, o direito surge não a um, mas a dois passos além do interesse próprio. Existe um interesse próprio e, em seguida, há a disposição documentada de pessoas e agentes públicos de fazerem a coisa certa como eles a enxergam (incluindo o envolvimento num comportamento cooperativo e a obediência a normas sociais relevantes) e, até mesmo, com algum sacrifício pessoal. Mas, então há o direito, que obtém sua força e muito de sua importância precisamente quando diz às pessoas que, mesmo aquilo que acham ser a coisa certa a fazer e mesmo quando coisa certa a fazer não é necessariamente do seu interesse pessoal, não é o que eles deveriam fazer. E, quando visto dessa maneira – quando entendemos que o valor do direito muitas vezes repousa em sua capacidade de levar as pessoas a deixar de lado não apenas seu interesse próprio, mas também seu melhor julgamento não necessariamente interessado –, o desafio de garantir obediência ao direito apenas porque é direito se torna muito mais compreensível. [12]
A passagem de Schauer evidencia que o direito surge com a função de ser um instrumento que pensa em trazer uma solução que leve adiante o interesse individual; logo, analisamos as estruturas do pluralismo jurídico, que ali se constroem num direito interno paralelo que independem da questão da coerção, mas pela necessidade de regulação de algo que o direito institucional não pode convalidar ou da necessidade imposta pela origem cultural, social e histórica que o direito institucional também não conseguiria abranger.
Ante todo o exposto, deduz-se que, ao observamos núcleos sociais em sua individualidade, cada qual possui sua “personalidade” específica, seja por meio da influência religiosa, cultural ou até mesmo ancestral que ali influi.
Podemos usar como exemplo inicial alguns casos de maior repercussão internacional, como a mutilação genital feminina[13], que, conforme dados disponibilizados pela BBC, atingem 30 países na África e no Oriente Médio. Dessarte, há uma concentração de sua ocorrência em diferentes lugares da Ásia, América Latina, e, conforme os dados acima e das Nações Unidas, também por imigrantes residentes na Europa Ocidental, América do Norte, Austrália e Nova Zelândia. A prática consiste em uma espécie de costume que deriva da convenção social daquela comunidade e também de perfil religioso. Em geral, o referido procedimento não é feito com o consentimento da pessoa a que se sujeita.
Para tanto, observa-se que, dado o contexto social da comunidade em questão, essa é uma prática não somente comum, mas necessária para uma validação social/religiosa. Nessa seara, finda-se o questionamento de se temos uma coerção que advém da norma internacional que estabelece o respeito à dignidade humana, ou se estaríamos tratando de uma situação onde a autoridade local, que seria em um aspecto a comunidade, quem possuiria o poder de compelir determinada conduta para aquele núcleo social.
Os quatro propósitos essenciais da Carta da ONU mostram a necessidade da cooperação internacional para resolução de problemas relacionados ao caráter social, cultural e humanitário, e trazem o respeito ao princípio de igualdade de direitos e autodeterminação dos povos.
Nesse sentido, ao observar a proteção que a Carta nos traz, há uma dicotomia de tutela de direitos em um caso concreto, pois analisa-se que, dentro dos propósitos da Carta, as Nações Unidas devem respeitar não somente os povos, mas aquilo que os constitui como uma sociedade em seu caráter individual que engloba cultura, religião e costumes, ao passo que, por outro lado, é preciso tutelar a proteção e a integridade da vida humana.
Então, em que momento deve ocorrer a análise de onde começa um direito e termina o outro, e como deveria ocorrer a atuação nesses casos, onde a intenção não é ferir a individualidade de um povo, mas sim proteger a sua essência que é o fator humano.
1. Manter a paz e a segurança internacionais e, para esse fim: tomar, coletivamente, medidas efetivas para evitar ameaças à paz e reprimir os atos de agressão ou outra qualquer ruptura da paz e chegar, por meios pacíficos e de conformidade com os princípios da justiça e do direito internacional, a um ajuste ou solução das controvérsias ou situações que possam levar a uma perturbação da paz;
2. Desenvolver relações amistosas entre as nações, baseadas no respeito ao princípio de igualdade de direitos e de autodeterminação dos povos, e tomar outras medidas apropriadas ao fortalecimento da paz universal;
3. Conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário, e para promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião; e
4. Ser um centro destinado a harmonizar a ação das nações para a consecução desses objetivos comuns.[14]
Nesse contexto, vislumbra-se a construção de uma ordem de caráter cultural: uma prática que concerne a um núcleo social específico, mas, nesse caso, diferentemente do direito de Pasárgada, pelo qual há um benefício efetivo da sua aplicação em um paralelismo de direito interno. Aqui, há, efetivamente, uma violação aos direitos humanos, violando o direito inerente à dignidade da pessoa humana.
O relativismo cultural aposta na manutenção das diferenças culturais, preservando as identidades e a diversidade das inúmeras sociedades existentes. Neste pensamento, cabe considerar como parâmetro o respeito à autonomia de cada nação ou povo para definir sua forma de vida, conforme seus valores e crenças. E assim, opõe-se a criação de um parâmetro do universalismo, porque entendem que, se defini-lo como tal, pode buscar se sobrepor aos princípios e fundamentos de sociedades que não consideram esse parâmetro como legítimo.[15]
Apesar da função que o relativismo cultural traz em si de respeito à cultura e à diversidade, a questão cultural por fato concreto deve ser respeitada até o limite que não venha a infringir as normas de direito internacional, bem como doméstico e que, acima de tudo, respeite os princípios da carta das nações unidas.
