Hodiernamente, em todo o mundo, a aplicação das “penas alternativas” ou restritivas de direitos avança, porque elas atendem melhor aos anseios de prevenção da criminalidade e de restauração da convivência respeitosa entre as pessoas com a devida responsabilidade social.
Quanto aos critérios legais, podem ser aplicadas às penas alternativas as pessoas que cometeram delitos sem violência ou grave ameaça, com sentença de até quatro anos - nos crimes dolosos (com intenção) – e nos crimes culposos (sem intenção), de acordo com alguns critérios: antecedentes criminais, conduta social e grau de culpabilidade, dentre outros.
As penas e medidas alternativas permitem aos cumpridores a manutenção de suas atividades profissionais e o contato com a família, amigos e comunidade. Como consequência, desaparece o problema da ressocialização, diminui a estigmatização que persegue os “ex-presidiários” e preserva os apenados dos malefícios do cárcere. Por estas razões e pelo acompanhamento individualizado da equipe pluridisciplinar (psicólogo, assistente social e advogado) os índices de reincidência são muito menores, em torno de 2% a 12%, que os das penas privativas de liberdade (prisão), que varia entre 70% a 85% (GOMES, 2008).
As Penas Alternativas existem no Brasil desde 1984. De acordo com a Lei nº 9.714/98, as penas alternativas (restritivas de direitos) são: prestação pecuniária, perda de bens e valores, prestação de serviço à comunidade ou entidades públicas, interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana. As penas alternativas (substitutivas) têm como característica principal a aplicação destas ao invés da pena privativa de liberdade (prisão), quando estejam presentes, em cada caso analisado pelo Juiz, as exigências descritas na Lei. Tais penas têm respaldo em diversas leis, além de comprovadamente alcançarem maiores níveis de eficácia, reforçada pela estrutura de monitoramento das Centrais e Núcleos de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas Alternativas.
Nos ensinamentos de Machado (2007):
Apesar de a pena restritiva de direitos atingir o prestígio que a pessoa em questão detém, ela visa, implicitamente, proteger a dignidade da pessoa humana, principio fundamental esculpido na Constituição Federal, que observa a necessidade de proporcionar a estes condições para uma vida digna, com destaque para o aspecto econômico.
Outro ponto a ser destacado se refere à questão da efetividade das penas alternativas está atrelada a uma estrutura de monitoramento.
Com relação à mecânica de cumprimento e fiscalização das penas restritivas de direitos Neves (2008, p.213) destaca que,
Ainda que as penas restritivas de direitos sejam bem aplicadas pelos juízes, sem que se cuide de seu cumprimento por parte dos apenados, estariam, sem sombra de dúvidas, destinadas ao fracasso. Ademais, triunfaria alta e certeira a voz da mídia, sentenciando a vigência da impunidade.
Por outro lado, a criação de uma estrutura de monitoramento eficaz é muito complexa, porque envolve investimento financeiro, capacitação de pessoal e nem sempre é de interesse dos governantes investirem em tais Centrais.
A aplicação de penas e medidas alternativas e acompanhamento pelas Centrais, além do relevante caráter social que possuem, permitem aos cofres públicos uma considerável economia, na medida em que, além de possibilitar a redução com os gastos inerentes ao encarceramento, gera renda para instituições cadastradas a rede social das Centrais que recebem as doações, auxiliando a rede pública na disponibilização de serviços as pessoas de baixa renda.
De acordo com a Cartilha da Ceapa do Estado da Bahia (2010), a Central e Núcleos do interior do Estado de 2002 a 28 de fevereiro de 2010 já atenderam 7.570 cumpridores de penas e/ou medidas alternativas. E a título de prestação pecuniária ou prestação de outra natureza a Ceapa da capital já arrecadou o valor de R$552.202,64 beneficiando as 206 instituições cadastradas a rede social da Ceapa.
