Palavras-chave: Criminalidade. Regime Disciplinar Diferenciado. Direitos Humanos. Ressocialização. Constitucionalidade.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO 2 DO REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO 2.1 Comentários da alteração da Lei de Execução Penal (LEP) 3 A INCONSTITUCIONALIDADE DO REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO EM RELAÇÃO AOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS DO CONDENADO 4 CONCLUSÃO REFERÊNCIAS.
O presente trabalho pretende demonstrar a situação jurídica do Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) no que concerne à sua inconstitucionalidade em face dos princípios que são infringidos no momento em que esta medida é aplicada, bem como às posições doutrinárias e jurisprudenciais que vêm sendo adotadas quanto à matéria.
A atual legislação penal ao longo do tempo vem implantando em seu texto algumas medidas drásticas relacionadas ao caos em que diversos presídios vêm sofrendo, em razão da falta de controle da própria administração penitenciária e da inadequada aplicação das normas pelo Judiciário que são fixadas, em regra, pelo legislativo.
Entretanto, essa mudança no Ordenamento Penal só vem ocasionando revoltas aos que se encontram presos e insegurança jurídica a sociedade, pois esse Regime disciplinar tem como escopo aplicar castigos severos, cruéis e desumanos aos encarcerados que implicam em faltas graves ou apresentem risco à ordem e a segurança do estabelecimento penal, tendo, assim, o legislador a grande ilusão de que aplicando medidas de natureza punitiva, chegaria ao fim da crise penitenciária esquecendo, portanto, que o problema não está nos presídios, mas sim na falta de aplicação efetiva das normas que já se encontram elencadas no sistema normativo e na ausência de recursos básicos para se manter uma sociedade digna.
Nesse sentido, a definição jurídica acerca do RDD, atribuindo-lhe ou não constitucionalidade bem como o considerando ou não medida eficaz para os encarcerados, admite previsões bastante ilegais, pois sua gravidade se funda primordialmente em relação à violação dos direitos fundamentais da pessoa humana.
Sobre tal questionamento, diversos estudiosos emitem as mais variadas opiniões, não se podendo apontar de forma pacífica o entendimento prevalecente. Isso porque, desde a Resolução SAP n° 026, a partir da qual esse Regime foi implantando, já apresentava algumas discussões sobre sua constitucionalidade, uma vez que havia sido criado por ato de Secretário de Estado, o qual de acordo com o artigo 22, I, da Constituição Federal não possui competência para tal ação. No entanto, o próprio ordenamento jurídico brasileiro, em virtude dessa ilegalidade, criou a nova Lei 10.792/03, que alterou alguns dispositivos da Lei de Execução Penal (LEP) tornando-se, assim, incompatíveis com alguns princípios fundamentais previstos na Constituição Federal.
Todavia, mesmo com essas incompatibilidades o Congresso Nacional aprovou essa lei que entrou em vigor no dia 1° de dezembro de 2003. Sua origem deu-se por meio de resoluções, mas devido à ilegitimidade do meio adotado para implantar esse Regime, o Presidente da República elaborou um anteprojeto a fim de legalizar essa medida que já estava sendo adotada nos presídios.
Essa medida cautelar surgiu em meio a uma onda de criminalidade e violência por parte dos detentos que não viam seus direitos respeitados e nem acolhidos, portanto com o intuito de ver seus direitos mínimos alcançados, revoltaram-se por meio de organizações criminosas, subvertendo a ordem do cárcere e amedrontando a sociedade que se vê indefesa por conta da falta de controle do Estado perante esses criminosos.
Contudo, a administração penitenciária como não dispõe de provimentos suficientes para controlar essa crise em razão da falta de assistência do próprio Estado, a única solução foi criar uma nova lei opressora a fim de solucionar esse problema, e foi com objetivo de solucionar esse tal problema que surgiu o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), que até hoje vem sendo matéria de grandes discussões pelos doutrinadores. Sendo assim, como compatibilizar esse Regime drástico à Constituição Federal?
A atual lei que modificou a LEP veio com o objetivo de amenizar esses conflitos que ocorrem dentro dos estabelecimentos prisionais, tendo o intuito de atribuir uma maior segurança à sociedade e, principalmente, aos que se encontram detidos nesse Sistema Carcerário falido, mas pelo que se percebe só tem ocasionado mais problemas ao mundo do crime.
A escolha do tema foi motivada por reflexões acerca dos problemas comentados acima, preocupando-se, portanto, com os aspectos fundamentais à vida do condenado, mais precisamente à sua dignidade humana que está sendo cada vez mais abolida por essas novas leis opressoras que surgem em razão de um determinado fato social, tornado o corpo legislativo brasileiro um verdadeiro “tonel” de normas sem coesão, em razão da maneira isolada de legislar.
Inúmeras conseqüências práticas serão observadas conforme o momento em que se define o ingresso desse Regime Disciplinar Diferenciado no ordenamento jurídico, pois o mesmo vai de encontro a diversos princípios constitucionais, quais sejam: o princípio da legalidade, da dignidade da pessoa humana, da presunção de inocência, da humanização das penas. A Constituição Brasileira e o Sistema Internacional de Direitos Humanos não admitem em seus textos penas cruéis, desumanas que ofendam a integridade física do condenado e, principalmente, o seu psicológico, uma vez que fica abalado em virtude das repressões que sofrem em razão dessa medida drástica, fugindo, assim, da função essencial da pena que é ressocializar. Contudo, não há como tratar a respeito da Lei Federal 10.792/03 sem admiti-la como inconstitucional.
Assim, dentre tantas repercussões, este trabalho terá como alvo, o estudo sobre a Inconstitucionalidade do Regime Disciplinar Diferenciado, face à entrada em vigor da Lei 10.792, de 1° de dezembro de 2003 que deu origem a esse Regime no corpo normativo.
2 DO REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO (RDD)
Como ponto de partida na tentativa de esclarecer as indagações jurídicas a respeito do Regime Disciplinar Diferenciado, indispensável se faz definir seu conceito e sua finalidade.
O Regime Disciplinar Diferenciado como se viu no capítulo anterior, surgiu em meio a uma onda de violência e criminalidade que vêm ocorrendo dentro dos presídios em razão da falência do sistema carcerário, é adotado para os presos que vem prejudicando a ordem dentro dos presídios levando como conseqüência a insegurança da sociedade e principalmente daqueles que convivem dentro do cárcere.
Faz-se necessário, portanto, estabelecer a definição do termo RDD levando em consideração os elementos jurídicos que irão nortear o presente trabalho. Com atributo define Marcão (2008, p.39) que:
O regime disciplinar diferenciado é modalidade de sanção disciplinar (art.53, V, da LEP), e para sua aplicação basta a prática do fato regulado. Não é preciso aguardar eventual condenação ou o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, o que por certo inviabilizaria a finalidade do instituto.
Complementa ainda o autor (2008, p. 39) que:
Conforme disciplinado, o RDD - regime disciplinar diferenciado – possui as seguintes características: 1°) duração máxima de 360 dias, sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada. Em se tratando de preso provisório, sem pena aplicada, na falta de expressa previsão legal, leva-se em conta a pena mínima cominada; 2°) recolhimento em cela individual; 3°) visitas semanais de duas pessoas, sem contar as crianças, com duração de duas horas; 4°) o preso terá direito à saída da cela por duas horas diárias para banho de sol.
Contudo, esta medida não se trata de mais um novo Regime adotado pelo Direito Penal como o Regime fechado, semi-aberto e aberto, mas como uma medida cautelar, ou seja, uma forma de punição mais drástica imposta aos presos delinqüentes com a finalidade de prevenir e diminuir a criminalidade, tornando esses infratores, indivíduos disciplinados, além de amenizar os conflitos destes dentro do cárcere, que mesmo já sofrendo uma pena cominada pelo Estado em virtude do crime praticado, continuam a delinqüir, pois o que se entende é que esta pena cominada que foi aplicada já não seria mais eficaz para a ressocialização do apenado.
Portanto, como já é de se saber essa nova forma de punir do Estado vem sendo adotada desde 2003 principalmente no interior dos presídios de São Paulo (SP) e Rio de Janeiro (RJ), que acreditam que fixando uma medida mais severa, isolando os presos que são líderes e integrantes de facções criminosas ou que obtenham um comportamento que põe em risco a Segurança Pública dos demais, possam vir a melhorar a ordem no cárcere e evitar problemas futuros como rebeliões e práticas de crimes.
2.1 Comentários sobre alteração da Lei de Execução Penal (LEP)
Ajudando a esclarecer a conceituação do Regime Disciplinar Diferenciado, far-se-á uma breve análise dos artigos da Lei de Execução Penal que dispõe sobre este tema.
A nova Lei 10.792 introduzida no ordenamento jurídico brasileiro em 1° de dezembro de 2003 alterou alguns artigos da Lei de Execução Penal, destarte tratando sobre essa reforma o Poder Judiciário acrescentou determinados dispositivos que aborda o Regime Disciplinar Diferenciado.
Nesse sentido, cumpre mencionar o artigo 53 da Lei de Execução Penal que após o surgimento dessa nova lei passou a rezar sobre as sanções disciplinares da seguinte maneira:
Art. 53. Constituem sanções disciplinares:
I – advertência verbal;
II – repreensão;
III – suspensão ou restrição de direitos (artigo 41, parágrafo único);
IV – isolamento na própria cela, ou em local adequado, nos estabelecimentos que possuam alojamento coletivo, observado o disposto no artigo 88 desta lei;
V – inclusão no regime disciplinar diferenciado.
