Resumo: Desenvolve comparação entre o Código Penal vigente e a proposta do novo Código Penal que tramita no Congresso Nacional. Interpreta as propostas de mudanças a partir do contexto atual no qual a influência do Direito Internacional no Direito pátrio, parece fazer ameaçar a soberania nacional e tornar os atos burocrático-legislativos e burocrático-jurídicos meros rituais de passagem. Observa também em que medida os objetivos enunciados pela comissão elaboradora do anteprojeto foram cumpridos, principalmente do que diz respeito á busca de adequação aos parâmetros pré-estabelecidos. Apresenta algumas das principais doutrinas do Direito Penal e reflete sobre os discursos da expansão punitiva e a possível deslegitimação do Direito Penal. Para fundamentar tal abordagem realiza esta revisão sobre doutrinas que influenciam o Direito Ocidental e também latino-americano.
Palavras-Chave: Código Penal, Direito Penal, Direito Internacional e Constituição.
I. Introdução
Atualmente, estão em vigor, discursos “críticos” e, ao mesmo tempo, salvacionistas de base foucaultiana e marxista que tentam colocar para o Direito Penal um ônus mal calculado.
O conceito de crime sempre foi um desafio para o Direito Penal. O primeiro grande rompimento foi com o conceito de pecado, como parte do processo de afastamento entre instituições religiosas, Estado e Direito. Logo em seguida, como extensão, aparece o dilema da pena. Como punir sem vingar.
Entretanto, de acordo com as origens modernas judaico-cristãs o homem tem uma natureza pecadora que, por analogia e extensão, não teria o homem também uma natureza violenta ou mesmo criminosa? Esse tema transcorreu todo o debate jusnaturalista e, a própria teoria do contrato, traz essa preocupação na sua essência. O desafio assim proposto, expõe um leque de opções de como entender o certo e o errado, a virtude e o pecado dentro de uma visão racionalizada e moderna que tem na concepção de “crime” e punição a possibilidade de controlar, em alguma medida, a conduta humana no convívio social.
Os problemas criminais recentemente colocados para o Direito Penal não são particulares deste nosso tempo, apenas ganham novas proporções. As possibilidades de respostas das instituições modernas aos fenômenos pós-modernos são retratadas exatamente no nível do agravamento do conceito de “crise” e, na dificuldade de transformar retóricas soltas ao vento em respostas práticas para problemas cotidianos.
Sendo assim, quando perguntamos o que é “crime”, ou melhor, o que deve ser descrito como uma conduta típica, antijurídica e culpável está sendo perguntado, antes de tudo a uma sociedade e no seu tempo, aos indivíduos que a compõem, como eles são e como querem continuar sendo.
O debate sobre criminalizar e descriminalizar reflete assim a “crise” e todo o seu fardo, enfadonho, dessa cruz de aço, concreto, status e vaidade que nos obrigamos a carregar.
Dentro desse universo, fazer o recorte sobre uma conduta típica passa a exigir nova forma de redigir em que, a antiga fonte do Direito, a dos pecados capitais, pode deixar de fora detalhes incriminadores importantes que trazem conseqüências importantes a respeito da legalidade, taxatividade e proporcionalidade. O “não matarás” convertido em “matar alguém” pode já não bastar para definir um crime, uma vez que, a sofisticação das formas e justificativas para matar, pode pôr em dúvida a tipicidade, o nível de afronta ao Direito ou mesmo, se for o caso, a culpabilidade do agente. Em outras palavras, a crescente despenalização em função da relativização do Direito Penal no Brasil e na América Latina sacrifica de imediato o seu aspecto primordialmente preventivo ao tempo que, o reduz muitas vezes, a uma mera regulamentação progressiva do crime. Então, é cada vez mais, um conjunto de regras de como proceder caso o indivíduo esteja realmente disposto ou disposta a cometer crime(s) do que um alerta impeditivo.
Isso por que os novos fenômenos criminais desafiam os olhos atentos dos especialistas, quanto a uma possível classificação doutrinária e uma precisa descrição do iter criminis. Isso se verifica sobremaneira nos crimes que pelo nosso ordenamento abrangem a legislação especial.
Quando o Direito e o Estado fogem à responsabilidade de impor regras à conduta individual faz voltar o antigo problema da vingança privada, contra o qual durante tanto tempo o Direito e Estado buscaram se impor. Volta-se assim a um novo modelo de guerra de todos contra todos baseada em discursos socialistas e atenuadores que só possuem base doutrinária no clássico “O Contrato Social” de Rousseau para o qual o indivíduo nasce bom e a sociedade é que o corrompe. Por isso, justifica-se sempre uma atenuante para aquele que é vítima de uma sociedade corruptora, o criminoso. Não por acaso, no nosso tempo, cada vez mais, Direito Penal volta-se para proteger o criminoso, esquecendo em muito a situação da verdadeira vítima do ato delituoso. É nesse contexto também que o Garantismo Penal é distorcido e colocado como proteção a quem comete crime, supostamente vítima de um Estado repressor.
Talvez, a distância que existe entre o Direito Penal e o crime seja permanente, apesar de parecer o contrário. Basta ver que o Direito e mesmo o Direito Penal tem orientação deontológica, já a Criminologia é ontológica. A Criminologia busca as causas, o Direito Penal é um ramo de uma ciência normativa. Dito isso, observamos que esta busca da essência do crime tanto no Direito Penal, como na Criminologia, se faz necessário recurso de outras áreas do conhecimento.
O Direito alemão e italiano inovaram e aprofundaram as razões para punir e os objetivos da punição no momento em que seguem as tradições jusfilosóficas de Kant e Hegel. Tendo em vista não desprezar as contribuições do Direito Penal italiano, principalmente, a partir das obras de Carrara e Ferri, o Direito alemão traz a ideia de “essência” e “fenômeno” para a análise da “vontade” e da conduta humana.
Não por acaso o Direito Penal fala em conduta proibida ou ato criminoso, e não em mente criminosa ou indivíduo criminoso, senão este último termo, quando se refere à pessoa que praticou, foi julgada e condenada. Porém, por mais que se insista o Direito Penal não pode se furtar ao fato de que, mesmo quando fala apenas em condutas proibidas ou inadequadas, está falando também em indivíduos inadequados. O receito do estigma é salutar, mas a sua ocorrência é inevitável. Daí que a teoria de Rousseau, exposta no Contrato Social, vai fundamentar a legitimação do Direito e do Estado de punir tanto na doutrina causalista quanto na finalista, na funcionalista e, no abolicionismo penal, pela justificativa ou repúdio ao conceito de crime.
Mas, no rol da evolução doutrinária, o mesmo aperfeiçoamento e aprofundamento que traz mais certeza no entendimento e atribuição de condutas típicas como faz a teoria finalista, garante poder apontar com maior grau de certeza que aquele suspeito cometeu crime e com qual grau ou intensidade da vontade. O que a fenomenologia tradicionalmente chamou de “intencionalidade”, Welzel associa à ”vontade”.
Ao falar em autor de um fato punível o Direito Penal está falando de uma pessoa que cometeu crime, por isso adjetivada de “conduta criminosa”. Quais os fundamentos doutrinários, epistemológicos e legais de tal afirmação é outra questão a ser tratada. O Direito Penal pune fatos e pessoas no mundo real. O que assistimos muitas vezes é o Direito Penal, ou melhor, juízes, juristas e legisladores que costumam reduzir o fenômeno criminal aos limites e possibilidades do Direito Penal, problema que tanto Welzel como Roxin e Jakobs já haviam alertado. O circuito que há de ser percorrido é da abstração-teoria para o real do fato punível.
A ideia de “valoração” jurídico-penal, como está na teoria finalista, não busca fragilizar e relativizar o Direito Penal. Ao contrário do que se faz no Brasil, onde se relativiza tudo e não se chega a lugar nenhum, é preocupante que o está sendo aqui chamado de “despenalização do Direito Penal”. Uma vez que a “conduta” está entre os elementos que compõem o tipo e a “vontade” entre os elementos que compõem o dolo, Welzel traz o dolo para a conduta e, com isso, inova ao associar conduta e vontade na relação observada no mundo fático, através da possibilidade de identificar a finalidade da ação do agente anteriormente proibida.
Se o critério para a distinção entre um ilícito civil e penal, por exemplo, passou aqui no Brasil a ser, como dizem, meramente político, não há que se culpar o Direito, como se este tivesse vida própria. Tal concepção acanhada demonstra seguramente o afastamento dos mestres do Direito quando, desde o século XIX, ao menos em matéria penal, reclamavam e exerciam a articulação entre Direito Penal, Política Criminal e Criminologia. É o afastamento do Direito Penal de outras áreas afins que apontam para esse reducionismo mediocrizante, que nos faz incapazes de desenvolvermos um ordenamento jurídico mais maduro e coerente que possibilite um direcionamento das instituições de Estado para um ordenamento social mais equilibrado.
Se as mudanças nas leis, as interpretações da Constituição, são baseadas em pressões de movimentos sociais, ong’s e outros achismos, o que esperar de tal “combate à criminalidade”, cujo perfil se sofistica na mesma velocidade do desenvolvimento tecnológico?
Tem sido lugar-comum dizer que o Direito Penal no Brasil é extremamente punitivo, quando outra interpretação pode apontar para um Código Penal que seja muito mais um convite ao crime, por parte daqueles que querem ou já delinqüem. Desvanece o aspecto preventivo do Direito Penal, fragiliza-se o convívio social em nome de retóricas jurídicas que lembram a diversidade abstrata da escola Clássica jusnaturalista. Repudia-se tudo que se tem por científico ou positivo. A moral que ainda resta foi associada a preconceito. Nesse contexto, não por acaso, toda a demanda por ordem, estabilidade e coerência volta-se para o Direito Penal e suas respectivas instituições representativas. Depois que a crise se instaurou, usam de tal situação, para justificar mais relativismos e incertezas jurídicas.
O que será explanado e refletido nesse trabalho é sobre a atualidade e tendência do Direito Penal no Brasil. Há uma grande dificuldade em identificar tal tendência por influência de uma única Escola: finalista, abolicionismo ou funcionalista que inclusive pouquíssimo se fala. Basta ver as alterações que serão trazidas no Novo Código Penal, por imposição da ONU através da implantação impositiva do PNDH-3. Além disso, a tendência à descriminalização de condutas humanas, tanto no Brasil como na América Latina, está e continuará ocorrendo muito mais por atestada incompetência e desinteresse político do Estado em pôr em prática o Direito Penal estabelecido, que por influência de Escolas e jusfilósofos estrangeiros que, não raras vezes, temos dificuldade de interpretar e adequar.
