RESUMO: O assédio moral apresenta aspectos sociais pluriofensivos, o que enseja a atuação do Ministério Público como órgão agente. Temos como empecilhos para o combate ao assédio moral a falta de conhecimento das vítimas acerca do que é o assédio moral e quem pode ajudá-los a resolver esse dilema. Conseqüências desastrosas são causadas pela sua prática, sendo a mais significativa a de natureza psicológica, além do grave prejuízo no rendimento do servidor, que se encontra num ambiente de trabalho inadequado. Para que seja combatida essa humilhação contínua, o Ministério Público tem legitimidade, constitucionalmente prevista, para atuar extrajudicialmente e judicialmente, além de diversas normas sendo criadas em âmbito municipal, estadual e federal referentes ao assédio sofrido por servidores públicos. Portanto, a prática de assédio moral gera conseqüências no âmbito social, econômico e físico.
PALAVRAS-CHAVE: Assédio Moral; Ministério Público Estadual; Legitimidade.
ABSTRACT: Bullying has pluriofensives social aspects, which entails the performance of Prosecutors and court staff. We as deterrents to combat bullying lack of knowledge of the victims about what is bullying and who can help them solve this dilemma. Disastrous consequences are caused by its practice, most significantly the psychological, in addition to serious damage in the server's income, which is inappropriate in a work environment. To be combated this continuing humiliation, the Attorney General has standing, constitutionally provided for, to act judicially and extra-judicially, and different standards being created at the municipal, state and federal level regarding the harassment suffered by public servants. Therefore, the practice of bullying generates consequences in the social, economic and physical.
WORD-KEY: Moral blockade; PublicPprosecution Service; Standing.
1 INTRODUÇÃO
O assédio moral nas relações de trabalho apresenta aspectos sociais plurionfensivos, o que enseja a atuação do Ministério Público como órgão agente. No presente estudo importa-nos a violência sofrida pelo servidor público, também enquadrado num amplo conceito de trabalhador segundo a doutrina laboral, tal ato denomina-se, na doutrina Americana, de Mobbing de Estado.
Envolve também aspectos econômicos, posto que acarreta prejuízos previdenciários para o Estado.
Eventos que propiciam a divulgação das causas e consequências do assédio moral têm sido realizados em todo o mundo.
Tendo em vista o recente início do combate e fiscalização dos casos de assédio moral no Brasil, que ocorreu em 2000, observa-se o crescimento da atuação do Ministério Público neste ponto, além de diversas normas sendo criadas em âmbito municipal e estadual incidentes no âmbito da Administração Pública.
Intenta ser o presente estudo um instrumento divulgador do fenômeno do assédio moral. O tema abrange a área Constitucional, posto que fere os direitos humanos e as garantias fundamentais ao degradar o meio ambiente de trabalho. Adentra a seara do Direito Administrativo, ao incidir nas relações de trabalho entre administrador e administrado. Por fim, insere-se nos âmbitos Penal e Civil, havendo responsabilização penal dos assediadores e conseqüente reparação do dano indenizável.
Pretendemos mostrar para os operadores do direito que a atual ausência de previsão legal específica de âmbito federal para reprimir o assédio moral no ambiente de trabalho não deve servir de pretexto para o seu não reconhecimento como prática atentatória aos direitos humanos do trabalhador, em especial, do servidor público, frente à discricionariedade do administrador.
2 MATERIAIS E METODOS
Nosso estudo foi feito através da utilização de uma abordagem qualitativa que implica uma série de leituras sobre o assunto pesquisado para elaboração de resenha, ou seja, é preciso descrever ou relatar minuciosamente o que diferentes autores ou especialistas escrevem sobre o assunto e a partir daí, estabelecer uma série de correlações para, ao final, o pesquisador construir seu ponto de vista conclusivo.
A colheita de informações será realizada através de pesquisa bibliográfica, que é o ato de fichar, relacionar, referenciar, ler, arquivar, fazer resumos (abstracts) de assuntos relacionados com a pesquisa em questão, utilizando-se do método indutivo, que é um raciocínio em que, de fatos particulares, se tira uma conclusão genérica, caminhando de fatos singulares para chegar a uma conclusão ampla.
Em nosso estudo utilizamos fontes de pesquisa de primeira mão que são as leis e jurisprudências bem como usamos a doutrina como fonte de pesquisa de segunda mão.
3 ASSÉDIO MORAL DE ESTADO
No que se acredita ser a primeira obra de autoria brasileira acerca do tema, Guedes[1] expõe: “A relevância do estudo, porém, reside na constatação de que só nas últimas décadas do século XX é que o assédio moral veio a ser identificado como 'fenômeno destruidor do ambiente de trabalho”.
Somando-se o exposto acima com uma análise superficial do tema em estudo, difere-se que um dos grandes fatores de desenvolvimento da violência psíquica no ambiente de trabalho é o sistema de produção capitalista. Segundo Molon[2]:
Em um novo ambiente de trabalho, forjado pela globalização e a modernização, indústrias e empresas vêm cada vez mais forçando o seu ritmo de trabalho na luta pelo lucro. A organização do trabalho com a sua estruturação hierárquica, divisão de tarefas, jornadas de trabalho em turnos, ritmos, intensidade, monotonia, repetitividade e responsabilidade excessiva são fatores que contribuem para desencadear uma série de distúrbios ao trabalhador, sejam elas físicas ou psíquicas.
Atualmente, as altas taxas de desemprego que assolam praticamente a maioria dos países do globo refletem a instabilidade econômica atual. A competição da sociedade capitalista em que vivemos torna as pessoas cada dia mais inseguras quanto à instabilidade no emprego. Em consonância a isso, a busca desenfreada pelo poder influencia o âmago de algumas pessoas e as fazem tornar o ambiente de trabalho um lugar de conflitos sem escrúpulos. As diferenças, sejam elas sociais, étnicas, psicológicas, políticas tornam o ambiente de trabalho lugar de discriminação e marginalização.