Da leitura do artigo mencionado, percebe-se que com a Lei 10.792/03 foi incluído o inciso V que trata desse novo regime que é atribuído ao preso quando este venha cometer falta grave durante a execução da sua pena.
Porém, com o cometimento desta falta grave que vem disposta no rol do
artigo 51 da LEP, o encarcerado é submetido a uma sanção mais rigorosa, diferente daqueles que venham cometer uma falta mais leve ou média, na qual são proporcionadas apenas algumas advertências, suspensões de acordo com a proporcionalidade da natureza da conduta, isto é, nesse caso serão reprimidos à sanções estabelecidas nos incisos de I a IV do artigo transcrito, em que o próprio diretor do estabelecimento de acordo com que constitui o artigo 53 da mesma Lei pode aplicar sem necessidade da anuência do juiz da execução, diferente do que ocorre com a aplicação do inciso V, por se tratar de uma sanção mais drástica em relação às demais, na qual haverá necessidade da interferência do juiz.
Comentando sobre o tema, ensina Marcão (2008, p. 45):
Compete ao diretor do estabelecimento prisional a aplicação das sanções previstas nos incisos I a V, por ato motivado. A sanção do inciso V só poderá ser aplicada por prévio e fundamentado despacho do juiz competente, observado o procedimento legal.
Complementa o autor (2008, p. 45-46):
É necessário que a sanção seja individualizada e proporcional à conduta, aferindo caso a caso a natureza e gravidade da infração praticada, bem como as circunstâncias do fato e da pessoa do faltoso.
Para o mencionado autor, um dos requisitos para o bom emprego dessas sanções está relacionado ao princípio da proporcionalidade, razoabilidade e não o da cumulatividade, pois cada conduta praticada pelos detentos tem sua sanção específica de acordo com o grau e a natureza da falta cometida, conseqüentemente, a violação a esses princípios caracterizaria ilegalidade da medida aplicada.
Nota-se também que a nova lei inclui esse regime no sistema normativo, na verdade não se trata de uma espécie de regime de cumprimento de pena, mas de uma medida repressiva aos que não cumprem a disciplina no momento da sua execução. Contudo a redação do artigo 52 da lei 7.210/84 passou a ser da seguinte forma:
Art. 52. A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando ocasione subversão da ordem ou disciplina internas, sujeita o preso provisório, ou condenado, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado, com as seguintes características:
I – duração máxima de trezentos e sessenta dias, sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada;
II – recolhimento em cela individual;
III – visitas semanais de duas pessoas, sem contar as crianças, com duração de duas horas;
IV – o preso terá direito a saída da cela por 2 horas diárias para banho de sol.
§ 1° O regime disciplinar diferenciado também poderá abrigar presos provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros, que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade.
§ 2° Estará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso provisório ou o condenado sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando.
Da leitura do artigo mencionado percebe-se expressamente a alteração em relação à antiga redação da Resolução SAP n° 26 de 04 de maio de 2001, que tratava apenas dessa sanção disciplinar no sentido amplo, não explicitando detalhadamente a figura do Regime Disciplinar Diferenciado em caso de cometimento de falta grave, uma vez que antes dessa modificação o artigo 1° dessa ordem era apresentado da seguinte forma: “o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), aplicável aos líderes e integrantes de facções criminosas, bem como aos presos cujo comportamento exija tratamento específico”.
Deste modo, independia de qualquer repercussão a ordem ou disciplina no cárcere de forma relevante, bastando à participação em facções criminosas e comportamento incompatível para imposição da determinada sanção disciplinar, hoje a situação é outra como demonstra o caput da nova redação do artigo 52 em que para aplicação desse Regime não basta o cometimento de uma falta grave qualquer, todavia tem que ocasionar tumulto a ordem, controle e disciplina do estabelecimento prisional, alarmando, assim, uma grande insegurança tanto para quem está dentro como para a sociedade que também sofre os reflexos dessa desordem.
Na tentativa de mitigar esses conflitos, o legislador consagrou medidas mais rigorosas especificando um pouco mais as condutas percebidas como falta grave, a qual vem sendo matéria de grande discussão em relação a sua constitucionalidade.
Ao comentar o citado artigo, afirma Marcão (2008, p. 39) que “[...] não basta, como se vê, a prática consistente em fato previsto como crime doloso. É imprescindível que de tal agir decorra subversão da ordem ou disciplina internas.”
No mesmo raciocínio, conclui o autor (2008, p.40):
Destarte, se o crime doloso praticado pelo preso provisório ou definitivo tumultuar a organização, a normalidade do estabelecimento prisional, ou demonstrar descaso, desobediência aos superiores, abre-se a primeira
hipótese para sua inclusão no regime disciplinar diferenciado.
Cumpre ressaltar ainda, que mesmo sofrendo uma sanção severa esta não exclui a tipicidade da conduta do faltoso, caso venha ser considerada como crime, podendo, ainda, sofrer outras penalidades.
As regras admitidas pelo Regime Disciplinar Diferenciado na nova redação desse artigo aproveitaram alguns dos dispositivos utilizados pela antiga Resolução n° 26/01 mudando apenas na questão do prazo que passou a ser de no máximo 360 (trezentos e sessenta) dias prorrogável até 1/6 (um sexto) da pena em caso de nova falta grave, sem prejuízo de uma nova aplicação desse regime, uma vez que o encarcerado cometa outra falta grave; nas horas diárias para banho de sol, que antes era de 1 (uma) hora apenas, agora passou a ser de 2(duas) horas, já em relação ao direito as informações que antes também não era admitido, agora passou a vigorar por conta do art. 39 das Regras Mínimas do Tratamento aos Prisioneiros.
No entanto, em relação ao isolamento em cela individual e às visitas semanais por período de 2 (duas) horas permaneceram com a mesma redação, restringindo apenas na quantidade de pessoas.
Uma das grandes discussões quanto ao direito das visitas que se faz, é em relação à presença ou não das crianças, ou seja, se é vedada à visita de crianças ou se essas apenas não computam ao número restrito de 2 (duas) visitas. Seria isso uma infrigência ao direito de família? Por força do artigo 227 da CF é importante a convivência familiar para o preso não podendo, portanto, privá-lo desse direito apenas em face da sua periculosidade. Todavia, em razão do artigo 6° do ECA que proíbe a presença de crianças e adolescentes em lugares que possam acarretar problemas ao seu desenvolvimento psicológico e aos seus fins sociais devido a alta periculosidade do meio, seria sim inadmissível a presença destas visitas, pois acabaria infringindo o princípio da proteção integral desses indivíduos que estão em fase de desenvolvimento.
Frisa-se ainda o parágrafo primeiro do aludido artigo, que essa medida drástica do Regime Disciplinar Diferenciado alcança além dos presos provisórios ou condenados, nacionais, também aos presos estrangeiros, diferente do que apresenta o caput do artigo e o parágrafo segundo do mesmo.
A partir dessa análise, conclui se que esses presos, nacionais ou
estrangeiros, submetidos à pena provisória ou definitiva ingressam nesse regime desde que comprometam a ordem e a segurança tanto do estabelecimento prisional como da sociedade, apesar disso não há necessidade da prática de crime doloso como falta grave para enquadrarem nesse regime, basta submeter à sociedade e o estabelecimento prisional em risco.
Dessa forma, preleciona Marcão (2008, p. 40):
Ao contrário do que reclama o caput do art. 52, para a inclusão do preso provisório ou condenado, nacional ou estrangeiro, no regime disciplinar diferenciado, o § 1° do mesmo artigo não exige que tenham eles praticado crime doloso durante o período de permanência no estabelecimento prisional. Para a inclusão no RDD basta que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade.
Resta por fim, a análise do parágrafo segundo do mesmo artigo, o qual faz menção àqueles que participam de organizações criminosas, desta forma é notório saber que não há necessidade do ingresso desses presos nessas alianças criminosas para recaírem nesse regime desumano, pois de acordo com o citado artigo basta à plausível desconfiança de envolvimento com esses grupos para caracterizar a entrada desses delinqüentes nessa medida disciplinar, tratando-se, dessa maneira, de uma medida cautelar, servindo como uma forma de prevenção para evitar esses conflitos dentro dos presídios e, conseqüentemente, a insegurança da sociedade, diferente do que preleciona o caput do mesmo artigo que trata de uma media punitiva, pois para impor esse regime rigoroso é indispensável a pratica de um crime doloso para caracterizar a falta grave.
Entretanto, complementando o estudo do parágrafo segundo, observa-se que os aprisionados a que se refere não incluem os estrangeiros como menciona o parágrafo primeiro do artigo citado, pois não faz menção a eles, sendo assim improvável nesse caso suas admissões nesta medida disciplinar, pois de acordo com que dispõe Marcão (2008, p. 40): “as normas que impõem limitações a direitos devem ser interpretadas restritivamente”. Isto é, sempre com intuito de preservá-los de normas abstratas que não delimitam as matérias e acabam infringindo garantias fundamentais desse indivíduo, portanto, de acordo com o posicionamento elencado, afirma-se que não cabe ao intérprete limitar aonde o legislador não restringiu.
Ainda em relação à nova Lei que inclui o Regime Disciplinar Diferenciado no ordenamento jurídico, dispôs o artigo 60 da LEP da seguinte forma:
Art.60. A autoridade administrativa poderá decretar o isolamento preventivo do faltoso pelo prazo de até dez dias. A inclusão do preso no regime disciplinar diferenciado, no interesse da disciplina e da averiguação do fato dependerá de despacho do juiz competente.