O projeto do Novo Código Penal que já tramita no Congresso Nacional é uma proposta de reduzir o amplo conjunto de leis extravagantes que passou a caracterizar o Direito Penal brasileiro e ao mesmo tempo ajustar a nossa lei penal ao arcabouço constitucional. Além dessas preocupações está também a necessidade de atualizar e adequar o Direito Penal brasileiro às normas dos Tratados, Pactos e Convenções assinados pelo Brasil.
Com isso, buscou-se também reduzir o número de tipificações que protegiam o mesmo bem jurídico em leis diversas e, por isso, a observância da fragmentariedade no Direito Penal. Com esse objetivo a Comissão adota o seguinte critério: “i) se permanece necessário e atual; ii) se há figuras assemelhadas previstas noutra sede normativa; iii) se as penas indicadas são adequadas à gravidade relativa do delito” (2012, p.05).
São dignas de nota também outras preocupações que a Comissão exteriorizou na redação do Projeto. Entre elas a concepção de que muitas leis extravagantes compreendiam verdadeiros “microsistemas nos quais as normas penais complementavam ou eram complementadas por disposições civis e administrativas”. Além dos desarranjos provocados pelas “mais de cento e vinte e cinco leis com dispositivos penais fora do Código Penal” (2012, p. 05).
Outras diretrizes apontadas pela comissão na análise da legislação especial em vigor:
a) da necessidade de adequação às normas da Constituição de 1988 e aos tratados e convenções internacionais;
b) da intervenção penal adequada e conforme entre a conduta e a resposta de natureza penal por parte do Estado;
c) da seleção dos bens jurídicos imprescindíveis à paz social, em harmonia com a Constituição;
d) da criminalização de fatos concretamente ofensivos aos bens jurídicos tutelados;
e) da criminalização da conduta apenas quando os outros ramos do direito não puderem fornecer resposta suficiente;
f) da relevância social dos tipos penais;
g) da necessidade e da proporcionalidade da pena (2012.p. 06).
Está entre as novidades do Projeto a introdução do Título: “Dos Crimes contra a Humanidade”, “cibernéticos”, além das tipificações: “Intimidação Vexatória” e “Perseguição Insidiosa ou Obsessiva” e do novo entendimento de que infração penal e crime passam a ser expressões sinônimas.
Uma das maiores dificuldades para estudar e entender o Direito Penal brasileiro reside no mosaico de conceitos, princípios e doutrinas no qual foi transformado. Basta ver, como será feito, o tratamento dos conflitos entre as influências da Escola Clássica e Escola Positiva no Direito pátrio. Percebe-se claramente tal conflito na definição sobre a estrutura analítica de crime, cujo Projeto parece ter tentado resolver ao acrescentar o Parágrafo Único do artigo 1° que diz: “Não há pena sem culpabilidade”.
O mais estranho tem sido o repúdio ao dogma salientando-se uma “crítica” ao suposto dogmatismo que torna apenas o mundo jurídico algo sem referências. Mas, os mesmos dogmas reproduzem-se em trechos de doutrinas estrangeiras sem a devida reflexão e enquadramento no Direito brasileiro.
Neste ambiente, no qual o discurso de denúncia da “expansão punitiva” ganha tanta repercussão é de estranhar que a Comissão tenha de fato atuado na busca de aproximação com a Constituição, nas propostas de redução de penas. Não foi possível identificar ajustes quanto ao problema da proporcionalidade e, a vítima continua sendo uma figura negligenciada pelo Direito Penal brasileiro.
Entretanto, é curioso observar que tão pouca atenção tem sido dada, por exemplo, ao instituto da dosimetria da pena em face na análise e correspondência com a realidade fática dos critérios que orientam as circunstâncias judiciais. Há, contudo, certa confusão interpretativa quanto aos incisos da Constituição que prescrevem o princípio da individuação da pena e o princípio da proporcionalidade na aplicação da pena, ou seja, a sua dosimetria. De fato, todo esse périplo até o cumprimento em cela individual faz parte do que, por aqui no Brasil, acanhadamente, chama-se “individuação da pena”.
O princípio da individuação da pena está claro e restrito ao inciso XLV do 5° artigo, onde consta, - “nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens serem, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;”
No Inciso XLVI do mesmo artigo, consta: “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos;”. Não se trata, portanto, da prescrição do princípio, mas das regras que orientam a sua eficácia. Reside aí, como em outros casos, quando princípios são confundidos com regras, possibilitam outro equivoco que é aquele que ocorre quando são confundidas a discricionariedade e a obrigatoriedade de vinculação ao parâmetro legal.
O método para o desenvolvimento deste trabalho sofreu alteração durante o desenvolvimento. Primeiro foi observada a possibilidade de se efetivar uma comparação tomando como parâmetro o Código vigente em direção ao Projeto. Logo foi percebido ser desnecessário tal esquematização uma vez que, muitos detalhes que eram identificados com tal nível de comparação artigo por artigo, resultavam em identificar mudanças, muitas vezes, apenas redacionais.
Logo foi percebido também que seria muito mais proveitoso se fosse obedecido o itinerário traçado pela própria Comissão, quando da versão colocada na “exposição de motivos”. Acrescentado a esse método foram feitas pesquisas em sites e fontes bibliográficas para fundamentar a possível interpretação do material e objeto de estudo.
I. Conceitos, Doutrinas e Escolas Penais
Desde o final do século XIX quando Raymond Saleilles escreveu “A Individualização das Penas”, que algumas questões tornam-se evidentes no universo do Direito Penal, principalmente, como relacionar liberdade, responsabilidade e punição. Na introdução a esta obra o também, famoso jurista de então Gabriel Tarde, salienta alguns dilemas para Direito ocidental moderno que continuaram desafios para a Escola Positiva. Por exemplo:
[...] a dificuldade em conciliar suas duas conclusões: por um lado, conservar a responsabilidade moral, apoiada no livre-arbítrio, como fundamento da condenação; de outro, fundar a penalidade em um princípio totalmente distinto: a individuação da pena. [...]
Não obstante, isso significa que, quando o ato não parecer emanar do caráter próprio do agente, quando parecer uma anomalia passageira, não é oportuno punir, já que não há de se reformar seu caráter por causa de atos que não lhe dizem respeito. Portanto, seria mais racional fazer com que a culpabilidade e a penalidade dependessem da natureza do caráter pessoal. E então, responsabilidade e individuação, longe de se contradizerem ou afrontarem-se de maneira estéril, teriam a mesma origem (2006, p. 17).
Na medida em que se pretendia que o Direito e particularmente o penal se afastem dos juízos de valor morais e o Direito Penal pudesse adquirir um grau de ciência, cada vez mais, a criminologia e a sociologia foram matrizes para embasar a perspectiva do um Direito científico ou, dito de outro modo, uma ciência jurídica. Por isso:
Não se trata de dimensionar a pena com relação ao mal cometido; nem se trata apenas de dimensioná-la segundo o grau de criminalidade empregado no momento do ato; antes de tudo, trata-se de adaptá-la à natureza da perversidade do agente, à sua virtualidade criminal, que se deve impedir que se traduza em novos atos [...] considerando a punição mais como um remédio do que como uma dívida e uma expiação (2006, p. 17).
E ainda, como se estivesse no nosso tempo, observa Tarde:
É algo estranho, quando os criminalistas contemporâneos, naturalistas ou socialistas, investigam as causas do delito, não descobrem mais do que fatores impessoais, o clima, a estação, a raça, as anomalias cranianas ou de outra espécie, os estímulos do meio social; em resumo, naturalizam ou socializam o delito e o tornam impessoal (2006, p. 17).
O entendimento de que o Direito Penal é um conjunto de leis positivadas cujo objetivo é proteger a sociedade é muito evidente nos estudos do século XIX. Essa visão a respeito do Direito Penal originou, inclusive, interpretações mais radicais, algumas das quais estão presentes até hoje. Dentre elas a “defesa social” ou a “nova defesa social”, o “abolicionismo penal” que, tal como antes e agora, pregam a extinção dos presídios, e a substituição do Direito Penal, por uma sociologia criminal que estaria voltada exclusivamente para a adoção de políticas preventivas e ressocializadoras. O próprio Raymond Saleilles admite: “O Direito Penal, evidentemente, é sociologia criminal” (2006, p. 27).
A primeira questão reside na necessidade de se trazer o Direito Penal para uma proximidade com o mundo fático. E isso, sem dúvida, é ao mesmo tempo uma reação à abstração teórica da Escola Clássica. Pode-se perceber então que são imediatas as reações a essa necessidade ao apresentar-se com certa constância, na medida em que, senão os crimes, mas a forma de cometê-los cobra atualizações das Políticas Criminais e por isso, da persecução penal.
Não por acaso surge naquele contexto a expressão “defesa social” retratando o principal objetivo e função do Direito Penal, para logo em seguida, tornar-se uma Escola penal e criminológica.
Desta forma, o argumento atual de que o Estado não tem direito legítimo para exercer a punição é um discurso marxista e foucaultiano. A origem moderna da legitimidade do Estado criar leis e punir encontra-se toda no jusnaturalismo e no contratualismo. Hobbes resume muito bem esta questão quando afirma: “Mas tal como os homens, tendo em vista conseguir a paz, e através disso sua própria conservação, criaram um homem artificial, ao qual chamamos Estado, assim também criaram cadeias artificiais, chamadas leis civis” (1997, p. 172).
Em Rousseau, um século mais tarde, a questão está ainda mais clara:
O fim do tratado social é a conservação dos contratantes: quem quer o fim quer também os meios, que são inseparáveis de alguns riscos e até algumas perdas.
[...] quanto mais o malfeitor insulta o direito social, torna-se por seus crimes rebelde e traidor da Pátria, de que cessa de ser membro por violar suas leis e à qual até faz guerra; a conservação do estado não é compatível com a sua, deve um dos dois morrer, e é mais como inimigo que se condena à morte como cidadão (2004, p.46)
Entretanto, contraditoriamente é o mesmo Rousseau que infunde o início da “naturalização do crime”, ou seja, imputar ao meio ambiente social a culpa pelos comportamentos danosos. Uma vez que, para Rousseau, “o homem nasce livre e em toda parte encontra-se a ferros” (2004, p. 23). O homem como vítima do seu meio. Essa ideia está presente em muitos jusnaturalistas, mas é Marx no século seguinte que levará tal concepção às últimas consequências.
