Resumo: O texto busca estudar a possibilidade de cessão da posição contratual em contratações públicas à luz da reflexão sobre dogma que costuma ser apontado como óbice a esse tipo de operação: o personalismo dessas avenças. Como hipótese central, sugere-se que a cessão de contratos públicos é perfeitamente consentânea com os ditames do ordenamento jurídico brasileiro, sobretudo pela não procedência do entendimento mencionado.
Palavras-Chave: Direito Administrativo. Cessão de Contratos Administrativos. Personalismo.
Abstract: This paper aims at the possibility of contractual assignment in public contracts under the investigation regarding one plea pointed as objection to this kind of operation: they would be personal contracts. As a central hypothesis, it is suggested that contractual assignment in public contracts is perfectly legal in Brazilian Law, mainly because the mentioned objection is not true.
Keywords: Administrative Law. Contractual Assignment. Personal Contracts.
O cotidiano dos contratos públicos[1] enfrenta percalços que ora os aproxima, ora os afasta dos ajustes privados. Em ambos os regimes, nem sempre é possível ou economicamente interessante que se mantenha um dos polos subjetivos de determinada avença ao longo de toda a sua execução.
As razões para isso são muitas e dariam azo a estudos – não somente jurídicos – destinados unicamente à questão. Seja como for, o dinamismo inerente à economia contemporânea afeta contratos privados e também públicos.
Em verdade, as contratações públicas estão, por vezes, sujeitas a vicissitudes que tornam a possibilidade de cessão da posição contratual especialmente interessante. Cito duas.
Primeiramente, podem ser contratações longas, verdadeiros contratos incompletos[2]. Além disso, em nuance que se aplica a basicamente qualquer contrato público brasileiro, são contratações marcadas por riscos ao particular que as executa, seja quanto ao não recebimento total (ou excessiva demora no pagamento) das contrapartidas pecuniárias combinadas, seja quanto à sua diminuição ou rescisão supervenientes.
É dizer: de um lado, o grande lapso temporal de execução do contrato pode alterar as circunstâncias econômicas ou estratégicas do contratado, que pode precisar ou entender mais conveniente ceder sua posição contratual a outra empresa do ramo. De outro, os riscos dos contratos públicos podem facilmente dissuadir esse particular de manter esses ajustes.
Naturalmente, a exemplo do que ocorre nos pactos privados, em linhas gerais, não se pode simplesmente “mudar de ideia” quanto a compromissos anteriormente assumidos em prejuízo à outra parte do negócio. Fazê-lo depende, no mínimo, da anuência do contratante inicial.
Contudo, não há benefício em negar a realidade[3]: se as adversidades que ensejam a cessão da posição contratual persistem – ou mesmo se intensificam – nos contratos públicos, não me parece lógico que, cumpridos determinados requisitos, impeça-se essa operação comercial[4]-[5]. Quais são esses requisitos? Eis a questão.
O texto tem como problema o óbice jurídico de cessão de contratações públicas sob o enfoque do dogma que costuma ser apontado como principal questão a essas operações: o personalismo dessas avenças.
Em outras palavras, este artigo visa a responder à seguinte pergunta: a cessão da posição contratual nos contratos públicos é antijurídica no ordenamento brasileiro em razão do necessário personalismo desses ajustes?
A hipótese a ser enfrentada é a de que a cessão de contratos administrativos é perfeitamente consentânea com os ditames do ordenamento jurídico brasileiro, sobretudo pela não procedência do entendimento supramencionado. Isso porque não existiria um personalismo necessário nas contratações públicas brasileiras. Segundo a hipótese a ser estudada, ele estaria mais próximo dos parâmetros de personalismo dos contratos privados, isto é, basicamente, a natureza da prestação. Não haveria diferenciação entre contratos intuitu personae e personalíssimos. O personalismo nos contratos públicos brasileiros teria sido herdado dos franceses sem maiores reflexões quanto à sua transposição à nossa realidade.
Para confirmar ou rejeitar a hipótese proposta, utilizarei basicamente o método analítico-interpretativo do ordenamento brasileiro. Pretendo (re)visitar aportes doutrinários e jurisprudenciais atuais e de épocas – e, nos casos que o escasso tempo permitiu, nações – distintas.
No tópico central, não só topograficamente, do trabalho: a revisitação do personalismo nos contratos administrativos. Tem-se como meta analisar essa clássica lição – que, diga-se de passagem, já encontra resistência em alguns setores mais modernos da doutrina e jurisprudência –, argumentando se ela persiste no nosso direito.
Dentro de meus limites fáticos, aportarei o maior número possível de contribuições doutrinárias e jurisprudenciais a fim de entender a origem desses ensinamentos e se, de fato, não se está diante de, com a devida vênia, velhas opiniões formadas sobre tudo[6].
Passarei às reflexões dessas análises no cenário normativo nacional. Esta parte do trabalho objetiva demonstrar que, em parte, essas discussões já reverberam em diplomas brasileiros, mesmo na dita fase maximalista[7] da legislação sobre contratações públicas. Aqui, cabe um alerta: limitarei minha análise às Leis nº. 8.666/1993 e 8.987/1995, por razões esmiuçadas no início do tópico 4.
Buscarei também propor interpretações dos dispositivos aludidos que, à luz de minha hipótese, sejam mais consentâneas com o ordenamento jurídico brasileiro. Não abdicando de mudanças sem redução de texto, sugerirei alterações de lege ferenda por entender que podem, no mínimo, trazer mais clareza normativa à discussão e, assim, mais segurança jurídica às operações.
2.Personalismo como óbice à cessão contratual nas contratações públicas.
O tema da cessão da posição contratual nos contratos públicos gera intensa discussão acerca da compatibilidade entre o instituto e a disciplina dos ajustes com a Administração Pública.
Dentre os professores, Fábio Barbalho Leite, em estudo monográfico sobre a polêmica, elenca que Diogo de Figueiredo Moreira Neto, Jessé Torres Pereira Júnior e Celso Antônio Bandeira de Mello, este conquanto focado na hipótese de concessão de serviço público, sustentam a inadmissibilidade de cessão da posição contratual em contrato administrativo[8].
Todavia, mais que vedações ou permissões absolutas, doutrina e jurisprudência divergem principalmente em relação a quais seriam os limites e possibilidades da aplicação desse negócio jurídico quando o objeto, em si, é um negócio titularizado pelo Poder Público. Fábio Barbalho Leite esquematiza as diversas opiniões nesse sentido[9].
Cada uma das restrições e condicionamentos apontados mereceria estudo específico e apartado. No entanto, conforme adiantei na introdução e ao fim do último tópico, terei um grande eixo de reflexão.
Examinarei as razões pelas quais há certo consenso em se afirmar que as contratações públicas são intuitu personae, posição essa adotada inclusive por alguns autores que sustentam a juridicidade da cessão contratual em contratos públicos.
Quando o português chegou
Debaixo de uma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena!
Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O português
(Oswald de Andrade)
São muitos os autores que sustentam que as contratações públicas são intuitu personae. Em lição que subscrevo totalmente com base nas pesquisas realizadas, Marçal Justen Filho alude que a maioria esmagadora da doutrina caracteriza essas avenças como personalíssimas[10].
Maria Sylvia Zanella Di Pietro destaca que todos os contratos para os quais a lei exige licitação são firmados intuitu personae, ou seja, em razão de condições pessoais do contratado[11]-[12].
De forma semelhante, José dos Santos Carvalho Filho sustenta como característica dessa relação contratual a confiança recíproca (intuitu personae), porque o contratado é, teoricamente, quem melhor demonstrou condições de contratar com a Administração[13].
Mesmo em artigos que advogam pela possibilidade de cessão da posição contratual em contratação pública, como o trabalho de Eduardo Vianna Motta, alude-se que a característica intuitu personae é inerente a todo contrato de obras públicas[14].
Essa concepção também cruza fronteiras, como o próprio título deste subtópico sugere. Na Argentina, o autor Rafael Bielsa assevera que esse tipo de contrato é celebrado intuitu personae. Isso decorreria da natureza do contrato – cujo fim é de utilidade pública[15]. Na Espanha, cita-se Carrillo De Albornoz[16].
Na jurisprudência, o STJ já reconheceu o caráter intuitu personae dos contratos públicos[17] – mesmo em decisão autorizando a subcontratação, tendo em vista a disposição expressa prevista no art. 72 da Lei nº. 8.666/1993, que será aprofundada no momento adequado.