Parágrafo único. O tempo de isolamento ou inclusão preventiva no regime disciplinar diferenciado será computado no período de cumprimento da sanção disciplinar.
Nesse sentido, cumpre ressaltar que de acordo com que demonstra esse artigo, a autoridade administrativa do estabelecimento prisional, independentemente da manifestação do juiz da execução penal, poderá aplicar, em caso de urgência, o isolamento preventivo do preso infrator no prazo máximo de dez dias sem prorrogação, pois, após determinado período será necessário a manifestação do juiz para decidir a aplicação da medida, sob pena de ilegalidade e abuso de poder.
O que vem se discutindo na doutrina quanto a esse prazo é em relação ao artigo 54 § 2°, o qual determina que o juiz possa prolatar sua decisão no prazo de até 15 (quinze) dias após a manifestação do Ministério Público e da defesa. Portanto, seria viável a administração do presídio prorrogar o isolamento do preso até 15 (quinze) dias, já que a decisão do juiz poderá ser dada nesse prazo? Todavia, o aprisionado que se mantém isolado não poderá ter seu prazo de carceragem superior ao período que determina o caput do artigo 60 sob pena de constrangimento ilegal, pois de acordo com o princípio do “favor rei” aplica-se a forma mais favorável ao réu.
Contudo, se vê uma incompatibilidade de prazos em que a doutrina vem resolvendo da seguinte maneira. Assim explica Nucci (2008, p. 1005):
Embora o juiz tenha prazo máximo de 15 dias para decidir a respeito, a autoridade administrativa, em caso de urgência, pode isolar o preso previamente, por até dez dias, aguardando a decisão judicial (art. 60, LEP). Os prazos, no entanto, deveriam coincidir, ou seja, se o juiz tem até 15 dias para deliberar sobre o regime disciplinar diferenciado, o ideal seria que a autoridade administrativa tivesse igualmente 15 dias para isolar o preso, quando fosse necessário. Nada impede, aliás recomenda, no entanto, que o juiz, alertado de que o preso já foi isolado, decida em dez dias evitando-se alegação de constrangimento ilegal.
Também na tentativa de ilustrar sobre esses prazos é encontrado o comentário de Brito (2006, p. 167):
Na ausência de disposição legal quanto ao prazo preventivo do regime, entendemos que não poderá exceder a 10 dias, em interpretação analógica ao próprio artigo 60 que estipula aquele prazo para o isolamento preventivo.
Dispõe ainda o parágrafo único desse artigo a figura da detração que
como se sabe é o período computado da pena privativa de liberdade quando esta já está sendo cumprida de maneira provisória, portanto assemelha-se com o que afirma o determinado artigo citado, pois o período de isolamento preventivo durante o prazo de dez dias vai servir como período já cumprido quando o juiz aplicar a sanção disciplinar de maneira definitiva.
Tratando a respeito do tema, temos a lição de Brito (2006, p. 170):
O tempo de isolamento ou inclusão preventiva no regime disciplinar diferenciado será computado no período de cumprimento da sanção disciplinar. Nada impede que o período de isolamento preventivo seja descontado nos casos em que a sanção aplicada seja a de suspensão ou restrição de direitos.
Continuando na mesma vertente, nota-se ainda a importância de demonstrar a competência para requerer esse regime drástico e a presença de dois princípios fundamentais expressos no artigo 54 e seus parágrafos da Lei de Execução Penal, como o princípio da motivação dos atos e o princípio do contraditório e da ampla defesa.
O Regime Disciplinar Diferenciado para que possa ser empregado em decorrência dos fatos delituosos do artigo 52 da LEP, terá que haver a necessidade do requerimento da autoridade competente do estabelecimento prisional, podendo ser o diretor do presídio ou outra autoridade administrativa, uma vez que essa competência é privativa da administração não podendo o Ministério Público requisitar, e nem o juiz determinar de ofício, tendo estes respectivamente apenas o dever de apresentar o parecer e decidir sobre a imposição ou não dessa medida cautelar. Desta forma, vale destacar a explicação do professor Brito (2006, p. 166):
Para a inclusão no regime de exceção, a autoridade administrativa diretora do estabelecimento deverá elaborar um requerimento circunstanciado e alegar um dos motivos acima. Evidentemente, a prerrogativa estende-se aos seus superiores, in casu, o Secretário de Segurança Pública ou da Administração Penitenciária. Não existe a possibilidade do Ministério Público requerer a inclusão do regime. Este deverá se manifestar antes da decisão judicial de deferimento ou não. É um procedimento jurisdicionalizado, o que importa dizer tratar-se de um incidente à execução, conforme muito bem observa Maurício Kuehne.
O princípio da motivação dos atos conforme preceitua alguns dispositivos da Constituição Federal como o artigo 37 e 93, inciso IX, demonstra que, toda e qualquer decisão tomada tanto pela administração como pelo Judiciário deverão ser motivadas, ou seja, indicar quais foram os motivos, quais as razões e justificativas que levaram a tomar determinada decisão, assim como aponta o caput do artigo 54 que trata da motivação desses atos tomados, afirma que “as sanções dos incisos I a IV do art. 53 serão aplicadas por ato motivado do diretor do estabelecimento e do inciso V, por prévio e fundamentado despacho do juiz competente.”
Aliás, é certo afirmar que a validade dos atos administrativos e judiciais vinculam-se aos seus fundamentos, mas desde que esses motivos sejam também verdadeiros, pois caso contrário serão nulos, inválidos. Já em relação ao contraditório e a ampla defesa dispõe o artigo 5°, inciso LV, da Constituição Federal: “Art. 5°, LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
Nesse sentido, demonstrando preocupação sobre a severa medida a ser tomada em relação ao apenado, retratou o legislador no artigo 54 § 2° da LEP o princípio do contraditório e da ampla defesa que é tratado na Constituição como foi apresentando acima, entretanto como se trata de um princípio e uma garantia fundamental ao indivíduo perante a justiça, pois mesmo este, sendo reprimido de sua liberdade, jamais lhe será arrancado o direito de defesa, sob pena da norma que não o respeite ser considerada inconstitucional, dessa forma afirma o artigo 5°, inciso LIV que, “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Por conseguinte, para que haja legalidade e validade nas decisões tomadas pelas autoridades há necessidade de um devido processo, seja este administrativo ou judicial com observância do direito de defesa para adoção justa da medida disciplinar.
Faz-se necessário demonstrar ainda a importância de outro direito fundamental que é corolário natural da ampla defesa no âmbito desse procedimento executório, como o duplo grau de jurisdição que mesmo a nova Lei não fazendo menção em sua redação, este princípio é aplicado de acordo com a norma geral penal e constitucional, pois é utilizado em todo procedimento seja este administrativo ou judicial com escopo de minimizar a insatisfação humana sobre determinada decisão, uma vez que trata-se de um direito constitucional daquele que participa de um determinado processo.
Logo, o aprisionado que foi condenado a ingressar no Regime Disciplinar Diferenciado poderá utilizar-se desse princípio revisor com intuito de reformar a decisão que possa ter achado injusta ou errada, a fim de obter uma maior segurança da decisão, que é realizado por via de recurso podendo este ser um Agravo à Execução, um Recurso em Sentido Estrito e como regra geral um Hábeas Corpus que mesmo não sendo uma forma de recurso, é utilizado estiver sofrendo ou ameaçado de sofrer privação na sua liberdade de maneira ilegal ou abusiva, como dispõe o artigo 5°, LXVIII, da CF.
Portanto, dependendo da fase do processo em que estiver o aprisionado, seja a fase de execução ou de conhecimento, fará jus a esse benefício recursal. Mas, se o preso estiver cumprindo uma pena provisória utilizar-se-á do Recurso em Sentido Estrito, como demonstra o artigo 581 do Código de Processo Penal, mas se já estiver executando uma pena definitiva, poderá se valer do recurso utilizado nas fases de execução penal que é o chamado Agravo como dispõe o artigo 197 da LEP, no entanto, vale ressaltar em que ambas as fases o encarcerado poderá se valer do Habeas Corpus, pois o mesmo é cabível sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer privação de sua liberdade.
Por fim, cumpre destacar o artigo 4°e 8° da Lei 10.792/03 que trata sobre os estabelecimentos prisionais em relação a esse regime diferenciado do seguinte modo:
Art. 4°. Os estabelecimentos penitenciários, especialmente os destinados ao regime disciplinar diferenciado, disporão, dentre outros equipamentos de segurança, de bloqueadores de telecomunicação para telefones celulares, rádio transmissores e outros meios, definidos no art. 60, § 1°, da Lei n° 9.472, de 16 de julho de 1997.
Art. 8°. União priorizará, quando da construção de presídios federais, os estabelecimentos que se destinem a abrigar presos provisórios ou condenados sujeitos a regime disciplinar diferenciado.
Da leitura dos artigos mencionados percebe-se que a Lei fala da criação de presídios específicos com meios mais sádicos para esse tipo de regime, com objetivo de obter recursos adequados para atender a eficiência da medida e a segurança da sociedade, conferindo dessa forma equipamentos de seguranças, criação de novos estabelecimentos prisionais apropriados aos presos nesse regime, tudo isso com a finalidade de chegar ao fim do dilema que vem desgastando esse Sistema Prisional que se diz tão seguro.