Para piorar, o contexto econômico atual propicia a busca desenfreada pelo lucro sem precedentes na história: leis de mercado que geram competitividade exacerbada, a busca incessante do aperfeiçoamento profissional, a disciplina interna voltada para conseguir o máximo de produtividade com o mínimo de dispêndio. Tudo isso tem contribuído para gerar um certo distanciamento entre as pessoas dentro da empresa, um grau tamanho de impessoalidade com a conseqüente adoção de procedimentos moralmente reprováveis.
Contudo, para a Administração Pública, o efetivo aproveitamento da força laboral dos seus servidores, estáveis ou comissionados, não deve ser ligado ao Capitalismo, e sim à deturpação e extrapolamento de limites do que seja o Princípio da Eficiência, previsto na Constituição, em seu art. 37, cabeça, e do Poder Hierárquico da Administração.
Mas não é esta a origem majoritária do injime de Estado, em geral, as divergências ideológicas e político-partidárias, além do fundo discriminatório são as causas ensejadoras do assédio, isto porque, segundo VIANA[3]:
No serviço público, o assunto deve ser amplamente debatido, pois apesar da estabilidade, o assédio se apresenta de formas sutis: na avaliação de desempenho, nas progressões, promoções, etc. Como não têm poder para demitir, chefes passam a perseguir, humilhar e sobrecarregar o trabalhador de tarefas inúteis. Chefes são, muitas vezes, nomeados por relação de amizade ou parentesco e não por competência. Daí por que podem se tornar arbitrários para compensar.
Impende ser dito, por fim, que o assédio moral de Estado, ou seja, no âmbito da Administração Pública, no Brasil, originou-se com o fato trágico e enganoso denominado “Caça aos Marajás”, no ano de 1989, quando do governo de Fernando Collor de Melo, o qual fez com que grande quantidade de servidores públicos fossem colocados à disponibilidade, com o único intuito de excluir os trabalhadores indesejáveis, incorrendo num fenômeno em massa, ou mobbing organizacional no país.
4 ASSÉDIO MORAL
4.1 Definição
Assediar implica causar constrangimento físico ou psicológico ao indivíduo. Somando-se a palavra moral ao verbo supra, temos o seu objeto, ou seja, trata-se de um importúnio direcionado ao íntimo da vítima, com o intuito de denegrir-lhe a imagem e auto-estima.
Tem natureza psicológica com vistas a excluir o empregado do emprego, deteriorando o ambiente do trabalho, tornando-o degradante, o que possibilita a atuação do Ministério Público como instituição investigadora, conforme veremos adiante.
Sobre o conceito de assédio moral, Marie-France Hirigoyen, citada por Irany Ferrarri e Melchíades Rodrigues Martins[4], assim dispôs:
Por assédio moral em um local de trabalho temos que entender toda e qualquer conduta abusiva manifestando-se, sobretudo, por comportamento, palavras, gestos, escritos, que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de trabalho.
Por tratar-se de matéria subjetiva, os organismos internacionais entendem que a cultura de cada sociedade modifica a definição de assédio moral, não havendo como obter uma conceituação capaz de defini-lo por completo.
Importante salientar que, apesar da definição supra, o assédio moral pode se dar fora da jornada de trabalho, isto nos casos em que o abuso decorre de tal trabalho.
4.2 Elementos Caracterizadores
Neste ponto os doutrinadores divergem, sendo que os elementos caracterizadores do assédio moral que têm mais incidência são dano, repetição, intencionalidade, intensidade da violência psicológica, duração no tempo, premeditação e existência de danos psíquicos. Passemos à análise de alguns destes.
O dano se traduz no ato agressor à dignidade do servidor público. Conforme já exposto, fala-se aqui de ataque psicológico, não sendo necessário que ocorra um dano físico-psíquico, mas sim uma deterioração do ambiente de trabalho, prescindindo de prova robusta do dano ocorrido, posto que a simples configuração do assédio moral traz consigo a conduta abusiva, trata-se de dano moral.
O próximo elemento caracterizador em estudo é a repetição. Temos aqui um dos requisitos mais exigidos para a configuração do acoso moral em vários países, constando em legislações, doutrina e jurisprudência. Afirma-se que, para a conformação do assédio moral é necessária a repetição do ato agressor, não sendo considerados os atos pontuais, ainda que de extrema violência.
Quanto à intensidade da agressão, conforme já exposto, não é considerada um elemento do assédio moral por alguns doutrinadores, tendo em vista que a mesma pode existir em alto grau, mas se for pontual não caracteriza o bullying. A despeito desse posicionamento, Ferreira[5] afirma:
[...] O certo é que episódios pontuais e esporádicos, por mais agressores e desagregadores que possam ser, não configuram a ocorrência do assédio moral.
Deve, ainda, o comportamento, para configurar assédio, apresentar grande intensidade de violência psicológica e essa gravidade deve ser avaliada relativamente à concepção de uma pessoa normal.
No tocante à duração há divergências doutrinárias. Alguns autores a consideram um elemento caracterizador, inclusive discriminando quanto tempo é necessário para que seja concreto o assédio moral, havendo no Brasil jurisprudência que afirma a necessidade do prolongamento no tempo da degradação psíquica para que se configure o assédio em estudo.
Assim como a premeditação, a intensidade da violência é considerada por alguns autores como elemento caracterizador, a exemplo temos Alice Monteiro de Barros, contudo, em sentido contrário, Thome[6] entende que “a intensidade parece ser mais adequada para a fixação da indenização devida que para a configuração do assédio moral em si.”.
Por fim, tratemos da necessidade da configuração do dano psíquico para a ocorrência do assédio moral. Neste ponto, a exigência é que os danos provocados sejam efetivos e se revistam de índole patológica, necessitando, assim, de um diagnóstico clínico. Conforme expõe Ferreira[7], o dano gerado pode ser permanente ou transitório, causando a alteração da personalidade da vítima, desequilibrando-a fisicamente, podendo o assédio, inclusive, atuar como concausa do dano.