Tampouco esta corrente de pensamento está alinhada necessariamente com professores mais clássicos, afastados do Direito Administrativo em Evolução ou de seus Novos Paradigmas[18].
Alguns dos autores mais modernos, talvez como forma de dialogar com as concepções mais restritivas que inadmitem a cessão contratual dos contratos administrativos, tendem a sustentar que o caráter intuitu personae dessas contratações não elide, por si só, essa operação[19]. Para tal, afirmam que os contratos públicos são, sim, intuitu personae, mas isso não significaria afirmar que eles seriam personalíssimos[20], na esteira das considerações de Marcello Caetano[21].
Essa argumentação não me parece de todo infundada. De fato, essa característica não seria totalmente incompatível com a cessão contratual caso se entendesse que os contratos administrativos são intuitu personae apenas no sentido do liame com o licitante que se sagrou vencedor no certame público, e não no sentido comum do Direito Civil de um objeto que só pode ser cumprido por uma pessoa, como já adiantou Alexandre Santos de Aragão[22].
Com a devida vênia, entendo que é necessário abandonar o pudor ao tratar do tema. Parece-me que, se não há natureza personalíssima, tampouco há, em si, uma natureza intuitu personae nos contratos públicos em geral.
É certo, nas palavras de Rozen Noguellou – e como se percebe pela controvérsia –, que o conceito de intuitu personae é noção particularmente difícil de definir[23]. Todavia, entendo que, ao menos para fins de cessão contratual, trata-se de instituto bastante próximo do personalismo/caráter personalíssimo do contrato ou obrigação.
Na definição do clássico De Plácido e Silva, direitos oriundos de contratos ou obrigações intuitu personae, a priori, não podem ser cedidos. Mas só podem ser assim entendidos os que se geram ou nascem em consideração da pessoa, e que somente possam subsistir em consideração dela. Nessa hipótese, não podem ser cedidos ou transferidos em condições idênticas. Daí a razão de sua incedibilidade[24].
Em dissertação dirigida ao estudo da admissibilidade cessão da posição contratual nos contratos administrativos, a autora portuguesa Sara Augusto de Matos explicita a aplicação da noção de intuitu personae no tema do presente trabalho. Segundo ela, refere-se às características do co-contratante que hajam sido absolutamente determinantes na adjudicação. Apenas quando essas sejam claras, ou seja, somente quando o contrato haja sido concluído em razão delas, estaremos perante casos aos quais se deva vedar a cessão ou da subcontratação. Assim, para a lusitana, a definição abrangerá apenas um número tendencialmente circunscrito de contratos[25].
Em outras palavras, com base nas contribuições supracitadas e dos aportes do direito privado do tópico 2, os conceitos de contratos intuitu personae e personalíssimos, caso distintos, são absolutamente parecidos.
Esse apego taxionômico[26] não me parece ter maiores repercussões práticas: como um contrato é celebrado em razão das características pessoais do contratante, mas é possível a cessão de uma de suas posições contratuais? Se o fato de outrem poder ocupar aquela relação contratual distingue o intuitu personae do personalismo, qual é o efeito prático daquela classificação? Ser intuitu personae seria, de fato, uma classificação em si? Os conceitos são fungíveis. Tão fungíveis que a jurisprudência trata frequentemente a expressão intuitu personae como sinônimo de contrato (ou obrigação) personalíssimo[27].
Adotando a linha de raciocínio de que os contratos públicos não seriam personalíssimos, mas apenas intuitu personae, o ilustre professor Floriano de Azevedo Marques Neto busca esclarecer os efeitos dessa classificação. Para o autor, pelo caráter intuitu personae desses ajustes, dependendo do contrato, essa cessão poderá se efetivar desde que com a expressa anuência da Administração contratante[28].
Entretanto, como se percebe pelas contribuições trazidas na segunda seção deste artigo, destaco que a anuência do cedido é condição mesmo para a cessão de contratos privados, independentemente do seu personalismo.
É dizer: a anuência da Administração Pública é decorrência do próprio instituto da cessão contratual, sendo, quanto aos contratos administrativos, exigência expressa da legislação, a exemplo do art. 78, VI, da Lei nº. 8.666/1993. No Código Civil, não há essa previsão expressa – como existe no art. 424 do Código Civil Português –, mas ela de forma alguma inexiste, como reconhecem doutrina e jurisprudência já exaustivamente citadas.
Conforme ressaltei ao final do tópico 2, ou o contrato é personalíssimo/intuitu personae e a anuência na transferência da posição contratual configura nova contratação, vez que aquele contrato não pode ser cedido, ou o contrato não é intuitu personae/personalíssimo e a anuência do cedido é apenas um requisito para sua cessão.
O Tribunal de Contas da União – TCU, no Acórdão 453/2014, entendeu que quando a contratada cede ou transfere sua posição, significa que a Administração está firmando um novo contrato, devido à característica intuitu personae dos contratos[29].
De fato, concordo que, nos casos de contratos intuitu personae, entendidos por mim e pelo Tribunal de Contas da União como expressão análoga a contratos personalíssimos, sua cessão configura nova contratação. Minha diferença está em não crer que os contratos públicos tenham essa natureza sempre ou necessariamente.
Autores como José Augusto Delgado extraem a natureza intuitu personae – doravante tratada como sinônimo de natureza personalíssima/personalista – dos contratos públicos do processo seletivo que, em regra, adota a Administração[30].
Argumenta-se que o personalismo das contratações públicas adviria do fato de que o contratante privado seria escolhido em razão de suas características pessoais, as quais foram aferidas no procedimento licitatório[31].
Em outras palavras, a Administração Pública, por meio da licitação, escolheu o particular que detivesse as características adjudicadas. Selecionou-se empresa com determinado número de empregados, com certo valor em fluxo de caixa, com as certidões e atestados pedidos. Esse processo de escolha, por ter alto grau de vinculação[32], impediria o Poder Público de alterar o contratante privado selecionado. Daí o caráter intuitu personae dessa contratação.
Entretanto, esse raciocínio é um sofisma. Sua lógica olvida-se de ponto central: a licitação escolhe propostas, não proponentes.
Em rápida digressão, a regra licitatória[33] é exigência do art. 37, XXI, da Constituição Federal, sendo procedimento que consubstancia princípios como moralidade e publicidade (art. 37, caput, da CF/88), mas sobretudo o dever de impessoalidade na ação administrativa.
Daí que as seleções de contratações a serem feitas pela Administração Pública, em decorrência da impossibilidade de se beneficiar escolhas pessoais dos administradores, mas também diante da dificuldade de se exprimir uma vontade puramente do Poder Público, precisam de processo objetivo de escolha desses contratantes privados[34].
A exemplo das contratações diuturnas dos particulares, salvo interesses pessoais – beneficiar amigos, fortalecer relações comerciais, prejudicar concorrentes, hipóteses que violariam o princípio da impessoalidade –, ao escolher contratantes, selecionam-se propostas, e não pessoas.
Em exemplo simples, busca-se um carro 0 km, com determinada quantidade de cavalos, na cor estabelecida, no menor preço possível; a concessionária é selecionada em razão do objeto e no que se oferece em relação a ele, não por si só. Pela própria definição intensamente debatida, o ajuste só é intuitu personae se, de fato, escolheu-se o contratante A em face de B tendo como norte características – e critérios – subjetivas.
O fato de se adotar o procedimento A ou B, desde que eles mantenham seu foco em escolher propostas, não altera a característica personalista ou não do contrato. Pode-se privilegiar o critério da concessionária que mais rápido oferecer o carro, o maior tempo de seguro, ou, até mesmo, com base na autonomia privada, optar pela escolha aleatória. Em nenhum desses casos houve contratação intuitu personae: ela só existe se as características pessoais do fornecedor foram a nota distintiva da avença.
Para a Administração Pública, a autonomia é evidentemente limitada, beirando a inexistência em diversas hipóteses. A licitação, por expressa determinação constitucional e legal, é uma delas[35].
É dizer: pelos motivos aludidos – que podem chegar até mesmo ao princípio republicano –, trata-se de procedimento de escolha mais objetivo, e não menos. Como aponta Marçal Justen Filho, o personalismo das contratações públicas somente pode verificar-se na ocorrência de escolha discricionária do sujeito a ser contratado pela Administração Pública. O procedimento licitatório elimina essa discricionariedade e, com ela, também se exclui o personalismo da contratação[36]. A licitação é processo despersonalizante, não o contrário.
No sintético, porém certeiro, ensinamento de Diogo de Figueiredo Moreira Neto, a licitação é escolha de um determinado sujeito – o licitante – em função de um determinado objeto – a proposta[37].