Para eficiência e segurança desses planos no sistema prisional, afirma Carvalho (2007, p. 277):
Atualizados os propósitos penais, hoje o que está colocado é a necessária combinação entre a certeza de uma punição severa e eficaz complementada pelo propósito de proporcionar algum tipo de confiança capaz de reduzir, mesmo que parcialmente, as angústias coletivas.
Dessa maneira, o Estado brasileiro no sentido de buscar essa plena efetividade das punições, a fim de proporcionar uma real segurança àqueles que sofrem com os reflexos dessa violência, resolveu aplicar punições mais severas, na qual ocasiona mais dúvidas, revoltas e incertezas aos que esperam por uma justiça segura e digna. E ainda assim, pretende construir estabelecimentos prisionais que comporte os requisitos para o emprego desse regime, fez-se necessário, criar dispositivos em Lei para sua idéia, pois como se sabe o direito penitenciário somente se institui por meio de Lei.
Isso demonstra mais uma vez como se encontra o Sistema Carcerário Brasileiro, pois é incapaz de obter recursos para adotar meios mais severos àqueles presos faltosos tendo-se, que construir presídios para casos de medidas mais drásticas, contudo o legislador brasileiro se esquece que não tem recursos suficientes para gerir o preso no estabelecimento quanto mais para construir presídios específicos para detentos delinqüentes, uma vez que não se sabe se é essa realmente a postura a ser seguida para a solução desse dilema.
Partindo dessa premissa, o que se tem visto na realidade desse sistema falido é que mesmo nessa situação caótica sem fim, estes “responsáveis” pouco se importam pela ordem e controle dos estabelecimentos prisionais e os que têm legitimidade e competência para legislar, ao invés de criarem novas formas para melhorar essa situação desequilibrada como aprimorando na educação, saúde e empregos à sociedade, se preocupam apenas em criar novas maneiras de punir, reprimir o preso acreditando que esse é o caminho para diminuir a violência e a criminalidade dos cárceres, sendo que o resultado que se tem visto até hoje é apenas o aumento desenfreado dessa crise.
3 A INCONSTITUCIONALIDADE DO REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO EM RELAÇÃO AOS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS DO CONDENADO
Uma vez de posse da origem referente ao Regime Disciplinar Diferenciado, observa-se que este já afrontava alguns aspectos formais da Constituição Federal, pois antes mesmo desse regime ser estabelecido por uma Lei Ordinária Federal, já era abordado por uma Resolução criada por um ato administrativo no Estado de São Paulo (SP) e posteriormente no Rio de Janeiro (RJ), na qual já era clara sua ilegalidade perante a Carta Magna que preceitua em seu artigo 22 cujo conteúdo versa sobre matéria referente à Direito Penal, Processual Penal entre outras, afirma que compete apenas ao ente político da União por meio de uma Lei, legiferar sobre determinado assunto.
Destarte, desde sua origem esse Regime já apresentava problemas para o Ordenamento Jurídico Brasileiro, pois a Administração jamais poderia tratar de assunto penal, sendo que este é privativo do Legislativo havendo, no entanto, uma afronta ao Princípio da Independência dos Poderes, pois como se sabe, de acordo com o artigo 2º da Constituição, estes são independentes e nenhum poderá intervir na competência do outro, sob pena de abuso de poder, pois cada Poder tem que saber exercer o limite da parcela de sua competência até o momento que inicie a do outro.
Apesar de todas estas orientações, o que se vê são posturas díspares, que confrontam prerrogativas legais, pois nenhum dos 3 (três) poderes ultimamente tem exercido seu verdadeiro papel, a exemplo do legislativo, que hoje, é clara a sua omissão perante a legislação brasileira, eximindo-se assim da sua típica função de legislar, e em razão disso o administrativo e judiciário por muitas vezes vem ocupando a lacuna do legislativo tentando cobrir os “buracos” deixados por este, deste modo, o que se percebe é que a Constituição está sendo desrespeitada pelos próprios entes que a regulamenta.
No entanto esses poderes não podem reagir à hipertrofia do outro com intuito de solucionar os conflitos, mas sim organizar suas atribuições para que haja uma harmonia entre eles, conforme prevê a Constituição. Logo a intenção de apresentar essa discussão é demonstrar que matéria tratada nessa pesquisa do RDD, não é assunto para ser legislado pelo poder administrativo, pois como se sabe é competência do legislativo por meio de uma lei introduzi-lo no ordenamento jurídico e não por via de resoluções as quais não possuem atribuições para isso. Do mesmo modo se manifesta o presidente do STF, Gilmar Mendes (Revista VEJA, ano 41 – nº. 34, p. 65): “o direito deve ser achado na lei, não na rua”. Isto é só a lei por meio do processo legislativo poderá tratar desse assunto, não cabendo outro poder através de qualquer norma instituí-lo.
Com maior precisão assim é o comentário fornecido por Gomes em um artigo jurídico divulgado em na Revista Síntese de Direito Penal e Processual Penal n° 14 (2002, p. 24):
O Presidente da República, depois de EC 32/01 (art. 62, §1°, b, da CF), definitivamente não pode adotar medidas provisórias (contra réu) sobre Direito penal ou processual penal. Medidas que restringem a liberdade devem emanar diretamente do Congresso Nacional.
Sobre essas matérias só a União (pelo Congresso Nacional) pode legislar (CF, art. 22). Há reserva da competência legislativa. Ainda sobre elas vigora, como sabemos, não só o princípio da legalidade (CP, art. 1°; LEP, art. 2°; CP, art. 40) senão sobretudo o da reserva legal (CF, art. 5°, XXXIX).
Continuando na mesma vertente, a Administração de acordo com os preceitos constitucionais não teria competência para aplicar esse Regime Disciplinar, cabendo apenas ao Legislativo criá-lo e o Judiciário aplicar, tendo, portanto, essa Administração apenas a prerrogativa de controlar e fiscalizar essa sanção cautelar chamada RDD, para que haja, conseqüentemente, uma adequada harmonia entre esses poderes e uma justa aplicação das normas como pretende a Constituição.
Todavia, essa falha formal foi suprida do Ordenamento Jurídico em virtude de alguns acontecimentos trágicos, em que acabou tornando-se matéria de discussão no Congresso Nacional criando assim a nova Lei 10.792 de 2003 que alterou Lei de Execução Penal incluindo dessa forma o RDD no Ordenamento Penal Brasileiro por intermédio de uma Lei Ordinária.
Percebe-se, no entanto que, tratar a respeito dos problemas desse regime não é questionar apenas o seu aspecto formal que como foi visto já foi solucionado, mas também o seu aspecto material que até hoje é um dos grandes marcos para o falido Sistema Carcerário Brasileiro, que com o intuito de solucionar os seus conflitos, acabam aumentando-os em razão da criação de medidas exorbitantes como o RDD, que não possui o mínimo de arrimo e respeito com os direitos e garantias que a Constituição garante ao condenado.
Cumprem ressaltar ainda, que os requisitos para adoção desse regime são os mais abstratos possíveis e suas medidas a serem cumpridas as mais drásticas, em que acabam entrando em conflitos com diversos princípios constitucionais.
Continuando na vertente que o Regime Disciplinar Diferenciado é um caos para o nosso Sistema Carcerário e um mal para sociedade, cabe destacar alguns preceitos em que este regime afronta, pois a entrada em vigor dessa nova Lei violou bastante o chamado Direito de Execução Penal.
Por meio de tais considerações, o que se pode observar é que além do insulto a alguns princípios fundamentais da Constituição, os artigos 1° e 3° da Lei de Execução Penal também foram desamparados pela atual redação do artigo 52 dessa Lei. Nesse sentido, observam-se os artigos 1° e 3°:
Art. 1°. A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.
Art.3°. Ao condenado e ao internado serão assegurados todos direitos não atingidos pela sentença ou pela lei.
Parágrafo único. Não haverá qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política.
Percebe-se, que na tentativa de amenizar esses conflitos criando medidas mais rigorosas, acabaram gerando outro problema que corresponde à integração social desse criminoso, pois de acordo com as características desse Regime, estas não satisfazem a melhoria desses delinqüentes perante o mundo social, uma vez que da leitura desses dispositivos legais mencionados, estes não correspondem com a realidade que é imposta pela medida, pois de acordo com suas características adotadas não tem como ter o mínimo de apreço com os direitos assegurados a esses indivíduos. Portanto, ao invés de ajudar na ressocialização desses encarcerados como prevê o artigo 1° acima, o que se percebe é justamente o oposto, tornando-os cada vez mais rebelados.
Frisa-se ainda, que os direitos assegurados pela Constituição são inerentes à condição de qualquer ser humano, estando preso ou não, sendo esses direitos prevalentes independentemente da atribuição por qualquer ordenamento. Todavia, esses direitos como à vida, à integridade física e moral, a igualdade entre outros não podem estar ao livre dispor do Estado, como ocorre com o direito positivado em que é modificado conforme as circunstâncias vividas pelo povo, como é o caso do RDD, por exemplo, que infringe por completo esses direitos fundamentais. Pois, como se sabe não se podem desfazer deles, porque são de ordens constitucionais e invioláveis (SILVA, 2002).
Com maior precisão assim é a definição dos direitos fundamentais fornecida por Nucci (2008, p. 66):
Os direitos fundamentais, pois, constituem-se de direitos individuais, coletivos, sociais e políticos, exaltados na Constituição, e são os indispensáveis ao pleno desenvolvimento do homem e do cidadão, especialmente frente ao Estado, que tem por obrigação não somente respeitá-los, mas também assegurá-los e protegê-los. As garantias fundamentais são os instrumentos constitucionais colocados à disposição dos indivíduos e das instituições para fazer valer os direitos fundamentais.