Ao falar do assédio Moral de Estado, Jorge Luis Wagner, em seu artigo Assédio moral: a Microvalência do Cotidiano.Uma Cartilha Voltada para o Serviço Público[8], aponta uma forma de comprovar a ocorrência do assédio baseada na paciência do servidor, conseguindo a colaboração de testemunhas, recolhendo provas escritas, registrando ocorrências, juntando atestados médicos que mostrem o dano psicológico sofrido, chegando, até mesmo a abrir mão dos seus direitos.
4.3 Sujeitos Do Assédio Moral Laboral
São elementos subjetivos do assédio moral. Portanto, neste tópico desenvolveremos o estudo do sujeito ativo e passivo.
Quando passamos à análise dos sujeitos do assédio moral não necessariamente o empregador estará no pólo ativo da relação, ou seja, como agressor, tampouco este será obrigatoriamente individual, podendo perfeitamente o mobbing ocorrer em caráter coletivo, tanto no tocante ao agressor quanto à vítima.
O agressor, de acordo com Guedes[9], é classificado pela Vitimologia como um sujeito perverso, que se utiliza de mecanismos perversos para se defender como regra de vida, sem sentir-se culpado. Não raro o assediante utiliza-se de superioridade hierárquica para impedir que a vítima reaja às agressões, daí ser mais freqüente a incidência do chefe como agressor, denominando-se essa forma de hostigamiento de assédio moral descendente.
Daí retira-se também a existência de outra forma de assédio, o horizontal, o que comprova a desnecessidade da hierarquia como elemento caracterizador do ijime. Nesse caso, os agressores e as vítimas estão na mesma posição simétrica na estrutura organizativa da empresa, o que, conforme Lima Filho[10], ocorre “com o consentimento ou a passividade e às vezes até mesmo com a cumplicidade do empresário ou dos superiores hierárquicos.”.
Para completar o quadro de atividades ou omissões relativas ao papel desempenhado pelos agressores, Soares[11] reflete acerca do ambiente laboral ao afirmar:
Muitos empregadores dispensam pouca ou nenhuma atenção à higidez do ambiente de trabalho, cujas condições de labor devem ser adequadas não somente à saúde física, mas também à higidez mental dos seus subordinados, mesmo porque ambas são co-dependentes. Se não há saúde mental, inexiste saúde física, assim como uma doença física pode perfeitamente desestabilizar emocionalmente.
No que se refere ao sujeito passivo, qualquer trabalhador pode ser vítima do assédio moral, sendo que certos grupos de indivíduos apresentam maior probabilidade de figurar no pólo passivo dessa relação. Quanto ao assunto, Lima Filho[12] manifesta-se:
Esses coletivos são representados em regra pelas mulheres, pelos trabalhadores estrangeiros, por aqueles que são contratados por tempo determinado ou que sofrem alguma incapacidade. É claro que esses coletivos não esgotem os que grupalmente possam também ser vítima do assédio moral em razão de sua maior vulnerabilidade, como os idosos, os negros, os homossexuais e outros segmentos que até mesmo em razão do preconceito têm sido as principais vítimas da discriminação e maltrato, inclusive pelos próprios colegas.
No tocante à Administração Pública, o grupo de servidores que ocupam cargos comissionados é, por regra, um dos mais vulneráveis à violência em estudo, justamente por não contarem com a estabilidade dos servidores ditos efetivos, podendo ser exonerados à discricionariedade do Administrador.
Impende observar que, no caso dos servidores públicos organizados em carreira, ocorrendo o assédio contra um servidor em virtude da categoria em que se encontra, estaremos diante de assédio moral coletivo com fundo discriminatório contra a classe inteira organizada em carreira.
4.4 Conseqüências do Assédio Moral
Tendo em vista o foco desse estudo ser exatamente a competência e legitimidade do Ministério Público Estadual para o combate ao assédio moral, impende serem analisados os reflexos desta violência.
Inicialmente trataremos de forma breve acerca das conseqüências para o empregador, no caso, a Administração Pública. Frequentemente constata-se num grupo assediado, ou naqueles ao redor da vítima, uma redução na capacidade produtiva e na eficácia, haja vista o desânimo que os atinge, minando as suas forças laborais.
Além disso, outras situações surgem para a Administração, trazendo prejuízo de diversas ordens, conforme mostra Guedes[13]:
Os efeitos perversos do abuso moral não se limitam apenas ao trabalhador a ele submetido, mas espraiam-se, em termos de custos, para as empresas que respondem pelas conseqüências diretas da violência no interior do grupo de trabalho. De modo geral, verifica-se, em nível do grupo, uma redução na capacidade produtiva e na eficácia; acentuada crítica aos empregadores; elevada taxa de absenteísmo por doenças; tendência do grupo de fazer tempestades em copo d’água, transformando pequenos problemas em gigantescos conflitos; a busca de bodes expiatórios, para mascarar os reais problemas e culpados.
O aumento dos custos da empresa é determinado pelas faltas por doenças, substituições e despesas com processos judiciais. Está provado que um trabalhador submetido a violência psicológica tem um rendimento inferior a 60% em termos de produtividade e eficiência, em relação a outros trabalhadores, e o seu custo para o empregador é de 180% a mais. [...]
Sendo assim, o assédio moral conhecido como “geladeira”, ou seja, a retirada total de atribuições e material de trabalho, o isolamento e a colocação à disposição do Setor de Recursos Humanos, deixando o servidor ser pago sem trabalhar, gera prejuízos aos cofres públicos, incorrendo o superior assediante no ilícito de crime contra o erário público, pois pratica a violência sem o conhecimento dos órgãos superiores.
Além do empregador, também o Estado é alcançado pelo acoso moral praticado. Ocorre que o mesmo, além dos altos custos com a saúde pública, ainda sofre com as aposentadorias precoces, conseqüências da invalidez permanente advinda do assédio, e que causam prejuízo para os cofres públicos e para a coletividade. Quanto ao assunto, Ferreira[14] afirma:
Por fim, o Estado é atingido, devido ao crescimento de afastamentos superiores a 15 dias para tratamento de saúde, na maior parte das vezes a cargo da rede pública e as aposentadorias precoces, que acarretam um prejuízo incalculável para a sociedade.
