RESUMO
Discute a colisão dos princípios constitucionais diante da Suspensão de Segurança no âmbito recursal. Analisa a polêmica questão da constitucionalidade deste instituto.
Palavras-chave: Suspensão de Segurança. Colisão de Princípios. Constitucionalidade.
ABSTRACT
Discusses the impact of the constitutional principles before the suspension of Security of appellate. Analyzes the controversial question of the constitutionality of the institute.
Keywords: Suspension of Security. Collision of Principles. Constitutionality.
SUMÁRIO: Resumo - 1 Introdução – 2 Breve comentário sobre o Mandado de Segurança – 3 Suspensão de Segurança – 3.1 Natureza Jurídica – 3.2 Legitimidade e Competência 4 Questionamentos Constitucionais sobre a Suspensão de Segurança 5 Considerações Finais – Referências.
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho abordará sobre um instituto da suspensão de segurança, criada pelo art. 4º da Lei 4.348/64.
Esse dispositivo citado remete uma possibilidade de que as pessoas jurídicas de direito público possam suspender os efeitos de liminares ou sentenças em Mandado de Segurança, para evitar “grave lesão à ordem, saúde, segurança e economia pública”. Sendo assim, a decisão judicial (interlocutória ou sentença) que concede segurança a uma pessoa ofendida por autoridade pública pode ser cassada, com base nesse instituto.[1]
Com o intuito de verificar a constitucionalidade este deste instituto no âmbito recursal, este trabalho discorrerá sobre alguns tópicos relevantes importantes para o melhor entendimento do assunto em questão, dentre eles o Mandado de Segurança, as peculiaridades da Suspensão de Segurança, o choque de princípios fundamentais, dentre outros.
2 BREVE COMENTÁRIO SOBRE O MANDADO DE SEGURANÇA
Torna-se necessário abordarmos antes de qualquer coisa o Mandado de Segurança, (suas origens e finalidades) para que se possa melhor compreender a sua suspensão, objeto principal deste trabalho.
O Mandado de Segurança teve sua origem no direito mexicano, com o chamado juicio de amparo e visava garantia ao cidadão que fosse lesado por ato abusivo do Estado a proteção judicial. Sentindo-se vítima do poder estatal, este poderia recorrer às vias judiciais para que pudesse ser reparar a injustiça, de modo mais célere e eficaz que num processo comum.[2]
Vale ressaltar que desde a Constituição Federal de 1988, o mandado de segurança pode ser intentado por aqueles que possuem direito “líquido e certo” (art. 5º, LXIX) não amparado por habeas corpus ou habeas data.
Pode-se assim apontar os quatros requisitos identificadores do mandado de segurança: ato comissivo ou omissivo de autoridade praticado pelo Poder Público ou por particular decorrente de delegação do Poder Público; ilegalidade ou abuso de poder; lesão ou ameaça de lesão e caráter subsidiário: proteção ao direito líquido e certo não amparado por habeas corpus ou habeas data.[3]
Desse modo o particular teria uma garantia fundamental para exercer o direito que lhe é legalmente conferido. Como tal, a lei lhe concede tratamento especial, distinto daqueles direitos ordinários regidos na legislação civil, pois não se compara um direito líquido e certo a um direito controverso e passível de provas.
Dessa forma é que a Lei do Mandado de Segurança (Lei Federal 1.533/51) confere ao Mandado a sua auto-executoriedade imediata, independente de trânsito em julgado (art. 12, parágrafo único). Isto porque de nada adiantaria o legislador constituinte prever uma série de direitos se esse não pudessem se materializar no plano fático, virando o que popularmente se conhece por “letra morta”, que é o direito desmoralizado pelo seu não-cumprimento.
Alçado a essa condição de garantia fundamental, o Mandado de Segurança é tão vital para a democracia quanto os direitos que visa resguardar.[4]
3 SUSPENSÃO DE SEGURANÇA
A suspensão de segurança encontra-se prevista no art. 4º da Lei assim previsto:
“Quando, a requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, o Presidente do Tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso (VETADO) suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar, e da sentença, dessa decisão caberá agravo, sem efeito suspensivo no prazo de (10) dez dias, - (agora são 05 dias – Lei 8437/92) - contados da publicação do ato”.
