RESUMO: O presente trabalho apresenta uma análise da realidade em termos de ressocialização do preso em face do que é vivenciado hoje em nossos estabelecimentos prisionais. A falta de assistência devida que nosso ordenamento jurídico e estatal deve dispor em relação a ele, por ser uma garantia constitucional e infraconstitucional, como bem disciplina nossa Lei de Execução Penal e outras normas, levando em conta sua condição de ser humano e não somente de infrator, corroborando para a falência do sistema que não contribui para o objetivo principal da execução penal: a ressocialização e a reinserção social do condenado. Através do método empírico dedutivo, neste contexto, buscasse como objetivo, mostrar uma realidade crua e indigna não vista aos olhos das autoridades competentes e da própria sociedade, que também participa como fiscalizadora na administração do cumprimento da pena durante sua execução. Objetiva-se, também, propor como resultado, sugestões para solução da crise que assola a instituição carcerária brasileira.
Palavras-chave: Sistema prisional. Ressocialização. Execução Penal.
1 INTRODUÇÃO
O maior desafio para o sistema carcerário brasileiro é a promoção integral do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, expresso no art. 1º, da Constituição Federal. Perdura a possibilidade de que não seja possível o cumprimento de tal premissa através do sistema prisional, pelos próprios efeitos do cárcere sobre o condenado. A esperança de ressocialização não pode estar sedimentada no afastamento do indivíduo do seio da convivência social. Especialmente, em se tratando do mundo globalizado onde as mudanças são mais velozes e fazem com que os condenados fiquem desatualizados no exercício de suas profissões, quando possuem qualificação, dessa forma, o aprendizado do crime é facilitado.
Uma vez considerada a permanência nos estabelecimentos prisionais, há o desafio da devida acomodação do preso, segundo critérios de separação estabelecidos na Lei de Execução Penal – LEP. Por seu turno, deve ser remediado o problema da superlotação, fator esse que indica que o Brasil passa por uma explosão demográfica carcerária, ocupando o quarto lugar no mundo em números de presos, segundo ultima estatística divulgada pelo Ministério da Justiça, datada de junho de 2012.
Sobre a eficácia da LEP, Mirabete, (2007, p. 29), por seu magistério, assim leciona:
Embora se reconheça que os mandamentos da Lei de Execução Penal sejam louváveis e acompanhem o desenvolvimento dos estudos a respeito da matéria, estão eles distanciados e separados por um grande abismo da realidade nacional, o que a tem transformado, em muitos aspectos, em letra morta pelo descumprimento e total desconsideração dos governantes quando não pela ausência dos recursos materiais e humanos necessário a sua efetiva implantação.
Destarte, é imprescindível a articulação da Política Criminal no sentido de promover o princípio da eficiência nos gastos públicos com relação ao sistema penitenciário nacional. Do mesmo modo, deve ocorrer o combate veemente à corrupção e a melhoria das condições de trabalho dos profissionais da área de segurança pública e penitenciaria.
Mais do que isso, também se constitui num desafio, apresentar a realidade prisional tal como se encontra, a fim de que, com base nas estatísticas, seja melhorada a forma como as penas são aplicadas. Isso deve ser realizado, sem perder o foco na ressocilazação e na melhoria das condições de convivência do cárcere, enquanto existir. Carece ainda de melhor apresentação o tema dos motins de presos no interior dos estabelecimentos penais, tendo em vista, que em muitos casos de divulgação desses motins, não são devidamente apresentadas suas causas, fins ou abrangência.
No âmbito teórico, não há consenso quanto ao destino ao qual devem ser remetidos os condenados pelos mais diversos crimes. Para a maioria dos réus, condenados ou não, restará a condução ao cárcere prisional, ou seja, cumprir uma pena privativa de liberdade. Se ao menos a maioria das prisões fosse eficiente para o tratamento e ressocialização do prisioneiro, o sistema penitenciário nacional daria bons auspícios acerca da recuperação dos reclusos e detidos por meio das prisões. O cenário brasileiro é conflitante e contrastante a respeito do contencioso tema.
A prisão gera um maior descontentamento do condenado e ainda evoca a idéia de uma possível piora ou reincidência, quando da saída do apenado, através do processo que ocorre em seu interior, como explicado por Paixão (1987 apud PESSIONE, 2007):
Recolhendo indivíduos socialmente definidos como deteriorados, as instituições prisionais não apenas os expõe a técnicas de sofrimento, como oferece a essas pessoas um espaço de interação e aprendizagem, do qual resulta a “conversão” de novos adeptos a uma perspectiva criminosa. São, nesse sentido, “universidades do crime” – local de socialização e aperfeiçoamento de técnicas delinqüentes.