Neste século XIX, a obra de Liszt se insere num contesto de visível contestação ao classicismo, onde para fundamentar uma tese científica do Direito Penal, um Direito Penal Positivo, a Criminologia passa ser fonte primária de informações a respeito. Outras necessidades já se apresentam como, por exemplo, trazer o Direito Penal para uma aproximação com a realidade dos atos humanos.
O Tratado de Direito Penal Alemão de F. Von Liszt, publicado em 1881, é um marco no assunto. A influência do Positivismo no Direito pela via da Sociologia de Augusto Comte e no Direito Penal, também, pela Criminologia é uma reação aos Clássicos no sentido de uma insuficiência de respostas para a criminalidade que se apresenta para o glamoroso edifício teórico jusnaturalista que passa a não sustentar uma política criminal adequada. Nesse ambiente desenvolve-se também na Alemanha o Direito Comparado, que mesmo de influência Clássica, fazia parte desta nova busca de respostas para o mundo fático.
É prudente salientar que a influência do jusnaturalismo e, no seu conjunto, denominada por Carrara de “Escola Clássica”, terá penetração no Direito Ocidental até os nossos dias. Entretanto, naquele momento, final do século XVIII e início do século XIX, com uma revolução industrial literalmente a todo vapor, as sociedades urbanas de então careciam de um modelo regras de condutas que descem respostas aos fenômenos humanos que transpareciam por sua extensão, ao universo coletivo. Nesse contexto ganha destaque o Código Penal Prussiano de 1810, sobre o qual muitos juristas da época, inclusive Liszt, vão se remeter.
Não por acaso, a transição entre a teoria o Direito Clássico para o Direito Positivo, quando voltado para a questão penal, a preocupação com a “defesa social” é um clamor evidente. Em outras palavras, a função do Direito Penal a partir do século XIX é evidente: proteger a sociedade. Nesse contexto, podemos falar de um sujeito passivo genérico, a sociedade, diante do fenômeno criminal, mesmo quando o crime é analisado individualmente.
Outro dilema desse momento herança da Criminologia e do Direito Clássico é o problema da imputação. Está em cena o problema do livre arbítrio versus a predeterminação divina. Se o crime é resultado do livre-arbítrio, ou seja, um ato resultado de uma vontade livre, estaria resolvida a questão da imputação. Porém havia também a crença numa predestinação e, sendo assim, em que medida o ato criminoso ou mesmo o comportamento delituoso contumaz não seria um resultado dessa predeterminação divina, do destino?
Tem então a necessidade de observar o ato e o resultado sem levar em conta o autor ou as circunstâncias. Temos uma imputação objetiva em andamento fruto não do positivismo jurídico como pensam alguns. Mas, ao contrário, resultado de um humanismo iluminista que buscava através de um direito prescrito eliminar a barbárie das penas e a insegurança dos processos. Além disso, a ansiosa busca pela igualdade perante a lei.
Sobre essas questões, a versão foucaultiana, pacificamente aceita pelo meio acadêmico brasileiro, como sendo obra quase exclusiva de Beccaria, é tal o equívoco, que qualquer leitor atento da literatura do século XVII, já verificaria que tal assunto e concepções eram correntes neste século na Inglaterra. Quanto ao conflito entre crime e pecado e a possibilidade imputação nos ensinou Hobbes:
Um pecado não é apenas uma transgressão da lei, é também qualquer manifestação de desprezo pelo legislador. Por que tal desprezo é uma violação de todas as leis ao mesmo tempo. Pode portanto consistir, além da prática de um ato, ou do pronunciar de palavras proibidas pela lei, ou da omissão do que a lei ordena, também na intenção ou propósito de transgredir. [...]
Um crime é um pecado que consiste em cometer (por feito ou por palavra) um ato que a lei proíbe, ou em omitir um ato que ela ordena. Assim todo crime é um pecado, mas nem todo pecado é um crime. A intenção de roubar ou matar é um pecado, mesmo que nunca se manifeste através de palavras ou atos, porque Deus, que vê o pensamento dos homens, pode culpá-los por eles. Mas antes de aparecer alguma coisa feita ou dita, onde um juiz humano possa descobrir a intenção, não pode falar-se em crime. [...]
Não há lugar para humana acusação de intenções que nunca se tornaram visíveis em ações exteriores. [...]
Nenhuma lei feita depois de praticado um ato pode transformar este num crime, pois se o ato for contraditório à lei de natureza a lei existe antes do ato, uma lei positiva não pode ser conhecida antes de ser feita, portanto não pode ser obrigatória (1997, p. 223, 225, 225).
Fica assim ilustrado o trânsito longo pelo qual passou o pensamento moderno. Já no século XIX, fruto de toda aquela herança intelectual, concebe-se a ideia de que para crimes iguais penas iguais. A proporcionalidade seria estabelecida a partir do tipo de crime cometido que apontaria para o que chamavam de grau de “criminalidade” do agente e o teor de ofensa ou ameaça à sociedade.
Nesse momento concebe-se a ideia de que para crimes iguais penas iguais. A proporcionalidade seria estabelecida a partir do tipo de crime cometido que apontaria para o que chamavam de “grau de criminalidade” do agente e o teor de ofensa ou ameaça à sociedade.
O Tratado de Liszt é uma das primeiras respostas a tudo isso em meio aos conflitos teóricos, onde o autor abraçou a Criminologia da Terceira Escola que, como sabemos é uma das grandes tentativas de síntese que surgem desde meados do século XIX.
Como observa Duarte Pereira (1899, p. 35):
Segundo v. Liszt, essas ciências concernentes á repressão do crime são o direito penal, a política criminal e a criminologia. O direito penal é Ciência essencialmente jurídica e, portanto, sistemática. Se o direito em geral tem por objeto a personalidade humana, e por fim a proteção de interesses, dos bens da vida nas relações entre pessoas, o objeto especial do direito penal é a responsabilidade dos que violam as normas sancionadas pela lei penal. [...] Ao lado do direito penal figura a política criminal. Quem diz política diz investigação dos meios adequados à consecução de fins do Estado.
Por isso, como não há o que se discutir sobre importância da obra de Liszt, tanto para o Direito Penal como para Criminologia, observemos então as definições de alguns dos seus conceitos fundamentais, para que possamos abstrair a sua influência no nosso Direito Penal.
Sobre o seu conceito de “pena”:
I. — Pena (l) é o mal, que, por intermédio dos órgãos da administração da justiça criminal, o Estado inflige ao delinqüente em razão do delicio. 1.° A pena é um mal que o delinqüente sofre, é lesão de bens, ofensa de interesses juridicamente protegidos pela mesma ordem jurídica que os protege. E por aí a pena distingue-se essencialmente da indenização, embora uma e outra possam ser compreendidas na ideia superior e comum dos efeitos jurídicos do injusto (2); porquanto a indenização é reparação da lesão, deve curar a ferida, ao passo que a pena abre uma nova ferida e deste modo garante a manutenção da ordem jurídica.
b) a expedição da sentença condenatória ao ofendido, bem como a autorização que lhe é dada para publicar a sentença à custa do condenado; porquanto também nesta parte não se trata de lesar interesses juridicamente protegidos do ofensor, mas de restabelecer, pela declaração judiciária, a honra lesada do ofendido. Eis porque não tem influência o perdão do condenado (Liszt, 1899, p 477).
2.° — A pena é ofensa de um bem jurídico, que pertencente ao delinqüente e tem por fim lesa-o nesse seu interesse. Se a ofensa não recai sobre o delinqüente ou se somente o atinge indiretamente, não se dá pena (Liszt, 1899, p. 478, 479).
3.° — A pena resulta da ofensa cometida, e, conquanto estenda-se, pelo seu destino, ao futuro, liga-se, como efeito do injusto, a um fato passado. Por aí é que ela distingue-se da medida penal coercitiva
(Strafzwang) que, como execução forçada, tem por fim obrigar alguém a praticar ou deixar de praticar uma ação determinada, mediante ofensa de bens jurídicos (Liszt, 1899, p.481).
Do CRIME:
I.— Crime é o injusto contra o qual o Estado comina pena e o injusto, quer se trate de delito do direito civil, quer se trate do injusto criminal, isto é, do crime, é a ação culposa e contraria ao direito. l.°— D'estas definições resulta imediatamente a construção sistemática da teoria do crime. Devemos considerar o crime primeiramente como injusto, e portanto: a) como ação, b) como ação contraria ao direito, c) como ação culposa; ao que acresce d) a indagação da diferença entre o injusto punível e o não punível. 2.° — Além dos caracteres (necessários) do conceito do crime, os quais em cada crime devem ser encontrados, temos de submeter a um acurado exame as formas (eventuais), sob que o crime se pôde objetivar. Essas formas são: a) a tentativa e a consumação; b) a autoria e a cumplicidade; c) a unidade e a pluralidade no crime. (Liszt, 1899, p.261).
Para Liszt, qual o fim, ou objetivo do Direito Penal?
I. Para podermos fixar a ideia do injusto, devemos investigar qual é o conjunto de circunstâncias a que a ordem jurídica liga os efeitos do injusto. As circunstâncias que são a condição para que se siga um efeito jurídico consistem sem exceção alguma em fatos juridicamente relevantes, isto é, em mudanças do mundo exterior apreciáveis pelos sentidos. Mas os efeitos do injusto, e conseqüentemente a pena, só se ligam a certos e determinados fatos. As circunstâncias constitutivas do injusto não podem ser acontecimentos, que independam da vontade humana, mas somente ações humanas.
II. Ação é pois o fato que repousa sobre a vontade humana, a mudança do mundo exterior referível á vontade do homem. Sem ato de vontade não ha ação, não ha injusto, não ha crime: cogitationis panam nemo patitur. Mas também não ha ação, não ha injusto, não ha crime sem uma mudança operada no mundo exterior, sem um resultado. Destarde são dados os dois elementos, de que se compõe a ideia de ação e portanto a de crime: ato de vontade e resultado. A estes dois elementos deve acrescer a relação necessária, para que eles formem um todo, a referencia do resultado ao ato. Em dois casos referimos a mudança do mundo exterior á vontade humana: 1.° quando a mudança foi causada voluntariamente; 2.° quando voluntariamente não foi impedida. A comissão e a omissão são as duas formas fundamentais da ação e conseqüentemente do crime. Trataremos separadamente de uma e de outra nos dois parágrafos seguintes.