O pedido de suspensão cabe em todas as hipóteses em que se concede provimento de urgência contra a Fazenda Pública ou quando a sentença contém efeitos imediatos, por ser impugnada por recurso desprovido de efeito suspensivo.[5]
A exemplo da legislação referente ao mandado de segurança, o pedido de suspensão foi estendido à ação civil pública, às medidas cautelares e à tutela antecipada, respectivamente através das Leis nº. 7.437/85, 8.437/92 e 9.494/97.
Assim, todas as medidas de urgência contra o Poder Público comportam a possibilidade de suspensão da medida pelo presidente do tribunal, mediante requerimento da pessoa jurídica de direito público interessada.[6]
3.1 NATUREZA JURÍDICA
A doutrina controverte sobre a natureza jurídica do instituto.
Sobre a Suspensão de Segurança, faz o resumo da posição doutrinária tratar-se de: “ato de caráter administrativo” exercido pelo Presidente do Tribunal; consideram o pedido de suspensão como recurso; consideram que se trata de incidente processual; sucedâneo recursal; natureza cautelar, forte na instrumentabilidade e provisoriedade.[7]
A jurisprudência, embora se encontre julgados prestigiando a tese de que se trata de um recurso (1ª Turma do STJ, REsp. 175360/DF, DJ 09-11-98, p. 33) registra freqüentes entendimentos que esposam a tese de tratar-se de incidente processual (2ª Turma do STJ, REsp. 46405, DJ 22-09-97, REsp. 120.530/SP, DJ 22-09- 97).[8]
O STF tem prestigiado a corrente que atribui natureza cautelar ao pedido de suspensão (Suspensão de Segurança 228, Rel. Min. Rafael Mayer, RTJ 125/904), o Min. Sepúlveda Pertence, (AGRSS 846-3/DF) outorga à decisão suspensiva natureza de contracautela. Tomando posição na discussão, parece ser mais acertado o entendimento de que se trata de incidente processual de contracautela,[9] voltado a subtrair da decisão de sua eficácia. No seu âmbito não se examina o mérito da controvérsia principal, apreciando- se, apenas a ocorrência de lesão a interesses públicos relevantes.[10]
3.2 LEGITIMIDADE E COMPETÊNCIA
Quanto à questão da legitimidade para propor a Suspensão de Segurança a lei não é suficientemente clara. O texto legal (art. 4º da Lei 4.348/64) menciona a expressão “pessoa jurídica de direito público interessada”. Há na doutrina quem afirme que não só as pessoas jurídicas, mas também os órgãos públicos e as pessoas e órgãos de direito privado que suportam a ação civil de segurança são legítimas para propor a suspensão.
Obviamente deve-se interpretar a lei de modo que todas as pessoas suscetíveis de sofrer a ação de Mandado de Segurança possam requerer a suspensão. Há quem defenda até que mesmo a pessoa jurídica de direito público não atingida, mas direta ou indiretamente interessada no feito possa ingressar com o pedido. Todavia, falham aqueles que afirmam que os órgãos públicos não podem ser partes legítimas porque simplesmente não têm personalidade jurídica. Assim, não têm a capacidade postulatória exigida pelo Código de Processo Civil para atuar em juízo (art. 7º do CPC), de sorte que somente a pessoa jurídica de direito público à qual está vinculado o órgão (União, Estado-membro, Distrito Federal ou Município) é que tem legitimidade para intentar o pedido de suspensão.[11]
Em se tratando da competência para o conhecimento do pedido de Suspensão de Segurança está explícita no art. 4º da Lei 4.348/64: é do Presidente do Tribunal esta tarefa ao qual caiba conhecer recurso em sede de Mandado de Segurança. Por exemplo, se este tramita no primeiro grau da Justiça Estadual, será de competência do Presidente do Tribunal de Justiça que conhecer o pedido. Do mesmo modo, se a ação é de competência da Justiça Federal, a Suspensão será analisada pelo Presidente do respectivo TRF, e assim por diante.[12]
4 QUESTINAMENTOS CONSTITUCIONAIS SOBRE A SUSPENSÃO DE SEGURANÇA
É quase que impossível discorrer sobre Suspensão de Segurança e não discutir sobre a questão mais controversa e talvez mais interessante que circunda este instituto: sua constitucionalidade.