O procedimento licitatório não escolhe o sujeito em função de si mesmo, por mais que existam condições à proposta relacionadas à habilitação do contratante para prestar o objeto[38]. A habilitação não é nota distintiva da proposta, mas mera condição à sua execução. Tanto é assim que condições de habilitação excessivamente rígidas, que só podem ser cumpridas por um licitante, frequentemente são punidas por violação à regra licitatória[39]-[40].
Enquanto se estiver escolhendo “como” ou “o que”, não se está diante de contrato intuitu personae. Essa característica só aparecerá se se estiver selecionando “quem”, independentemente de quem estiver fazendo essa escolha[41].
Inclusive, tecendo breve opinião, não me parece que em toda e qualquer contratação pública direta haja personalismo. Isso porque, ainda que sem licitação, não se está necessariamente diante de hipóteses de escolhas discricionárias e muito menos subjetivas.
A contratação direta costuma ter seu procedimento autônomo que elide, ao menos em parte, a discricionariedade (por exemplo art. 26 da Lei nº. 8.666/1993). A própria prática administrativa adota frequentemente procedimentos objetivos que afastam a subjetividade em seleções sem licitação, de modo a observar os princípios da Administração Pública, sobretudo o da impessoalidade[42].
Nas contratações diretas, o ponto fica bastante evidente nas hipóteses em que ela se dá em razão da pessoa[43]. O fato de se tratar de contratação subjetiva é que atrai para esta contratação o personalismo.
Ao contrário, não procede estender necessariamente o caráter intuitu personae, fruto de escolha subjetiva, a todas as contratações públicas. Daí que se falou em personalismo “à francesa”.
No início do século XX, as contratações administrativas na França, país que em muito influenciou nosso direito administrativo[44], não eram necessariamente precedidas de licitação. A Administração selecionava seus contratantes com base em aferição discricionária que considerava características pessoais dos agentes[45]. Daí é que se origina o personalismo dos contratos públicos franceses, como aponta Marçal Justen Filho[46].
A título ilustrativo, o secular Gastón Jèze, em escritos datados de 1932, destacava a impossibilidade de cessão dos contratos administrativos. Mas isso porque o contratado foi selecionado especificamente em razão de suas qualidades pessoais[47].
Georges Dupuis, Marie-José Guédon e Patrice Chrétien destacam a relação entre escolha subjetiva da Administração quanto ao contratante privado e contratos intuitu personae. Perceba-se que os argumentos chegam a se parecer com a defesa feita por nossos personalistas pelo personalismo de contratos previamente licitados. Segundo as afirmações dos franceses natos, quanto a numerosos contratos, a Administração é livre para escolher seu co-contratante como ela assim bem o entender. São contratos concluídos intuitu personae: o prestador é selecionado pela apreciação de suas qualidades pessoais[48]-[49].
Com a evolução normativa que aumentou o grau de vinculação de seleção dessas contratações, as opiniões pelo personalismo da contratação administrativa foram perdendo força[50]. Assim, administrativistas franceses do século XXI tenderam a rechaçar esse personalismo, sobretudo se entendido como óbice à cessão de contratos administrativos[51].
Portanto, como adverte Marcos Augusto Perez, a frequente classificação dos contratos públicos enquanto contratos intuitu personae talvez seja uma importação irrefletida do Direito Administrativo francês, que não se coaduna totalmente com o Direito Positivo brasileiro[52].
Que pena! Fosse uma manhã de sol, teríamos despersonalizado os marchés publics.
3.Breves reflexões sobre o cenário normativo brasileiro.
Até aqui, foram examinados os contornos do instituto da cessão contratual e do alegado limite à sua aplicação aos contratos públicos. A ideia desta seção é aplicar os debates das páginas anteriores ao ordenamento brasileiro[53], ainda que de forma singela.
Refletirei sobre escolhas legislativas na temática da cessão dos contratos públicos, bem como suas repercussões doutrinárias e jurisprudenciais. Quando possível ou necessário, proporei interpretações e mesmo alterações de lege ferenda.
Nos próximos subtópicos, adentrarei, ainda que rapidamente, o contexto dos contratos sujeitos à Lei nº. 8.666/1993 (Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos), à Lei nº. 8.987/1995 (Lei de Concessões).
Esse recorte deu-se por duas razões. Em primeiro lugar, para demonstrar que, já nos anos 1990, quando a doutrina quase unanimemente aludia ao personalismo como óbice às cessões dos contratos públicos, o direito positivo não comportava essa leitura. Em segundo lugar, porque as leis ora examinadas já foram escarafunchadas por doutrina e jurisprudência, de modo a possibilitar sua revisitação à luz das reflexões do último tópico, ao contrário da incipiente discussão sobre novos diplomas como a Lei das Estatais (Lei nº. 13.303/2016) e o Programa de Parcerias de Investimentos (Lei nº. 13.334/2016)[54].
Conforme se nota nas páginas deste trabalho, utilizei a terminologia cessão de contratos públicos, abarcando o instituto em geral, sem delimitações expressas quanto ao objeto desse contrato. Na análise deste tópico, estabelecerei algumas diferenças nos regimes aplicáveis aos contratos administrativos em geral e às concessões de serviços públicos.
Seja como for, meu ponto de partida é a lição de Leon Frejda Szklarowsky. Segundo o autor, a cessão e a sub-rogação das avenças públicas encontram sustentação no direito positivo[55]. Meu propósito é esmiuçar os nuances das positivações feitas pelo legislador.
A cessão da posição contratual nos ajustes públicos em geral, sujeitos à Lei nº. 8.666/1993, tem como lar normativo o art. 78, VI, do diploma. Transcrevo o dispositivo, centro dos debates sobre o tema:
Art. 78. Constituem motivo para rescisão do contrato:
VI - a subcontratação total ou parcial do seu objeto, a associação do contratado com outrem, a cessão ou transferência, total ou parcial, bem como a fusão, cisão ou incorporação, não admitidas no edital e no contrato;
Autores como Fábio Barbalho Leite[56] e Leon Frejda Szklarowsky[57] extraem da interpretação a contrario sensu do art. 78, VI, da Lei nº. 8.666/1993 a possibilidade de cessão de contratos administrativos. Vertendo o texto legal, se a cessão não admitida no edital e no contrato constitui motivo para a rescisão do contrato, ela é lícita desde que admitida no edital e no contrato.
A simples interpretação a contrario sensu do dispositivo não me parece ser apta a autorizar, por si, a cessão de contratos administrativos nessa lei.
A interpretação gramatical (literal) tem suas limitações[58]. Além disso, a interpretação a contrario sensu deve ser utilizada com ainda mais cautela. Consoante afirmou Carlos Maximiliano, generalizar esse tipo de argumento restringiria o campo da interpretação estrita[59].
Mas, acima de tudo, a própria interpretação a contrario sensu do art. 78, VI, da Lei nº. 8.666/1993 não necessariamente leva à conclusão defendida pelos professores (e grande parte da doutrina).
O inciso que menciona a cessão contratual insere-se entre as hipóteses de rescisão do contrato. Interpretando em contrário, de fato, a cessão admitida em edital e contrato não ensejaria o desfazimento do ajuste. Entretanto, isso não quer dizer que ela esteja plenamente admitida. Poderiam incidir outras sanções sobre essa operação[60].
Assim, uma interpretação unicamente gramatical a contrario sensu do dispositivo não parece apta a ensejar plena segurança jurídica às operações de cessão contratual nos contratos públicos. Tanto é assim que, por diversas vezes, o Tribunal de Contas da União entendeu que esse tipo de negócio jurídico afrontaria justamente o art. 78, VI, da Lei nº. 8.666/1993[61].
A fim de conferir maior segurança jurídica às cessões contratuais nos ajustes da Lei nº. 8.666/1993, entendo ser desejável a reformulação do texto legal. Se possível, seria interessante a inclusão de dispositivo como o art. 316.º do CCP Português, que denota o seguinte: “Na falta de estipulação contratual ou quando outra coisa não resultar da natureza do contrato, são admitidas a cessão da posição contratual e a subcontratação, nos termos do disposto nos artigos seguintes”.[62] Essas disposições[63] seriam proveitosas até mesmo para dispor sobre os limites e possibilidades à cessão nos contratos públicos.
Contudo, como defendido ao longo deste trabalho, a cessão de posição contratual nas contratações públicas já é compatível com nosso ordenamento. Mesmo sem inclusão de novos artigos ou sem alteração do art. 78, VI, da Lei nº. 8.666/1993, não há óbices à sua juridicidade.