A mudança do mundo exterior, causada ou não impedida, denominamos resultado da comissão ou omissão. Como toda mudança do mundo exterior acarreta consigo outras mudanças, deve-se distinguir entre o resultado próximo e o remoto. Para saber-se qual o resultado que deve ser tomado em consideração, porque a ele se refere a cominação penal, cumpre consultar as definições do direito. Para a ideia do homicídio em direito penal somente tem importância a morte da vítima, e não o ferimento mortal, nem também os efeitos quiçá muito extensos que da morte resultem para a família do morto. Mas a toda ação, por força da ideia mesma, se liga um resultado qualquer apreciável pelos sentidos, ainda quando o legislador abstraia aparentemente de um resultado ulterior que na verdade ele tem em vista. Isto é também verdade dos delitos de inação propriamente ditos. A ideia geral do resultado tem também aplicação ao fato de pôr em perigo, tão importante no direito penal. Pôr em perigo ou comprometer é provocar um perigo, isto é, uma situação em que (Liszt, 1899, p. 271, 272, 273).
Antes mesmo de Liszt, para fugir aos dilemas trazidos com a separação entre o Direito e a moral religiosa, recorre-se a adoção de paradigmas que convergem no Direito Penal para os fundamentos de uma definição mais racional de “crime”. Em Carrara podemos observar a adoção desse pressuposto:
Pergunta-se-vos quais as ações puníveis e vós respondereis: as que são punidas. Reconhecemos a verdade dessas observações, e por isso formulamos francamente os preceitos que deve o legislador obedecer no exercício da alta missão de discriminar que ações constituirão delitos dentro da orbita do seu poderio. Dissemos que se ele, ao ditar suas proibições, desrespeita princípios que tais, comete um abuso de poder, e sua lei é injusta. [...] Definindo o delito como a violação da lei promulgada, pressupomos que essa lei tenha sido ditada de modo conforme a suprema lei do direito natural (2002, p. 60).
Vemos assim parecer que, ainda faltavam, ao tempo dos autores, teorias que dessem ao direito penal a possibilidade de sistematizar uma definição de “crime” e com isso assegurar uma justa punição ensejada na legalidade, proporcionalidade e taxatividade.
O processo evolutivo do qual somos resultado contou com o aparecimento e desenvolvimento de conceitos que se tornaram fundamentais para a sustentação de uma Teoria do Crime. Entre os principais estão: conduta, tipo penal, culpa, dolo, relação de causalidade e culpabilidade.
Buscando entender o conceito de Critério Legal, segundo Greco (2012): “Nosso Código Penal não nos fornece um conceito de crime, somente dizendo, em sua Lei de Introdução, que ao crime é reservada uma pena de reclusão ou de detenção, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa" (2012, p. 139). Salientando ainda que apenas existe um critério, para a partir do tipo penal, podermos distinguir “crime” de “contravenção”.
Questão mais controvertida é quanto à definição de crime seguindo o critério formal ou dogmático. Segundo Basileu Garcia:
Formalmente, conforme enunciou Liszt, o crime é o acontecimento a que a legislação relaciona pena, como conseqüência de Direito, ou, consoante disse Manzini, é o fato individual com que se infringe um preceito jurídico, provido de sanção específica que é a pena em sentido próprio (1980, p. 211).
Nesse sentido, analisando os aspectos: formal e material do crime, Greco nos ensina:
Sob o aspecto formal seria toda conduta que atentasse, [...] contra a lei penal editada pelo Estado. [...] seu aspecto material, conceituamos o crime como aquela conduta que viola os bens jurídicos mais importantes. [...] os conceitos formal e material do crime não traduzem o crime com precisão, pois não conseguem defini-lo (2012, p. 140).
Surge assim, outro conceito, chamado analítico, porque realmente analisa as características ou elementos que compõem a infração penal. Não é bem verdade que o conceito formal e material do crime não conseguem defini-lo e sim, que no universo do comportamento humano, as infinitas facetas que podemos adotar podem justificar não se considerar uma conduta como ameaça ao meio social, mesmo quando reservada ao rol dos critérios da lei penal. Isto porque a incapacidade de conter-se e necessidade de zelar pela própria existência podem levar a atos humanos típicos das manifestações mais instintivas. O critério analítico põe fim a dúvidas que pairem sobre periculosidade do agente do fato ocorrido.
Como ensina Basileu Garcia “a pena convém à segurança social, pois a ameaça do castigo é de modo a restringir a possibilidade de novos crimes, mas a sua imposição deve ser conforme à ideia de justiça, que lhe traça intransponíveis balizas” (1980, p. 81). Então, qual o comportamento criminoso que o Direito Penal proíbe e tenta evitar? Quais critérios para melhor defini-lo?
Sendo assim, sem nos atermos quais os doutrinadores pátrios ou estrangeiros se adéquam à bipartição ou tripartição do crime, é fato que, o desenvolvimento do conhecimento em matéria penal, levou a novas reformulações de objeto de estudo tão escorregadio. Ao mesmo tempo não há que se ter surpresa pelo fato do Direito Penal só definir o crime no seu sentido jurídico. Sendo a sua função definir condutas proibidas não penetra no universo do fenômeno criminal, no seu âmbito psico-fenomenal. Não lhe compete apontar causas e desenvolvimentos do fenômeno criminal, senão aqueles que são captados nos conceitos que fundamentam a tipologia do crime: formal, material ou substancial e analítico.
O conceito analítico traz a tripartição do crime: fato típico, antijurídico e culpável para o centro do debate da teoria do crime. É através do conceito de culpabilidade que o Direito Penal consegue se aproximar, desvendar com mais clareza o fenômeno criminal sobre o qual de debruça. Acrescenta às definições objetivas da tipicidade e da antijuridicidade o aspecto subjetivo do fenômeno criminal que é o mais próprio da essência da conduta proibida.
Como dizem Galvão e Greco: Na verdade, os conceitos formal e material não traduzem com precisão o que seja crime. [...] Surge, assim, outro conceito, chamado analítico, porque realmente analisa as características ou elementos que compõem a infração penal (1999, p. 30).
A culpabilidade, por sua vez, é notoriamente composta pela imputabilidade, potencial consciência da ilicitude do fato e a exigibilidade de conduta adversa. Essa composição para a formulação do que vem a ser “crime”, torna o Direito Penal mais apto para atuar no mundo dos fenômenos humanos. Daí decorre a crítica à bipartição do crime em típico e antijurídico, pois a tripartição quando introduz a culpabilidade deixa aclarar o grau de responsabilidade do agente para o resultado, uma vez, já prevista a tipicidade e antijuridicidade da conduta.
Descrever objetivamente as condutas proibidas, ou mesmo os limites do que lhe é permitido, sempre foi um desafio para o Direito Penal. O conceito de culpabilidade busca atestar a importância dos elementos subjetivos e psicológicos para o mais preciso estabelecimento da relação entre o autor e o fato, para se estabelecer o grau da vontade na conduta tipificada. O problema é que a composição do Tipo Penal traz também a possibilidade de análise da vontade ao lhe compor o preceito da “conduta”. Ou seja, de fato, há possibilidade de analisar e entender o grau de “consciência de...”, tanto na “conduta”, parte integrante do tipo, quanto na “exigibilidade de conduta diversa” e no “potencial consciência da ilicitude do fato” integrantes da causalidade. Por isso, se o dolo e a culpa foram transferidos para o Tipo Penal, nada mais lógico que a estrutura analítica do crime ser reconhecida como bipartite. Sendo assim, voltamos à máxima: “só há pena se houver culpabilidade”.
Abreviando detalhes da evolução da teoria do crime, vemos que em Welzel a “teoria da ação final”, modificou conceitos, concepções e a estrutura adotada pelo sistema clássico ou mesmo o neoclássico. Antes a estrutura da culpabilidade apontava para: imputabilidade, dolo ou culpa e exigibilidade de conduta diversa. Entretanto, com as alterações trazidas por Welzel, a causalidade passou a compreender: imputabilidade, potencial consciência sobre a ilicitude do fato e exigibilidade de conduta diversa.
Ao conduzir o elemento do dolo e culpa para a “ação final”, Welzel demonstra acertadamente os limites do Direito Penal na objetificação do comportamento criminoso, quando é chamado a demonstrar a intensidade, os motivos e vontades de ações comissivas ou omissivas. É então através da estrutura analítica que é possível se aproximar da “estrutura lógico-objetiva” do comportamento e valorar a unidade final da ação. Nas palavras de Welzel:
O ordenamento jurídico determina por si mesmo quais elementos ontológicos quer valorar e lhes vincular consequências jurídicas. Mas não pode modificá-los (os elementos em si), se os configura nos tipos. Pode designá-los através de palavras, assinalar seus caracteres, mas eles próprios constituem o elemento individual e matéria, que é a base de toda valoração jurídica possível. Os tipos podem refletir apenas esse material ontológico, previamente dado, descrevê-lo linguística e conceitualmente, mas o conteúdo dos reflexos linguísticos e conceituais só pode ser manifestado mediante uma profunda compreensão da estrutura essencial, ontológica, do elemento material em si mesmo (2011, p. 10).
O homem é então interpretado conforme o princípio do livre-arbítrio trazido para o Direito Penal pela Escola Clássica, mas, ao não se limitar a essa versão abstrata do crime, enfatiza a análise ontológica ação humana quando voltada para o crime. O homem como ser pensante e possuidor de vontade. O desenvolvimento da teoria finalista implica o envolvimento do viés fenomenológico na compreensão da relação entre homem e objeto. A compreensão do mundo (no decorrer de um ato criminoso), passa pela interpretação do mundo (sempre de forma individual e subjetiva), que só pode ser apreendida (de maneira objetificada), ao analisar o resultado da ação que pode atestar a intencionalidade fenomenológica da vontade.
Quanto a essa importante teoria fenomenológica da vontade no universo do crime, esclarece Welzel:
É possível imaginar um Código Penal, [...] em que os tipos estejam redigidos de tal forma que não seja necessário apreciar a existência de elementos subjetivos do injusto. A tentativa, como ação dirigida pela vontade do autor à produção de um resultado delitivo, não poderia ser objeto de punição nesse Código Penal (2011, p. 14).
A teoria finalista vai além da objetividade fria do tipo penal e da previsão de sua ilicitude e possível imputação objetiva, meramente causal, para buscar entender as características do fenômeno criminal nos limites epistemológicos e doutrinários do Direito Penal, aprofundando as percepções acerca da intencionalidade no agente. Como bem esclarece Greco:
A adequação da conduta ao modelo abstrato previsto pela lei penal somente pode ser realizada com perfeição se conseguirmos visualizar a finalidade do agente. [...] Os tipos penais, na concepção finalista, passaram a considerar-se complexos, uma vez que neles deviam fundir-se os elementos de natureza objetiva com aqueles de natureza subjetiva (dolo e culpa).