Segundo o renomado doutrinador Scarpinella Bueno a polêmica questão sobre a constitucionalidade da Suspensão de Segurança inicia-se pela sua própria natureza. Segundo o doutrinador, o instituto tem como finalidade de minimização dos efeitos salutares e democráticos do Mandado de Segurança, o que, em última instância, é uma agressão ao cidadão lesado. Nesse sentido torna-se necessário trazer à tona sua doutrina:
“Se o que o mandado de segurança tem de mais caro é sua predisposição constitucional de surtir efeitos imediatos e favoráveis ao impetrante, seja liminarmente ou a final, a mera possibilidade da ‘suspensão de segurança’ coloca em dúvida a constitucionalidade do instituto. Em verdade, tudo aquilo que for criado pelo legislador infraconstitucional para obstaculizar, dificultar ou empecer a plenitude da eficácia do mandado de segurança agride sua previsão constitucional. Nesse sentido, não há como admitir a constitucionalidade do instituto, independente de qual seja sua natureza jurídica. É instituto que busca minimizar efeitos do mandado de segurança? Positiva a resposta, trata-se de figura inconstitucional”.[13]
Como toda tese possui sua antítese existem também defensores da Suspensão de Segurança como um meio de garantir a supremacia do interesse público sobre o privado, o que parece ser o grande trunfo daqueles que se filiam a esta corrente.
Uma importante discussão é então suscitada (sobre a constitucionalidade de um instrumento legalmente previsto) na qual dois princípios da Constituição se colidem: primeiro, o princípio da garantia dos direitos fundamentais, que afirma ser a Suspensão de Segurança inconstitucional por violar uma garantia fundamental dos cidadãos – o Mandado de Segurança – sem que para tanto seja necessário um recurso próprio (que seria o agravo no caso de liminar ou apelação no caso de sentença); por outro lado, alega-se o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, de modo a garantir o bem-estar de todas em detrimento da minoria.[14]
Porém é notório que baseado no caput do art. 5º da Constituição que trata do princípio da isonomia quando diz “todos são iguais perante a lei”, a questão da Suspensão de Segurança coloca-se como uma afronta a tal direito uma vez que baseado no princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, este se encontrará sempre em desvantagem.
Embora possamos reconhecer que o interesse público supere o interesse privado, não se pode esquecer que o Mandado de Segurança parte de um pressuposto essencial: o de que o particular é não se encontra no mesmo patamar da Administração o que mostra a fragilidade daquele que possui uma possibilidade ou de fato um direito lesado por esta Instituição.
O Mandado de Segurança (e via de conseqüência a sentença ou interlocutória que o concede em definitivo ou liminarmente) visa exatamente corrigir essa desproporcionalidade que ocorre freqüentemente. O remédio constitucional parte dessa premissa inafastável: a de que o Poder Público, utilizando-se de seu império, cometeu uma injustiça.[15]
O princípio do devido processo legal previsto na nossa Carta Magna é aqui citado como mais uma forma de garantir o direito individual frente a uma ameaça de atos do Poder Público, sendo uma ferramenta fundamental para a realização e defesa das liberdades públicas e das garantias individuais, tanto no aspecto processual, quanto no que tange à sua função de controle da razoabilidade das normas e dos atos do Poder Público.
Assim como o princípio do devido processo legal deve-se ressaltar também princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional é premissa básica do devido processo legal, e trata de garantir a todos uma tutela jurisdicional justa, efetiva e adequada às soluções dos litígios que se apresentam em sociedade.
Não são poucos os argumentos que pesam contra a constitucionalidade do instituto aqui tratado, porém o que nos parece mais contundente é o que se encontra inserido no art. 60, § 4º, IV: trata-se de uma cláusula pétrea. Segundo o mencionado dispositivo, é vedada a deliberação, pelo Congresso Nacional, sobre qualquer proposta de Emenda Constitucional tendente a abolir os direitos e garantias fundamentais.