O assédio é, assim, um fator de risco psicossocial capaz de provocar danos à saúde, podendo caracterizar-se como doença do trabalho, equiparada a acidente do trabalho, conforme art. 20 da lei 8.213/91.
No tocante à vítima, as conseqüências são de cunho eminentemente psicológico. O assédio moral, conforme tabela anexa disponibilizada no sítio www.assediomoral.org.br, produz diferentes conseqüências em relação ao sexo da vítima e traz uma rigidez à relação laboral, que se concretiza com as dificuldades da vítima em enfrentar as agressões, interagir com o grupo, causando danos emocionais, a exemplo, temos a baixa-estima, estresse permanente, irritação constante, falta de confiança em si mesmo, insônia, desconcentração, exclusão dentro e fora do ambiente de trabalho, utilização de bebidas alcoólicas e outras drogas, obesidade, culminando com pensamentos suicidas, que por diversas vezes se consolidam, conforme afirma Guedes[15]:
A pesquisa realizada pela médica brasileira Margarida Barreto revelou que 42% das pessoas entrevistadas apresentaram histórias severas de humilhação no trabalho. Embora as mulheres estejam mais expostas e consequentemente sejam mais humilhadas do que os homens, são eles, entretanto, que pensam mais em suicídio. Todos os 376 homens entrevistados admitiram já ter pensado na possibilidade ou tentado cometer suicídio. A crise é particularmente grave nos homens, segundo a doutora Margarida, porque eles têm mais dificuldades de expressar as emoções. De um grupo de 870 pessoas entrevistadas, 30% passaram a usar drogas, incluindo bebidas alcoólicas e drogas pesadas. Nesse caso, os homens foram mais atingidos. Nos homens é muito comum o desejo de vingança, enquanto as mulheres passam a chorar por tudo.
Assim, temos escopo para enquadrar o assédio moral como prática atentatória a um dos princípios da República Federativa Brasileira, exposto no art. 1º da Constituição Federal de 88, a dignidade da pessoa humana, além de confrontar também os direitos fundamentais individuais e sociais, como a garantia de igualdade, não discriminação, liberdade e meio ambiente saudável.
Daí retiramos mais uma conseqüência do injime, a degradação do meio ambiente de trabalho, o qual torna-se hostil e inadequado à atividade laboral. É de responsabilidade da Administração Pública manter um meio ambiente laboral saudável e equilibrado em seus órgãos e repartições, ou seja, nos casos de constatação de assédio moral, esta deverá atuar combatendo-o, sob pena de responsabilizar-se pelos danos ocorridos ao servidor público.
Por fim, impende salientar que, apesar de majoritariamente ser o sistema psicológico da vítima que é afetado, trata-se de uma atuação pluriofensiva, posto que fisicamente e economicamente o assediado é afetado pelo acoso moral, conforme afirma Lima Filho[16]:
Ante essa constatação, não é fácil afirmar que a conduta de assédio é efetivamente, e antes de tudo, um atentado aos direitos fundamentais do trabalhador, porque afeta à sua integridade moral, a sua dignidade (pessoal e profissional) e também o direito de não sofrer discriminação. Ademais, pode ainda afetar e danificar outros direitos fundamentais como o direito ao trabalho, à liberdade de expressão e de opinião, a intimidade provocando danos de ordem patrimonial e moral à vítima.
Assim, a conduta caracterizadora do assédio moral tem uma dimensão pluriofensiva, pois é capaz de lesionar vários bens e direitos do ser humano enquanto tal, mas também como trabalhador, como integrante de uma coletividade, de uma família, etc. Por isso, deve ser considerada como uma conduta antijurídica porque em si mesma e sem outras exigências, supõe um atentado a integridade moral da pessoa humana.
4.6 Aspectos Legislativos Nacionais
No Brasil ainda não há lei de âmbito federal que discipline, conceitue ou combata especificamente o terror psicológico, assim como em diversos outros países.
Já na Europa, países como a Suécia, França, Finlândia, Holanda, Bélgica, Espanha e Portugal já trataram do assunto, seja em lei específica ou por meio de artigos inseridos em códigos que tratam de seguridade, previdência e de trabalho. Na América do Norte, os Estados Unidos da América vêm desenvolvendo estudos acerca do tema. Na América Latina, o Uruguai e a Argentina já possuem legislação disciplinando as faltas laborais, incluído nestas o assédio moral.
Até a conclusão do presente trabalho, no estado de São Paulo foram aprovadas leis locais nos município de Americana, Campinas, Guarulhos, Iracemápolis, Jaboticabal, São Paulo, Ubatuba, Araraquara e Amparo, restando ainda os projetos de lei pendentes de votação dos municípios de Cruzeiro, Guararema, Guaratinguetá, Presidente Venceslau, Ribeirão Pires e São José dos Campos.
Em todo o Brasil, segundo o sítio assediomoral.org.br[17], a supracitada cidade de Iracemápolis-SP foi a primeira a legislar acerca do assédio moral nas relações de trabalho ao editar a Lei nª 1163/2000, datada de 24 de abril de 2000, inclusive trazendo definição de injime em seu art. 1º, parágrafo único[18]:
Artigo 1º - Ficam os servidores públicos municipais sujeitos às seguintes penalidades administrativas na prática de assédio moral, nas dependências do local de trabalho:
I- Advertência.
II- Suspensão, impondo-se ao funcionário a participação em curso de comportamento profissional.
III- Demissão.
Parágrafo Único - Para fins do disposto nesta Lei, considera-se assédio moral todo tipo de ação, gesto ou palavra que atinja, pela repetição, a auto-estima e a segurança de um individuo, fazendo-o duvidar de si e de sua competência, implicando em dano ao ambiente de trabalho, à evolução da carreira profissional ou à estabilidade do vínculo empregatício do funcionário, tais como: marcar tarefas com prazos impossíveis, passar alguém de uma área de responsabilidade para funções triviais; tomar crédito de idéias de outros; ignorar ou excluir um funcionário só se dirigindo a ele através de terceiros; sonegar informações de forma insistente; espalhar rumores maliciosos; criticar com persistência; subestimar esforços.