Ainda que a interpretação gramatical do art. 78, VI, da Lei nº. 8.666/1993 não leve obrigatoriamente às conclusões desejadas, reitero a lição de Eros Grau de que não se interpreta o direito em tiras[64]. É dizer: a aplicação de um dispositivo não pode ser considerada isoladamente, hermeticamente ao cenário normativo em que se insere.
Defendo que a leitura das trinta e cinco palavras constantes no dispositivo não possibilita, necessariamente, a admissão de cessão da posição contratual nas contratações públicas. Isso tem, sim, valor jurídico: essa transferência é menos segura por não haver disposição permitindo-a expressamente.
Todavia, não basta a leitura desses trinta e cinco vocábulos. O dispositivo precisa ser lido à luz do ordenamento brasileiro. Nele, não há personalismo nas contratações públicas; existe instituto de cessão contratual totalmente consagrado mesmo sem cláusula normativa sobre o tema. E mais: como se verá, há previsão direta quanto à cessão de contratos administrativos referentes a concessões de serviços públicos, muito mais delicados que os contratos públicos comuns.
Nesse cenário, a interpretação sistemática do art. 78, VI, da Lei nº. 8.666/1993 conduz à juridicidade das cessões de posição contratual nos contratos administrativos. Não é só pela (insuficiente) interpretação a contrario sensu do dispositivo. É que, somando-a ao ordenamento jurídico em que se insere, à prática negocial e mesmo ao cenário do direito comparado, tem-se legítimo esse negócio jurídico.
Há outros dispositivos da Lei nº. 8.666/1993 que corroboram com o argumento deste trabalho – à inexistência de personalismo nos contratos públicos. Primeiramente, o art. 30, §10,[65] possibilita a substituição dos profissionais que denotem a capacidade técnica-profissional do licitante sem maiores óbices à proposta feita.[66]
Ainda mais ampla é a possibilidade prevista no art. 64, §2º, destinada à substituição do convocado que não assine o termo de contrato. Mantida a proposta oferecida, a Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos denota que não há qualquer personalismo em quem a executa. Nesse sentido, posiciona-se Marçal Justen Filho[67].
Por fim, há a já consagrada subcontratação. Trata-se de instituto análogo, mas distinto da cessão contratual. Na definição de Jessé Torres Pereira Junior, por subcontratação deve entender-se o trespasse da execução do contrato e, não a cessão ou a transferência do próprio contrato[68].
Além de sua vedação quando não admitida em contrato ou no edital (art. 78, VI, do diploma geral de licitações), a subcontratação é expressamente prevista no art. 72 da Lei nº. 8.666/1993. Segundo ele, “o contratado, na execução do contrato, sem prejuízo das responsabilidades contratuais e legais, poderá subcontratar partes da obra, serviço ou fornecimento, até o limite admitido, em cada caso, pela Administração”.
Evidentemente, há diferenças entre o regime jurídico da subcontratação e da cessão contratual, até por aquela ser mais branda que esta quanto à identidade do contratante[69]. Todavia, não deixa ser um reforço à inexistência de personalismo nas contratações públicas: fossem esses ajustes intuitu personae, nem mesmo seria possível subcontratar sua execução[70].
O art. 175 da Constituição Federal determinou que a exploração dos serviços públicos, “diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão”, incumbe ao Poder Público “na forma da lei”. O parágrafo único do artigo determinou que a lei disporia sobre a normatização geral das concessões e permissões de serviço público[71]. Dado o comando constitucional, foi editada a Lei nº. 8.987/1995[72].
A Lei nº. 8.987/1995 é apenas dois anos mais velha que a Lei nº. 8.666/1993 e, em meu entender, trata de contratos mais sensíveis que muitas das avenças desse diploma.[73] No entanto, suas normas são bem mais permissivas que as de sua coirmã no que toca às alterações subjetivas do executor dos contratos públicos.
Em primeiro lugar, a Lei Geral de Concessões também previu a possibilidade de subcontratação (art. 25, §1º[74]). Esse instituto não é o foco deste trabalho. Isso porque, nela, permanece o vínculo entre subcontratante e poder concedente[75]. De todo modo, a exemplo do que ocorre na Lei nº. 8.666/1993, a positivação da subcontratação não deixa de ser elemento lateral na refutação do personalismo dos contratos administrativos[76].
Na Lei nº. 8.987/1995, há instituto que pode ser tido como intermediário entre a subcontratação e a cessão da posição contratual. Trata-se da subconcessão, prevista expressamente no art. 26 do diploma: “é admitida a subconcessão, nos termos previstos no contrato de concessão, desde que expressamente autorizada pelo poder concedente”.
Arnoldo Wald define o instituto como o contrato administrativo em que a concessionária figura, não como contratante em nome próprio, mas no do Poder Público delegante, operando-se a sub-rogação legal a terceiros, dos direitos e obrigações do concessionário, nos limites da subconcessão[77].
A subconcessão separa parte da concessão original e delega-a a outro particular. Opera-se uma concessão dentro da concessão – daí sua nomenclatura. O concessionário-concedente, subconcedente, diferentemente da subcontratação, não permanece obrigado juridicamente por aquele escopo contratual. Isso se deduz do §2º do art. 26 (“o subconcessionário se sub-rogará todos os direitos e obrigações da subconcedente dentro dos limites da subconcessão”), havendo aqueles que sustentam que, por conta desse parágrafo, o dispositivo não prevê subconcessão propriamente dita, mas sim subconcessão imprópria[78].
Para Marçal Justen Filho, a subconcessão institui outro vínculo jurídico, além da concessão original, tratando sobre a prestação do mesmo serviço público. Para o autor, haveria duplicação da concessão, com um terceiro assumindo algumas prestações específicas e determinadas, por conta e risco próprios.[79] Daí mais força à tese de não personalismo nos contratos públicos: não se poderia duplicar e repassar a outrem vínculo que fosse, de fato, intuitu personae.
De toda sorte, a cessão (ou trespasse) propriamente dita da concessão foi prevista no art. 27 da Lei nº. 8.987/1995. Em seus termos, “a transferência de concessão ou do controle societário da concessionária sem prévia anuência do poder concedente implicará a caducidade da concessão”. À primeira vista, o dispositivo se assemelha com o art. 78, VI, da Lei nº. 8.666/1993, que exige interpretação a contrario sensu não necessariamente direcionada à consagração da cessão, mas sim ao seu não sancionamento.
Todavia, o §1º do art. 27 da Lei de Concessões favorece a interpretação gramatical pela previsão da cessão da concessão, alterando o cenário em relação ao artigo da Lei nº. 8.666/1993: “§ 1o Para fins de obtenção da anuência de que trata o caput deste artigo, o pretendente deverá: I - atender às exigências de capacidade técnica, idoneidade financeira e regularidade jurídica e fiscal necessárias à assunção do serviço; e II - comprometer-se a cumprir todas as cláusulas do contrato em vigor”. É dizer: o legislador alude expressamente às condições para anuência da transferência da concessão, de onde se extrai gramaticalmente a possibilidade dessa cessão. Em comparação, a Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos encerra-se no caput que prevê a rescisão por cessão que descumpra as condições.[80] Ainda que assim não fosse, replico aqui as lições no sentido da interpretação sistemática de ambos os dispositivos.
Naturalmente, não se nega que o dispositivo da Lei nº. 8.987/1995 não é tão direto quanto poderia ser. Haveria ainda mais segurança jurídica se o dispositivo aludisse algo como “é admitida a cessão da concessão, seguidas as seguidas condições”. Trata-se de alteração de lege ferenda que, em minha opinião, facilitaria o tratamento da questão.
Fato é que, ao prever a cessão contratual das concessões, não se falou em precedência de licitação. O art. 27 silenciou-se eloquentemente[81] quanto ao procedimento licitatório. Isso fica ainda mais claro se comparado com o artigo imediatamente anterior, que aludiu expressamente à necessidade de concorrência para escolha do subconcessionário. O mesmo não se deu quanto ao cessionário.
Autores como Maria Sylvia Zanella Di Pietro[82] e Humberto Ribeiro Soares[83] questionam a juridicidade dessa previsão. Segundo sua posição, a ausência de procedimento licitatório para transferência da concessão violaria o art. 175 da Constituição Federal, que prevê que a concessão seja feita “sempre através de licitação”.
Discordo dos eminentes professores. Pelas razões elencadas neste trabalho, não é estranho que tenha sido prevista a licitação para subconcessão, mas inexista tal disposição para a transferência da concessão aludida no art. 27 da Lei nº. 8.987/1995.