A antijuridicidade, como predicado da ação típica, também deveria, a partir de agora, vir impregnada do mesmo elemento subjetivo dessa última. [...]
Da culpabilidade foram extraídos o dolo e a culpa, sendo transferidos para a conduta do agente, característica integrante do fato típico. O dolo após sua transferência, deixou de ser normativo, passando a ser um dolo tão somente natural. Na culpabilidade, contudo, permaneceu a potencial conseqüência sobre a ilicitude do fato – extraída do dolo -, juntamente com a imputabilidade e a exigibilidade de conduta diversa (2012, p. 380, 381).
Em outras palavras o Direito Penal, particularmente, tem que se aproximar do real e apropriar-se da essência do fenômeno através do seu entendimento e descrição. O contrário nunca é verdadeiro, ou seja, não há possibilidade de alterar o fenômeno para se adequar ao Direito Penal.
Cabe ressaltar a importância do entendimento da doutrina, pois, julgamos ser ela uma importante fonte do Direito. Um entendimento detalhado da doutrina faz-se imprescindível para evitar erros de entendimento e interpretação aqui no Brasil, como assinalado por Cláudio da Rocha quando diz:
A palavra “finalismo” quando empregada no universo jurídico remete o ato de investigação do pesquisador diretamente ao âmbito penal. Todavia, muito doutrinadores confundem a origem do temo “finalismo”. São recorrentes os equívocos que conduzem o pesquisador do Direito Penal com o finalismo aristotélico, como se o telos de Aristóteles se evidenciasse na intenção conscientemente dirigida a uma determinada conduta e fosse só isso.
[...] ao contrário do que se acredita ser a origem da teoria finalista da ação, o seu fundamento não está em Aristóteles e sim na fenomenologia de Husserl. Portanto, a teoria finalista de cunho jurídico e criação germânica surgida no século XX, formulada fundamentalmente com as noções de intencionalidade da consciência, noesis, noema, redução transcendental, essência e não com noções tais como: causas material, formal, eficiente e final, todas de origem aristotélica (2010, p. 167, 168).
O que complica, então, é articular um Código Penal baseado no tecnicismo jurídico de Arturo Rocco e, agora, interpretá-lo pela fenomenologia de Husserl. Mas, como bem explica Cláudio Rocha:
A ação é uma atividade final humana. Partindo disso, Welzel afirma que a ação humana é o exercício da atividade finalista. É, portanto, um acontecimento finalista e não causal. A finalidade baseia-se em que o homem, consciente dos efeitos causais do acontecimento, pode prever as conseqüências de sua conduta, portanto, dessa forma, objetivos de índole. Conhecendo a teoria de causa e efeito, tem condições de distinguir sua atividade no sentido de produzir determinados efeitos. A causalidade, pelo contrário, não se encontra ordenada dessa maneira. Ela é cega, enquanto a finalidade é evidente.
[...] As ações que, produzindo um resultado causal, são dividas à inobservância do mínimo de direção finalista no sentido de impedir a produção de uma determinada conseqüência, ingressam no rol dos delitos culposos.
O finalismo percebeu bem essa dinâmica e operou uma modificação no tipo, fazendo com que o dolo que integrava a culpabilidade rumasse para a conduta. Em determinado momento da evolução dogmática do Direito Penal, a doutrina entendia que a antijuridicidade era exclusivamente objetiva, não dependendo da vontade do sujeito. Essa ideia vingou até que foram descobertos os chamados elementos subjetivos do injusto, expressão adotada por aqueles que apreciavam a ilicitude concretizada no tipo (2010, p. 174, 175).
Ao trazer todos esses debates contexto atual de Brasil e América Latina, Zaffaroni, por exemplo, argumenta que o sistema penal já não consegue dar as respostas ao mundo cotidiano e fático, pois atua a partir de construções teóricas que não mais condizem com a realidade. Afirma então ser o sistema penal uma:
[...] programação normativa que baseia-se numa “realidade” que não existe e o conjunto de órgãos que deveria levar a termo essa programação atua de forma completamente diferente. [...] É bastante claro que, enquanto o discurso jurídico-penal racionaliza cada vez menos – por esgotamento de seu arsenal de ficções gastas -, os órgãos do sistema penal exercem seu poder para controlar um marco social cujo signo é a morte em massa (2001, p. 12, 13)
Essa falsidade do discurso jurídico-penal latino-americano, como mostra o autor, não pode ser reduzida a respostas pseudo-liberais que não acrescentam nada à situação vigente e talvez até agravando o problema embutindo nesse cenário, novas falsas polêmicas.
Talvez a primeira questão mais importante que a obra de Zaffaroni tenta mostrar é a condição de um ordenamento jurídico, e mais especificamente de um Direito Penal de Terceiro Mundo. E retratando tal contexto, diz Zaffaroni: “Hoje, temos consciência de que a realidade operacional de nossos sistemas penais jamais poderá adequar-se à planificação do discurso jurídico-penal” (2001, p. 15). É preciso então que antes de falarmos nas penas perdidas temos que lembrar das inúmeras situações históricas, inclusive recente, nas quais ao invés de nos distanciarmos de certas raízes históricas mantivemos a continuidade. É muito mais honesto do que essa culpabilização frustrada a respeito do “sistema capitalista”.
Não podemos esquecer que todas as questões que caracterizam a crise do sistema penal no mundo inteiro são apenas um lado mais flagrante da crise da modernidade, do Estado-nação, do Direito e todas as demais formas de expressão dessa construção chamada de modernidade. Rever os clássicos modernos, tal como fazemos hoje, não é nada mais do que voltarmos às origens.
Sem dúvida num mundo onde toda moral e tradição tornam-se preconceito, destruindo com isso toda a possibilidade de vida comunitária por estas vias, como não esperar que somente o Estado e, principalmente através do Direito Penal, venha ser chamado a dar respostas num mundo vazio? Nesse contexto, aqueles que defendem um Direito Penal relativo, acabam por legitimar, de fato, um Direito Penal regulamentador do crime. Ou seja, são tantas as possibilidades de uma pessoa que cometa crimes não seja punida ou com penas dóceis, que o Direito Penal acaba por perder quase que completamente, a característica e função tão importante de prevenir o crime. Se não há tal inibição propriamente dirigida pelo Direito Penal, então, na dúvida, na sociedade dos desejos e dos impulsos, comete-se o crime, realiza-se o desejo e espera-se para ver o que vai dar.
Tanto Foucault como Zaffaroni insistem em descrições distorcidas da história das instituições modernas, mudando completamente o sentido do que passaram a chamar de “poder”. A disciplina que passa a caracterizar o sistema penal moderno é sempre analisada e interpretada como simples artimanha de um poder de classe. Nesse ponto, tanto Foucault como Zaffaroni se articulam com a teoria marxista, substituindo o conceito de “classe burguesa” por “sociedade” e “relações de poder”.
Entretanto, Foucault e Zaffaroni, poderiam não ter interpretação duvidosa se acompanhassem precisamente o desenvolvimento das doutrinas e instituições penais modernas tal como sinalizam as obras de Hobbes, Montesquieu, Beccaria e Bentham, por exemplo. A introdução do conceito de “disciplina” é muito mais sinônimo de evolução das regras de convívio desenvolvidas pela sociedade moderna e urbana do que a reduzida concepção de disciplina somente como estratégia sorrateira de grupos dominantes. É evidente que as ideologias e poder de classe estão presentes em qualquer grupo social. Nesse sentido, Marx e Foucault não inventaram nada.
Ao seguir Foucault para analisar a “disciplina” Zaffaroni entra em contradição com seus argumentos iniciais. Primeiro, porque como foi visto, a “disciplina” sempre foi carência, sempre houve imenso esforço para impor-se. Segundo, porque parece consolidar a estigmatização de que realmente nós, povos e pessoas de Terceiro Mundo não temos realmente condições de interiorizar os valores modernos de origem européia, todos girando em torno ou fundamentados mesmo na autodisciplina. É bem comum, por aqui, os juristas desviarem o foco da instituição judiciária, Estado, para o Direito Penal.
De fato, antes de tudo, estamos falando de uma crise da República e por isso, do modelo dos três poderes com base em Montesquieu. Essa crítica ao Direito Penal vem sendo desenvolvida, principalmente com base na teoria marxista em escolas criminológicas tais como a Criminologia da Reação Social, a Criminologia Crítica e o Abolicionismo Penal.
Críticas dirigidas ao Direito Penal e, principalmente essa crítica na América Latina tem duas variáveis que se apresentam permanentemente. Primeiro, a crítica ao Direito Penal carece de pontuação específica. Segundo, o discurso direcionado contra o Direito Penal é muitas vezes resultado da ausência da reflexão sobre o Estado e a sua insuficiência institucional. Em outras palavras, é simplesmente inexistente o desenvolvimento teórico sobre o Estado. Dessa forma, a crítica ao Direito carece de uma reflexão entre a validade e a eficácia passando pela instituição, “Estado”.
De modo geral são autores como Zaffaroni (2001) e Nilo Batista (2001) que propõem críticas ao Direito Penal sem, contudo, mostrar exatamente qual caminho a seguir enquanto alternativa; quais reformulações podem ser adotadas e principalmente aonde, exatamente.
O rápido desenvolvimento tecnológico dotou o Estado de tal capacidade de vigilância que, quando incorporado pelas forças de segurança do Estado, dotaram-no e de uma capacidade incrível de vigilância, captura e busca de provas. Ao mesmo tempo é visível que um número cada vez maior de pessoas se dispõe a comer crimes e dos mais variados tipos. Por isso, quando Zaffaroni afirma que o “discurso jurídico-penal é falso” (2001, p. 14, ) em função da manutenção de interesses das relações de poder, temos de perguntar quem escreve e interpreta sobre o Direito, senão juízes e juristas.
Em outras tantas vezes esses autores “críticos”, tecem suas análises e comentários, direcionando para o Direito o que de fato é uma clara questão de Estado, de república, de divisão de poderes e instituições fortes.
Por exemplo, quando Zaffaroni, denuncia:
Seria completamente ingênuo acreditar que o verdadeiro poder do sistema penal seja exercido, por exemplo, quando suas agências detêm, processam e condenam um homicídio. Esse poder que se exerce muito eventualmente, de maneira altamente seletiva e rodeada de ampla publicidade através dos meios de comunicação social de massa, é ínfimo se comparado com o poder de controle que os órgãos do sistema penal exercem sobre qualquer conduta pública ou privada através da interiorização dessa vigilância disciplinar por grande parte da população (2001, p. 24).
