O Código Penal define o crime de furto como a subtração de coisa alheia móvel, fato que ocorre frequentemente nas grandes cidades do nosso país. Na seara condominial, o tema repercute na questão da responsabilidade do condomínio pelo evento ocorrido. De um lado o condômino furtado que deseja ser ressarcido pelo condomínio, e de lado oposto, o restante dos condôminos que não querem dividir o prejuízo. Então, até onde vai a responsabilidade do condomínio? Há obrigatoriedade em indenizar?
Inicialmente, cabe esclarecer que a temática se refere a direito patrimonial, portanto, totalmente disponível. Ou seja, as partes envolvidas, no caso, os condôminos, podem deliberar sobre o tema decidindo da forma que melhor lhes aprouver, razão pela qual é fundamental analisar a Convenção e o Regimento Interno do condomínio. A princípio, se esses documentos contiverem cláusula expressa no sentido de não indenizar, qualquer dano resultante de furto na área comum, o condomínio ficaria isento de tal responsabilidade, sendo que o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça é de que o condomínio só deve responder por furtos em áreas comuns se a Convenção expressamente prever esse dever de reparação.
Dessa forma, nas hipóteses em que a Convenção for omissa, não existe fundamento jurídico para impor ao condomínio a obrigação indenizatória, pois não é correto afirmar que ele poderia assumir de forma implícita a obrigação de guarda de bens perante os condôminos. Muito menos aceitar que a responsabilidade do condomínio decorreria da simples situação condominial que traz o dever de guarda e vigilância restrito aos padrões médios da possibilidade e razoabilidade. Não podendo significar que o condomínio, automaticamente, em razão da sua existência, seja responsabilizado por todos os danos que ocorrem no prédio.
Nesse sentido, o condomínio só responderia por furto ou roubo em suas áreas comuns se existisse cláusula expressa na Convenção ou Regimento Interno quando assume a responsabilidade contratual, eis que resultante do acordo de vontades entre os condôminos, sendo imprescindível que no momento da assinatura da Convenção os condôminos estejam cientes do dever assumido. De fato, sem a manifestação expressa dos condôminos não há fundamento jurídico para se responsabilizar o condomínio quando nenhuma obrigação assume perante os condôminos relativamente à guarda de veículos e seus acessórios.
A questão torna-se polêmica quando o condomínio com a deliberação dos condôminos implementa medidas complementares de segurança, bem como disponibiliza medidas de proteção além dos padrões normais de segurança. Parte da doutrina e jurisprudência entende que quando o condômino é onerado no rateio mensal dos custos do condomínio com valores referentes à segurança (vigilantes, câmaras de vigilância e outros artefatos que visem maior segurança ao condomínio), então surge para o condômino o direito ao ressarcimento.
Nesses casos alguns entendem que, implicitamente, o condomínio obrigou-se a propiciar segurança aos condôminos, indicando o desejo por maiores garantias, além de que restaria aos condôminos o direito à contraprestação pelos valores pagos oriundos da implementação e manutenção com os cuidados extras de segurança, momento em que o condomínio estaria assumindo o dever de vigilância, decorrendo então, a obrigação de indenizar ocorrendo o evento danoso.
Em sentido contrário, outros doutrinadores e boa parte da jurisprudência entende que o condomínio não pode ser responsabilizado por fatos ilícitos ocorridos em detrimento dos condôminos, unicamente em razão de implementar reforços na segurança do prédio. Afinal, a indenização pelos prejuízos experimentados por um dos condôminos implicaria em onerar os demais proprietários, o que somente seria possível se decorresse de expressa anuência destes. Razão pela qual seria necessária cláusula na Convenção do condomínio ou Regimento Interno prevendo a reparação.
Outro argumento para defender a não responsabilização do condomínio seria também porque trata-se de uma obrigação de meio, ou seja, o condomínio só é responsável pelos meios de execução dos serviços não podendo garantir o resultado, por isso, mesmo que o condomínio possua empregados encarregados e especializados em vigilância interna, realizando ronda noturna, ainda sim, não se poderia responsabilizar o condomínio, pura e simplesmente.
Para que subsistisse algum dever de indenizar pelo condomínio, seria necessário que, além de ter assumido, por deliberação dos condôminos, o dever de guarda e vigilância, nas áreas comuns, tenha ocorrido o evento danoso por culpa dos funcionários ou do síndico. Se não ficar caracterizada a ocorrência de negligência, imprudência ou imperícia na execução dos serviços não seria possível cobrar do condomínio qualquer indenização.
Por isso, ainda que assumida a obrigação de guarda e vigilância nas áreas comuns, através da implementação de medidas extras visando a segurança dos condôminos, o condomínio só poderia ser responsabilizado se o síndico ou os funcionários do condomínio, ainda que terceirizados, tenham agido com culpa no cumprimento desse dever.
O fundamento para responsabilizar o condomínio pelos atos dos funcionários do condomínio ou de empresa terceirizada que agem de forma negligente ou de qualquer outro modo concorrem ao evento danoso, reside no fato da responsabilização pela escolha, pois entende-se que houve culpa in elegendo, ou seja, ocorreu uma falha na seleção dos empregados ou administradores. Caso o condomínio terceirize a função de segurança é possível minimizar os efeitos do dano se a empresa contratada tiver seguro para tais eventualidades.
Outro tema recorrente é o furto de bicicleta, que também está submetido às mesmas considerações expostas neste artigo. O diferencial ocorre quando as bicicletas são depositadas em local específico cuja chave fica em poder exclusivo de funcionário do condomínio. Neste caso incide o dever de indenizar, pois este seria o único com acesso ao mobiliário, assumindo a guarda dos bens e o condomínio, por sua vez, é responsável pelos seus funcionários.
Ainda existe certa confusão por alguns condôminos que invocam a aplicação do Código de Defesa do Consumidor para exigir do condomínio a reparação pretendida, mas é importante esclarecer que não há relação de consumo entre os condôminos e sim uma relação de co-propriedade.
Portanto se a convenção aprovada por dois terços dos condôminos dispor que o condomínio não irá indenizar os condôminos por danos ocorridos nas áreas comuns, essa cláusula de não indenizar é válida, legal e, uma vez estabelecida, mesmo que existente um esquema de segurança e vigilância, não subsiste respaldo jurídico para responsabilizar o condomínio, pois não se pode descaracterizar a manifestação livremente pactuada pelos condôminos que manifestaram sua vontade.
Por fim, vale ressaltar a importância da Convenção e Regimento Interno para prevenir os condôminos de futuros problemas com ressarcimentos e indenizações decorrentes de furto em área comum. Se o condomínio não quiser ser responsabilizado por eventuais danos a bens de condôminos em área comum é importante que a Convenção seja expressa em tal restrição, pois a cláusula excludente de responsabilidade é lícita e representa a vontade dos co-proprietários em não indenizar eventuais prejuízos suportados pelos condôminos ou terceiros.
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