Uma vez considerando a prisão concebida como uma universidade do crime, por sua própria natureza institucional, na dinâmica social das penitenciárias, deve ser observada a separação entre presos e se evitar que um número de reclusos forme uma massa de corpos vivos amontoados sobre um cenário mortificante. O amontoamento de presos é responsável pela impressão psicológica da pena comum, ou seja, de que todos os apenados sofrem da mesma condenação.
Destarte, o problema da superlotação representa, sem reserva, o problema da gradual perda de identidade do detento ou recluso. Sendo assim, a separação entre prisioneiros, fato que tem se tornado impossível em muitas penitenciárias brasileiras, é de vital importância, em função do aspecto da sociabilidade prisional. Implica dizer que, a adaptação ao convívio é gradativa e não deve haver perturbações nesse critério, haja vista que, no dizer de Pessione (2007, p. 100):
Em geral, os delinqüentes ocasionais conseguem de certa forma resistir às influências da comunidade penitenciária, o que não ocorre com os submetidos às penas mais longas. Desta forma, quanto mais longa for a pena, mais alienado se tornará o indivíduo, tanto no aspecto social quanto no mental, gerando um processo denominado anomia.
Resulta-se, dessa feita, a supressão completa da identidade do detento, que é sinal de sua extrema alienação. Por sua vez, tal nível alienante permite ao prisioneiro uma absorção mais rápida da cultura prisional e, por conseguinte, o aprendizado de novas modalidades criminais, quando em contato com outros delinqüentes. Há casos em que a prática de tais modalidades ocorre no próprio estabelecimento prisional, de forma conjunta. Ademais, o sentimento de impunidade atinge também aos parentes e amigos mais próximos em contato constante com aquela realidade.
A anomia prisional é um fenômeno social que pode representar a própria indiferença do preso com o seu destino ou sua saída do estabelecimento carcerário. Mais do que isso, é um fenômeno coletivo de perturbação psíquica, onde a conduta criminosa é praticada sem despertar algum resquício de consciência repressiva, num ambiente que evoca a idéia de caos a toda sociedade, pressupondo a necessidade de indiferença sobre os fatos, como forma de adaptação para a sobrevivência no cárcere.
O cenário exposto acima, contudo, não representa a perda da esperança da saída e nem a perda do sentimento de revolta com aquela situação. Também não representa a perda dos sentimentos dos presos pelos familiares ou amigos, mas a aquisição gradual de um sentimento diferente. Trata-se de um sentimento de revolta propriamente dita. Quando ele é maior que a esperança de saída, ocorrem rebeliões e a reincidência é praticamente determinada antes da saída do recluso do estabelecimento onde cumpre pena.
A separação de detentos de acordo com o sexo e os crimes cometidos não chega a ser o mínimo que pode ser feito para que os mesmos possam chegar ao final do cumprimento da pena em condições de serem reinseridos na comunidade de onde saíram na condição de criminosos.
Historicamente, em termos de políticas públicas, a solução adotada pelos Estados-membros para o dilema da superpopulação carcerária e a separação de presos, ficou, em geral, sempre no improviso. Conforme Holloway (1997 apud PESSIONE, 2007, p. 59), acerca da situação prisional no Rio de Janeiro do século XIX, esclarece que:
Em várias épocas, os fortes das ilhas das Cobras, de Santa Bárbara, e Villegaignon, além dos fortes de São João e de Santa Cruz, nos dois lados da entrada da baía, foram utilizados como prisão. Em épocas de grandes agitações civis, os prisioneiros excedentes eram colocados em barcos ancorados no porto, enquanto os detidos por pouco tempo ficavam em instalações provisórias, perto das delegacias de polícia e em casas de guarda espalhadas pela cidade.
No período inicial da República, a situação não havia melhorado. No Maranhão, a título de exemplo, a promiscuidade era grande, pois não se separavam adultos, menores e mulheres, ainda que os cubículos que servissem como celas fossem amplos. Como conseqüência, muitas mulheres enlouqueciam (PESSIONE, 2007).
No tocante á separação dos segregados em estabelecimentos penais, cabe ressaltar que a separação constitui-se em uma forma qualitativa de acomodação de presos num estabelecimento prisional. Ademais, trata-se de um direito do próprio preso, conhecido como princípio da individualização da pena, presente no art. 5º, da Lei 7.210/1984.