Observa-se que a primeira lei brasileira a tratar do assunto abordou-o, justamente no tocante à Administração Pública. Aqui, ressaltamos que, ao se referir às empresas públicas e sociedades de economia mista, os seus empregados, hodiernamente, são regidos pela CLT, ou seja, o combate ao assédio moral efetua-se pelo Ministério Público do Trabalho. Já quanto aos servidores públicos, regidos por estatutos próprios, a quem se destina a norma supra-transcrita, a violência de que são vítimas é de combate legítimo do Ministério Público Estadual, posto que a este cabe intervir nas relações entre a Adminstração Pública e os seus servidores, quando o assunto está enquadrado no rol de suas competências, como a dignidade da pessoal humana e o direito ao meio ambiente saudável.
Retornando ao sub-tema, no âmbito estadual, temos leis aprovadas nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Mato Grosso, havendo projetos de lei nos estado de Pernambuco, Espírito Santo, Bahia e Ceará.
Passando ao âmbito federal, encontramos até o momento apenas duas leis aprovadas, o Projeto de Lei nº 4.326, de 2004[19], que estabelece o dia 2 de maio como sendo o Dia Nacional da Luta contra o Assédio Moral, de iniciativa da Deputada Federal Maria José da Conceição Maninha, ainda não possuindo numeração de lei, e a Lei nº 11948/09, de 16 de junho de 2009, proveniente da Conversão da Medida Provisória nº 453, de 2008, que proíbe a concessão de empréstimo pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social-BNDES às empresas que tenham sido condenadas pela prática de assédio moral.
Devem ser aqui expostos os projetos de lei no âmbito federal, os quais são de grande relevância, a exemplo temos a proposta de tipificação do assédio moral como crime, de iniciativa do Deputado Federal Marcos de Jesus (Projeto de Lei Federal nº 4741/2001), o qual pretende que seja inserido o art. 146-A no Código Penal Brasileiro[20] com a seguinte redação:
Assédio Moral no Trabalho
Art. 146 A. Desqualificar, reiteradamente, por meio de palavras, gestos ou atitudes, a auto-estima, a segurança ou a imagem do servidor público ou empregado em razão de vínculo hierárquico funcional ou laboral.
Pena: Detenção de 3 (três) meses a um ano e multa.
Há ainda o Projeto de Lei Federal nº 4591/2001[21], que propõe a alteração da Lei nº 8112, para que nesta conste a proibição da prática do mobbing, introduzindo, além de outras alterações, o art. 117-A, de disposição a seguir:
Art. 117-A É proibido ao servidores públicos praticarem assédio moral contra seus subordinados, estando estes sujeitos às seguintes penalidades disciplinares:
I -Advertência;
II - Suspensão;
III - Destituição de cargo em comissão;
IV - Destituição de função comissionada;
V - Demissão.
§ 1º - Para fins do disposto neste artigo considera-se assédio moral todo tipo de ação, gesto ou palavra que atinja, pela repetição, a auto-estima e a segurança de um indivíduo, fazendo-o duvidar de si e de sua competência, implicando em dano ao ambiente de trabalho, à evolução profissional ou à estabilidade física, emocional e funcional do servidor incluindo, dentre outras: marcar tarefas com prazos impossíveis; passar alguém de uma área de responsabilidade para funções triviais; tomar crédito de idéias de outros; ignorar ou excluir um servidor só se dirigindo a ele através de terceiros; sonegar informações necessárias à elaboração de trabalhos de forma insistente; espalhar rumores maliciosos; criticar com persistência; segregar fisicamente o servidor, confinando-o em local inadequado, isolado ou insalubre; subestimar esforços.
§ 2º - Os procedimentos administrativos para apuração do disposto neste artigo se iniciarão por provocação da parte ofendida ou pela autoridade que tiver conhecimento da infração.
§ 3º - Fica assegurado ao servidor denunciado por cometer assédio moral o direito de ampla defesa das acusações que lhe forem imputadas, sob pena de nulidade.
§ 4º - A penalidade a ser aplicada será decidida em processo administrativo, de forma progressiva, considerada a reincidência e a gravidade da ação.
§ 5º - O servidor que praticar assédio moral deverá ser notificado por escrito da penalidade a qual será submetido.
5 ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO COMBATE AO ASSÉDIO MORAL
5.1 Direitos Tutelados Pelo Ministério Público
De acordo com a Constituição Federal de 1988, o Ministério Público, instituição autônoma e essencial à função jurisdicional do Estado, divide-se em Ministérios Públicos dos Estados e Ministério Público da União, este subdividido em Ministério Público Federal, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Militar e Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.
Ainda focando a Carta Magna[22], encontramos o objeto de atuação do Ministério Público como um todo, este é a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.(grifou-se)
Bem como indica como funções institucionais do Parquet, entre outras:
Art. 129. ...
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; (grifou-se).
Posto isso, esclarecemos que são fundamentos da República Federativa do Brasil, pertinentes a este trabalho, a cidadania, a dignidade da pessoas humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, como previsto no art. 1º, incisos II, III e IV, da Constituição Federal de 1988. Impende citarmos o dito por Barreto[23]:
No intuito de dar relevo aos direitos individuais e coletivos que devem ser respeitados, pode-se dizer como pressupostos para que se estabeleça um meio ambiente sadio e confiável de trabalho, dentre os direitos e deveres individuais e coletivos inseridos no referido art. 5º, destacam-se:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
(...)
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
(...)
XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados, e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;
(...)
LXI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;
(...)
O meio ambiente do trabalho está inserido no conceito de meio ambiente global, tendo a CF 88, através do artigo 225, disposto sobre o meio ambiente como um todo. O constituinte, contudo, cuidadoso no tocante à saúde e qualidade de vida do trabalhador, relacionou o meio ambiente de trabalho equilibrado à saúde do trabalhador ao dispor que ao Sistema Único de Saúde-SUS compete: “colaborar com a proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho (CF art. 200 VIII)”.
