As astreintes, previstas no art. 461, §1º, do Código de Processo Civil, são multas diárias aplicadas ao devedor que estiver em mora com a sua obrigação para coagi-lo ao cumprimento, sendo tal instituto mais um instrumento em prol da máxima efetividade da prestação jurisdicional.
Foi dada ao magistrado a discricionariedade para dosar a quantidade necessária das astreintes para provocar o devedor ao adimplemento da obrigação. Consoante o §6º do art. 461 do CPC, o aspecto da suficiência do valor poderá ser revisto a qualquer tempo, independente da iniciativa das partes, para que a multa mantenha a proporcionalidade adequada ao caso.
No mesmo passo, o juiz detém certa liberalidade para controlar o período em que as astreintes serão vigentes, tendo em vista as especificidades do caso concreto.
Nota-se que a mens legis foi deixar a cargo do magistrado o manuseio desta multa, eis que somente ele possui a devida intimidade com o processo para, com equidade, arbitrar o tal valor.
Assim sendo, toda a tentativa de se criar critérios objetivos para a aplicação das astreintes, que não sejam os legais, irão falhar, haja vista a imperiosa necessidade da discricionariedade do juiz em tais casos.
Com coerência, a jurisprudência e a doutrina enfatizam os parâmetros legais que ensejam o término da incidência da multa, quais sejam, o adimplemento da obrigação e a impossibilidade superveniente de se cumpri-la.
Entretanto, segundo o STJ, isso não quer dizer que o magistrado possua algum supedâneo para prever o término da incidência das astreintes, haja vista que a sua finalidade é induzir o devedor ao pagamento, portanto, deve perdurar até o momento em que a obrigação for adimplida ou se tornar impossível a posteriori:
“No entanto, não há fundamento legal, nem lógico, para a fixação de termo final para a incidência da multa. Tal marco será o dia do cumprimento da obrigação. Enquanto não cumprida a ordem judicial a multa incidirá.” (Voto do Min. Rel. Humberto Gomes de Barros nos autos do REsp nº 890.900/SP, DJ 13.05.2008)
No entanto, são legitimas algumas sugestões dadas pela jurisprudência no sentido de embasar o juiz quando da fixação das astreintes.
Nas entrelinhas, percebe-se que o real sentido da existência desta multa é dar maior prestígio e exigibilidade às decisões judiciais. Por isso, a orientação da massiva jurisprudência é a de se aplicar os valores levando em consideração a possibilidade máxima do devedor em arcar com o ônus da desobediência do comando judicial.
Não se pode deixar de ressaltar que o devedor possui meios imediatos para impugnar a aplicação das astreintes, mas, na maioria das vezes, por afronta ao mandamento judicial, opta por se quedar inerte ao cumprimento da obrigação e nem sequer informa o juízo dos motivos do não-cumprimento.
Por estas razões, as astreintes deverão vigorar até o adimplemento da obrigação ou a impossibilidade superveniente de se cumpri-la, não podendo o magistrado converter a obrigação em perdas e danos ex offício, pois violaria a finalidade legal das astreintes, qual seja, penalizar o devedor recalcitrante em cumprir a obrigação judicialmente imposta.
Inadequado seria olvidar de que o ponto mais importante trazido pela Lei nº 8.952/94, em alteração ao Código de Processo Civil, foi a alteração da regra geral de conversão ex offício das obrigações de fazer em perdas e danos pela execução específica.
Portanto, cumpre ao magistrado apenas modular os valores periódicos das astreintes para mantê-las num patamar necessário a compelir o devedor ao adimplemento, pouco importando o montante em que a dívida já se encontra, eis que tal fato só se dá, em grande parte, pela desídia do devedor.
Vejamos, então, um julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo que corrobora as afirmações até então feitas:
“As astreintes foram instituídas para convencer o devedor a cumprir a obrigação de fazer em tempo razoável (...), quando ocorre o imcumprimento injustificado, com o devedor pouco ou nada se importando com a possível incidência das astreintes, a sua exigibilidade passa a ser questão de honra para a efetividade do processo.” (RT 792/253)
Por derradeiro, cumpre transcrever os brilhantes apontamentos de Nelson Nery e Rosa Maria de Andrade Nery que sintetizam o pensamento aqui exposto sobre o tema:
“Não há limites para a fixação da multa, e sua imposição deve ser em valor elevado, para que iniba o devedor com intenção de descumprir a obrigação. O objetivo precípuo das astreintes é compelir o devedor a cumprir a obrigação e sensibilizá-lo de que vale mais a pena cumprir a obrigação do que pagar a pena pecuniária. A ilimitação da multa nada tem a ver com o enriquecimento ilícito do credor, porque não é contraprestação de obrigação, nem tem caráter reparatório (Código de processo civil comentado e legislação extravagante, 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, v. I, p. 1013).”
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