Diante de tais argumentos, ressalta-se aqui o sábio posicionamento de Colares:
“[...] a Suspensão de Segurança é inadmissível sob o seguinte ângulo: se uma Emenda Constitucional, norma hierarquicamente superior à lei ordinária, uma vez que exige aprovação de três quintos dos membros do Legislativo, não pode sequer deliberar (quanto mais aprovar) uma norma que tenda a abolir direitos e garantias individuais, como é possível que uma lei ordinária o faça? Se a própria Emenda seria inconstitucional, então o art. 4º da Lei 4.348/65 também o é”.[16]
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
É diante dessas considerações apresentadas que se considera inconstitucional a Suspensão do Mandado de Segurança uma vez que as razões que o legitimam contradizem direitos fundamentais do cidadão, o que é vedado expressamente pela Constituição.
Compartilhando da mesma idéia diz Scarpinella Bueno: “não há como admitir a constitucionalidade do instituto, independente de qual seja sua natureza jurídica. É instituto que busca minimizar efeitos do mandado de segurança? Positiva a resposta, trata-se de figura inconstitucional”.
REFERÊNCIAS
BRANDÃO, Flávia Monteiro de Castro. “A suspensão das medidas de urgência nas ações contra o Poder Público à luz do devido processo legal”. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo: Dialética, 2003, n. 4, p.30.
BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de Segurança. São Paulo, Saraiva, 2002.
COLARES, Samuel Miranda. Suspensão de Segurança. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/x/22/30/2230/>Acesso em: 18 out. 2007.
DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. v.3. 4.ed. ver.amp e atual. Jus Podvim: Salvador: 2007.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
TESSLER, Marga Inge Barth, Suspensão de Segurança. Disponível em: <http://www.trf4.gov.br/trf4/upload/arquivos/curriculo_juizes/suspensao_de_seguranca.pdf >Acesso em: 18 out. 2007.
[1] COLARES, Samuel Miranda. Suspensão de Segurança. Disponível em: < http://www.direitonet.com.br/artigos/x/22/30/2230/>Acesso em: 18 out. 2007.
[2] COLARES, Samuel Miranda. Suspensão de Segurança. Disponível em: < http://www.direitonet.com.br/artigos/x/22/30/2230/>Acesso em: 18 out. 2007.
[3] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
[4] Op. cit.
[5] DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. v.3. 4.ed. ver.amp e atual. Jus Podvim: Salvador: 2007.
[6] BRANDÃO, Flávia Monteiro de Castro. “A suspensão das medidas de urgência nas ações contra o Poder Público à luz do devido processo legal”. Revista Dialética de Direito Processual. São Paulo: Dialética, 2003, n. 4, p.30.
[7] Idem.
[8] TESSLER, Marga Inge Barth, Suspensão de Segurança. Disponível em: <http://www.trf4.gov.br/trf4/upload/arquivos/curriculo_juizes/suspensao_de_seguranca.pdf >Acesso em: 18 out. 2007.
[9] Op. cit.
[10] CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Jurisprudência Sistemática. RT-813. jul.03-92º ANO.
[11] COLARES, Samuel Miranda. Suspensão de Segurança. Disponível em: < http://www.direitonet.com.br/artigos/x/22/30/2230/>Acesso em: 18 out. 2007.
[12] Op. cit.
[13] BUENO, Cássio Scarpinella. Mandado de Segurança. São Paulo: Saraiva, 2002.
[14] COLARES, Samuel Miranda. Suspensão de Segurança. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/x/22/30/2230/>Acesso em: 18 out. 2007.
[15] Idem.
[16] COLARES, Samuel Miranda. Suspensão de Segurança. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/x/22/30/2230/>Acesso em: 18 out. 2007.
Acadêmica de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco (UNDB) e Bacharel em Fisioterapia pela Faculdade Santa Terezinha (CEST).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: JESUS, Silmenne Natalie Gomes de. Suspensão de segurança: uma afronta aos direitos fundamentais do particular Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 jan 2010, 08:35. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/19102/suspensao-de-seguranca-uma-afronta-aos-direitos-fundamentais-do-particular. Acesso em: 22 nov 2024.
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