Continuando, o autor complementa que (2008, p. 69):
[...] uma vez eleita determinada norma como direito ou garantia individual pelo constituinte, mesmo que seja só formalmente um direito ou garantia fundamental, deve ser respeitada como tal. Inexiste, pois, esse contraste entre o formal e material: todos os direitos e garantias individuais são valorativamente superiores.
Observa-se assim, que as mudanças que essa Lei trouxe para o nosso ordenamento jurídico foram bastante relevantes para o estudo de certos princípios constitucionais que ela viola, pois é transparente o seu desrespeito aos direitos e garantias fundamentais.
Nesse sentido um dos aspectos que se pode advertir, é que o caput do artigo 52 da LEP quando menciona a prática de crime doloso como uma falta grave, refere-se, de uma forma bastante abrangente, não especificando que espécie de crime doloso é este, pois é de se notar que no âmbito do Direito Penal não se pode tratar de medidas que não estejam delimitadas de forma clara na lei, sob pena de ofensa ao principio da legalidade penal. Nesse sentido, dispõe o artigo 5º, XXXIX, da Constituição Federal: ”Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.
Todavia, de acordo com que se vê no texto desse mencionado artigo, é que há muitos termos abstratos, em que não se sabe exatamente seu real significado. Portanto, como se sabe a Lei no Ordenamento Brasileiro tem que ser precisa, contudo não se pode aplicar uma pena severa a alguém se não se sabe exatamente que espécie de crime doloso é esse, sendo que a maioria dos crimes previstos na nossa legislação penal são dolosos. Estaria aqui, no entanto, havendo uma norma penal em branco ou realmente uma infringência da norma penal por conta do princípio da legalidade?
Analisando a citada pergunta, conclui-se que tal dispositivo não se enquadra como uma norma penal em branco, uma vez que não existe outra lei no sistema penal para dizer quais são as espécies de crime doloso para se enquadrar nesse regime disciplinar, havendo, portanto uma clara incoerência a esse princípio constitucional.
É de se notar também que em relação aos crimes dolosos, estes possuem um procedimento específico para a justa aplicação de suas penalidades, observando-se assim um devido processo legal, o qual não se vê durante a aplicação do regime disciplinar, portanto como já foi demonstrado em tópicos anteriores sabe-se que é a própria Administração que aplica essa medida e muitas vezes é imposta de forma preventiva, se quer ver a presença do contraditório e da ampla defesa como ocorre no caso previsto no art.60 da LEP em que essa autoridade administrativa poderá estabelecer o isolamento preventivo do preso que comete falta grave por até 10 (dez) dias.
Entretanto é de se observar uma verdadeira ilegalidade na adoção dessa medida, já que essa Administração jamais poderia aplicar uma pena e julgar um delito, pois isso é matéria que compete ao judiciário, uma vez que a Administração não detém de autoexecutoriedade para o emprego desses tipos de sanções penais.
Esse princípio do devido processo legal está previsto também no artigo 5º da Constituição nos incisos LIII e LIV que dispõem:
Art. 5º.
LIII – ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;
LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem do devido processo legal.
Assim, para esse citado artigo, ao delituoso não se poderá aplicar a medida sem o devido processo legal, no entanto o que se percebe é justamente o oposto, ou seja, não é o que se vê disposto na aplicação do Regime Disciplinar Diferenciado, pois de acordo com que demonstram os artigos 54 § 1º e 60, “caput” da LEP, este Regime poderá ser imposto por qualquer autoridade administrativa sem a necessidade de um devido processo legal. Todavia, essa Administração de acordo com os preceitos constitucionais não teria competência para aplicar essa penalidade, até porque se trata de uma privação de liberdade, ou seja, um direito fundamental que jamais poderia ser suprimido de forma superficial e sem um trâmite processual, pois não estaria cumprindo os requisitos formais para aplicação de uma penalidade, havendo assim um abuso do poder administrativo em relação as suas prerrogativas de função.
Em relação ao mesmo raciocínio acima explanado, o questionamento que ainda surge, é saber que autoridade administrativa é essa que permite a autorização para inclusão do apenado nessa medida; seria a Administração Política como o prefeito, governador do Estado ou a própria autoridade administrativa do presídio? A resposta não está delimitada de forma concreta, pelo fato da Lei mais uma vez apresentar um grau de abstração e subjetividade bastante relevante ferindo novamente o princípio da legalidade previsto na Constituição.
Observa-se ainda que essa autoridade administrativa pode, em caso de urgência e relevância, decretar o isolamento preventivo do delinqüente mesmo sem o despacho do judiciário pelo prazo de 10 dias, de acordo com o artigo 60 da Lei de Execução Penal. Com respaldo na redação desse dispositivo, percebe-se, portanto, mais uma afronta ao principio da legalidade, pois que tanta discricionariedade é essa que a Administração está usufruindo, apenas onde caberia ao Judiciário desfrutar? Observa-se, assim, uma afronta de competências de um poder em relação ao outro, pois a Constituição Federal não atribui tanta discricionariedade assim para a Administração, sendo esta matéria elencada no art. 60 da LEP de competência do Judiciário, pois apenas este pode decretar isolamento preventivo de determinada pessoa.
Logo, uma lei infraconstitucional como a LEP, jamais poderia sobrepor ao que dispõe uma Constituição devendo prevalecer apenas o que esta retrata, em razão do que demonstra a hierarquia das normas e o princípio da limitação de competência entre os poderes.
Ainda na vertente desse isolamento preventivo, pode-se perceber uma nítida violação ao princípio da presunção de inocência, pois é incabível impor um regime puramente severo àquele sob o qual não se tem a certeza de ser realmente o infrator do delito. Em relação a esse princípio conceitua Tucci (1993, p. 402): “asseguração ao imputado do direito de ser considerado inocente até que sentença penal condenatória venha transitar formalmente em julgado”.
Assim, violar o princípio da não culpabilidade é infringir a própria
Constituição Federal, uma vez que em seu artigo 5°, LVII, confirma: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Portanto, é completamente inconstitucional a redação do artigo 52 da LEP quando abriga presos provisórios nessa medida. Desse modo, é altamente incongruente ver um indivíduo submetido a um regime cruel sem ter a real certeza da sua pratica delituosa, confirmada por uma sentença que demonstrasse com firmeza sua conduta infratora.
A autoridade administrativa junto com o poder judiciário estaria, portanto, abusando dos seus poderes e arriscando uma conduta extremamente desnecessária, pois caso posteriormente fosse descoberto à inocência desses prejudicados, o Estado assumiria uma responsabilidade extremamente relevante, além de causar graves danos à vida desses inocentes que muitas vezes seria irreparável como sua dignidade perante a sociedade.
Nesse sentido, complementa a Declaração Universal dos Direitos do Homem em seu artigo XI:
Toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.
Outra problemática que surgiu com o implemento do Regime disciplinar, foi o prazo em que o detento é submetido, pois ultrapassa o prazo legal previsto no artigo 58 da LEP, que afirma que os direitos de qualquer pessoa não poderão ser privados por um prazo superior ao de 30 (trinta) dias, caso em que o inciso I do artigo 52 reza de uma outra forma impondo um prazo acima do legal, pois sujeita o preso a um isolamento por 360 (trezentos e sessenta) dias, prorrogável até 1/6 da pena aplicada, podendo ainda ser novamente aplicada em caso de cometimento de nova falta grave, portanto é uma pena considerada bastante elevada em relação ao motivo a qual é consagrada.
Sabe-se que o Direito penal brasileiro adota como uma de suas fontes legais o princípio da intervenção mínima, ou seja, utilizado como ultima ratio, e só poderá interferir no aspecto social quando os outros ramos do direito não se demonstrarem capazes para conter o ilícito ocorrido. Nesse sentido leciona Bitencourt (2000, p. 11):
O princípio da intervenção mínima, também conhecido como ultima ratio,
orienta e limita o poder incriminador do Estado, preconizando que a criminalização de uma conduta só se legitima se constituir meio necessário para a proteção de determinado bem jurídico. Se outras formas de sanção ou outros meios de controle social revelarem-se suficientes para a tutela desse bem, a sua criminalização é inadequada e não recomendável. Se para o restabelecimento da ordem jurídica violada forem suficientes medidas civis ou administrativas, são estas que devem ser empregadas e não as penais. Por isso, o Direito Penal deve ser a ultima ratio, isto é, deve atuar somente quando os demais ramos do Direito revelarem-se incapazes de dar a tutela devida a bens relevantes na vida do indivíduo e da própria sociedade.
Partindo dessa premissa, o RDD diferentemente do que preceitua o princípio elencado acima, não goza de aspectos relevantes para sua aplicação a um preso que comete “falta grave”, pois de acordo com as disposições de alguns artigos inseridos na lei de execução penal são na maioria de aspectos abstratos, não apresentando requisitos típicos suficientes para implantação da medida.
Abordando tal comentário é citado o artigo 52, §§ 1° e °2° da LEP:
Art. 52.
§1°O regime disciplinar diferenciado também poderá abrigar presos provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros, que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade.
§ 2º Estará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso provisório ou o condenado sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando. (grifo nosso).