A meu ver, a licitação em questão seria mais escolha legislativa que imperativo constitucional. A cessão parcial consubstanciada na subconcessão é concorrencialmente mais arriscada que procedimento no qual o concessionário simplesmente se afasta da concessão. Na primeira, os cartelizados podem dividir lucros, enquanto na transferência apenas um deles manterá o vínculo.
No mais, o art. 175 da Constituição Federal afirma a precedência da licitação para a concessão ou permissão. Como já se disse neste trabalho em relação aos contratos públicos em geral, a cessão da posição contratual, via de regra, não configura novo ajuste. Portanto, a licitação prevista no art. 175 já foi realizada quando da seleção da proposta vencedora. E essa proposta não será alterada: o próprio §1º do art. 27 da Lei nº. 8.987/1995 demanda que sejam mantidas as condições originais.
Emerson Gabardo e Thiago Priess Valiati diferenciam a subconcessão e transferência da concessão. Para eles, enquanto na subconcessão parte da concessão é desmembrada e transferida a um terceiro, na transferência da concessão (direta), substitui-se plenamente a concessionária no polo da relação jurídico-contratual. Em outras palavras, a subconcessão gera duas ou mais concessões; por sua vez, a transferência da concessão mantém apenas uma concessão, porém, mediante concessionária distinta da original[84].
Isto é: se há nova concessão, sujeita constitucionalmente à licitação, ela existe no caso da subconcessão – não da transferência. Segundo Mauro Roberto Gomes de Mattos, a necessidade de licitação não se exige justamente porque a transferência da concessão não consubstancia novo vínculo, já que todas as cláusulas e condições do contrato em vigor são mantidas[85]-[86].
Por fim, a Lei nº. 8.987/1995 positivou outro instituto apto a abalar a concepção intuitu personae das contratações públicas: os step-in rights, previstos no art. 27-A da Lei Geral de Concessões. Lucas de Moraes Cassiano Sant’Anna e Pedro Romualdo Saullo explanam que step-in right é uma técnica contratual que possibilita a intervenção dos financiadores na sociedade financiada, em momentos de alto risco à continuidade econômica do empreendimento. A cláusula de step-in possibilita, em suas palavras, a assunção pelo financiador do controle direto da sociedade que se encontra em situação de inadimplemento no âmbito do contrato de financiamento[87].
Step in é simplificação da locução step into someone’s shoes[88], isto é, assumir as funções de alguém. Como aponta a dissertação portuguesa de Silva Pedro dos Santos, este mecanismo é utilizado em hipóteses de financiamento de projetos (project finance) para possibilitar que os provedores de recursos financeiros (funders) possam intervir nos empreendimentos financiados e, nessa toada, garantir o reembolso e a remuneração do empréstimo concedido[89]. Prevê o caput do referido art. 27-A da Lei nº. 8.987/1995:
Art. 27-A. Nas condições estabelecidas no contrato de concessão, o poder concedente autorizará a assunção do controle ou da administração temporária da concessionária por seus financiadores e garantidores com quem não mantenha vínculo societário direto, para promover sua reestruturação financeira e assegurar a continuidade da prestação dos serviços.
Trata-se, portanto, de alteração subjetiva na concessão de serviços públicos que sequer advém da pura consensualidade entre o concessionário original e aquele que assume a concessão: este assume a concessão em virtude de inadimplemento das obrigações bancárias do primeiro.
Os parágrafos do art. 27-A normatizam o step-in no contexto dos contratos de concessão sujeitos à Lei nº. 8.987/1995. O instituto não é o foco deste trabalho[90], sendo apenas o exemplo final a reforçar a argumentação pela inexistência de personalismo nas contratações públicas[91].
Assim, destaco que muitas das reflexões desta monografia foram positivadas no tratamento do step-in, quer em relação à anuência da Administração, quer quanto à não exigência licitatória para transferência da concessão por meio do instituto, quer ao não se falar que o instituto consubstancia novo contrato de concessão, até por serem mantidas as condições do contrato original[92].
4.Conclusão.
Este trabalho teve como objeto de estudo um grande dogma ainda persistente no estudo do direito administrativo brasileiro: o personalismo dos contratos públicos, principalmente sua eventual diferenciação ao caráter intuitu personae. Minha ideia não era resolver a questão sobre a admissibilidade da cessão de posição contratual nas avenças do Poder Público – até mesmo por incapacidade temporal. Busquei examinar o instituto à luz dessa característica tida como inerente às contratações públicas.
O objetivo, em outras palavras, era estudar a cessão contratual das avenças públicas com uma lente bem clara. Inclusive, de forma metalinguística, procurei enxergar essa lente sob outro olhar.
Analisando a hipótese formulada na introdução, este trabalho levou-me a duas conclusões centrais: (i) não há personalismo nas contratações públicas brasileiras (no mínimo, para fins de cessão contratual); e, (ii) para os fins de cessão dessas avenças, não há diferença significativa entre contratos personalíssimos e intuitu personae.
Seguem a seguir as conclusões objetivas do texto:
a) Dentre os óbices apontados à cessão de contratos públicos, destaca-se o personalismo dos contratos públicos.
b) Costuma-se entender que os contratos públicos são intuitu personae. Parte da doutrina admite a cessão contratual desses ajustes por diferenciar contratos personalíssimos de contratos intuitu personae.
c) Por mais que sejam conceitos de difícil delimitação, a distinção entre contratos intuitu personae e contratos personalíssimos não se justifica, ao menos para fins de cessão contratual.
d) Os contratos públicos não são intuitu personae.
e) Alguns autores extraem a natureza intuitu personae dos contratos públicos da licitação. Contudo, o argumento não procede, vez que a licitação escolhe propostas, e não sujeitos.
f) Nem mesmo se pode falar que em toda contratação direta existe personalismo. Ainda que sem licitação, não se está necessariamente diante de hipóteses de escolhas subjetivas.
g) O personalismo das contratações públicas brasileiras advém de transposição equivocada do personalismo francês, oriunda das seleções discricionárias feitas na França no início do século XX.
h) Há autores que extraem da mera leitura a contrario sensu do art. 78, VI, da Lei nº. 8.666/1993 a admissibilidade da cessão de contratos públicos. Entretanto, isoladamente, o texto do dispositivo não conduz necessariamente a essa conclusão.
i) Diante da dubiedade do art. 78, VI, da Lei nº. 8.666/1993, sugere-se a alteração de seu texto ou a incorporação de regra que preveja expressamente a cessão contratual.
j) Seja como for, a interpretação sistemática do dispositivo conduz à admissibilidade da cessão de posição contratual em ajustes públicos.
k) A Lei nº. 8.666/1993 prevê outras normas que possibilitam questionar o personalismo dos contratos a ela sujeitos. Dentre eles, destaca-se o art. 30, §10, o art. 64, §2º, e a previsão da subcontratação (art. 72).
l) Além da subcontratação (art. 25, §1º), a Lei nº. 8.987/1995 prevê a subconcessão (art. 26), que separa parte da concessão original e delega-a a outro particular. Opera-se uma concessão dentro da concessão, sem que o subconcedente permaneça nessa relação jurídica. Sua admissibilidade é argumento forte contra o personalismo, vez que a subconcessão do art. 26 da Lei nº. 8.987/1995 é, basicamente, cessão parcial do contrato.
m) A Lei nº. 8.987/1995 previu outro instituto apto a questionar o entendimento do personalismo dos contratos públicos: os step-in rights (art. 27-A).
O tema segue em voga e merece ser acompanhado com olhares atentos e livre de dogmas.
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[1] Como aprofundarei em nota de rodapé no tópico 2, tentei evitar a terminologia “contrato administrativo”, substituindo-a por “contratos públicos” ou “contratações públicas”. Essa escolha de palavras deu-se como forma de conferir amplitude às reflexões deste trabalho, sobretudo por não ver distinção significativa entre “contratos administrativos” e “contratos privados da Administração”, na esteira da multicitada Maria João Estorninho.
[2] Sobre o tema, ver BANDEIRA, Paula Greco. Contrato Incompleto. São Paulo: Atlas, 2015.
[3] A frase costuma ser atribuída à professora de Yale Susan Rose-Ackerman. A assertiva remete ao assim chamado princípio da realidade. Sobre esse princípio, v. MENDONÇA, José Vicente Santos de. O princípio da realidade no Direito Administrativo. Revista Consultor Jurídico, 18 de março de 2011.