Com a promulgação da Lei n. 11.042/2008, o Estado da Bahia interiorizou o programa de apoio e acompanhamento às penas e medidas alternativas com a previsão de implantação de 10 centrais no interior do Estado. Já foram inaugurados os núcleos nos municípios de: Ipirá (17/07/2008), Jequié (30/07/2008), Vitória da Conquista (17/09/2008), Ilhéus (21/11/2008) Valença (29/04/2009), Juazeiro (22/03/2010) e Teixeira de Freitas (26/03/2010). Os demais núcleos, previstos na Lei, ainda a serem inaugurados se localizarão nas cidades de: Barreiras, Feira de Santana e Bom Jesus da Lapa.
No Brasil a legislação tocante às alternativas penais à prisão estava bem avançada, no entanto, restava uma política pública em nível nacional com o objetivo de fomentar a aplicação dessas penas e medidas, pois o judiciário encontrava sérias restrições em aplicá-las, diante da impossibilidade de operacionalizar e fiscalizar o seu cumprimento. De fato, este era um grande problema, pois a falta de fiscalização das penas e/ou medidas alternativas poderia tornar frustrado o direito de punir estatal.
Ciente da necessidade de operacionalizar e criar mecanismos eficazes de fiscalização no ano 2000, o Ministério da Justiça instituiu um órgão próprio para a execução do Programa Nacional de Apoio às Penas Alternativas, a CENAPA – Central Nacional de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas Alternativas – subordinada à Secretaria Nacional de Justiça. A CENAPA, hoje CGPMA – Coordenação Geral do Programa de Fomento às Penas e Medidas Alternativas, já previu que o funcionamento de uma central deveria ser desenvolvido por equipe multidisciplinar integrada por psicólogos, assistentes sociais, advogados, terapeutas (GOMES, 2008).
Dessa forma, após a criação da CENAPA, o primeiro passo dado rumo à celebração de convênios com os Estados, junto às Secretarias competentes e/ou Tribunais de Justiça no intuito de se viabilizar a criação das Centrais de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas Alternativas nos Estados foi dado.
Com o objetivo de tornar economicamente viável a implantação das Centrais nos Estados, o Ministério da Justiça por meio de convênios forneceu recursos de implementação, que permitiram a constituição de uma estrutura mínima para que fossem iniciados o acompanhamento e a fiscalização do cumprimento das penas e medidas alternativas.
A precarização do funcionamento das Centrais por meio de projetos celebrados entre os Estados com o Ministério da Justiça fez com que muitos Estados brasileiros, dentre estes, a Bahia se antecipasse aos fatos e absorvesse a estrutura da Central a sua estrutura de Governo. Tal ação foi de grande relevância, afinal elevou o funcionamento da Central baiana ao patamar de uma política pública e não mais de projeto, que dentre outros requisitos que comprometem o funcionamento por meio de projeto está no caráter de continuidade da atividade, que não ficará pendente da renovação dos convênios para funcionar.
Em 2009, o Conselho Nacional de Justiça, proferiu a Resolução nº 101, de 15 de dezembro de 2009, que definiu a política institucional do Poder Judiciário na Execução das Penas e Medidas Alternativas à Prisão, que dentre outras deliberações tornou as Centrais de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas Alternativas órgão oficial de apoio e acompanhamento ao cumprimento das penas alternativas.
Esta resolução representou um grande marco para a legitimidade do trabalho já desempenhado pelas Centrais. E também representou um maior estimulo para a aplicação das penas alternativas pelo Poder Judiciário, que muitas vezes, se ancorava na falta de fiscalização, e por isso não aplicava tais penas.
Cumpre salientar, por sua vez, que as questões que envolvem as alternativas penais são diversas, no entanto este trabalho tem o objetivo de centrar seus estudos não só na evolução histórica das penas alternativas e possibilidades de aplicação, mas na sua efetividade, que deve ser atrelada aos monitoramentos realizados pelas Centrais de Apoio e Acompanhamento – CEAPAs, de todo o país.
