1 INTRODUÇÃO
A licitação é um procedimento administrativo formal, disposto no ordenamento jurídico brasileiro, realizado pela Administração Pública, onde a mesma decidirá entre a melhor proposta oferecida pelos fornecedores, objetivando a celebração de um contrato de compra ou de prestação de serviços.
Esse processo deve ser utilizado por qualquer órgão do governo na contratação de particulares, no entanto para isso é necessária a observância de dois princípios primordiais do Direito Administrativo, a supremacia e a indisponibilidade do interesse público, onde o foco principal é a proteção dos interesses da coletividade.
Com o crescimento e o aumento da sobrevida da população brasileira, a cada ano vem aumentando a procura dos usuários pelo atendimento dentro dos serviços de saúde em geral, em contrapartida a criação do Serviço Único de Saúde possibilitou a clientela um acesso igualitário aos serviços públicos de saúde.
Com o avanço tecnológico nas pesquisas de equipamentos, insumos e medicamentos, ocorreu também a necessidade de aquisição desses produtos para o abastecimento dos hospitais públicos possibilitando ao usuário um melhor atendimento e uma maior chance de cura ou de restabelecimento. Na prática, porém, muitas vezes o gestor não consegue em tempo hábil suprir todas as necessidades desses serviços devido à demora e a burocracia que demanda nos processos licitatórios.
O presente artigo vem abranger de forma sucinta acerca do tema licitação, os procedimentos básicos usados nesse processo, bem como demonstrar as dificuldades vivenciadas pelo gestor de saúde no gerenciamento dos recursos de materiais hospitalares, citando ainda a burocracia existente para a aquisição desses insumos dificultando muitas vezes a assistência ao paciente.
2 O PROCEDIMENTO LICITATÓRIO
Segundo Celso Antonio Bandeira de Mello, um dos mais renomados doutrinadores do direito administrativo, a licitação é o procedimento administrativo pelo qual um ente governamental pretende adquirir, alienar ou locar bens, realizar obras ou serviços, de acordo com as condições previamente por ele estipuladas a todos os seus participantes. Esse processo visa observar o princípio da isonomia, previsto na Constituição Federal de 1988, possibilitando aos candidatos chances idêntica entre si.
A atuação da administração pública está baseada em diversos princípios os quais também estão obrigatoriamente presentes no processo de licitação. É o que estabelece a Constituição brasileira, onde expressa em seu artigo 37, caput:
"Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:".
Além da carta magna, a licitação também se encontra regulamentada pela Lei infraconstitucional 8.666/93, onde em seu art. 3º dispõe:
"Art. 3o. A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhe são correlatos.".
3 PRINCÍPIOS DA LICITAÇÃO
Os princípios são as idéias norteadoras de um sistema. De acordo com o dicionário jurídico princípio “é a lei, doutrina ou acepção fundamental em que outras são baseadas” (GUIMARÃES, 2012).
Para José Afonso da Silva, os princípios são "ordenações que se irradiam e imantam os sistemas de normas."
Já Miguel Reale relata que,
"(...) os princípios são ‘verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades de pesquisa e da praxis."
Os princípios existentes na licitação não diferem muito dos quais compõem o Direito Administrativo. Muitos deles estão dispostos em texto legal e outros estão presentes na Constituição. O conhecimento de tais princípios torna-se essencial para o entendimento adequado da matéria, pois eles são o alicerce do Direito e da Administração Pública Brasileira.
3.1 Princípios da Supremacia e da Indisponibilidade do Interesse Público
São considerados os princípios basilares do direito administrativo, devendo ser observados nos atos realizados pela Administração pública. Ela deve se preocupar com os interesses da coletividade e mediante isso não pode dispor de tais interesses, pois é função do administrador zelar pelo bem de todos.
3.2 Princípios da Legalidade e da Moralidade
Todos os atos da Administração devem estar em conformidade com a legislação, de acordo com a CF/88, art. 5ª, II, "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma senão em virtude de lei." Diferentemente do que ocorre com o particular onde esse é livre para fazer uso da autonomia da vontade, podendo fazer ou deixar de fazer tudo o que a lei não proibir. Já para o administrador público isso se torna impossível, pois o mesmo encontra-se vinculado a norma para exercer seu poder de atuação.
O princípio da moralidade está atrelado ao princípio da legalidade, tanto que para alguns doutrinadores os dois princípios se confundem. Tal princípio tem o objetivo de proteger o licitante do formalismo presente no processo de licitação, bem como atentar para que o administrador público procure garantir a proposta mais vantajosa para a Administração Pública visando sempre o bem da coletividade.