Da interpretação do artigo supracitado entende-se que o meio ambiente do trabalho inclui-se entre os direitos metaindividuais que devem ser objeto da atuação do Parquet, bem como depreende-se que cabe ao mesmo o dever de zelar pelo interesse público, contudo, deve ser observado o exposto por Fonseca[24]:
[...] O interesse Público que deve ser tutelado pelo MP é o interesse público primário, quer dizer, aquele que está vinculado ao bem geral da coletividade, da sociedade, ou do indivíduo que necessitar especial proteção do Estado.
Neste ponto impende ser feita uma breve explanação acerca dos direitos coletivos lato sensu, estes compõem a modalidade dos direitos transindividuais ou metaindividuais, que se projetam além do indivíduo para atingir a coletividade, incluindo-se dentre estes os interesses patrimoniais, extrapatrimoniais e morais.
Os direitos metaindividuais, segundo Mildner[25], classificam-se como difusos, coletivos stricto sensu e individuais homogêneos.
Os primeiros caracterizam-se como sendo interesses comuns a uma coletividade de pessoas, com objeto indivisível e vínculo–base fático. Já os coletivos strictus sensu, superam o âmbito individual, contudo dizem respeito a um número determinável de pessoas, mas não determinado, tendo como vínculo-base uma relação jurídica.
Os direitos individuais homogêneos, introduzidos no ordenamento jurídico pelo Código do Consumidor-CDC, referem-se a uma modalidade peculiar de direitos metaindividuais. Gonçalves[26] assim os define:
São conceituados no art. 81, parágrafo único, III, do Código do Consumidor como aqueles que decorrem de uma origem comum. Caracterizam-se por serem divisíveis, terem por titular pessoas determinadas ou determináveis e uma origem comum, de natureza fática. Diferem dos interesses difusos porque têm sujeitos determinados ou determináveis, e seu objeto é divisível.
......................................................................................................................
São manifestas as diferenças entre os interesses coletivos e os individuais homogêneos. Naqueles, o vínculo comum é algo que diz respeito diretamente à relação jurídica base.
Expostas breves explanações acerca dos direitos tutelados pelo Ministério Público em geral, impende ser dito que o Ministério Público Estadual atua objetivando a garantia dos direitos metaindividuais relacionados à competência da Justiça Comum Estadual, bem como nos demais casos dispostos em lei, ou seja, o assédio moral degradante do meio ambiente do trabalho e da dignidade da pessoa humana, incidente no âmbito da Administração Pública, é certamente objeto de atuação do Parquet.
5.2 Da Legitimidade Do Ministério Público Estadual
A doutrina processualista classifica a legitimação para a causa como ordinária e extraordinária. No primeiro caso, os próprios interessados ajuízam a ação, assim, quando o Ministério Público propõe demanda judicial defendendo interesses coletivos strictu sensu ou difusos, temos uma legitimidade ad causam ordinária, posto que tal tutela será sempre de interesse social.
Quanto aos direitos individuais homogêneos temos mais uma vez uma peculiaridade, tendo em vista que se trata de direitos de índole primordialmente particular, mas advindos de uma situação fática que atinge uma quantidade indeterminada de pessoas, a legitimidade do Parquet, segundo Mildner[27], assume uma natureza extraordinária, ocorrendo a substituição das partes pela instituição.
Posto que o art. 114, I da CF afirma ser da competência da Justiça do Trabalho “as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”, e que o STF, na ADIn 3.395-6, suspendeu a interpretação do referido inciso, que atribuísse à Justiça do Trabalho, a competência para apreciar e julgar causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores estatutários, temos, por consequência lógica, que:
→ A competência para apreciar e julgar causas instauradas entre o Poder Publico e seu servidor público estatutário é da Justiça Comum, Estadual ou Federal, a depender do ente ao qual é vinculado;
→ Sendo o servidor público estadual vítima de assédio moral, a competência para julgar a ação respectiva será da competência da Justiça Estadual;
→ Posto ser o assédio prática atentatória à dignidade da pessoa humana e degradante do meio ambiente de trabalho, ferindo direitos e garantias individuais constitucionalmente protegidos, logo, cabe ao Ministério Público Estadual atuar no feito, seja como fiscal da lei ou como parte.
Somando-se o exposto acima ao dito nos capítulos anteriores, no que se refere ao assédio moral como agente degradante do meio ambiente do trabalho e da dignidade, temos como resultado a legitimação originária do MP para atuar no combate ao mobbing.
Isto porque a Constituição Federal de 1988 assegura a todos o direito a um meio ambiente equilibrado, especificando ainda o meio ambiente do trabalho, colocando-o entre os direitos coletivos lato sensu, os quais, conforme visto acima, são tutelados pelo Ministério Público, consoante assertiva de Melo[28]:
Assegura a Constituição brasileira (art. 225) que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, incumbindo ao Poder Público e à coletividade defendê-lo e preservá-lo, incluso o meio ambiente do trabalho (CF, art.200, inciso VIII). Incorporou a nossa Carta Maior a tendência contemporânea de preocupação com o meio ambiente e com a qualidade de vida do homem em todos os aspectos.
Quanto ao meio ambiente do trabalho especificamente, no art. 7º, inciso XXII, elencou a Constituição, como direito humano fundamental dos trabalhadores, alem de outros direitos que visem à sua melhoria, “a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança.
Ainda como forma de legitimar a atuação do Ministério Público no combate ao assédio moral temos a caracterização desta violência como ofensa ao princípio da dignidade humana, trazido pela Constituição Federal de 88 em seu art. 1º.
Posto isso, podemos afirmar que caso haja a prática de assédio moral organizacional em uma repartição pública estadual ou municipal, por exemplo, o Ministério Público Estadual é quem terá legitimidade para fazer cessar a atitude invasiva.
Contudo, casos há em que o injime é direcionado especificamente a uma pessoa e não ao grupo de servidores públicos, ou seja, não é organizacional e sim individual. Daí surgem imprecisões acerca da legitimação do MP para atuar.