Surge, portanto, de acordo com o artigo acima citado, mais uma ilegalidade em relação a esse Regime disciplinar, pois percebe-se a presença clara de uma norma ampla e imprecisa, que não delimita de maneira suficiente e concreta o que seria alto risco e fundadas suspeitas, pois como é de se notar o Direito penal só poderá ser aplicado àquelas condutas que estão tipificadas de forma clara na lei justamente para evitar insegurança jurídica, não podendo despertar, portanto, qualquer dúvida quanto a conduta ilícita do suposto infrator, uma vez que este não poderá ser prejudicado por uma conduta que não praticou de fato.
Tratando a respeito do tema, tem-se a lição de Zaffaroni e Pierangeli (1997, p.117-119):
O sentimento de segurança jurídica não tolera que uma pessoa (isto é, um ser capaz de autodeterminar-se), seja privada de bens jurídicos, com finalidade puramente preventiva, numa medida imposta tão somente pela sua inclinação pessoal ao delito sem levar em conta a extensão do injusto cometido e grau de autodeterminação que foi necessário atuar. Isso não significa que com a pena nada seja retribuído, mas apenas o estabelecimento de um limite à ação preventiva especial ressocializadora que se exerce sobre uma pessoa. De outra parte, a inclinação ao delito, além de não ser demonstrável, possui o sério inconveniente de, muito freqüentemente, ser resultado da própria ação prévia do sistema penal, com o que se iria cair na absurda conclusão de que o efeito aberrante da criminalização serve para agravar as próprias conseqüências, e, em razão disso, para aprofundar ainda mais a sua aberração [...].
Ainda que não haja critério unitário acerca do que é direito penal de autor, podemos dizer que, ao menos em sua manifestação extrema, é uma corrupção do direito penal em que não se proíbe o ato em si, mas o ato como manifestação de uma ‘forma de ser’, do autor, esta sim considerada verdadeiramente delitiva. O ato teria valor de sintoma de uma personalidade; o proibido e o reprovável ou perigoso seria a personalidade e não o ato. Dentro dessa concepção não se condena tanto o furto como o ‘ser ladrão’, não se condena tanto o homicídio como o ser homicida, o estupro como o ser delinqüente sexual etc.
Deste modo, nota-se que o trecho acima citado, faz referência acerca da absurda concepção do direito penal do autor, pois em relação a essa teoria que não é adotada no Brasil, o preso fica submetido a uma pena não em razão da conduta típica que pratica, mas pela pessoa que é, pela sua periculosidade, pelo suposto risco que causaria a ordem do estabelecimento e a sociedade. Contudo, observa-se uma nítida infringência aos princípios da tipicidade e da legalidade, pois o Direito penal brasileiro segue o conceito de que o tipo penal é aquele que descreve precisamente a conduta ilícita praticada, ou seja, adota o modelo do Direito penal de fato, sob pena de esta ser considerada atípica, dessa forma dispõe Greco (2004, p. 173):
[...] só haverá tipicidade se existir uma adequação perfeita da conduta do agente ao modelo em abstrato previsto na lei penal (tipo), estamos querendo dizer que por mais que seja parecida a conduta levada a efeito pelo agente com aquela descrita no tipo penal, se não houver um encaixe perfeito, não se pode falar em tipicidade. (grifo nosso).
Também na tentativa de justificar juridicamente a tipicidade penal, encontram-se os comentários de Capez (2002, p. 166):
É a subsunção, justaposição, enquadramento, amoldamento ou integral correspondência de uma conduta praticada no mundo real ao modelo descrito constante da lei (tipo legal). Para que a conduta humana seja considerada crime, é necessário que se ajuste a um tipo penal. Temos, pois de um lado, uma conduta da vida real e, de outro, o tipo legal de crime constante na lei penal. A tipicidade consiste na correspondência entre ambos. (grifo nosso).
Cumpre destacar, portanto que o RDD não vem cumprindo esse conceito adotado do tipo penal, mas sim requisitos amplos e imprecisos que é inadmissível no direito penal brasileiro, atribuindo ao autor sanções relacionado ao seu perfil e não a conduta que talvez pudesse praticar, portanto vale mencionar que está se criando um direito penal do inimigo.
Segundo Jakobs (2003), o Direito Penal do Inimigo é voltado para o futuro, isto é, pune-se o inimigo pelo delito que ele poderia vir a cometer e não pelo ilícito cometido; nesse prisma vê-se o inimigo sem qualquer status de cidadão e, ainda, como inimigo de toda coletividade; sendo ele, portanto, punido pela sua periculosidade e não pela sua culpabilidade; havendo, ainda, a minimização ou descarte das garantias processuais e penais ante ao combate do “perigo” emanado pelos inimigos
Outra crítica que se faz em relação aos preceitos dos parágrafos do artigo 52 é quanto ao princípio do non bis in idem, pois como já vem retratado na parte especial do Código Penal, participação em organização criminosa, quadrilha ou bando, são figuras consideradas crimes, nas quais precisam ser comunicadas a autoridade competente para registrar o ilícito cometido e não de uma aplicação de sanção disciplinar, pois uma vez essa conduta sendo caracterizada como crime, o preso responderá apenas pelo crime cometido e cumprirá apenas a pena deste tal delito, jamais poderá ser responsabilizado duas vezes pela mesma conduta. Conforme dispõem os artigos 27 e 30 das Regras Mínimas Brasileiras para o Tratamento de Prisioneiros:
Art. 27. A disciplina e a ordem serão mantidas com firmeza, mas sem impor mais restrições do que as necessárias para a manutenção da segurança e da boa organização da vida comunitária.
Art. 30. Nenhum preso será punido senão de acordo com os termos da lei e regulamento, e nunca duas vezes pelo mesmo crime.
Mas o Regime Disciplinar Diferenciado de acordo com seus requisitos não corresponde a esses preceitos legais sendo, portanto, aplicado aos presos que cometam fato previsto como crime doloso, apresente alto risco a sociedade e a ordem do estabelecimento, além de apresentar fundadas suspeitas em partição de crimes como quadrilha ou bando e organização criminosas sem prejuízo da pena específica da prática desses delitos. Nesse sentido, esclarece Tucci (2004, p. 4):
O RDD, mais do que um retrocesso, apresenta-se como autêntica negação dos fins objetivados na execução penal, constituindo um autêntico ‘bis in idem’, uma vez tida a imposição da pena como ajustada à natureza do crime praticado – considerados os seus elementos constitutivos e os respectivos motivos, circunstâncias e conseqüências -, e à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social e à personalidade do agente.
Vale salientar ainda que da leitura dos artigos das Regras Mínimas mencionados acima, percebe-se que para que haja a implantação de qualquer restrição tem que haver certa proporcionalidade entre a sanção que está sendo aplicada e a conduta que foi praticada, sendo proibidas aplicações de medidas exorbitantes como o RDD para garantir a segurança jurídica, pois a medida disciplinar tem que obter a finalidade de reintegrar o preso socialmente e não impor medidas violentas e exageradas àqueles que muitas vezes são submetidos a cumprir penas superiores ao fato que foi praticado, além de superar o limite legal do artigo 58 da LEP que se refere ao máximo de 30 (trinta) dias para isolamento do preso, sendo assim o RDD o único que ultrapassa esse prazo legal podendo chegar a mais de 1 (um) ano.
Corroborando com esse entendimento, assim dispõe Coyle (2004, p. 90):
Uso mínimo de segurança máxima especial.
Nos casos em que grandes números de presos forem alocados para instalações especiais de segurança máxima, existe o perigo de que, para muitos deles, essas condições sejam excessivas e desproporcionais à ameaça em potencial que eles representam. Como regra geral, os presos devem ser confinados a condições especiais de segurança máxima, nos casos em que seu comportamento tiver demonstrado que eles representam tamanha ameaça à segurança que a administração penitenciária não tenha outra escolha. Qualquer alocação de pessoas presas para essas funções deve ser por um período de tempo tão curto quanto possível e deve estar sujeita a uma revisão contínua do comportamento do preso como indivíduo.
O princípio da individualização da pena também é matéria de grande preocupação, visto que este princípio no momento em que o RDD é imposto, não é aplicado da forma devida como estabelece os artigos 5°, XLVI, da CF e 59 do Código Penal, pois cabe ao juiz atender os aspectos pessoais do agente, o motivo pelo qual o levou a realizar aquela determinada conduta, além das circunstâncias e conseqüências do crime para individualizar a penalidade do delinqüente.
Todavia, o Regime disciplinar não passa por toda essa avaliação minuciosa do art. 59 do Código Penal e é em razão dessas circunstâncias que se encontram muitos presos cumprindo penas de formas exageradas em relação ao que realmente deveria cumprir, pois como já foi observado o caráter de proporcionalidade da pena não é exercido.
Nesse cenário, tem-se o entendimento de Carvalho (2007, p. 289):
A individualização da pena constitui corolário da aplicação da garantia do devido processo legal, consubstanciando no direito à limitação do ius puniendi do Estado que, não obstante sua conotação nitidamente de direito material, tem indiscutíveis e inafastáveis reflexos na persecução penal.
Assim, um exemplo de tal possibilidade, é quando um encarcerado difama
algum colega de cela, e, em razão disso acaba provocando a subversão da ordem ou disciplina interna do cárcere; por conta dessa conduta acabaria cumprindo uma sanção disciplinar grave de acordo com que preceitua o caput do artigo 52; da mesma maneira se outro interno praticasse um homicídio culposo que é considerado um crime bem mais grave que o primeiro, sendo que aquele que cometeu o delito de difamação poderia até ser absolvido se fosse julgado nos tramites legais.