3.3 Princípios da Impessoalidade e da Isonomia
A impessoalidade e a isonomia devem estar presentes em todos os atos administrativos, a licitação como um procedimento pertencente ao grupo desses atos, requer em seu objeto uma finalidade legal, garantindo assim transparência e acesso a todos os participantes. Tais princípios obrigam a Administração, a tratar de forma única os licitantes, não privilegiando empresas, impedindo assim algum tipo de favoritismo.
3.4 Princípios da Publicidade
Princípio que norteia as empresas, permitindo o conhecimento do processo licitatório por meio das vias próprias de comunicação, podendo assim exercer o seu interesse de acordo com os produtos ou serviços disponibilizados. A publicidade visa permitir a participação dos interessados em tal processo, possibilitando uma maior autonomia das empresas, tanto na participação como na fiscalização das mesmas. Permitindo ainda que o cidadão comum tenha acesso ao processo de compras efetuadas pelo o Estado, contribuindo assim com uma maior transparência dos atos administrativos efetivados pela máquina pública.
3.5 Princípios da Probidade Administrativa, da Vinculação ao Instrumento e do Julgamento Objetivo
A probidade administrativa é um dos primeiros princípios expressos na lei de licitações e consiste na determinação do ente público praticar os seus deveres de forma honesta e transparente.
No que diz respeito à vinculação do ato administrativo ao instrumento convocatório, também chamado de edital, tornam-se necessárias a divulgação de todas as informações pertinentes ao procedimento licitatório a todos os licitantes, isso possibilitará aos mesmos a observância de todos os requisitos existentes e a providencia de toda documentação legal exigida no processo.
O princípio do julgamento objetivo trata da responsabilidade em realizar o julgamento, por meio de uma comissão ou do responsável, onde será avaliada toda documentação apresentada pelos participantes, verificando-se se tudo está de acordo com o que foi disposto no edital ou no convite. Tal julgamento deverá ser efetuado objetivamente, obedecendo aos critérios presentes no instrumento convocatório.
4 OS SERVIÇOS DE SAÚDE E A GESTÃO DE MATERIAIS
Os serviços de saúde são organizações extremamente complexas, onde o seu objetivo principal é o recebimento do cliente, normalmente doente, para poder convalescê-lo, proporcionando sempre que possível o seu retorno a sociedade o mais próximo possível da normalidade.
De acordo com o Ministério da Saúde, o hospital tem como função básica proporcionar à população uma assistência médica integral, curativa e preventiva.
O serviço hospitalar além de sua complexidade demanda um alto custo ao Estado. Ocorre que devido às constantes mudanças tecnológicas e com o surgimento de diversos produtos, materiais modernos e de alta qualidade, o gerenciamento nesse segmento deve ser realizado por pessoas qualificadas e que possuam um conhecimento técnico na gestão de materiais.
A gestão de materiais é o processo responsável pelo o planejamento, execução e o controle do fluxo de materiais hospitalares. A administração desses recursos torna-se muitas vezes limitada dentro dos serviços públicos de saúde devido ao alto custo desses insumos, os orçamentos restritos disponibilizados pela máquina pública e a burocracia para aquisição desses materiais. Barreiras essas que dificultam o acesso dos usuários ao serviço de saúde e ao consumo desses produtos, muitas vezes indispensáveis para o seu restabelecimento.
4.1 A Licitação e a Burocracia no Processo de Compra
A compra de materiais e equipamentos nos serviços de saúde pública se dá pelo o procedimento da licitação, onde se seleciona a proposta mais vantajosa do que se pretende adquirir proporcionando aos fornecedores, participantes da modalidade, oportunidades idênticas de concorrência, processo esse baseado nos princípios da Administração Pública e na legislação específica.
As empresas participantes do processo licitatório devem seguir as diretrizes estabelecidas em seus dispositivos legais, onde os mesmos estabelecem alguns critérios a serem seguidos pelos licitantes como, apresentação de documentação onde comprova a capacidade jurídica do estabelecimento e sua regularidade fiscal. Devido a isso tal procedimento torna-se deveras complexo, mediante a todas as etapas a serem seguidas no processo de licitação, dificultando a contratação dos suprimentos hospitalares necessários.