Concernente ao tema, há farta jurisprudência acerca de erros sobre a aplicação do critério de separação entre os segregados. Um caso de ampla divulgação, retirado do portal eletrônico de notícias G1, com publicação em 19 de novembro de 2007, é o da menor de Abaetetuba, no estado do Pará, que foi presa em flagrante por furto em 21 de outubro de 2007 com prisioneiros masculinos. Somente em novembro do mesmo ano, foram tomadas providências, como descrito a seguir:
No dia 19 de novembro, o Conselho Tutelar de Abaetetuba (PA) denunciou ao Ministério Público e ao Juizado da Infância e da Adolescência que uma adolescente ficou presa com vinte homens na delegacia do município, por cerca de 20 dias. Os policiais envolvidos na prisão da jovem afirmaram que ela disse ter 19 anos no momento da prisão. Eles alegaram que prenderam a garota com homens porque a cidade não possui carceragem feminina e que pediram a transferência dela à Justiça. Exames feitos pelo Instituto Médico Legal comprovaram que a jovem é menor de idade. Quando o caso veio à tona, a jovem e sua família foram retiradas do Pará pelo Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM) do Governo Federal.
Com relação ao caso supramencionado, a prisão desrespeitou o princípio da pessoalidade, estendendo-se à família da infratora que, ao invés de presa, tornou-se vítima de um patente erro na execução de sua prisão. Além disso, o problema não foi detectado prontamente pelos funcionários do sistema penitenciário. O Estado, como demonstrado, assumiu tardiamente o ônus da responsabilidade pela vítima perante sua família, constando também que se tornou necessária uma espécie de proteção especial.
De acordo com os fatos narrados, nota-se que há outros problemas graves do sistema prisional brasileiro, como a falta de estrutura nas delegacias, a corrupção e a falta de qualificação dos servidores públicos envolvidos com o indiciamento dos acusados e com o gerenciamento dos estabelecimentos penais. Quando, por outro lado, uma parcela da estrutura estatal funciona de forma adequada, como no caso do Conselho Tutelar de Abaetetuba, cuja denúncia resultou na soltura da indiciada, e os erros foram desbaratados pouco a pouco. Destaque-se que outros casos mais recentes aconteceram em nosso país e que não foram divulgados, este, é apenas um exemplo de maior repercussão trazido a tona.
Parte significativa da corrupção existente no interior do sistema prisional decorre da omissão e conivência dos funcionários do sistema penitenciário. O principal fator que contribui para isso é a realidade de que o Estado não fornece como deveria os subsídios necessários para a sobrevivência humana do encarcerado, o que motiva os presos a assediarem os agentes com suborno para que permitam a entrada de alimentos, medicamentos e outros produtos essenciais. Por outro lado, essa facilitação permite a entrada de drogas, celulares e armamentos. Os agentes penitenciários e outros funcionários da segurança pública, por seu turno, ficam mais sugestionáveis a esses assédios, por causa de sua remuneração incompatível com o cargo exercido.
É o que expressa o então representante no Brasil e Cone Sul da Fundação Internacional Penal e Penitenciária, Edmundo Oliveira, em entrevista concedida à rádio ONU, publicada em 16 de abril de 2010, no portal eletrônico da Rádio das Nações Unidas:
O representante no Brasil e Cone Sul da Fundação Internacional Penal e Penitenciária, Edmundo Oliveira, disse à Rádio ONU, de Salvador, que o excesso de presos nas celas está relacionado a outro problema: a corrupção dentro das penitenciárias. "Os presos na América Latina hoje usam celular das prisões. E porque isso acontece? Entra celular na prisão porque tem corrupção. Outro ponto fundamental é a falta de higiene. Não há sistema de saúde no sistema penitenciário", afirmou.
Em verdade, os estabelecimentos prisionais recebem, em termos de saúde pública, os investimentos mais defasados e ínfimos de toda a competência constitucional concernente à referida área. Sendo assim, doenças infecto-contagiosas também contaminam toda a população carcerária, uma vez que se apresentam no recinto prisional. Ademais, o ambiente propício ao contágio vitimiza os próprios agentes penitenciários e parentes dos presos.
A qualidade da alimentação carcerária, geralmente, é precária. Haja vista que os contratos firmados para a prestação de tal serviço prezam, principalmente, pelo menor preço, devido à grande quantidade de presos que precisam ser atendidos.