Entretanto, quando estão submetidos ao RDD não interessa o tipo de conduta que praticou, lhe serão aplicados as mesmas sanções podendo diferenciar apenas na quantidade de tempo que ficarão vinculados.
Nota-se ainda que os artigos 5° e 6° da LEP dispõem:
Art. 5°. Os condenados serão classificados segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da execução penal.
Art. 6°. A classificação será feita por Comissão Técnica de Classificação que elaborará o programa individualizador da pena privativa de liberdade adequada ao condenado ou preso provisório.
Percebe-se, contudo, que esses dispositivos não estão sendo aplicados durante a execução da pena de um indivíduo, pois como se observa nos estabelecimentos penais todos os presos são colocados juntos independente de estar cumprindo pena definitiva ou provisória, se é um encarcerado de alta ou baixa periculosidade, não tendo esses cárceres; portanto, as mínimas condições de proporcionar a harmônica integração do aprisionado, apenas em lhes aplicar medidas repressoras afim de conter os conflitos existentes. Com isso o Estado só tem demonstrado a sua incapacidade para dirimir essa crise e proteger a vida do prisioneiro, vivenciando a ilusão de que com medidas mais drásticas conseguirá solucionar esse colapso. Carvalho expõe de forma clara tal justificativa (2007, p. 292):
Lembre-se, a propósito, que a repressão ao crime organizado deve se dar dentro dos limites da lei e que a criação do regime disciplinar diferenciado não acabará com a violência urbana, assim como não tornará o preso uma pessoa melhor e não tornará mais segura a Sociedade.
Para o mencionado autor, o RDD não é a forma correta e precisa de sanção disciplinar para os presos considerados mais perigosos, isto é, não se trata de uma solução plausível para conter esse descontrole do sistema carcerário, mas sim de uma medida cruel e desumana que apenas acarreta insegurança jurídica. Contudo, não significa dizer que esses presos mais temidos não mereçam cumprir penas mais rigorosas ou em estabelecimentos prisionais específicos, mas desde que elas acarretam um fiel cumprimento da execução e garanta a reintegração social a esses criminosos, pois já aqueles que não ocasionam problema algum para a ordem e segurança do estabelecimento penal ou da sociedade, mas que por um deslize acabam cometendo uma falta grave merecem cumprir penas em estabelecimentos diferente daqueles quem sabe até com penas mais brandas ou até mesmo alternativas, certamente o resultado seria bem mais satisfatório.
No mesmo sentido, certifica Barros et al (2003, p. 4):
Observados os dispositivos da LEP, como resultado de classificação e individualização (em razão da especificidade de cada ser humano), pessoas determinadas poderiam ser levadas a cumprir pena em unidades prisionais específicas. E isto é tudo quanto se pode admitir como ‘diferenciação’, nenhuma outra, forma, chame-se ela de ‘peculiar’, ‘não discriminatória’ ou de qualquer outro eufemismo, pode vigorar no que toca à disciplina e ao regime prisional, senão a prevista na LEP.
Cabe então afirmar, que se a legislação penal fosse cumprida de forma precisa implementando todos os seus aspectos de forma adequada e suficiente, como por exemplo, os regimes fechado, semi-aberto e aberto não haveria necessidade de se criar uma medida desumana violadora da Constituição Federal e do Sistema Internacional de Direitos humanos para suprir a falta de eficácia desse sistema normativo penal.
Verifica-se assim, que a inovação feita pela lei 10.792/03 referente ao RDD à Lei de Execução Penal, não deixa de ser uma relevante incompatibilidade entre as regras desse Regime e os preceitos que a Constituição Federal adota, especialmente quando se trata do artigo 5° que estabelece as regras mínimas a serem respeitadas, sob pena de estarem violando direitos fundamentais garantido ao indivíduo, e como esses preceitos são invioláveis jamais poderão ser abolidos por qualquer ilegalidade da norma.
O Brasil é signatário da Convenção Americana sobre os Direitos Humanos, assinada em 22 de novembro de 1969, conhecida como Pacto de São José da Costa Rica. A ratificação de tal tratado internacional pelo Brasil, se deu em 25 de setembro de 1992 e sua incorporação como direito interno no Brasil ocorreu com a publicação do Decreto n° 678 de 06 de novembro de 1992.
A referida convenção traz em seu artigo 5°, n.2, a seguinte redação: “Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o devido respeito à dignidade inerente ao ser humano.” Complementando sua disposição, retrata ainda no artigo 5°, n. 6, intitulando como Direito a ressocialização do condenado, o seguinte: “As penas privativas de liberdade devem ter por finalidade essencial a reforma e a readaptação social dos condenados.”
Todavia, o que ocorre na realidade, não é o que se vê elencado nesses dispositivos, uma vez que o RDD implanta nas suas medidas um aspecto altamente desumano e degradante, pois o regime que submete um preso ao isolamento celular que poderá chegar até 360 (trezentos e sessenta dias), sem prejuízo de ser prorrogado por até 1/6 (um sexto) da pena em que só poderá sair por duas horas diárias apenas para banho de sol e o direito de informações e visitas restritas, infringe demasiadamente a dignidade humana desse indivíduo, podendo lhe trazer inúmeros distúrbios mentais e psíquicos. Além de conflitar totalmente com o artigo 5°, XLVII, CF que proíbe quaisquer tipos de penas cruéis, sob pena de violar o direito individual do preso e o direito difuso da sociedade que busca o bem comum de todos.
Pois de acordo com que declara as Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros essa medida disciplinar de isolamento é altamente reprovável. Assim dispõe seu artigo 31: “Serão absolutamente proibidos como punições por faltas disciplinares os castigos corporais, a detenção em cela escura, e todas as penas cruéis desumanas ou degradantes”.
Dessa forma, entende Wallon (1986, p. 178) em seu estudo sobre a psicologia do desenvolvimento que “[...] o grupo é o veículo ou iniciador de práticas sociais”, ou seja, o meio é a maneira pela qual o indivíduo pode desenvolver suas necessidades mais essenciais. No entanto, a falta de convivência grupal causada pelo isolamento compulsório por conta do RDD, trará ao preso diversos danos a sua estrutura mental.
Entende-se, no entanto, que aplicar sanções de forma adequada e precisa seria bem mais fácil resolver o problema carcerário, mas aplicá-las de formas rigorosas chegará à finalidade alguma, apenas a insanidade desses encarcerados. Como afirma ‘Beira-Mar’ em uma entrevista ao programa de televisão Fantástico em novembro de 2003, que por conta desse Regime disciplinar estava psicologicamente um ‘bagaço’, pois essa medida trata-se de uma “máquina de fazer malucos”.
Vale frisar, contudo, que o indivíduo é dotado de dignidade, ou seja, atribuída de valores absolutos e que jamais poderá ser utilizada pelo Estado como instrumento de humilhações, independente de estar ou não sob medida de privação de liberdade. Nesse cenário, retrata Kant o seguinte: “[...] o homem, e, de uma maneira geral, todo o ser racional, existe como fim em si mesmo, não só como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade”.
Nesse sentido, associando-se ao disposto acima, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, destaca em seu artigo 10 o seguinte:
ART.10 – 1. Toda pessoa privada de sua liberdade deverá ser tratada com humanidade e respeito à dignidade inerente à pessoa humana.
3. O regime penitenciário consistirá em um tratamento cujo objetivo principal seja a reforma e reabilitação moral dos prisioneiros.
Analisando o que foi exposto, percebe-se que o RDD não se enquadra em nenhum posicionamento firmado pelos Tratados, Convenções, Pactos e até mesmo os definidos pela própria Constituição, uma vez que desconsidera amplamente a dignidade do ser humano previsto no artigo 1° dessa Carta Magma.
Cumpre ressaltar, que já existem decisões de Tribunais manifestando-se nesse sentido, observa-se, portanto, o que retrata a 1° Câmara Criminal do TJ-SP:
Habeas Corpus nº 983.915-3/5-00 - São Paulo. Imperante: Bel. Luís Henrique Marques. Paciente: Priscila Rodrigues de Souza. Voto nº 9048 - Relator MARCO NAHUM. Habeas Corpus. Regime Disciplinar Diferenciado - RDD. Inconstitucionalidade. Ofensa a princípios fundamentais constantes da Constituição Federal. Ordem concedida. Alega ausência de contraditório no procedimento disciplinar que acabou por punir a paciente, assim como a inconstitucionalidade do referido regime de execução de pena (fls. 02/05). Independentemente de se tratar de uma política criminológica voltada apenas para o castigo, e que abandona os conceitos de ressocialização ou correção do detento, para adotar "medidas estigmatizantes e inocuizadoras" próprias do "Direito penal do Inimigo", o referido "regime disciplinar diferenciado" ofende inúmeros preceitos constitucionais. Trata-se de uma determinação desumana e degradante (art. 5º, III, da CF), cruel (art. 5º, XLVII, da CF), o que faz ofender a dignidade humana (art. 1º, III, da CF). Por fim, note-se que Estado Democrático é aquele que procura um equilíbrio entre a segurança e a liberdade individual, de maneira a privilegiar, neste balanceamento de interesses, os valores fundamentais de liberdade do homem. O desequilíbrio em favor do excesso de segurança com a conseqüente limitação excessiva da liberdade das pessoas implica, assim, em ofensa ao Estado Democrático.
Vale mencionar ainda que, medidas drásticas não são adotadas apenas no território brasileiro, pois os Estados Unidos se reveste penalidades bem piores como a pena de morte e a Supermax implantada no Sistema Penitenciário Americano desde 1983, e que em termos de requisitos admitidos para o ingresso do preso nessa medida é bastante parecidos com o Regime disciplinar utilizado no ordenamento jurídico do Brasil, mudando apenas em alguns aspectos do grau de rigorosidade.