5 TIPOS DE LICITAÇÃO
5.1 Menor Preço
Tipo de licitação considerado um dos mais simples, onde o fornecedor apresenta toda a documentação exigida no processo licitatório e também a proposta com menor preço. No caso dos licitantes apresentarem propostas de mesmo valor a escolha se dá por meio de sorteio.
5.2 Técnica e Preço e Melhor Técnica
Modalidade utilizada para a contratação de serviços de intelecto, elaboração de projetos e estudos técnicos preliminares. Nesse procedimento são consideradas a capacitação, a qualidade técnica da proposta e a experiência dos participantes.
A diferença básica entre essas modalidades é a forma de classificação dos fornecedores, onde ocorre uma classificação das propostas por meio de pontuação com base no preço e na técnica. É um procedimento extremamente complexo e que demanda tempo ao processo licitatório.
5.3 Maior Lance ou Oferta
Processo licitatório utilizado para alienação de bens ou concessão de direito real de uso. Tal procedimento encontra-se disposto no inciso IV, § 1º, Art. 45 da Lei 8.666/93.
6 MODALIDADES DE LICITAÇÃO NOS SERVIÇOS DE SAÚDE
Segundo os dispositivos legais nº 8666/93 e 10.520/02 são seis as modalidades de licitação, a saber, concorrência, tomada de preços, convite, concurso, leilão e pregão.
No entanto, as principais modalidades de licitação utilizadas nas instituições de saúde são a concorrência, a tomada de preço e o convite.
6.1 Concorrência
De acordo com a legislação 8.888/93 a qual refere em seu parágrafo 1º, “a concorrência é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir requisitos mínimos de qualificação exigidos no edital para execução de seu objeto.
Segundo alguns doutrinadores é a modalidade que possui maior rigor formal e exige uma maior divulgação, fato esse que acorda com o princípio da publicidade. Pode-se dizer também que é a mais complexa devido a todos requisitos estabelecidos.
6.2 Tomada de Preços
É muito utilizada para os contratos de serviços e compras de menor valor. Nessa modalidade ocorre um interesse de fornecedores que já se encontram devidamente cadastrados nos registros de órgãos públicos ou a todos os interessados que se enquadrem dentro das condições estabelecidas ao cadastramento. Esses fornecedores devem atender as condições exigidas para o cadastramento, onde o mesmo é feito até o terceiro dia anterior à data do recebimento das propostas.
6.3 Convite
Essa modalidade de licitação é considerada uma das mais simples de todas as existentes, normalmente é a escolhida para a contratação de serviços ou compra de produtos de menor valor, entre 80 a 150 mil reais. É utilizada para agilizar a aquisição de bens e serviços necessários ao Estado, seja nas esferas federal, estadual e municipal, podendo também ser utilizado nas empresas públicas e sociedades de economia mista.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Mediante o que foi exposto no presente texto e devido à complexidade do procedimento licitatório, é possível verificar a necessidade do conhecimento técnico o qual deve estar presente no gestor de saúde, o que muitas vezes não decorre devido à falta de preparo adequada desses profissionais. O gestor precisa atuar assessorado por profissionais preparados, que possuam uma formação jurídica, onde em algumas empresas ainda nos dias atuais, o procedimento de licitação é realizado por outros profissionais, geralmente do setor comercial.
A licitação é um procedimento formal e de extrema complexidade, onde todos os participantes necessitam preencher vários requisitos e seguir diversos critérios normatizados nos textos legais, e por isso a falta de conhecimento técnico-jurídico pode dificultar ainda mais tal procedimento.
A atuação do operador do direito torna-se indispensável dentro das instituições de saúde pública e do processo de licitação, uma vez que o mesmo poderá contribuir de maneira eficaz na análise dos critérios estabelecidos nos editais e providenciando o preenchimento adequado dos requisitos necessários, possibilitando assim uma celeridade no procedimento e colaborando para uma melhora da qualidade no atendimento das respectivas instituições, proporcionando a satisfação do cliente.
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ZANON, Uriel. Qualidade da assistência médico-hospitalar. Conceito, avaliação e discussão dos indicadores de qualidade. Rio de Janeiro: Medsi, 2001. p. 23.
Acadêmica do Curso de Direito da Faculdade Guararapes.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CASTRO, Graciely Maria de Oliveira. O processo licitatório e os serviços de saúde Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 out 2012, 06:39. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/31817/o-processo-licitatorio-e-os-servicos-de-saude. Acesso em: 22 nov 2024.
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