[4] Como anotou Alexandre Santos de Aragão, a tese da inconstitucionalidade da cessão de contratos administrativos ignora a realidade contemporânea de grande mobilidade empresarial e societárias das empresas. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Curso de direito administrativo. – 2. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 374.
[5] Em assertiva que me parece aplicável à cessão contratual, até mesmo pelo título de seu livro, Ernesto García-Trevijano Garnica aduz que a subcontratação goza de um importante enraizamento no campo da contratação administrativa, pois a realidade prática demonstra a impossibilidade de se fazer sem essa figura. GARNICA, Ernesto García-Trevijano. La cesión del contrato administrativo. La subcontrátación, Editorial Civitas, Madrid.
[6] Por via das dúvidas, trata-se de alusão à música “Metamorfose Ambulante”, de Raul Seixas, datada de 1973.
[7] ROSILHO, André Janjácomo. As licitações segundo a Lei nº 8.666: um jogo de dados viciados. Revista de Contratos Públicos – RCP, Belo Horizonte, ano 2, n. 2, p. 9-37, set. 2012/fev. 2013; ROSILHO, André Janjácomo. Licitação no Brasil. SBDP-Sociedade Brasileira de Direito Público, 2013.
[8] LEITE, Fábio Barbalho. A licitude da cessão de contrato administrativo. Revista de Direito Administrativo – RDA. Rio de Janeiro, 232, pp. 255-281, Abr.-Jun. 2003. Eis as referências apontadas pelo professor da PUC/SP: MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, Forense, 11. ed., p. 119; Jessé Torres PEREIRA JUNIOR, Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração Pública. Rio de Janeiro, Renovar. p. 459. Conquanto focado na hipótese de concessão de serviço público, por manejar argumentação extensível a outros contratos administrativos essa também parece ser a posição de Celso Antônio BANDEIRA DE MELLO. Curso de Direito Administrativo. São Paulo. Malheiros, 13. ed., 2001, pp. 640-641, posição que se repete na 14ª edição de seu curso, pp. 649-650.
[9] MARQUES NETO, Floriano de Azevedo, in A Cessâo de Contrato Administrativo entre Estado e Município como Alternativa para Evitar a Interrupção de Obras Públicas, in Boletim de Licitações e Contratos. São Paulo, NDJ, ano XIII, n. 3. mar./2000, pp. 146-147.
[10] JUSTEN FILHO, Marçal. Considerações acerca da modificação subjetiva dos contratos administrativos. Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 4, n. 41, maio 2005.
[11] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. – 30.ed. Rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 351.
[12] A título meramente ilustrativo, MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 23. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 189 e PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Comentários à lei das licitações e contratações da administração pública. – 8. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Renovar, 2009. p. 760.
[13] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 27. ed. rev. atual. e ampl. – São Paulo: Atlas, 2014. p. 180.
[14] MOTTA, Eduardo Vianna. Cessão de contrato de obra pública. Doutrinas Essenciais de Direito Administrativo, vol. 4, pp. 1003-1012, Nov/2012.
[15] BIELSA, Rafael. Derecho Administrativo, Ed. Depalma, Buenos Aires, 1955, 5a. ed., tomo II, págs. 355-356. Apud MOTTA, Eduardo Vianna. Cessão de contrato de obra pública. Doutrinas Essenciais de Direito Administrativo, vol. 4, pp. 1003-1012, Nov/2012.
[16] CARRILLO DE ALBORNOZ, Antonio Jiménez-Blanco. La cesión de los contratos administrativos, Poder Judicial, 2ª época, n.º 4, Consejo General del Poder Judicial, Madrid, Diciembre 1986, p. 156, apud DE MATOS, Sara Younis Augusto. Da admissibilidade da cessão da posição contratual e da subcontratação e sua autorização pelo contraente público no contexto das relações jurídico-contratuais administrativas, Mestrado em Direito Administrativo, Vertente de Contratação Pública, sob orientação da professora Maria João Estorninho, Universidade Católica Portuguesa, 2012, p. 25.
[17] REsp 468.189/SP, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/03/2003, DJ 12/05/2003, p. 221. Também reconhecendo o caráter intuitu personae, TJMG, AC nº. 0148040-58.2011.8.13.0079 MG, 9ª Câmara Cível, Rel. Amorim Siqueira, Julgado em 16/12/2014, Publicação 21/01/2015 e TJDFT, APC nº. 0017591-88.2009.8.07.0001 DF, 2ª Turma Cível, Rel. Fátima Rafael, Julgado em 26/02/2014, Publicado em 06/03/2014.
[18] Tratam-se de referências expressas às consagradas (e brilhantes) obras MEDAUAR, Odete. O Direito Administrativo em evolução, 2. ed. São Paulo: RT, 2002 e ARAGÃO, Alexandre Santos de; MARQUES NETO, Floriano de Azevedo (Coord.). Direito administrativo e seus novos paradigmas. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2017.
[19] Na França, esse posicionamento é sustentado por IZORCHE, Marie-Laure. Information et cession de contrat, Recueil Dalloz Sirey, n.º 40, Éditions Dalloz, Paris, 1996, p. 350..
[20] MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Contratos Administrativos: a possibilidade jurídica da sua cessão de titularidade à luz do interesse público. Revista Tributária e de Finanças Públicas, vol. 13/1995, p. 191-214, Out-Dez/1995. Doutrinas Essenciais de Direito Administrativo, vol. 4, pp. 1013-1046, Nov/2012.
[21] CAETANO, Marcello. Manual de Direito Administrativo - tomo I, Rio de Janeiro, Editora Forense, 1970, p. 554.
[22] ARAGÃO, Alexandre Santos de. Curso de direito administrativo. – 2.ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2013, XIII.5.
[23] NOGUELLOU, Rozen. La Transmission des Obligations en Droit Administratif, Librairie Générale de Droit et de Jurisprudence (L.G.D.J), Bibliothèque de Droit Public, Tome 241, Paris, 2004, p. 149.
[24] SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico / atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Priscila Pereira Vasques Gomes – 31. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 1176.
[25] DE MATOS, Sara Younis Augusto. Da admissibilidade da cessão da posição contratual e da subcontratação e sua autorização pelo contraente público no contexto das relações jurídico-contratuais administrativas, Mestrado em Direito Administrativo, Vertente de Contratação Pública, sob orientação da professora Maria João Estorninho, Universidade Católica Portuguesa, 2012, pp. 23-24.
[26] Para Geisa de Assis Rodrigues, a ciência jurídica dedica-se muito ao estudo taxionômico para, talvez, superar um possível complexo de inferioridade em relação às ciências naturais. Em sua opinião, esse esforço deveria ser minorado. RODRIGUES, Geisa de Assis. Ação Civil Pública e Termo de Ajustamento de Conduta, Ed. Forense, Rio de Janeiro, 2002, pp. 139-140. De forma similar, ver CARRIÓ, Genaro R. Notas sobre Derecho y Lenguaje, 4ª ed., Abeledo-Perrot, Buenos Aires, 1990, pp. 101-102. Apud ARAGÃO, Alexandre Santos de. O conceito de serviços públicos no direito constitucional brasileiro. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico. Número 17 – fevereiro/março/abril - 2009 – Salvador – Bahia – Brasil.
[27] REsp 1346171/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 11/10/2016, DJe 07/11/2016.
[28] MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Contratos Administrativos: a possibilidade jurídica da sua cessão de titularidade à luz do interesse público. Revista Tributária e de Finanças Públicas, vol. 13/1995, p. 191-214, Out-Dez/1995. Doutrinas Essenciais de Direito Administrativo, vol. 4, pp. 1013-1046, Nov/2012.
[29] TCU, Acórdão 453/2014, Processo nº 028.923/2010-3, Primeira Câmara, Rel. Walton Alencar Rodrigues, Data da Sessão 11/02/2014.
[30] In RDP 62/122, apud MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Contratos Administrativos: a possibilidade jurídica da sua cessão de titularidade à luz do interesse público. Revista Tributária e de Finanças Públicas, vol. 13/1995, p. 191-214, Out-Dez/1995. Doutrinas Essenciais de Direito Administrativo, vol. 4, pp. 1013-1046, Nov/2012. De forma ainda mais clara, sustenta ALVIM, Arruda. Sucessão em Contrato Administrativo, in Mandado de Segurança e Direito Público, São Paulo, RT, 1995, pp. 311-322, p. 317, apud LEITE, Fábio Barbalho. A licitude da cessão de contrato administrativo e operações similares e o mito do personalismo dos contratos administrativos. In: Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, vol. 232, p. 255-281, Abr./Jun. 2003
[31] BARROS JÚNIOR, Carlos S. de. Contratos Administrativos, São Paulo, Saraiva, 1986. p. 51.