Para dirimir tais dúvidas acerca da atuação do Ministério Público como órgão agente, investigando e ajuizando ação civil pública, ou ainda como órgão interveniente, manifestando-se através de parecer, citemos explanação feita por Fonseca[29]:
Outra questão que precisa ser destacada diz respeito a quando o Ministério Público atua em situações de assédio moral. Já dissemos que, em regra, todas as denúncias são autuadas e dão início a um procedimento. Quando no curso desse procedimento constatamos que a situação é meramente isolada, normalmente arquivamos, por entendermos que não é caso para nossa atuação. Contudo, a manifestação momentânea do assédio em relação a um único trabalhador, por si só, não afasta a atuação do Ministério Público. Assim, por exemplo, atuamos e, se necessário, ingressamos com a ação judicial, quando o assédio moral é desencadeado contra um trabalhador, por ele ser homossexual (ou qualquer outro fundamento discriminatório, como a obesidade, a existência de doença crônico degenerativa, como a AIDS, ou outro). Neste caso, o processo de assédio está associado a uma prática discriminatória.
Ocorre que, baseando-se em discriminação (ofensa ao art. 5º da CF), o assédio cometido contra um servidor, provavelmente incidirá quando da descoberta de outras pessoas na mesma condição da vítima, quer dizer, há um grande potencial de infringência de normas constitucionais relativas a interesses transindividuais, ainda que no caso concreto haja apenas um assediado.
Tal assertiva não implica a inexistência do direito à indenização que tem o servidor assediado, o que ocorre é que a legitimidade ad causam não será do MP, porém a Administração ainda será responsabilizada pela prática do assédio, ainda que horizontal, tendo em vista que é de sua competência a manutenção do meio ambiente de trabalho sadio e equilibrado, devendo o estatutário postular diretamente a reparação do seu direito individual lesado.
Desta forma, podemos agora afirmar que a atuação do Parquet no combate ao assédio moral, geralmente, foca-se nas situações organizacionais, justamente por serem estas as que degeneram e desequilibram o meio ambiente do trabalho, garantindo desta forma aos servidores um ambiente saudável e isento de bullying, o que não alude necessariamente à ilegitimidade do Ministério Público quando da investigação do assédio direcionado a um só servidor, tendo por base a ofensa à dignidade do ser humano.
6 CONCLUSÃO
Diante de todo o exposto, passamos a tirar conclusões do presente estudo, assim, temos que o assédio moral no local de trabalho não é um incidente individualizado, mas sim um dilema que contém fatores sociais, econômicos e culturais, sentido em todo o mundo e combatido inicialmente na Europa.
Frente à dificuldade de definição de assédio moral, deve ser analisada a cultura de cada ambiente, aliada aos elementos caracterizadores para que possa ser verificada a ocorrência ou não do terror psicológico, que tem graves conseqüências, conforme já expressamos.
Detectou-se neste trabalho que a inexistência de lei federal que combata o assédio moral não impede tal atividade, posto este atingir diretamente a dignidade do servidor e degradar o meio ambiente do trabalho, direitos constitucionalmente garantidos e que o Ministério Público possui legitimidade para assegurar o cumprimento, o que o faz por meios judiciais e extrajudiciais.
Por fim, impende ser dito que os direitos fundamentais da pessoa humana devem ser colocados como questão central, não podendo os empecilhos legislativo, procedimental e cultural impedirem a sua concretização.
REFERÊNCIAS
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_______. Projeto de Lei Federal nº 4741/2001. Introduz artigo 146-A, no Código Penal Brasileiro - Decreto-lei nº 2848, de 7 de dezembro de 1940 - , dispondo sobre o crime de assédio moral no trabalho.
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ANEXO A- SINTOMAS DO ASSÉDIO MORAL NA SAÚDE
Entrevistas realizadas com 870 homens e mulheres vítimas de opressão no ambiente profissional revelam como cada sexo reage a essa situação (em porcentagem)
Mulheres |
Homens |
|
Crises de choro |
100 |
- |
Dores generalizadas |
80 |
80 |
Palpitações, tremores |
80 |
40 |
Sentimento de inutilidade |
72 |
40 |
Insônia ou sonolência excessiva |
69,6 |
63,6 |
Depressão |
60 |
70 |
Diminuição da libido |
60 |
15 |
Sede de vingança |
50 |
100 |
Aumento da pressão arterial |
40 |
51,6 |
Dor de cabeça |
40 |
33,2 |
Distúrbios digestivos |
40 |
15 |
Tonturas |
22,3 |
3,2 |
Idéia de suicídio |
16,2 |
100 |
Falta de apetite |
13,6 |
2,1 |
Falta de ar |
10 |
30 |
Passa a beber |
5 |
63 |
Tentativa de suicídio |
- |
18,3 |
Fonte: BARRETO, M. Uma jornada de humilhações. São Paulo: Fapesp; PUC, 2000.
Fonte: www.assediomoral.org
[1] GUEDES, Márcia Novaes. Terror Psicológico no Trabalho. São Paulo: LTr, 2003. p. 11.
[2] MOLON, Rodrigo Cristiano. Assédio moral no ambiente do trabalho e a responsabilidade civil: empregado e empregador. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 568, 26 jan. 2005. Disponível em: . Acesso em: 26 maio 2009.
[3] VIANA,Rui. FRANÇA, Robert Wagner. LOBATO, Arthur. MILITÃO, Leonardo. OLIVEIRA, Dinorá. Del Rei, Belo Horizonte, maio de 2008.
[4] FERRARRI, Irany; MARTINS, Melchíades Rodrigues. Dano Moral- Múltiplos Aspectos nas Relações de Trabalho. São Paulo: LTr, 2005. p. 83/84.
[5] FERREIRA, Maria Cristina Sanchez Gomes. Assédio Moral- Breves Linhas Conceituais. Revista do Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul, Rio Grande do Sul, n 01, 2006. p. 77.