A Supermax em comparação ao Regime Disciplinar Diferenciado é bem mais cruel e violadora dos princípios gerais que norteiam o ser humano, pois quanto aos seus requisitos é bem mais rigorosa, uma vez que só admite a saída da cela por 1 (uma) hora, mas não para banho de sol e sim para o ocupar uma outra cela onde poderá caminhar algemado; só poderá banhar a cada dois dias; não terá direito de ver TV a não ser que tenha bom comportamento e só após um ano de permanência no Regime; não terá direito a informações de pessoas que vivam a um raio de 90 quilômetros da prisão e qualquer outra correspondência será primeiramente lida pelo responsável do estabelecimento prisional e visitas de advogados é bem restrita mesmo com autorização da direção da Supermax (OLIVEIRA, 2003).
No mesmo sentido do RDD, a Supermax busca amenizar a criminalidade americana, mas pelas mesmas conseqüências sociais que o Regime brasileiro vem presenciando, esta também vem sofrendo, pois violar alguns preceitos da Constituição Americana que proíbe a prática da tortura. Deste modo a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, disciplina em seu art. 2°:
Para os efeitos desta Convenção, entender-se-á por tortura todo ato pelo qual são infligidos intencionalmente a uma pessoa penas ou sofrimentos físicos ou mentais, com fins de investigação criminal, como meio de intimidação, como castigo pessoal, como medida preventiva, como pena ou qualquer outro fim. Entender-se-á também como tortura a aplicação, sobre uma pessoa, de métodos tendentes a anular a personalidade da vítima, ou a diminuir sua capacidade física ou mental, embora não causem dor física ou angústia psíquica.
Contudo, analisando as características acima já impostas desse Regime americano, percebe-se claramente a prática da tortura em relação aos presos que lá convivem, pois essas medidas só servem para desrespeitar a dignidade humana do encarcerado, já que o problema carcerário está longe de ser resolvido dessa maneira.
Mas ainda assim, doutrinariamente há entendimento a respeito da eficácia dessas medidas severas como retrata Porto (2007, p. 65): “[...] na prática, o Regime Disciplinar Diferenciado foi uma vitória do Estado na luta contra as facções criminosas”. Complementando ainda o autor (2007, p. 65):
O sucesso deste modelo pode ser aferido estatisticamente. Durante os mais
de quatro anos de funcionamento do Regime Disciplinar Diferenciado implementado no Centro de Readaptação Penitenciária de Presidente Bernardes, nenhuma fuga foi registrada. Não há qualquer registro de rebeliões ou mortes provocadas pelos detentos. Também não há registro de espancamentos de presos ou maus tratos por parte da Administração.
Sobre a alegação, o mencionado autor esqueceu uns dos principais direitos assegurados ao indivíduo que é o da Dignidade da Pessoa Humana, portanto, jamais poderia admitir uma medida como essa constitucional apenas no aspecto da sua eficácia que ainda assim é bastante relativo, pois se for analisar de forma clara esse Regime repressor com os aspectos em que a sociedade vive a criminalidade não apresentou déficit algum, apenas aumentou, uma vez que essa medida não vem amedrontando os infratores, apenas causando mais revoltas em virtude de ver seus direitos violados.
Pois, como se sabe, a criminalidade não é conseqüência apenas da falta de punições mais severas nos presídios, mas sim da escassez de condições mínimas para obter uma vida digna, como necessidades de escolas, saúde, emprego, transporte, lazer entre outros.
Deste modo, pode-se concluir que essa crise no Sistema Penitenciário vem se proliferando não exclusivamente em razão da ineficiência da justiça, mas conjuntamente com a falta de condições sociais. O Estado, portanto, tem que buscar o equilíbrio entre o seu poder de impor sanções e a liberdade do indivíduo junto às suas necessidades sociais. Pois se continuar adotando essas medidas extravagantes, só tenderá ao aumento das revoltas e violências nas cadeias.
4 CONCLUSÃO
Diante do que foi exposto sobre o assunto, entende-se que a entrada em vigor da nova legislação penal trouxe uma das mais drásticas inovações ao Direito Penitenciário: o Regime Disciplinar Diferenciado.
A falência do Sistema Carcerário, a criminalidade, a violência permitiram a alteração na Lei de Execução com o advento dessa nova regra penal, pois devido à falta de controle desse sistema falido essa crise não tinha como ser solucionada, como atualmente ainda não foi estagnada.
Assim, com a antiga redação da LEP e a falta de mantimentos do sistema para conter essa crise, surgiu a Lei 10.792/03, que passou a admitir uma forma de punição mais cruel àqueles que infringiam a disciplina do estabelecimento prisional em que se encontravam, causando insegurança e medo com os que conviviam e também a sociedade que infelizmente sofre os reflexos desse colapso em razão da omissão do Estado “protetor”.
Na verdade, esta mudança em nada adiantou, visto ser uma transformação que só tem a trazer malefícios à segurança social e principalmente ao encarcerado, que muitas vezes acabam tendo problemas psicológicos bastante relevantes em razão das condições desumanas que são submetidos nesse regime.
O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, sem dúvida alguma é um dos mais atingidos por essa atual lei, contudo, a Constituição Federal não absorve a alteração feita na LEP advinda dessa lei nova, pois entende-se que esta não encontra-se nivelada com o texto da Constituição, em virtude da transparente inconstitucionalidade perante os princípios mais importantes desta Carta Magna.
É de se notar que, tratar a respeito desses princípios fundamentais é referir-se a uma das cláusulas pétreas do texto Constitucional que vem mencionado em seu artigo 60, § 4°, IV, pois como se sabe jamais poderão ser abolidos independentemente de qualquer situação, uma vez que impossibilita o legislador impor qualquer alteração que infrinja ou modifique esses direitos e garantias nelas previstos, no entanto, são irremovíveis.
Nesse passo, todas essas mudanças oriundas da nova lei e os insultos aos direitos e garantias fundamentais que encontram-se mais precisamente no artigo 5° da Constituição, e por possuir prerrogativas de cláusula pétrea, geraram conseqüências sociais bastante relevantes, pois como é se sabe não é implantando uma iniciativa bárbara como essa medida disciplinar desrespeitando vidas humanas, que vai reduzir essa situação alarmante da criminalidade nos presídios.
Portanto, resta afirmar que essa medida foi uma das piores a ser admitidas pelo ordenamento jurídico, pois não é tratando com violência que se elide os violentos, mas dando oportunidade de uma vida digna e medidas ressocializadoras, uma vez que essa onda de marginalidade aumenta e diminui na medida em que seus direitos sociais são alcançados.
Nesse sentido, esse problema jamais será resolvido apenas com construções de cadeias e medidas repressoras, mas sim dando a sociedade desde cedo oportunidades de estudar, trabalhar, de obter uma vida digna de ser vivida, pois caso contrário continuará se vivendo nessa mácula social e sofrendo repressões da própria liberdade de ir e vir.
No entanto, essa posição não esgota o assunto, pois há outras divergentes que entendem ser esse Regime Disciplinar a melhor solução para reduzir a criminalidade de dentro dos presídios, pois vão à premissa de que quanto mais severas forem as penalidades, melhor, mas esses que pensam dessa forma não vêem que essa criminalidade vem da miséria, da falta de assistência social, portanto não adianta reprimir se o problema não está na cadeia, mas sim na má administração da vida social em geral.
E mesmo que essa não seja a única solução, existem outras formas de resolver esse problema que não seja apenas reprimindo ainda mais aqueles que já se encontram reprimidos, portanto poderia se optar pela implantação de forma mais eficaz das penas alternativas, pelo menos para aqueles que forem menos perigosos até porque sabe-se da realidade dos presídios, onde freqüentemente não encontram-se vagas nem para aqueles que lá já residem.
Pelo menos com a aplicação dessa pena alternativa que não deixa de ser uma sanção penal, teriam esses infratores uma oportunidade mais fácil de trabalho durante o cumprimento de uma pena garantindo, assim, o seu real caráter ressocilaizador, uma vez que não é alcançado durante o cumprimento de uma pena privativa de liberdade.
Contudo, observa-se que o legislador está introduzindo no Sistema Normativo uma aberração jurídica, pois neste regime se os aprisionados não morrerem ou ficarem loucos em razão das condições bárbaras que são submetidos, tornam-se delinqüentes reincidentes dos mesmos atos que os levaram a esse
regime cruel.
Mesmo porque, ao estipularem medidas como o RDD, os legisladores agiram somente na conseqüência e não nos fatos geradores. Portanto, o RDD não irá pôr fim à violência, apenas servirá como espetáculo para ludibriar a sociedade, no qual alguns fingem que estão combatendo o crime organizado e outros simulam que acreditam.
Contudo, diante desta flagrante inconstitucionalidade não se pode ficar silentes, até porque para acabar, ou melhor, diminuir a criminalidade, é preciso estudos de caráter preventivo e não repressivo, e o RDD, é eminentemente repressivo, portanto a inconstitucionalidade dessa medida é incontestável.
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Advogada e Pós-graduada em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Católica Dom Bosco(UCDB) - Campo Grande/MS.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MAIA, Rafaela Brandão. Inconstitucionalidade do Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 maio 2012, 05:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/29311/inconstitucionalidade-do-regime-disciplinar-diferenciado-rdd. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
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