[32] Sobre a noção de grau de vinculação, BINENBOJM, Gustavo. Um novo Direito Administrativo para o século XXI. In: Revista de Direito da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, 1997, p. 58.
[33] Filio-me entre aqueles que acreditam não se tratar de um princípio licitatório, vez que o constituinte – e o legislador – não determinam a licitação como mandado de otimização, mas sim como regra tudo ou nada.
[34] ARAGÃO, Alexandre Santos de. Curso de direito administrativo. – 2.ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2013, XII.1.
[35] Pode-se dizer, que dentro de alguma margem, a modalidade adotada no procedimento licitatório ser o pregão – mais simples – ou concorrência – mais complexa – não torna a contratação personalíssima.
[36] JUSTEN FILHO, Marçal. Considerações acerca da modificação subjetiva dos contratos administrativos. Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 4, n. 41, maio 2005.
[37] MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e parte especial. – 16. ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2014. Seção III, Ponto 40.
[38] DALLARI, Adilson Abreu. Transferência do contrato de concessão. Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 13, n. 156, p. 9-12, dez. 2014.
[39] STJ, REsp nº. 361.736/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Franciulli Netto, julgado em 05/09/2002, publicado em 31/03/2003.
[40] FURTADO, Lucas Rocha. Procedimento da licitação. Fórum de Contratação e Gestão Pública - FCGP, Belo Horizonte, ano 9, n. 99, p. 7-75, mar. 2010.
[41] MENDES, Renato Geraldo; MOREIRA, Egon Bockmann. Inexigibilidade de licitação. Repensando a contratação pública e o dever de licitar. Curitiba: Zênite, 2016. pp. 163-164.
[42] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. – 17. ed. rev., atual. e ampl. 2ª. tir. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016. p. 617.
[43] O professor Alexandre Santos de Aragão agrupa as hipóteses de dispensa de licitação (art. 24 da Lei nº. 8.666/1993) nas seguintes classificações: em razão do valor (incisos I e II) em razão de situações excepcionais (incisos III, IV, V, VI, VII, IX, XI c/c art. 64 § 2o, XIV e XVIII), em razão do objeto (incisos X, XII, XV, XVII, XIX, XXI, XXV, XXVI e XXVII) e em razão da pessoa (VIII, XIII, XVI, XX, XXII e XXIV). Apenas nesta última rubrica haveria necessário personalismo. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Curso de direito administrativo. – 2. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2013, XII.6.2.
[44] SUNDFELD, Carlos Ari. Direito Administrativo para Céticos. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 58.
[45] Renato Geraldo Mendes e Egon Bockman Moreira lecionam que, na França, até a década de 1990, a escolha do particular a ser contratado pela Administração era feita livremente. Isso, para os autores, gerou o caráter personalíssimo do contrato administrativo. MENDES, Renato Geraldo; MOREIRA, Egon Bockmann. Inexigibilidade de licitação. Repensando a contratação pública e o dever de licitar. Curitiba: Zênite, 2016, p. 162.
[46] JUSTEN FILHO, Marçal. Considerações acerca da modificação subjetiva dos contratos administrativos. Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 4, n. 41, maio 2005. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/bid/PDI0006.aspx?pdiCntd=29683>. Acesso em: 3 ago. 2018.
[47] JÈZE, Gaston. Formation, Exécution des contrats administratifs. v. 2. Paris: Marcel Giard Libraire-Editeur, 1932, pp. 213-214.
[48] DUPUIS, Georges; GUÉDON, Marie-José; CHRÉTIEN, Patrice. Droit Administratif. 6. ed. rev. Paris: Armand Colin, 1999, p. 400, apud JUSTEN FILHO, Marçal. Considerações acerca da modificação subjetiva dos contratos administrativos. Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 4, n. 41, maio 2005. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/bid/PDI0006.aspx?pdiCntd=29683>. Acesso em: 3 ago. 2018.
[49] Essa relação também pode ser percebida em JÈZE, Gaston. Formation, Exécution des contrats administratifs. v. 2. Paris: Marcel Giard Libraire-Editeur, 1932, p. 214.
[50] JUSTEN FILHO, Marçal. Considerações acerca da modificação subjetiva dos contratos administrativos. Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 4, n. 41, maio 2005. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/bid/PDI0006.aspx?pdiCntd=29683>. Acesso em: 3 ago. 2018.
[51] RICHER, Laurent. Droit des Contrats Administratifs. 3. ed. Paris: L.G.D.J., 2002, p. 211. No mesmo sentido, BRACONNIER, Stéphane. Droit des Marchés Publics. Paris: Imprimerie Nationale, 2002, p. 277.
[52] PEREZ, Marcos Augusto. Contrato Administrativo. Cessão de contrato. Possibilidade. In Genesis. Revista de Direito Administrativo Aplicado. Curitiba. Genesis, n. 12, jun-mar 1997, pp. 93-105, p. 97. Ver também FREITAS, Rafael Véras de. A subconcessão de serviço público. Revista Brasileira de Infraestrutura – RBINF, Belo Horizonte, ano 5, n. 10, p. 75-101, jul./dez. 2016.
[53] Para o estudo do direito, nunca podem ser desconsiderados os fenômenos socioeconômicos, mas é sempre importante que se leve em conta o contexto normativo da discussão. HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1991. p. 26.
[54] Nada impede que leis novas já tenham suas discussões inauguradas sob a contestação dos dois dogmas examinados neste trabalho. Todavia, preferi direcionar meu estudo às Leis nº. 8.666/1993 e 8.987/1995, até mesmo pela possibilidade de argumentação dialética com os entendimentos consagrados.
[55] SZKLAROWSKY, Leon Frejda. Subcontratação e cessão de contrato administrativo. Revista Tributária e de Finanças Públicas, vol. 23/1998, p. 120 – 131, Abr-Jun/1998.
[56] LEITE, Fábio Barbalho. A licitude da cessão de contrato administrativo e operações similares e o mito do personalismo dos contratos administrativos. In: Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, vol. 232, p. 255-281, Abr./Jun. 2003.
[57] SZKLAROWSKY, Leon Frejda. Subcontratação e cessão de contrato administrativo. Revista Tributária e de Finanças Públicas, vol. 23/1998, p. 120 – 131, Abr-Jun/1998.
[58] NEVES, A. Castanheira. Enciclopédia verbo da sociedade e do estado: interpretação jurídica. Lisboa/São Paulo: Verbo, 1985. v. 3, p. 658; MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. - 20. ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 99.
[59] MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. - 20. ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 199.
[60] Caso seja a cessão considerada como inexecução total ou parcial do contrato, poderiam incidir as sanções do art. 87 da Lei.
[61] TCU, Acórdão 2052/2016, Processo nº 020.052/2016-2, Plenário, Rel. Raimundo Carreiro, Julgado em 10/08/2016; TCU, Decisão n. 420/2002 – Plenário.
[62] Disponível em: <http://www.base.gov.pt/mediaRep/inci/files/base_docs/CCPTextoconsolidadojan2016.pdf>. Acesso em 24 nov. 2018.
[63] Conforme escrito no art. 316.º, os artigos seguintes estabelecem regulamentação desse procedimento, elencando hipóteses em que não se pode realizar a cessão (art. 317.º), limites à previsão contratual (art. 318.º) e etc.
[64] GRAU, Eros Roberto. Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do Direito. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 113.
[65] “Art. 30 (...). § 10. Os profissionais indicados pelo licitante para fins de comprovação da capacitação técnico-operacional de que trata o inciso I do § 1º deste artigo deverão participar da obra ou serviço objeto da licitação, admitindo-se a substituição por profissionais de experiência equivalente ou superior, desde que aprovada pela administração”.
[66] JUSTEN FILHO, Marçal. Considerações acerca da modificação subjetiva dos contratos administrativos. Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 4, n. 41, maio 2005. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/bid/PDI0006.aspx?pdiCntd=29683>. Acesso em: 3 ago. 2018.
[67] JUSTEN FILHO, op. cit.
[68] PEREIRA JUNIOR. Comentários à Lei de licitações e contratações da administração pública 5. ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 692, apud FONTOURA FILHO, Athayde. A subcontratação nos contratos decorrentes de inexigibilidade de licitação. Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 5, n. 60, dez. 2006.