Chega a impressionar o grau de superficialidade de Zaffaroni em tal análise, pois desconhece que é exatamente através dos meios de comunicação que é difundido o discurso do “problema social” que “o crime está nas favelas” e que é para lá que o aparato repressor estatal tem quer ser dirigido de acordo com certos interesses. E, sem dúvida, que para o mesmo Direito Penal, existem ao menos duas hermenêuticas, vinculadas as relações de classe.
O aparato estatal, muito pelo contrário, este sim, exerce um poder mínimo sobre o comportamento das pessoas, inclusive não sabe o referido autor das inúmeras falhas nos sistemas de segurança pública, que poderiam, se mais percebidos do que são, fazer todos os criminosos atuarem quase de uma só vez. Esse aparato estatal exerce uma ameaça violenta e constante, exatamente por que já perdeu todo o poder de controle das massas insubordinadas e do crime em geral. O próprio Zaffaroni em passagem posterior reconhece o problema:
Se todos os furtos, todos os adultérios, todos os abortos, todas as defraudações, todas as falsidades, todos os subornos, todas as lesões, todas as ameaças etc. fossem concretamente criminalizados, praticamente não haveria habitante que não fosse, por diversas vezes, criminalizado (2001, p. 26).
Nesse contexto, por que estranhar a desmoralização completa de um sistema prisional e jurídico-penal, cujo vexame só estava preservado por ser um universo que pouco chamava a atenção.
Como exemplo desse fenômeno temos o debate sobre drogas e tráfico de droga que resultou na tolerante lei 11.343/06. Quando o Estado e o Direito Penal começam a alcançar as classes mais abastadas, começa a aparecer o discurso de descriminalização da droga, inclusive transferindo sua competência da Segurança Pública para a Saúde Pública. Mas todas essas panacéias jurídicas possuem o seu prazo de validade e, nesse mundo grotesco e pálido, logo o real vem para a superfície e tudo se esclarece.
Essa essência da crise da modernidade que leva a buscas de alternativas para o que o está aí é bem retratada quando Zaffaroni diz:
O discurso jurídico-penal não pode desentender-se do “ser” e refugiar-se ou isolar-se no “dever-ser” porque para esse “dever-ser” seja um “ser que ainda não é” deve considerar o vir-a-ser possível do ser, pois, do contrário, converte-a em um ser que jamais será. Isto é num embuste. Portanto, o discurso jurídico-penal é socialmente falso, também perverso: torce-se e retorce-se, tornando alucinado um exercício de poder que oculta ou perturba a percepção do verdadeiro exercício de poder (2001, p. 19)
O único problema desta reflexão de Zaffaroni, visivelmente influenciada pela teoria constitucional de Lassalle, é que o Direito Penal é apenas uma expressão da modernidade e, dentro deste universo de valores e doutrinas, cujas origens estão lá no passado dos fins da Idade Média a concepção de liberdade é a palavra de ordem e os seus significados oscilavam entre estar subordinado à lei e autogoverno ou autocontrole. Então, como adequar o Direito Penal à nossa realidade fática e não reduzi-lo a um abolicionismo inconseqüente ou uma mera regulação do crime?
Não é novidade perceber que as instituições modernas, vindas de caravelas, não se adaptaram bem por aqui. Sérgio Buarque de Holanda em Raízes do Brasil já afirmava:
A frouxidão da estrutura social, a falta de hierarquia organizada deve-se alguns dos episódios mais singulares da história das nações hispânicas, incluindo-se nelas Portugal e Brasil. Os elementos anárquicos sempre frutificaram aqui facilmente, com a cumplicidade ou a indolência displicente das instituições e costumes. [...]
Essa ânsia de prosperidade sem custo, de títulos honoríficos, de posições e riquezas fáceis, tão notoriamente característica da gente de nossa terra, [...]. E, no entanto, o gosto da aventura, responsável por todas essas fraquezas, teve influência decisiva em nossa vida nacional (1988, p. 05, 15 e 16).
No mesmo sentido, quando o Dr. Edvaldo Brito redige sua “Nova Prévia” que vale como introdução e análise à Obra mestra de Orlando Gomes, qual seja: Raízes Históricas e Sociológicas do Código Civil Brasileiro (2006), deixa bem clara algumas das mais destacadas dificuldades que dois dos expoentes do Direito Civil brasileiro, tais como, Beviláqua e o próprio Orlando Gomes, sempre tiveram entretidos. São elas: a questão da importação de ideias e teorias estrangeiras para uma realidade sócio-cultural díspare; como tratar a “questão social” e imputar direitos e deveres; o problema da discricionariedade do juiz e as normas jurídicas, principalmente quando perante os “conceitos jurídicos indeterminados” e as “cláusulas contratuais gerais”.
É ainda importante notar que os mesmos autores brasileiros e latinos em geral que reclamam por um Direito Penal adequado vão buscar legitimação para suas “críticas” em autores e doutrinas também estrangeiras, ou seja, distantes do nosso contexto.
Nesse sentido, o abolicionismo penal, que nasce nos países nórdicos particularmente na Noruega, chega ao Brasil e América Latina em grande estilo. De base marxista-foucaultiana, essa doutrina prega em regra o fechamento dos presídios e a extinção do Direito Penal.
De um modo geral todos esses doutrinadores usam a mesma retórica estratégica de tentar denunciar a permanência de caracteres antigos nos sistemas penais atuais. Parece que não conseguem perceber que a distância e tantas diferenças entre o inquérito da Santa Inquisição e o inquérito policial nos moldes atuais é sinônimo de evolução, por exemplo.
Não conseguem compreender e explicar os motivos que levam ao aumento das taxas de crime e da população prisional no mundo inteiro. Geralmente denunciam os Estados Unidos, como se as prisões cubanas, chinesas ou russas fossem algum modelo a ser seguido.
Segundo Thomas Mathiesen, um dos autores mais reconhecidos dessa corrente,
[...] o sistema penal atual, elaborado por políticos, e muito mais dependente no contexto geral daquilo que chamamos de “opinião pública” e dos meios de comunicação de massa. [...]
O calcanhar de Aquiles, o solo de barro da prisão é sua total irracionalidade em termos de seus próprios objetivos estabelecidos, um pouco como a caça ás bruxas sem provas. Em termos de seus próprios objetivos, a prisão não contribui em nada para nossa sociedade e nosso modo de vida. Relatórios após relatórios, estudos após estudos às dezenas, centenas e milhares, claramente mostram isso.
Como vocês sabem, a prisão tem cinco objetivos estabelecidos que são ou têm sido usados como argumentos para o encarceramento. Primeiro, há o argumento da reabilitação, [...]. Segundo, há o argumento da intimidação do indivíduo, [...]. Terceiro, há o argumento da prevenção geral, isto é dos efeitos da intimidação, [...]. Quarto, há o argumento da interdição dos transgressores, [...]. Quinto, e último, acrescentem a essa justiça equilibrada – a resposta neo-clássica ao crime através da prisão e a lista estará completa (2003, p. 89, 90, 91, 95).
Mathiesen, com base em Foucault observa que os mecanismos de controle foram se aperfeiçoando, principalmente com o desenvolvimento e difusão da televisão que define valores a partir da imagem. A mensagem escrita foi substituída pela imagem. Sendo assim, algumas pessoas passam a ser alvos selecionados de atenção, particularmente no que diz respeito aos mecanismos repressivos.
Daí que, segundo a Escola do Abolicionismo Penal, faz muito pouco sentido punir com prisão pessoas que já são previamente estigmatizadas e, num aparato prisional apartado das suas finalidades. É exatamente nestas teorias do Abolicionismo Penal que Zaffaroni e Nilo Batista, por exemplo, estão baseados para tecer críticas ao sistema prisional e ao Direito Penal, no Brasil e na América Latina.
Os debates e teorizações sobre a função do Direito Penal em nosso tempo, não são tão recentes. Já vem ao menos desde os anos de 1970, quando tantas formas de rebelião: gangues, terrorismo marxista e máfias (envolvendo a criminalidade econômica), por exemplo, tornam-se, portanto, focos de atenção político-jurídica no mundo inteiro, particularmente na Europa. É nesse ambiente que aparece o Funcionalismo Penal alemão, cuja especulação doutrinária inicia-se exatamente nesse contexto no qual pessoas ou grupos “libertários” explodem bombas em lanchonetes repletas de pessoas em quando intelectuais acusam e reduzem o Direito Penal a uma elaborada estratégia de conspiração de classe e manutenção das relações de poder.
As obras de Roxin e posteriormente, Jakobs estão fundamentadas na realidade do mundo pós-Segunda Guerra, contexto esse, que traz, outra vez, a possibilidade se afastamento dos princípios do Direito reincorporado pelo trauma da Guerra. Como salienta Jakobs: “De acordo com uma cômoda ilusão, todos os seres humanos, enquanto pessoas estão vinculadas entre si por meio do direito” (2007, p. 09).
É exatamente essa ilusão que conduz tantos doutos a acreditarem que de fato a vida das pessoas é regida pelo Direito. Isso ocorre apenas em parte. Se tomarmos como breve exemplo, a realidade do Terceiro Mundo salta aos olhos que a informalidade que caracteriza a própria economia já mostra a distância entre o Direito, os “direitos” e a realidade cotidiana da vida das pessoas. Quantas pessoas pensam no que reza a lei antes de cometer um ilícito?
A forçosa saída deste paraíso imaginado ocorre por via do visível aumento de todo tipo de crime, no mundo inteiro, na mesma medida em que o Estado do bem-estar Social e a qualidade de vida aumentavam em toda parte. Cabe salientar inclusive que, em regra, tal como continua ocorrendo hoje, é exatamente nas regiões do planeta onde perdurou a fome e outras necessidades fundamentais onde as taxas de crimes eram menores e muitas vezes pareceram inexistir. No Brasil, o estado que tem o menor índice de homicídios é o Piauí. Ao contrário, tal como se revela hoje, quebrando a magia do policamente correto é entre aqueles que possuem e querem mais, aonde os crimes mais vem ocorrendo. Por isso, o crime é insensível à classe social é muito mais fenômeno ligado à natureza humana.
