A Lei 12.010, de 3 de agosto de 2009, traz na sua essência a clara tentativa de manter a criança e/ou adolescente o mais próximo de sua origem biológica. A família natural, ligada pela identidade genética, terá preferência em relação à família substituta, que se formará como consequência da desconstrução da citada família sanguínea. Assim, depois de esgotadas todas as possibilidades de adoção da criança por seus parentes consaguíneos, ela terá, enfim, a possibilidade de ser recebida como filho por uma pessoa a ela estranha.
A Lei Nacional de Adoção (L.N.A.) estabelece prazo para agilizar os processos de adoção, numa tentativa de reduzir o número de crianças e adolescentes institucionalizados; porém não soluciona questões de ampla discussão na sociedade, como exemplo, a adoção por casais homoafetivos. Ímpar destacar que após decisão do Supremo Tribunal Federal na equiparação da parceria homoafetiva às uniões estáveis heterossexuais, à adoção por casais homoafetivos não deve existir empecilhos quando tem por fim o melhor interesse do adotando.
A L.N.A. peca, também, por não disciplinar a adoção pré-natal. A adoção de embriões excedentários, produtos da Reprodução Assistida (R.A.), é considerada hipótese mais humana de destinação dos embriões não reclamados. Os embriões criopreservados nas mais de 150 clínicas brasileiras de R.A. (GONÇALVES, 2010, p. 363) ou serão objeto de pesquisas ou doados as pessoas interessadas; Inaceitável é a opção de descarte, pois o embrião criopreservado, mesmo não tendo status de pessoa, se equipara ao nascituro, ambos se diferenciam apenas na forma da concepção.
As técnicas de R.A., homóloga ou heteróloga, buscadas por casais homo ou heterossexuais, estão cada vez mais acessíveis, ao passo que as mudanças trazidas pela L.N.A. são rigorosas e, além de não permitir a adoção por casais homossexuais, dificultam ou, até mesmo, impossibilitam a adoção por família substituta e a adoção internacional.
Segundo nova resolução do Conselho Federal de Medicina (C.F.M.) “Todas as pessoas capazes podem ser receptoras das técnicas de reprodução assistida", como exemplifica Débora Diniz: “Um homem sozinho, uma mulher lésbica, uma travesti ou uma pessoa intersexo, qualquer uma delas pode ter seu desejo de filhos realizado com o auxílio das técnicas médicas.” (DINIZ, 2011)
Preocupação trazida por Maria Berenice Dias é que a doação de gametas e/ou embriões se torne frequente, pela facilidade cada vez maior obtida por solteiros ou pelos casais, heterossexuais ou não, às técnicas de R.A..
A lei (L.N.A.) assusta e as pessoas estão desistindo e fazendo filhos. É uma caça às bruxas, uma lei muito perversa. Há uma insistência na ideia de que o local da criança é a família biológica. Não é. Pai e mãe é quem cria e quem embala, quem a criança conhece. Precisa acabar com essa burocracia horrível. (DIAS, 2011)
No Brasil, como afirma Carlos Roberto Gonçalves, o Conselho Federal de Medicina autoriza, após três anos de congelamento, que os embriões sejam doados com autorização dos donos (GONÇALVES, 2010, p. 363). “A doação nunca terá caráter lucrativo ou comercial” e “os doadores não devem conhecer a identidade dos receptores e vice-versa”, assim regulamentado pelo C.F.M.. Essa doação pode acarretar, juntamente com a proibição da adoção por casais homossexuais e os rigores da L.N.A., o aumento do número de crianças em abrigos.
Segundo resolução do C.F.M., “as técnicas de reprodução assistida têm o papel de auxiliar na resolução dos problemas de reprodução humana, facilitando o processo de procriação quando outras terapêuticas tenham se revelado ineficazes ou consideradas inapropriadas.” Muitos irão optar pela R.A. em detrimento a adoção de crianças e adolescentes, pois realizarão os desejos de terem filhos com traços sanguíneos de forma “autônoma”, através da doação de gametas. Além de permitir que uma mulher solteira ou com parceiro impedido de reproduzir possa realizar o sonho da gravidez.
“A permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional não se prolongará por mais de dois anos” (art. 19, Lei nº 8.069), porém, na prática, esse prazo será superior, pela iminente popularização da R.A., promovida pela resolução nº 1.957/2010 do C.F.M..
Adoção é ato de amor e aceitação, não é exclusiva de pessoas estéreis, embora mais frequente. Como driblar o burocrático processo de adoção e reduzir o tempo de permanência da criança em abrigos garantindo-lhes o direito de serem criadas e educadas no seio de uma família, seja ela natural, extensa ou substituta, é o questionamento que só a reinvenção do afeto pode responder: Um estranho pode se tornar um filho numa família com amor, assim como um filho pode ser um estranho numa sem afeto.
Referências:
DINIZ, Débora. Desejo de filhos. In: http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=707. Acessado: 10/02/2011, às 19h.
DOMINGOS, Roney. “Casais sofrerão menos preconceito”, diz mãe que teve filhos com parceira: Nova medida garante a homossexuais acesso a técnicas de fertilização.
Mães de Carapicuíba garantiram na Justiça direito de registrar filhos. In: http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2011/01/casais-sofrerao-menos-preconceito-diz-mae-que-teve-filhos-com-parceira.html. Acessado: 17/01/2011, às 18h.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. 7. ed. v. 7. São Paulo (SP): Saraiva, 2010.
RIBEIRO, Paulo Hermano Soares; SANTOS, Vivian Cristina Maria; SOUZA, Ionete de Magalhães. Nova Lei de Adoção Comentada. 1. ed. Leme (SP): J.H. Mizuno, 2010.
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