5 CONCLUSÃO
O presente estudo analisou a força do direito e a dicotomia da figura de autoridade. Discutiu a análise de que, nem sempre, o direito institucional, com suas normas positivadas, é o único direito conhecido. Nesse sentido, trouxe a figura da autoridade em um sentido amplo, de modo que, através de um vínculo de confiança que estabelece com o indivíduo para determinados núcleos sociais, passa-se a ter um valor de respeito e submissão aos ditames que ela preconiza, por diversas vezes, maiores do que a norma de direito institucionalizada diz, por estar mais próxima à realidade do indivíduo do que o direito e o ordenamento jurídico.
Nesse contexto, foram utilizados como exemplos as questões do direito de Pasárgada e o pluralismo jurídico que existe e a figura de autoridade constituída internamente por meio de sua associação, bem como sobre a questão do relativismo cultural frente a uma questão de pluralismo jurídico e infração a direitos fundamentais. Dessarte, depreende-se que o direito é um mecanismo para fazer com que as pessoas deixem de pensar apenas no interesse próprio, aludindo então ao interesse coletivo. Logo, ainda que haja uma questão cultural e de direito interno paralelo na questão cultural de determinada comunidade, isso não justifica a violação a direitos e deveres fundamentais garantidos a qualquer ser humano. Nessa epígrafe, ressalta-se ainda como a figura de autoridade se torna forte, pois, nesse contexto cultural, a figura de autoridade se transmite em propagar culturalmente uma prática que viola direitos fundamentais – mas, nesse caso, o direito institucionalizado funciona de antemão como mecanismo para proteger o interesse coletivo, alçando uma seara de poder acima dessa autoridade em questão.
Diante disso, acreditamos que o objeto de análise, que é a dualidade, foi pleiteado de diferentes esferas nesse artigo, de modo a mostrar que um sistema de limites sempre deverá ser observado, e que, acima de tudo, quando da aplicação de qualquer direito, a máxima que deve ser respeitada é a inviolabilidade dos direitos inerentes a qualquer ser humano e a operação em si de forma altruísta, saindo do núcleo central individualizado e observando a esfera do interesse coletivo.
BIBLIOGRAFIA
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SANTOS, Boaventura de Sousa. O Direito dos Oprimidos: sociologia crítica do direito - Parte 1. São Paulo: Cortez, 2014.
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WOLKMER, Antonio Carlos. Pluralismo jurídico: fundamentos de uma nova cultura do direito. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2015, Ebook, p. 188, apud ANSART, Pierre. Op. cit., p. 172-173. <Disponível na biblioteca eletrônica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo/SP>.
[3] SCHAUER, Frederick. A força do Direito. Trad. Andre Luiz Freire. 1. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2022, p. 106.
[4]SCHAUER, Frederick. A força do Direito. Trad. Andre Luiz Freire. 1. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2022, p. 106.
[5]SCHAUER, Frederick. A força do Direito. Trad. Andre Luiz Freire. 1. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2022, p. 107-108.
[7]SANTOS, Boaventura de Sousa. O Direito dos Oprimidos: sociologia crítica do direito - Parte 1. São Paulo: Cortez, 2014.
[8]WOLKMER, Antonio Carlos. Pluralismo jurídico: fundamentos de uma nova cultura do direito. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2015, Ebook, p. 188, apud ANSART, Pierre. Op. cit., p. 172-173. <Disponível na biblioteca eletrônica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo/SP>.
[9]SANTOS, Boaventura de Sousa. O Direito dos Oprimidos: sociologia crítica do direito - Parte 1. São Paulo: Cortez, 2014, p. 43-44.
[10]SANTOS, Boaventura de Sousa. O Direito dos Oprimidos: sociologia crítica do direito - Parte 1. São Paulo: Cortez, 2014, p. 156-160.
[12]SCHAUER, Frederick. A força do Direito. Trad. Andre Luiz Freire. 1. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2022, p. 149-150.
[13]ONTIVERSOS, Eva. Mutilação genital feminina: o que é e por que ocorre a prática que afeta ao menos 200 milhões de mulheres. BBC World Service, online, 6 fev. 2019. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-47136842. Acesso em: 29 dez. 2022.
[14]ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Carta das Nações Unidas. Londres, 1941. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/91220-carta-das-nacoes-unidas. Acesso em: 29 dez. 2022.
[15]BARROSO, Priscila Farfan e BONETE, Wilian Junior. Estudos Culturais e Antropológicos. Sagah Educação S.A., Ebook, 2018, p. 194. <Disponível na biblioteca eletrônica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo/SP>.
Advogada de Societário, M&A, Mercado Financeiro e Capitais. Graduada em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pós-graduada em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MORENO, Marina Bortoletto. A dualidade entre a força do direito e as autoridades frente a diferentes núcleos sociais e culturais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 fev 2023, 04:43. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/61115/a-dualidade-entre-a-fora-do-direito-e-as-autoridades-frente-a-diferentes-ncleos-sociais-e-culturais. Acesso em: 23 dez 2024.
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