[6] THOME, Candy Florêncio. O Assédio Moral nas Relações de Emprego. 1ª ed. São Paulo: LTr Digital. 2008 < https://secure.jurid.com.br/bibliotecaltr/#>.
[7] FERREIRA, Maria Cristina Sanchez Gomes. Assédio Moral- Breves Linhas Conceituais. Revista do Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul, Rio Grande do Sul, n 01, 2006. p. 77.
[8] WAGNER, Jorge Luis; RAMBO, Luciana Inês; SPACIL, Daiane Rodrigues. Assédio moral: a microvalência do cotidiano.Uma cartilha voltada para o serviço público. Disponível em: http:www.assediomoral.org. Acesso em: 13 ago 2010.
[9] GUEDES, Márcia Novaes. Terror Psicológico no Trabalho. São Paulo: LTr, 2003. p. 57.
[10] LIMA FILHO, Francisco das C. Elementos Constitutivos do Assédio Moral nas Relações Laborais e a Responsabilização do Empregador. Revista do Ministério Público do Trabalho do Mato Grosso do Sul, Mato Grosso do Sul, n 01, 2007. p. 167.
[11] SOARES, Lucyne Pereira da Silva. O exercício do poder empregatício e o assédio moral. Contexto atual. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1801, 6 jun. 2008. Disponível em: . Acesso em: 29 ago. 2009.
[12] LIMA FILHO, Francisco das C. Elementos Constitutivos do Assédio Moral nas Relações Laborais e a Responsabilização do Empregador. Revista do Ministério Público do Trabalho do Mato Grosso do Sul, Mato Grosso do Sul, n 01, 2007. p. 170.
[13] GUEDES, Márcia Novaes. Terror Psicológico no Trabalho. São Paulo: LTr, 2003. p. 95.
[14] FERREIRA, Maria Cristina Sanchez Gomes. Assédio Moral- Breves Linhas Conceituais. Revista do Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul, Rio Grande do Sul, n 01, 2006.p. 80.
[15] GUEDES, Márcia Novaes. Terror Psicológico no Trabalho. São Paulo: LTr, 2003.p. 94.
[16] LIMA FILHO, Francisco das C. Elementos Constitutivos do Assédio Moral nas Relações Laborais e a Responsabilização do Empregador. Revista do Ministério Público do Trabalho do Mato Grosso do Sul, Mato Grosso do Sul, n 01, 2007. p. 189.
[17] ASSEDIO MORAL NO TRABALHO. Coordenação de Margarida Barreto. Desenvolvido pela Abelhaweb, 2001-2008. Apresenta legislações referente ao assédio moral. Disponível em: http://www.assediomoral.org/spip.php?rubrique3. Acesso em 29 ago 2009.
[18] IRACEMÁPOLIS. Lei nº 1163/2000, de 24 de abril de 2000. Dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática de assédio moral nas dependências da Administração Pública Municipal Direta por servidores públicos municipais.
[19] BRASIL. Projeto de Lei 4326/2004. Dispõe sobre a criação do Dia Nacional de Luta contra o Assédio Moral e outras providências.
[20] BRASIL. Projeto de Lei Federal nº 4741/2001. Introduz artigo 146-A, no Código Penal Brasileiro - Decreto-lei nº 2848, de 7 de dezembro de 1940 - , dispondo sobre o crime de assédio moral no trabalho.
[21] BRASIL. Projeto de Lei Federa nº 4591/2001. Dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática de "assédio moral" por parte de servidores públicos da União, das autarquias e das fundações públicas federais a seus subordinados, alterando a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990.
[22] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
[23] BARRETO. Marco Aurélio Aguiar. Assédio Moral no Trabalho - Responsabilidade do Empregador- Perguntas e Respostas. 1ª ed. São Paulo: LTr Digital. 2007, <https://secure.jurid.com.br/bibliotecaltr/#>.
[24] FONSECA, Ricardo Tadeu Marques da; GOSDAL, Thereza Cristina. Ministério Público do Trabalho e o Assédio Moral. Assédio Moral Interpessoal e Organizacional/ Um Enfoque Interdisciplinar. Organizadoras: Thereza Cristina Gosdal e Lis Andrea Pereira Soboll. São Paulo: LTr , 2009. p. 83.
[25] MILDNER, Roberto Portela. A Ação Civil Pública e a Reparação do Dano Coetivo no Processo do Trabalho. Revista do Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, n 01, 2006. p. 86.
[26] GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios. Tutela de Interesses Difusos e Coletivos. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007 (Coleção Sinopses Jurídicas; v. 26). p. 10.
[27] MILDNER, Roberto Portela. A Ação Civil Pública e a Reparação do Dano Coetivo no Processo do Trabalho. Revista do Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, n 01, 2006. p. 100.
[28] MELO, Raimundo Simão de. Danos ao Meio Ambiente do Trabalho e à Saúde do Trabalhador: Responsabilidade e Prescrição. Revista do Ministério Público do Trabalho do Mato Grosso do Sul, Campo Grande, n 01, 2007. p. 206.
[29] FONSECA, Ricardo Tadeu Marques da; GOSDAL, Thereza Cristina. Ministério Público do Trabalho e o Assédio Moral. Assédio Moral Interpessoal e Organizacional/ Um Enfoque Interdisciplinar. Organizadoras: Thereza Cristina Gosdal e Lis Andrea Pereira Soboll. São Paulo: LTr , 2009. p.88.
Bacharela em Direito pela Universidade Tiradentes-se. Pós-graduanda em direito público pela rede LFG de ensino. Analista de direito do Ministério Público do Estado de Sergipe.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LIMA, Amanda Maria Prado. Legitimidade do Ministério Público Estadual no combate ao Assédio Moral Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 out 2010, 08:49. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/21771/legitimidade-do-ministerio-publico-estadual-no-combate-ao-assedio-moral. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: LEONARDO DE SOUZA MARTINS
Por: Willian Douglas de Faria
Por: BRUNA RAPOSO JORGE
Por: IGOR DANIEL BORDINI MARTINENA
Por: PAULO BARBOSA DE ALBUQUERQUE MARANHÃO
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