Diversos autores, dentre estes Gomes (2008), Coitinho (2008), demonstram em suas obras que o sucesso das penas alternativas está, sem sombra de dúvidas, atrelada a existência de um órgão de apoio e acompanhamento a estas penas.
Neste sentido Gomes (2008,) retrata com clareza que,
Observa-se que a importância da existência de uma estrutura capaz de monitorar e fiscalizar o cumprimento das alternativas penais é vital para a noção de eficiência desta modalidade punitiva, para que se possa alterar a impressão deturpada que setores da mídia contribuem para formar no corpo social.
O atendimento individualizado realizado pela Central por equipe pluridisciplinar, ou seja, pelo Setor de Serviço Social, Psicologia e Jurídico antes do encaminhamento deste para cumprir a pena/medida alternativa é de fato um diferencial positivo.
O acolhimento inicial, as entrevistas, os grupos de encaminhamento, dentre outros instrumentos metodológicos que visam preparar o indivíduo para o cumprimento de sua pena/medida dá a este uma sensação de acolhimento e não de exclusão, tal como ocorre com a privação de liberdade.
É sabido que a pena com caráter puramente punitivo não tem satisfeito aos reclamos a que foi criada, e esta realidade se vê com a falência das prisões, que ao revés de punir no intuito de fazer com que o indivíduo repense e aprenda com a punição o faz muitas vezes mais perigoso e ameaçador para a sociedade.
Nos dizeres de Dotti (1998, p.212),
A proporcionalidade da pena revela, por um lado, a força do interesse da defesa social e, por outro, o direito do condenado em não sofrer uma punição que exceda o limite do mal causado pelo ilícito. A retribuição, como “alma de todas as penas”, é uma das imposições fundamentais do Direito Penal realmente democrático. Por outro lado, cumpre-se uma das antigas exigências de justiça, consubstanciadas no aforismo suum tribuere, cuja inspiração popular não pode ser posta em dúvida.
No cumprimento da pena alternativa, segundo Gomes (2008, p.185), “79,3% das organizações disseram que os sentenciados cumprem a pena com tranqüilidade, 12,5% de que há indiferença e 10% de que há revolta”.
Portanto, por meio do sistema de acompanhamento e monitoramento e fiscalização desempenhando pelas Centrais de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas Alternativas “evidencia-se o compartilhamento do poder disciplinador do Estado com a sociedade, que interage com o infrator” (GOMES, 2008, p.184), responsabilizando-o pelo fato delitivo cometido e tendo a oportunidade de reparar o dano cometido a sociedade de maneira justa, eficaz e razoável.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Resolução nº 101, de 15 de dezembro de 2009. Define a política institucional do Poder Judiciário na Execução das Penas e Medidas Alternativas à Prisão. Diário Oficial da União, Seção 1, em 25 jan 10, p.107.
DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.
FRAGOSO, Heleno Cláudio. Alternativas da pena privativa de liberdade. Revista de direito penal, Rio de Janeiro, n. 29, p. 6-7, jan./jun. 1981.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 22. ed. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2000.
GOMES, Luis Flávio. Penas e Medidas Alternativas à Prisão. São Paulo: RT, 1999.
NEVES, Sheilla Maria da Graça Coitinho das. Penas restritivas de direito: alternativa de punição justa. Curitiba: Juruá editora, 2008.
ROXIN, Claus. Problemas fundamentais de direito penal. 3.ed. Lisboa: Veja, 2004.
Villar, Thais Cravo et al. Ceapa: a construção de uma política pública. Cartilha da Secretaria da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do Estado da Bahia. Salvador, 2010.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Dyanne Gomes. As centrais de apoio e acompanhamento às penas e medidas alternativas e a resolução do CNJ nº 101 de 15 de dezembro de 2009 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 jun 2010, 01:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/20104/as-centrais-de-apoio-e-acompanhamento-as-penas-e-medidas-alternativas-e-a-resolucao-do-cnj-no-101-de-15-de-dezembro-de-2009. Acesso em: 22 nov 2024.
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