1. Introdução
No Direito, os bens existentes e pertencentes aos seus respectivos proprietários e possuidores poderão ser livremente alienados conforme as suas livres vontades. No entanto, quando tais bens estão sujeitos à responsabilidade patrimonial, em face de débitos relacionados aos seus devedores, esses bens não podem ser alienados, sob pena de caracterização de fraude.
Entre as formas de fraude na alienação dos bens sujeitos à execução, serão explicadas neste trabalho as chamadas fraude contra credores e fraude à execução, citando-se, ao final, a diferença entre ambos os institutos de Direito Processual Civil Brasileiro.
2. Fraude contra Credores
Esta é uma modalidade fraudulenta de bens, também conhecida como fraude pauliana. É a menos grave dentre as modalidades de fraude existente. Está prevista no Código Civil, integrando, entretanto, o Direito Processual, visto que se relaciona à responsabilidade patrimonial.
Consiste tal instituto na diminuição pelo devedor de seu patrimônio, a ponto de tornar-se insolvente, caracterizando o que a doutrina denomina de “dano”. Necessita, para ser configurada, também do elemento fraude, que é a intenção de querer esse estado. Observe-se, porém, que, nos atos com fraude a título gratuito, não se verifica o instituto aqui analisado.
Entende grande parte da doutrina que a fraude contra credores é um ato válido, porém sem eficácia. E isto se dá, pois, para ser considerado inválido, o ato praticado deve referir-se a um vício intrínseco dele, o que não ocorre com este tipo de fraude, cuja invalidade está ligada ao vício intrínseco do ato. Sendo extrínseco, o ato será considerado ineficaz, não inválido.
Quanto à ineficácia do ato fraudulento contra credores, verifica-se que ele pode ser enquadrado como uma ineficácia relativa, ou seja, inoponível a terceiros. Estes não serão atingidos pelo ato, embora este seja válido.
No que pertine ao efeito programado e ao efeito secundário, o primeiro consiste nos objetivos almejados pelas partes na formação do ato jurídico. Já os secundários, seriam as hipóteses em que as partes envolvidas no ato jurídico não desejem querer os resultados advindos, ou seja, involuntária. No caso da fraude contra credores, os efeitos programados consistem na possibilidade de uma pessoa alienar um bem para outra e, como pagamento, receber o valor equivalente. Já em relação aos efeitos secundários, eles não serão verificados, pois, em sendo o bem alienado de forma fraudulenta, este permanece passível de penhora por um credor do alienante, que realizou a venda mencionada.
Questão que se discute é a natureza jurídica da sentença na Ação Pauliana. Para responder a esta dúvida, é preciso verificar se a ineficácia é originária (o ato praticado é incapaz de produzir efeitos jurídicos) ou se a ineficácia é sucessiva (se o ato é capaz de produzir efeitos jurídicos até que seja proferida decisão judicial). Caso seja ineficácia originária, tem-se que a sentença será meramente declaratória. Se sucessiva, a sentença será constitutiva.
Logo, em princípio, parece que os bens alienados em fraude contra credores não são passíveis de penhora, pois tais bens foram transferidos para a esfera patrimonial de outrem. No entanto, advindo a sentença da Ação Pauliana, será restaurado a situação original, podendo o bem ser levado à penhora. Isso é o que revela a natureza constitutiva da decisão judicial, a qual retirará a eficácia em relação ao credor, além de tornar ineficaz o ato jurídico entre o credor e o devedor.
3. Fraude à Execução
Outra modalidade de fraude na alienação de bens, a doutrina considera a fraude à execução como uma “especialidade” da fraude pauliana. Tal comparação se dá quando se tem em vista a hipótese do inciso II, art. 593, do CPC, apenas. As outras hipóteses nada se referem àquela modalidade de fraude à alienação de bens.
Cabe ressaltar que, dentre as hipóteses de fraude à execução (art. 593, CPC), há vários elementos comuns, dentre os quais se situa a dispensa do elemento subjetivo, que consiste, para que se configure a fraude, no concerto entre os sujeitos que o praticam. Assim como na fraude contra credores, o ato praticado na fraude à execução é válido, mas ineficaz e inoponível ao credor.
O primeiro caso de fraude à execução, previsto no inciso I, do art. 593, diz respeito à fraude na pendência de demanda fundada em direito real. Trata-se de execução ligada à entrega de coisa. Embora a lei equipare os efeitos, não consiste, na verdade, em uma modalidade de fraude. O objetivo foi evitar, com essa equiparação, que houvesse uma sucessão processual fraudulenta, ingressando, na ação, uma pessoa insolvente, sub-rogando o demandado.
Quanto à segunda hipótese, prevista no inciso II, do art. 593, tem-se que é dispensável saber se houve intenção do demandado em tornar-se insolvente, prejudicando o credor. Basta apenas verificar se estão presentes os requisitos para a caracterização da hipótese prevista.
O requisito principal para a configuração deste caso de fraude à execução é que o ato fraudulento se dê na pendência de um processo capaz de reduzir o devedor à insolvência. É a chamada litispendência. Para que esta se configure, faz-se necessário a citação válida do demandado em outro processo idêntico.
Após este ato processual, verifica-se a ocorrência da modalidade de fraude aqui expositada. No entanto, mesmo antes da citação, poderá ocorrer a fraude de execução, provando o credor que o devedor sabia da existência de um outro processo já em andamento.
Embora a lei fale em “demanda capaz de reduzir o devedor à insolvência”, o que tornará, na verdade, o devedor insolvente é o ato de alienação ou oneração realizado no curso do processo, caracterizando, assim, a fraude à execução.
No que pertine ao inciso III, do art. 593, da lei processual civil, os outros casos expressos em lei podem ser, a título de exemplo, o contido no art. 672, §3º, CPC e o contido no art. 185 do CTN.
4. Distinção
Diante do exposto, pode-se afirmar que, enquanto a fraude à execução gera a ineficácia originária, pois o ato é inapto a produzir quaisquer efeitos jurídicos, a fraude contra credores gera ineficácia sucessiva, produzindo o ato jurídico efeitos até que advenha sentença desconstituindo o ato fraudulento (sentença pauliana). Na fraude à execução, pelo motivo supracitado, não se faz necessário ajuizar nenhuma ação visando o reconhecimento da fraude.
Distinguem-se ainda essas modalidades de atos de alienação fraudulentos no que diz respeito à espécie de execução. Enquanto na fraude contra credores a execução é para entrega de quantia certa, na fraude à execução a entrega é de quantia ou de coisa.
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