Diante de tal realidade, ocorre precariedade na promoção dos direitos mais básicos de um ser humano, conforme discorre Thompson (2000 apud PESSIONE, 2007, p. 128):
A prisão fornece ao indivíduo preso aquilo que ele estritamente necessita para sua sobrevivência. O mesmo ocorre com a alimentação, que é calculada em tantos gramas e em tantas calorias diárias, de acordo com tabelas dietéticas sofisticadas, asseguradoras, num plano abstrato, de serem suficientes para manter o indivíduo. Ainda que seja bem preparada, o que é raro, a alimentação carece de variedade, de atrativo, e é imposta como obrigação, o que faz com que o preso se sinta dolorosamente empobrecido, porque nenhum bem ou serviço apresenta-se com um caráter de amenidade, mas, tão-só, como alojamento, ração e tratamento de mantença.
A forma de tratamento exposto acima remete o pensamento de qualquer cidadão a um cenário de prisioneiros de guerra. A maneira como a questão da nutrição carcerária é tratada revela indícios dos muitos ferimentos causados pelo Estado ao princípio da legalidade na execução penal e principalmente, da dignidade da pessoa humana para com os presos.
No tocante à arquitetura e construção da maioria das penitenciárias, malgrado os seus projetos atendam a critérios para uma eventual concorrência licitatória, elas não atendem às necessidades a que se destinam. Por seu turno, a minoria que se adapta à finalidade institucional de uma prisão, enfrenta sérios problemas com a superlotação, por causa do aumento da violência no interior do cárcere.
A superlotação de uma nova penitenciária no Brasil tornou-se uma mera questão de tempo. Cabe ressaltar que, as melhores penitenciárias, por serem edificadas de forma encastelada, não são passíveis de ampliação de seus pavilhões e leitos. Seja porque não há mais espaço físico no terreno em que se encontra, seja porque haveria encarecimento na gestão logística do estabelecimento prisional.
Para efetuar a correta mensuração acerca do fenômeno das rebeliões no sistema carcerário brasileiro, seria necessário um trabalho de profundidade mais elevada e com um nível de acuidade que não pode ser coberto por um simples artigo cientifico.
Todavia, não seria possível atingir o escopo deste trabalho sem mencionar o tema da rebelião no interior dos estabelecimentos penais. Vale ressaltar que o termo tecnicamente mais correto para designar tal fenômeno seria “motim de presos”, que, por seu turno, provém etimologicamente “do latim movere, mover, resultando movimento no sentido de rebelião, revolta, e ensejando o francês meute, revolta, bem assim meutin e mutin, revoltoso, aquele que se volta contra alguém” (ACQUAVIVA, 2010, p. 568).
A conduta em foco representa um crime contra a Administração Pública consistente em empreender tentativa de fuga ou reivindicação de natureza justa ou injusta com emprego de violência, seja para com os funcionários do sistema penitenciário, seja pelo uso de violência com os próprios detentos (ACQUAVIVA, 2010).
Por sua vez, o Código Penal, em seu art. 354 dispõe: “Amotinarem-se presos, perturbando a ordem ou disciplina da prisão: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, além da pena correspondente à violência”. No que se refere a tal crime, figura como sujeito ativo o condenado a pena privativa de liberdade ou outras, excetuando-se as medidas de segurança. No outro âmbito subjetivo, é o Estado que sofre imediatamente os prejuízos causados pela amotinação. Por extensão, os indivíduos que sofrem violência correspondem aos sujeitos passivos mediatos.
O processo ora descrito desperta para o problema da reincidência dos reclusos dentro do próprio estabelecimento prisional, durante o cumprimento da pena, por motivo de motim. Ademais, as rebeliões criam uma cifra negra também para a questão dos presos provisórios, que aguardam julgamento, pois não serão considerados reincidentes enquanto a sentença não transitar em julgado.
Outro aspecto penal que chama a atenção no crime de motim de presos é que, para que seja tipificado o delito, há a necessidade de que haja ao menos três partícipes. Haja vista que o Código Penal prevê expressamente os casos de crimes que exigem ao menos dois partícipes. Ademais, na prática, a responsabilização dos autores é aferida de acordo com as depredações averiguadas no estabelecimento prisional em concurso com outros crimes, como homicídio, ameaça dentre outros (ACQUAVIVA, 2010).
