Relativamente à tutela da probidade no âmbito do controle interno da Administração Pública, ainda que se possa afirmar que a mesma seja decorrência, mesmo que indireta, do poder disciplinar, é importante deixar assente que a conduta tida como infração funcional em sede de processo administrativo disciplinar poderá, ou não, configurar simultaneamente um ato de improbidade administrativa.

Nesse sentido leciona Wallace Paiva Martins Júnior na obra “Probidade administrativa”, ao discorrer acerca da relação entre o referido instituto e o poder disciplinar da Administração Pública:

“A tutela da probidade administrativa também se executa e se desenvolve no seio do controle interno da Administração Pública. Aliás, é nele exatamente que deveria começar e ser agudamente estimada. Ainda que indiretamente, a repressão administrativa da improbidade é decorrência do poder disciplinar, mediante decisão em processo administrativo que assegure ao infrator ampla defesa (art. 41, § 1º, II, da CF) por falta funcional previamente definida em lei, como, por exemplo, a demissão a bem do serviço público. Por isso mesmo, assentou o Supremo Tribunal Federal que “a aplicação das penalidades previstas na Lei n. 8.429/92 não incumbe à Administração, eis que privativa do Poder Judiciário”. Todavia, não se pode olvidar que muitas infrações administrativas têm características similares às figuras de improbidade administrativa de cada uma de suas espécies (arts. 9º e 11 da Lei n. 8.429/92), embora tutelem bens jurídicos diversos em instâncias com fundamentos diferentes, podendo um mesmo fato caracterizar infração funcional e improbidade administrativa ou não.”[1] (grifou-se)

A par disso, cabe frisar que, para a caracterização do ato de improbidade administrativa, “é mister a existência de ilicitude (antijuridicidade) do ato, abrangendo tanto a sua imoralidade quanto a sua ilegalidade”[2]. Mas não só isso.

De acordo com a jurisprudência pátria atual, “não se pode confundir ilegalidade com improbidade, eis que a improbidade é ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente. Por isso mesmo, a jurisprudência dominante no STJ considera indispensável, para a caracterização de improbidade, que a conduta do agente seja dolosa, para a tipificação das condutas descritas nos arts. 9º e 11 da Lei 8.429/92, ou pelo menos culposa, nas do art. 10”[3].

Nessa linha, para que uma conduta possa ser reputada ímproba, faz-se necessária a comprovação tanto do elemento subjetivo (dolo, nos casos dos artigos 9º e 11, e ao menos culpa, nos casos do artigo 10) como da existência de ilicitude abrangendo imoralidade e ilegalidade.

Portanto, não se pode falar em ato de improbidade administrativa sem que haja a presença do elemento subjetivo, assim como não se pode confundir improbidade com mera irregularidade ou ilegalidade. Daí resulta que o ajuizamento da competente ação civil pública afigura-se cabível somente nas hipóteses de reconhecida gravidade do ato, sob pena de nefasto desvirtuamento do instituto.

De fato, a ação de improbidade administrativa constitui importante instrumento jurídico no combate à corrupção e na defesa da moralidade pública. Todavia, também é preciso ter em mente que o uso abusivo e indiscriminado dessa ferramenta pode, inversamente, surtir efeitos deletérios, “desmoralizando aquilo que poderia ser bem empregado e ter resultados positivos”[4].

No que diz respeito à prescrição, a Constituição Federal, em seu artigo 37, § 5º, estipula que “A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento”. Tais prazos, que foram regulados no artigo 23 da Lei nº 8.429/92, aplicam-se, portanto, às ações destinadas a levar a efeito as sanções previstas nesse diploma legal, à exceção daquelas que visem ao ressarcimento do dano, já que, quanto a esta última pena, o mencionado dispositivo constitucional previu expressamente a imprescritibilidade da ação. 

Desse modo, ainda que no caso concreto seja constatada a prescrição quanto às demais sanções previstas na Lei nº 8.429/92, afastando, com isso, o cabimento de ação civil pública por ato de improbidade administrativa, remanesce a viabilidade no ajuizamento de ação ordinária de cobrança visando à recomposição do patrimônio público lesado.

Bibliografia:

MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa. 4ª ed., São Paulo, Saraiva, 2009.

MEIRELLES, Hely Lopes; WALD, Arnold; MENDES, Gilmar Ferreira. Mandado de segurança e ações constitucionais. 32ª ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2009.