[69] Na subcontratação, preserva-se o vínculo jurídico entre subcontratante e Administração Pública. Isto é: por mais que materialmente aquela fração do contrato esteja a cargo de terceiro, o contratante original segue juridicamente responsável pela obrigação em face do Poder Público. Ademais, pelo limite fixado no art. 72 da Lei nº. 8.666/1993, alguma parte do contrato seguirá em execução direta do contratante original, que não pode subcontratar a integralidade do objeto.
[70] É o entendimento, por exemplo, de MUKAI, Toshio. Licitações e contratos públicos. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 120, apud FREITAS, Rafael Véras de. O regime jurídico do ato de transferência das concessões: um encontro entre a regulação contratual e a extracontratual. Revista de Direito Público da Economia – RDPE, Belo Horizonte, ano 13, n. 50, p. 167-196, abr./ jun. 2015.
[71] “Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.
Parágrafo único. A lei disporá sobre:
I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão;
II - os direitos dos usuários;
III - política tarifária;
IV - a obrigação de manter serviço adequado”.
[72] WALD, Arnoldo. Do regime jurídico da concessão e da subconcessão para prestação de serviços públicos de saneamento básico no município X. Pareceres: Direito das Concessões, v. 3 – Rio de Janeiro: América Jurídica, 2004. p. 293.
[73] Adotada concepção de serviços públicos não amplíssima, em que pese eventuais controvérsias doutrinárias, são atividades que o legislador previu como especiais aos interesses da sociedade, vinculando-se (para alguns autores) à própria garantia de direitos fundamentais prestacionais. Daí serem mais sensíveis que os contratos públicos em geral. Sobre o tema e as discussões inerentes à qualificação dos serviços públicos, ver ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos serviços públicos. 4. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2017.
[74] “Art. 25. Incumbe à concessionária a execução do serviço concedido, cabendo-lhe responder por todos os prejuízos causados ao poder concedente, aos usuários ou a terceiros, sem que a fiscalização exercida pelo órgão competente exclua ou atenue essa responsabilidade.
§ 1º Sem prejuízo da responsabilidade a que se refere este artigo, a concessionária poderá contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço concedido, bem como a implementação de projetos associados.
§ 2º Os contratos celebrados entre a concessionária e os terceiros a que se refere o parágrafo anterior reger-se-ão pelo direito privado, não se estabelecendo qualquer relação jurídica entre os terceiros e o poder concedente.
§ 3º A execução das atividades contratadas com terceiros pressupõe o cumprimento das normas regulamentares da modalidade do serviço concedido”.
[75] JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. – São Paulo: Dialética, 2003. pp. 133-134.
[76] Conforme mencionei ao fim do último subtópico, há autores que defendem a impossibilidade de subcontratação à luz do personalismo das contratações públicas. Dentre os que criticam a concepção personalista de contratação pública, Adilson Abreu Dallari, como eu, entende que a subcontratação enfraquece esse personalismo, v. DALLARI, Adilson Abreu. Transferência do contrato de concessão. Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 13, n. 156, p. 9-12, dez. 2014.
[77] WALD, Arnoldo. Do regime jurídico da concessão e da subconcessão para prestação de serviços públicos de saneamento básico no município X. Pareceres: Direito das Concessões, v. 3 – Rio de Janeiro: América Jurídica, 2004. p. 296.
[78] Essa é a posição de Marçal Justen Filho. Segundo o professor, a subconcessão propriamente dita envolveria a transferência da execução da concessão, mantendo-se o vínculo entre subconcedente e Administração Pública (poder concedente), em situação mais próxima da subcontratação. JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. – São Paulo: Dialética, 2003. p. 526.
[79] JUSTEN FILHO, op. cit. p. 519.
[80] A diferença entre os dispositivos reverbera no tratamento doutrinário da questão. Em relação à Lei nº. 8.987/1995, os professores quase unanimemente entendem pela admissão da transferência da concessão. Por todos, ver DALLARI, Adilson Abreu. Transferência do contrato de concessão. Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 13, n. 156, p. 9-12, dez. 2014.
[81] Conforme afirmou recentemente o Ministro Luís Roberto Barroso, silêncio eloquente significa que, ao não se dizer, há manifestação ativa. BARROSO, Luís Roberto. Conversas acadêmicas: Luís Roberto Barroso. Portal Os Constitucionalistas. Disponível em: <http://www.osconstitucionalistas.com.br/conversas-academicas-luis-roberto-barroso-i>. Acesso em 27 nov. 2018. Ver também MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. – 20. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 170; LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 3. ed. tradução de José Lamego, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa: 1997. p. 525.
[82] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública, 3ª ed., Ed. Atlas, 1999, p. 105.
[83] SOARES, Humberto Ribeiro. A Constitucionalidade e a Transferência de Concessão (O Art. 27 da Lei nº 8.987, de 13/2/95), in Revista Ibero Americana de Direito Público – RIADP, vol. 1, 2000, Ed. América Jurídica, pp. 116-117.
[84] GABARDO, Emerson; VALIATI, Thiago Priess. A prática de subconcessão promovida por concessionárias de serviços públicos de radiodifusão sonora e de sons e imagens – “Aluguel” de horários para televendas e programas religiosos. A&C – Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, ano 14, n. 57, p. 85-103, jul./set. 2014.
[85] MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. Da subconcessão e da transferência da concessão ou do controle societário da concessionária e o seu reflexo no contrato administrativo. Disponível em: <http://www.gomesdemattos.com.br/artigos/da_subconcessao_e_da_transferencia_da_concessao.pdf>. Acesso em: 26/11/2018.
[86] Também assim se posiciona WALD, Arnoldo; MORAES, Luiza Rangel de; e WALD, Alexandre de M. O Direito e a Lei de Concessões, 1996, RT, p. 146.
[87] CASSIANO, Sant’Anna Lucas de Moraes; SAULLO, Pedro Romualdo. Step-in rights e o regime da administração temporária no âmbito da Lei de Concessões. Revista Brasileira de Direito Público – RBDP, Belo Horizonte, ano 13, n. 49, p. 41-52, abr./jun. 2015.
[88] DOS SANTOS, Silva Pedro. Os direitos de step-in na Lei das Parcerias Público Privadas de Angola. Mestrado em Direito Administrativo. Vertente de Contratação Pública e Direito Público Empresarial. Orientado pelo Dr. Bernardo Diniz de Ayala. Universidade Católica Portuguesa, Faculdade de Direito. Lisboa, agosto de 2013. p. 6; ENEI, José Virgílio Lopes. Project Finance: financiamento com foco em empreendimentos: parcerias público-privadas, leveraged buy-outs e outras figuras afins. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 235.
[89] DOS SANTOS, Silva Pedro. op. cit.. pp. 6-7.
[90] Sobre o tema, ver, dentre outros, DOS SANTOS, Silva Pedro. Os direitos de step-in na Lei das Parcerias Público Privadas de Angola. Mestrado em Direito Administrativo. Vertente de Contratação Pública e Direito Público Empresarial. Orientado pelo Dr. Bernardo Diniz de Ayala. Universidade Católica Portuguesa, Faculdade de Direito. Lisboa, agosto de 2013 e CASSIANO, Sant’Anna Lucas de Moraes; SAULLO, Pedro Romualdo. Step-in rights e o regime da administração temporária no âmbito da Lei de Concessões. Revista Brasileira de Direito Público – RBDP, Belo Horizonte, ano 13, n. 49, p. 41-52, abr./jun. 2015.
[91] Questionando sobre a natureza intuitu personae dos contratos públicos, Renato Geraldo Mendes e Egon Bockmann Moreira alertam para sua incompatibilidade com os step-in-rights. MENDES, Renato Geraldo; MOREIRA, Egon Bockmann. Inexigibilidade de licitação. Repensando a contratação pública e o dever de licitar. Curitiba: Zênite, 2016, p. 164.
[92] “Art. 27-A (...).
§ 1o Na hipótese prevista no caput, o poder concedente exigirá dos financiadores e dos garantidores que atendam às exigências de regularidade jurídica e fiscal, podendo alterar ou dispensar os demais requisitos previstos no inciso I do parágrafo único do art. 27.
§ 2o A assunção do controle ou da administração temporária autorizadas na forma do caput deste artigo não alterará as obrigações da concessionária e de seus controladores para com terceiros, poder concedente e usuários dos serviços públicos”. (...).
graduado na UERJ - Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Daian Mendes Borges da. Personalismo à francesa? Cessão de contratos administrativos e seu caráter intuitu personae Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 mar 2023, 04:21. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/61170/personalismo-francesa-cesso-de-contratos-administrativos-e-seu-carter-intuitu-personae. Acesso em: 23 dez 2024.
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