No sistema carcerário brasileiro as rebeliões caracterizam-se pela fuga e transferência de presos, excesso de violência por parte de agentes penitenciários e policiais ou da própria violência dos encarcerados, além da dificuldade na responsabilização dos culpados. Disso resulta a sensação social de impunidade, agravada pela mídia especializada no assunto. Entre os presos, a oportunidade ocasionada pelo caos torna-se propícia para a ocorrência de “acertos de conta”. Nesse quadro, ocorrem delitos que não se relacionam com os motivos principais da rebelião. Destarte, a motivação para a ocorrência das rebeliões é variada. Desde o descontentamento com o gerenciamento do estabelecimento prisional até a atuação de facções pertencentes ao crime organizado.
O déficit prisional do sistema penitenciário nacional emerge dia após dia. As estatísticas prisionais, por mais elaboradas que sejam não podem mensurar os prejuízos subjetivos sofridos pelos detentos e reclusos do sistema prisional brasileiro. Faz-se necessário demonstrar os dados relativos ao tema da superlotação carcerária para fornecer um melhor embasamento do fenômeno em questão, evidenciando possíveis soluções.
Conforme números estatísticos de junho de 2012, publicado pelo Sistema Integrado de Informações Penitenciárias (Infopen), do Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN, Órgão vinculado ao Ministério da Justiça, a população carcerária brasileira é de 549.577 presos. Desse total, 508.357 estão no sistema penitenciário, sendo 476.805 homens e 31.552 mulheres e 41.220 nas Delegacias, sendo 36.733 homens e 4.487 mulheres. Do total da população carcerária do Brasil, 191.024, ainda são provisórios, cuja cifra é distribuída entre 180.038 homens e 10.986 mulheres, representando, aproximadamente 37% da população carcerária nacional. No tocante ao número de vagas existentes no sistema penitenciário nacional, em 2012, havia 309.074 vagas, sendo 287.150 reservadas a homens e 21.924 para mulheres, o que demonstra um déficit extraordinário e crescente para sua capacidade em relação aos números apontados.
Cada dado informado alerta para um problema associado à inoperância ou inefetividade das campanhas de combate ou controle da criminalidade pelos órgãos de Política Criminal. Os números revelam não somente a atualidade do sistema prisional, mas também uma tendência de recrudescimento nos problemas principais, a exemplo da superlotação dos presídios.
Número extremado de presos provisórios: representa a morosidade da justiça. Atenta para o fato de que a maioria de tais presos é formada por réus primários. Implica na desvalorização da função do Defensor Público, incapaz de agilizar a prestação jurisdicional aos presos mais pobres, haja vista não terem condições de contratar assistência jurídica adequada, sobrecarregando as Defensorias Públicas. Há omissão do Poder Judiciário, que sequer informa aos presos o período restante do cumprimento da pena, desobedecendo ao que determina a LEP.
É o dado mais grave e que mais fere a dignidade da pessoa humana, pois faz com que o réu seja retribuído por atos que não cometeu e o expõe a criminalização no próprio estabelecimento penal. Herança da ditadura militar, onde era comum o caso de prisão provisória sem autorização judicial, sob a acusação de subversão ou crime de lesa-pátria, permanecendo os presos, em situação degradante.
Maioria masculina dos detentos: uma parte deles pode representar uma tendência psicobiológica do gênero masculino. Sociologicamente, o fato demonstra uma maior exposição do homem à influência do crime. Outra justificativa é que a maioria das residências brasileiras têm um homem como pessoa de referência e a formação histórica do Brasil é patriarcal.
Falta de vagas: resulta de falhas na aplicação de recursos públicos destinados a segurança pública e atraso no desenvolvimento social brasileiro. É o principal dado que aponta a inefetividade da existência das prisões, o que é argumento forte para as alternativas penais. Representa ainda um continuísmo nas estratégias de combate ao crime, assim como um elevado índice de reincidência, ou seja, réus primários voltando a ocupar vagas com os novos criminosos.
Ressalte-se que o dado é fruto da exposição do sistema penitenciário às vicissitudes e mudanças eleitorais e políticas. Essa realidade é utilizada como meio de manobra de uma massa de cidadãos, diante da falta de preparo do Estado para lidar com a finalidade retributiva e preventiva da pena e com a sua pouca eficiência na ressocialização.
Déficit de vagas nos estabelecimentos policiais: indica uma conseqüente desestruturação das polícias judiciária e contenciosa, que não contam com instalações adequadas ao funcionamento da força de segurança pública. Essa, por seu turno, é incapaz de cobrir o elevado nível de criminalidade, resultando na existência de uma cifra negra ainda mais alarmante. Pode existir por excesso de indiciados ainda não remetidos para a prisão provisória.
