Introdução
O tema proposto faz alusão acerca da possibilidade do Ministério Público realizar investigação pré-processual como meio de fundamentar possível denúncia criminal.
Este assunto tem despertado grande discussão sobre a possibilidade do Órgão Ministerial, presidir investigação criminal, tema este que vem gerando calorosos debater na doutrina e divergências na jurisprudência. Em que pese tal quadro, o mais recente entendimento do Supremo Tribunal Federal parece vir pacificar o entendimento pela concessão de poderes investigatórios ao Ministério Público, conforme será demonstrado a seguir:
Desenvolvimento
Em que pese os embargos de parcela da doutrina que se posiciona no sentido de não poder o Ministério Público realizar a investigação criminal, o Superior Tribunal de Justiça ao julgar Habeas Corpus substitutivo de Recurso Ordinário, declarou que ao Ministério Público cabe o poder de investigação criminal, conforme se vislumbra na ementa a seguir:
CRIMINAL. HC. DETERMINAÇÃO DE COMPARECIMENTO AO NÚCLEO DE INVESTIGAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA DEPOR. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO-CONFIGURADO. ORDEM DENEGADA. Têm-se como válidos os atos investigatórios realizados pelo Ministério Público, que pode requisitar esclarecimentos ou diligenciar diretamente, visando à instrução de seus procedimentos administrativos, para fins de oferecimento de denúncia. Ordem denegada. [4] (grifamos)
O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, julgou recentemente a questão da admissibilidade da investigação criminal por parte do Ministério Público no Recurso Ordinário nº 81.326-DF, como se pode observar na ementa a seguir:
A Constituição Federal dotou o Ministério Público do poder de requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial (CF, art. 129, III). A norma constitucional não contemplou a possibilidade do parquet realizar e presidir inquérito policial. Não cabe, portanto, aos seus membros inquirir diretamente pessoas suspeitas de autoria de crime. Mas requisitar diligência nesse sentido à autoridade policial. Precedentes. O recorrente é delegado de polícia e, portanto, autoridade administrativa. Seus atos estão sujeitos aos órgãos hierárquicos próprios da Corporação, Chefia de Polícia, Corregedoria. Recurso conhecido e provido [5]. (grifamos)
São fortes os argumentos que autorizam o Órgão Ministerial a proceder investigação criminal, entre eles a Teoria dos Poderes implícitos, segundo o qual, quando a Carta Magna concede os fins, dá os meios, que se a atividade fim, foi outorgada ao "parquet" em competência de privatividade, não haveria como não lhe disponibilizar a obtenção de prova para tanto, já que o Código de Processo Penal permite que peças de informação fundamentem a denúncia.
Tal argumento, a nosso ver, repele certeiramente o argumento trazido pela corrente contrária ao poderes investigatórios do Ministério Público baseado na inexistência de tal atribuição institucional no art. 129 da Constituição Federal. Ainda que tal prerrogativa não esteja expressa no referido artigo da Carta Magna, trata-se de instrumento necessário ao exercício pleno do direito de ação.
Outro ponto a ser levado em conta é que os vícios do inquérito, peça dispensável para formação da "opinio delicti" pelo Ministério Público, não contaminam a ação, até porque não se contemplam nesta fase da persecução criminal os princípios da ampla defesa e contraditório, ademais o Inquérito policial é inquisitorial, mero procedimento administrativo.
Conclusão
Por derradeiro, deve-se registrar que o Ministério Público, em diversas ocasiões e por diversos motivos, se mostra um investigador mais eficiente do que a própria Polícia Judiciária, que sofre diversas limitações. Como exemplo, pode-se citar o fato de os Delegados de Polícia não possuírem as prerrogativas funcionais dos Promotores e Procuradores (vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios), o que pode comprometer a investigação por influências políticas em um caso de grande repercussão.
Esse quadro fático com certeza não pode ser ignorado quando se fala dos poderes investigatórios do Ministério Público, não sendo ousado demais dizer que deve ser repensada a inexistência de maiores prerrogativas funcionais aos Delegados de Polícia.
Por fim, cabe registrar as palavras do Ministro Carlos Ayres Brito, quando, votando no Inquérito 1.968-DF, resumiu o sentimento de quem deseja um Ministério Público forte e atuante:
"Investigar fatos, documentos e pessoas, assim, é da natureza do Ministério Público. É o seu modo de estar em permanente atuação de custos legis ou de defesa da lei. De custos iuris ou de defesa do Direito. Seja para lavrar um parecer, seja para oferecer uma denúncia, ou não oferecer, ou seja ainda para pedir até mesmo a absolvição de quem já foi denunciado".
"Privar o Ministério Público dessa peculiaríssima atividade de defensor do Direito e promotor da Justiça é apartá-lo de si mesmo. É desnaturá-lo. Dessubstanciá-lo até não restar pedra sobre pedra ou, pior ainda, reduzi-lo à infamante condição de bobo da Corte. Sem que sua inafastável capacidade de investigação criminal por conta própria venha a significar, todavia, o poder de abrir e presidir inquérito policial".
Referencias Bibliográficas:
BARROSO, Luís Roberto. Investigação pelo Ministério Público. Argumentos contrários e a favor. A síntese possível e necessária. Parecer disponível na Internet em: . Acesso em: 20 nov. 2004.
BRASIL. 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 233.072-4/RJ. Relator: Ministro Nelson Jobim. Brasília/DF: 18 de maio de 1999. Diário da Justiça de 03 de maio de 2002.
BRASIL. 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal. Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 81.326-7/DF. Relator: Ministro Nelson Jobim. Brasília/DF: 06 de maio de 2003. Diário da Justiça de 1º de agosto de 2003.
BRITO, Carlos Ayres. Voto no Inquérito 1.968/DF no Plenário do Supremo Tribunal Federal. 1º set. 2004. Disponível em . Acesso em: 31 mar. 2006.
GRINOVER, Ada Pellegrini. Investigações pelo ministério público. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.12, n.145, p. 4-5, dez. 2004.
RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 8ª edição. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2004.
PONTES, Manuel Sabino. Investigação criminal pelo Ministério Público: uma crítica aos argumentos pela sua inadmissibilidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1013, 10 abr. 2006. Disponível em: . Acesso em: 13 out. 2010.
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