Reluzi-lo ao mero resultado do conflito de classes é desconhecer a natureza do crime enquanto fenômeno humano. Nesse sentido, o Funcionalismo salienta preocupação na forma de questionamento que pode ser traduzida com uma única pergunta: qual a função do Direito Penal em uma sociedade?
Tomando tal viés, Roxin, em “Estudos de Direito Penal”, desenvolve um amplo debate com o Abolicionismo Penal, ao tempo que desenvolve conceitos importantes para a sua teoria tal como: “imputação objetiva”.
Nesta obra inicia com aquele tipo de pergunta, somente mais focada nos argumentos do Abolicionismo. Por isso questiona: “Tem futuro o Direito Penal?”, “O Direito Penal pode ser abolido?”. Segundo o autor, de fato, o Direito Penal caminha para uma grande reformulação, cujos resultados, implicam uma profunda despenalização de determinadas condutas que, mesmo mantidas como típicas e antijurídicas, não refletem necessidade de encarceramento.
Em certo sentido, Roxin concorda com alguns dos fundamentos do Abolicionismo Penal, inclusive admitindo que a necessidade de reforma do Direito Penal não reside apenas numa especulação abstrata. Ao contrário, tudo indica que um dos motivos que levam à necessidade de revisar o conceito e o sentido da “pena” é exatamente o fato de que as taxas de crime aumentaram e os recursos para construir e manter presídios já estão no patamar do esgotamento. Para o autor:
O movimento abolicionista, que possui vários adeptos entre os criminólogos [...] considera que as expostas desvantagens do direito penal estatal pesam mais que os seus benefícios. [...]
Se tais suposições são realistas, o futuro do direito penal só pode consistir em sua abolição. Mas, infelizmente, a inspiração social-romântica de tais ideias é acentuada demais para que elas possam ser seguidas. [...]
Não corresponde, portanto, à experiência que a criminalidade se deixe eliminar através de reformas sociais. [...] As circunstâncias sociais determinam muito mais “como” do que o “se” da criminalidade: quando camadas inteiras da sociedade passam fome, surge uma grande criminalidade de pobreza; quando a maioria vive em boas condições econômicas, desenvolve-se a criminalidade de bem-estar, relacionada ao desejo de sempre aumentar as posses e, através disso, destaca-se na sociedade. [...]
Minha primeira conclusão intermediária é a seguinte: também no estado Social de Direito, o abolicionismo não conseguirá acabar com o futuro do direito penal (2008, p. 03, 04 e 05).
Dito isso, podemos entender que mesmo admitindo que diversas formas de comportamentos proibidos possam ser revistos quanto ao problema da despenalização é diferente, cabe notar, com sua descriminalização. Essa reestruturação do Direito Penal à qual se referem tanto o Abolicionismo quanto o Funcionalismo implica repensar com mais detalhe e cuidado, tanto as teorias do crime quanto as teorias da pena.
A reflexão elaborada por Roxin não respalda uma descriminalização inconseqüente como propõem os abolicionistas, tomando muitas vezes exemplos distorcidos a respeito do sistema prisional e das causas da criminalidade. Trata-se sim, de reconhecer que o fato do sistema prisional não regenerar não implica dizer que se deve simplesmente fechar os presídios de deixar que, por exemplo, estupradores e homicidas venham ao convívio social, como se tais comportamentos fossem tipificações oriundas de preconceitos e interesses de classes. Ainda segundo Roxin:
A descriminalização é possível em dois sentidos: primeiramente, pode ocorrer uma eliminação definitiva de dispositivos penais que não sejam necessários para a manutenção da paz social. [...]
Um segundo campo de descriminalizações é aberto pelo princípio da subsidiariedade. [...] Tal caminho foi encetado pelo direito alemão, p. ex., ao se criarem infrações de contra-condenação. Assim, distúrbios sociais com intensidade de bagatela [..] não são mais sujeitos à pena, e sim, como infrações de contra-ordenação, [...] (2008, p. 12 e 13).
Podemos observar, então, que tais institutos já existem do Direito Penal brasileiro na figura do ”menor potencial ofensivo”. Sendo assim, há uma paridade entre o Direito Penal pátrio e que ocorre no cenário internacional. Contudo, ainda cabe muita preocupação a respeito da pouca diferença que parecemos fazer, de fato, entre menor potencial ofensivo e impunidade. A falta de operacionalidade das instituições que compõem toda a persecução penal e ainda, quando da competência da execução penal, parece ser, aqui no Brasil, um problema político amplamente generalizado e que está acima de ideologias político-partidárias.
Tal realidade tão evidente no cotidiano das instituições e na relação entre estas e os fenômenos do mundo da rua, mostra em parte, o desinteresse em interpretar adequadamente as doutrinas com seus respectivos institutos e aplicá-las adequadamente através do nosso ordenamento aos nossos problemas mais prementes.
II. Apontamentos de Análise Comparativa dos Dois Códigos Penais – Parte Geral
Anterioridade da Lei
Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.
O Projeto acrescenta: Parágrafo único. Não há pena sem culpabilidade. Quando o Projeto introduz esse “parágrafo único” parece admitir dentro do critério analítico a visão bipartida e finalista do crime, visto que poderia ser também finalista e tripartida (2012, NUCCI).
Tal como esclarece Masson (2012):
Diversas pessoas, inadvertidamente, alegam que o acolhimento de um conceito tripartido de crime importa obrigatoriedade na adoção da teoria clássica ou causal da conduta.
Não é verdade. Quem aceita um conceito tripartido de crime tanto pode ser clássico como finalista. De fato, Hans Welzel, criador do finalismo penal, definia o crime como fato típico, ilícito e culpável: “O conceito de culpabilidade acrescenta ao de ação antijurídica – tratando-se de uma ação dolosa ou não dolosa – um novo elemento, que a transforma em delito”.
A distinção entre os perfis clássico e finalista reside, principalmente, na alocação do dolo e da culpa, e não em um sistema bipartido e ou tripartido relativamente à estrutura do delito, como veremos na análise da conduta. [...]
Para os seguidores dessa teoria bipartida, a culpabilidade deve ser excluída da composição do crime, uma vez que se trata de pressuposto de aplicação da pena (2012, p. 176).
De fato, por exemplo, para Damásio de Jesus o crime consiste em fato típico e antijurídico, pois, apesar de ser possível a tipicidade, dada as circunstâncias, pode não ser uma afronta ao Direito e por isso, antijurídico como no caso da possível legítima defesa. Por isso, escreve: “Sob o aspecto formal, crime é um fato típico e antijurídico. A culpabilidade, como vemos, constitui pressuposto da pena. [...]. Não basta, porém, que o fato seja típico para que exista crime. É preciso que seja contrário ao Direito, antijurídico” (1980, p. 143, 144).
Porém é bem elucidativa a análise de Masson, a respeito desses conflitos doutrinários no Código vigente, admitindo as dificuldades em se aceitar de maneira clara e definitiva interpretação única. E, como observa Masson:
[...] E, em verdade, precisamos dizer que não há resposta segura para a questão.
O Código Penal de 1940, em sua redação original, acolhia um conceito tripartido de crime, relacionado à teoria clássica da conduta. Eram, portanto, elementos do crime o fato típico, a ilicitude e a culpabilidade.
A situação mudou com a edição da Lei 7.209/1984, responsável pela redação da nova Parte Geral do Código Penal. A partir de então, fica a impressão de ter sido adotado um conceito bipartido de crime, ligado obrigatoriamente à teoria finalista da conduta. Vejamos quais são os indicativos dessa posição.
[...] no Título II da Parte Geral o Código Penal trata “Do Crime”, enquanto logo em seguida, no Título III, cuida “Da Imputabilidade Penal”. Dessa forma, crime é o fato típico e ilícito, independentemente da culpabilidade, que tem imputabilidade penal como um dos seus elementos. [...]
Em igual sentido, ao tratar das causas de exclusão de ilicitude, determina o Código Penal em seu art. 23 que “não há crime”. Ao contrário, ao relacionar-se às causas de exclusão da culpabilidade (arts. 26, caput, e 28, § 1°, por exemplo), diz que o autor é “isento de pena” (2012, p. 177).
Duvidamos a respeito do posicionamento da Comissão no que se refere a tal polêmica, pois na exposição de motivos não esclarece qual posicionamento se refere, se antes da reforma de 1984 ou depois dela. Entretanto, sinaliza para uma compreensão do crime com estrutura bipartida, pois afirma:
Não há pena sem culpabilidade. A primeira inovação digna de nota na Parte Geral vem logo no artigo 1º. Após repetir a tradicional fórmula que vem desde o Código Criminal do Império – não há crime sem lei anterior, nem pena sem prévia cominação legal - adotada por igual pelo artigo 5º da Constituição Federal, a proposta sugere o acréscimo de parágrafo dizendo que “não há pena sem culpabilidade”. Consagra-se, deste modo, o Direito Penal do fato e da culpabilidade, infenso à responsabilidade objetiva e à condenação do ser ou do modo de ser da pessoa. É o fato, medido sob a régua constitucional da proteção dos bens jurídicos, anteriormente definido em lei, que pode sujeitar alguém à responsabilização, na medida de sua reprovabilidade (2012, p. 207).
Quando afirma que “não há pena sem culpabilidade”, refere-se à questão da possibilidade de punição. A expressão é clara, ou seja, fala-se em pena e não, crime. Por isso, há fortes indicações que a Comissão optou pela estrutura bipartite.
Em “Lei penal no tempo” e agora “Sucessão de leis penais no tempo”, art. 2°. Neste quesito houve uma reestruturação do artigo 2° que resultou na introdução do § 2º “O juiz poderá combinar leis penais sucessivas, no que nelas exista de mais benigno”.
Segundo a Comissão, além melhor adequação da lei penal à Constituição sobre a retroatividade da norma penal, ocorre a possibilidade de combinação das leis penais no que exista de mais benigno, afastando a polêmica sobre a possibilidade do juiz se tornar ao tempo em que julga e aplica leis diversas e complementa-as mutuamente tornar-se um legislador ad hoc. Por isso:
“a Comissão entendeu que não se trata de autorizar a mistura de leis vigentes, mas da eficácia ultrativa da lei que regia o fato, se mais favorável, com a eficácia retroativa da lei nova, igualmente favorável. Não ofende o sistema de separação de poderes autorizar o juiz à referida combinação de eficácias normativas” (2012).
Em “Extraterritorialidade” houve também uma reestruturação do artigo 7°. Neste, o §2° foi transformado em artigo 8°, deixando clara a diferença entre “Extraterritorialidade Incondicionada” e “Extraterritorialidade Condicionada”, ou seja, transformadas nos artigos 7° e 8°. Acrescenta o crime de terrorismo, racismo e tortura e não mais fica restrita a: “I - os crimes: a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir”.