Existência dos dados de forma detalhada e sistematizada no governo: indica que o Estado conhece a dimensão do problema prisional, mas ainda não efetivou medidas mais adequadas ao controle da criminalidade, apesar de assumir sua responsabilidade. A sistematização de tais dados fundamenta-se na exigência de organismos e entidades de defesa dos Direitos Humanos atuantes no Brasil e nas reformas advindas com a democracia e a Constituição de 1988.
8 CONCLUSÃO
Nossa Lei de Execução Penal, as Regras Mínimas da ONU para tratamentos de reclusos(as), além de outros dispositivos legais e constitucionais, por serem desobedecidos, é sem duvida um mentor para crise penitenciaria atual e o Estado busca soluções que na pratica ainda não funcionam, não adiantando somente construir mais unidades prisionais e deixar de lado a política penitenciaria interna, levando em consideração que o Brasil também é campeão em obras paralisadas e inacabadas, o que retrai ainda mais sua eficácia na aplicação de verbas publicas em setores que dão lucros, imaginem no sistema penitenciário que não dá nenhum retorno econômico.
É preciso que as autoridades atuem no sentido de buscar todos os meios, como forma de aprimorar o respeito legal que deve ser dado ao detento, com o objetivo de prepará-lo para seu retorno ao convívio em sociedade, de modo que para isso, seus direitos sejam preservados, ou caso contrario, estaremos permanecendo no “caos penitenciário”, o que dará margem para um acrescido sentimento de revolta, fazendo do pequeno infrator um verdadeiro profissional do crime, tudo em contrapartida ao sofrimento que passou durante a vida carcerária de condenado.
A criminalidade, a priori, deve ser tratada como um problema social, por isso, é necessário que o poder público se faça presente em comunidades mais violentas, buscando a paz social e dando estrutura para a educação e trabalho, como forma de prevenção do crime e reprimindo de forma eficaz quando essa paz seja resistida pelo poder paralelo que persistem em dominar territórios. Tem que ser feito uma limpeza geral e o Estado tem que mostrar que seu poder é maior que o poder do trafico e das organizações criminosas, não pode temer. Sendo assim, o país sairá de um submundo criminoso, as penitenciarias diminuirão sua lotação e a paz tão sonhada pode reinar no seio social.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico Acquaviva. 4 ed. São Paulo: Rideel, 2010.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir – História da violência nas prisões – Tradução de Raquel Ramalhete. 36. ed. Petrópolis: Vozes, 2009.
GOMES, Luiz Flávio. Código Penal, processo penal, legislação penal e processual penal, constituição federal. 10. ed. rev. ampl. atual. São Paulo: RT, 2008.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional esquematizado. 11. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Método, 2007.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução Penal.11. ed. São Paulo: Atlas, 2007.
PESSIONE, Vany Leston. (Con)vivendo na Prisão: a sociabilidade na sociedade marginal. Rio de Janeiro: Luzes – Comunicação, Arte & Cultura. Mar. 2007.
SILVA, João Miranda. A responsabilidade do Estado diante da vitima criminal. São Paulo: Mizuno, 2004.
Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade do Museu Social Argentino - UMSA - AR, (2013), Especialista lato sensu em Direito Fiscal e Tributário pela Universidade Cândido Mendes do Rio de Janeiro - UCAM - RJ (2003). Possui graduação em nível de Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal da Paraíba (2001). Atualmente é Professor efetivo de Direito Penitenciário e Prática Jurídica da Universidade Federal de Campina Grande, Coordenador do Núcleo de Prática Jurídica do Centro de Ciências Jurídicas e Sociais - CCJS/UFCG, Advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil e Sargento da Reserva Remunerada da Polícia Militar do Estado da Paraíba.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Iranilton Trajano da. Sistema prisional brasileiro: desafios e incertezas em face do caos social e de sua falência aparente Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 jan 2013, 07:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/33484/sistema-prisional-brasileiro-desafios-e-incertezas-em-face-do-caos-social-e-de-sua-falencia-aparente. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: LEONARDO DE SOUZA MARTINS
Por: Willian Douglas de Faria
Por: BRUNA RAPOSO JORGE
Por: IGOR DANIEL BORDINI MARTINENA
Por: PAULO BARBOSA DE ALBUQUERQUE MARANHÃO
Precisa estar logado para fazer comentários.