No Título II Do Crime, a nova redação coloca no mesmo patamar as condutas dolosas e culposas. Refere-se expressamente à agressão ao bem jurídico protegido, também tratado em artigos diversos. Já o crime culposo perde suas variáveis de negligência, imperícia e imprudência para, “inobservância dos valores de cuidado exigíveis nas circunstâncias”.
Dentro desse universo de conceitos retoma-se o antigo debate entre o dolo direto e indireto. Quando, de fato, não ficam claros quais os fundamentos para a Comissão admitir a possibilidade da redução da pena, em um sexto, em situação de dolo eventual.
Neste rol de conceitos encontra-se também o necessário discernimento entre a culpa consciente e culpa gravíssima, esta última prevista de forma explícita no “Novo Código”. Cabe até mesmo questionar a diferença entre dolo indireto ou eventual e culpa gravíssima. Consentir ou aceitar de modo indiferente o resultado ou não ter a intenção de provocá-lo sabendo do grande risco de ocorrer é muito pouca a distância entre estes dois institutos quando analisamos apenas o resultado. Porém atendo-se ao modelo doutrinário que ressalta a subjetividade para alcançar o resultado, cabe encontrar tal diferença e distância.
Aqui, será antecipada parte do que trata no artigo 121, para efeito de entendimento da redação e etapa atual deste trabalho. Por isso:
Culpa gravíssima
§5º Se as circunstâncias do fato demonstrarem que o agente não quis o resultado morte, nem assumiu o risco de produzi-lo, mas agiu com excepcional temeridade, a pena será de quatro a oito anos de prisão.
§ 6º Inclui-se entre as hipóteses do parágrafo a causação da morte na condução de embarcação, aeronave ou veículo automotor sob a influência de álcool ou substância de efeitos análogos ou mediante participação em via pública, de corrida, disputa ou competição automobilística não autorizada pela autoridade competente.
Tal citação esclarece a polêmica que surge freqüentemente com acidentes de trânsito em que o motorista está embriagado. Sendo aprovado, tais crimes estarão a salvo de tais polêmicas. Entretanto, permanece a questão sobre a diferença entre dolo indireto e culpa gravíssima. Pois, “consentimento e indiferença, diante da previsibilidade objetiva do resultado”, podem caracterizar tanto o dolo eventual quanto a culpa gravíssima, apesar de a Comissão atribuir tais características apenas ao dolo eventual. A culpa gravíssima, a Comissão, caracteriza da seguinte forma:
A culpa especialmente grave. Se todo o homicídio culposo nasce do descuido, existem situações nas quais o desvalor deste descuido é acendrado, indicativo de uma suscetibilidade à produção de tão terrível efeito. Se, conforme a própria Comissão propõe, não há dolo eventual sem assunção indiferente do risco de produzir a morte, cuidava-se de criar figura intermediária, lindeira tanto da culpa comum quanto da intenção indireta. Daí a culpa gravíssima, capaz de oferecer sanção penal mais intensa para os casos nos quais, sem querer e sem assumir o risco, o resultado fatal advém de excepcional temeridade.
Como é possível na ação que traz o resultado ou até no próprio resultado encontrar diferença entre “modo indiferente” e suposta figura intermediária de uma “culpa especialmente grave”, que nas palavras da Comissão, incorre em “produção de tão terrível efeito” ou, cujo “resultado fatal advém de excepcional temeridade”?
Polêmica semelhante nos causa “atos preparatórios” e “início da execução”, questão que levou a comissão envolver ou aproximar tais institutos. Sendo o início da conduta típica, o elo entre tais institutos, continua o entendimento que considera “haverá execução quando o agente, segundo seu plano delitivo, pratica atos imediatamente anteriores à realização do tipo [...]” (2012, p.218).
Outros institutos sofrem propostas de reforma e alteração, muito mais em função das polêmicas causadas por conta da nossa tendência em proteger o agente criminoso e, simplesmente, esquecer a vítima. O Direito Penal brasileiro não resolverá diversas polêmicas enquanto legisladores, juízes e juristas não assumirem que o Direito Penal para ser menos punitivo é preciso enfatizar o seu aspecto preventivo e que isso não se resolve oferecendo apenas punições brandas e sim, as executando. Ou seja, o Direito Penal brasileiro parece muitas vezes tender, como já foi dito, para uma espécie de regulamentação progressiva do crime. Nesse sentido, só há inibição por parte daquele cidadão comum que tem medo de cair nas malhas do sistema prisional.
No Brasil o cidadão tem medo da “cadeia” e não da lei. Por isso é possível afirmar que no seu aspecto preventivo o Direito Penal vem sendo desgastado muito em função de discursos foucaultianos e marxistas adotados por juristas brasileiros. Postura inclusive que se tornou modismo corriqueiro. Há até que se questionar sobre até onde vai o correto entendimento sobre Foucault e Marx, aqui no Brasil, principalmente quando aplicados a essa leitura do Direito Penal brasileiro.
Quanto às alterações ainda nessa Parte Geral é possível verificar que quando um problema se resolve aparece outro. Sobre o princípio da insignificância a proposta da Comissão adota três critérios que fundamentam a excludência de ilicitude: a “mínima ofencividade”, “reprovabilidade” e a “lesividade da conduta”.
No quesito: “A utilização de menores de dezoito anos para a prática de crimes”, entende a Comissão:
A imputabilidade penal a partir dos dezoito anos está prevista na Constituição Federal: “Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.” Não poderia ser objeto, destarte, de sugestões de alteração legislativa. Por igual, condutas praticadas por menores de dezoito anos não podem receber previsão típica no Código Penal, sendo exigível lei especial (atualmente, o Estatuto da Criança e do Adolescente estando, portanto, infensa a alterações por lei ordinária (e, talvez, até mesmo por emenda à Constituição).
Tal entendimento é decorrente da imposição que consta no Plano Nacional de Direitos Humanos – 3 (PNDH-3), que impede o Brasil de reduzir a idade que estabelece a maioridade penal. Mesmo critério utilizado para o entendimento dos problemas oriundos de “culturas indígenas”.
Em “inexigibilidade de conduta diversa” e “crimes contra a humanidade” quando aplicado à “coerção moral irresistível e obediência hierárquica”, o Brasil segue as mesmas polêmicas e omissões que são observadas no Estatuto de Roma e do Tribunal Penal Internacional. O primeiro problema é como punir uma população quando é sabido que, nenhuma ditadura e atrocidades coletivas são cometidas por minorias. Ditaduras e massacres são fenômenos de massas. O século XX nos trouxe diversos exemplos. Daí tais instituições justificarem punir apenas os responsáveis ou líderes.
Acrescentou também a Comissão previsão importante quanto incorpora à nova legislação o art. 42 que define:
Os crimes praticados pelas pessoas jurídicas são aqueles previstos nos tipos penais, aplicando-se a elas as penas neles previstas, inclusive para fins de transação penal, suspensão condicional do processo e cálculo da prescrição. As penas privativas de liberdade serão substituídas pelas seguintes, cumulativa ou alternativamente: (2012, p. 229).
A comissão fundamenta tal posicionamento com o seguinte argumento:
Responsabilidade penal da pessoa jurídica. O Direito Penal tem caráter dúplice. Serve à sociedade, protegendo-a de condutas danosas; serve às pessoas, limitando a atuação punitiva estatal. O diálogo entre estas duas utilidades, igualmente lastreadas na Constituição, é que lhe dá o perfil. Ele não é uma construção intelectual autojustificável, um fim em si mesmo. O fenômeno de condutas socialmente danosas, gerenciadas, custeadas ou determinadas por pessoas jurídicas (outra construção intelectual humana) foi, de há muito, identificado pelos estudiosos. Sancioná-las e preveni-las, portanto, é preocupação comum. A questão é: como fazê-lo? (2012, p. 229).
No Título III “AS PENAS”, ocorreram mudanças muito importantes e que demarcam diferenças expressivas para o Código em vigor. Está previsto o fim da distinção entre reclusão e detenção, atentando inclusive, para o fato de que: “não se diferenciam no cumprimento da pena, que ocorre no mesmo tipo de estabelecimento” (2012, p. 232).
Além dessa alteração ocorre também alteração no percentual de permanência em cada regime, a obrigatoriedade do exame criminológico e lapso de tempo exigido para saídas temporárias, revalorização do regime aberto de cumprimento de pena, o fim do sursis, tal como, o livramento condicional (2012).
Questão de muita relevância trata a Comissão ao defender a “humanização do cumprimento das penas”. Na verdade trata de assinalar direitos já previstos na Lei de Execução Penal e que desde 1984 aguardam alguma realização, tal como o “estudo para o preso”. Extingue também o tipo prisão albergue por reconhecida inoperância e ineficiência e em seu lugar introduz técnica provavelmente mais eficaz que implica em:
trabalho por quatro horas diárias (e não mais cinco!), aos sábados e domingos, em estabelecimentos credenciados pelo juízo das execuções. A proposta ressalva que a limitação de final de semana não pode, como não poderia qualquer outra pena, restringir a liberdade de consciência e de crença do condenado. Não pode, por exemplo, obrigar alguém a freqüentar instituição religiosa, ou outra por ela mantida, se tal contrariar as convicções que ele, condenado, como qualquer cidadão, pode livremente abraçar (2012, p. 247).
Nesse rol de alterações a comissão traz de volta a dívida da multa para o âmbito da execução penal. Uma vez cobrada pelo Ministério Público e não paga será transformada em perda de bens ou em prestação de serviços á comunidade e caso ocorra descumprimento desta última a pena será convertida em pena de prisão (2012).
No quesito Individualização das Penas alterações significativas passam a ocorrer. A multa, por exemplo, “deverá ser fixada em todos os crimes que gerem prejuízo para a vítima”, independente da existência de indicação no preceito secundário das penas (2012, p. 251).
Neste mesmo campo, outra alteração marcante está nos quesitos que compõem as Circunstâncias Judiciais, agora no artigo 75, que segundo a Comissão:
A proposta retira do espaço de cognição judicial, para fins de dosimetria da pena, aspectos subjetivos como a conduta social e a personalidade do agente. A conduta social porque permitia valorações de cunho moral ou de classe ou estamento social. Já a personalidade do agente se apresentava como de dificílima aferição pelo julgador, pois o processo crime raramente traz tais indicativos psicológicos que permitissem um exame acurado. A retirada destes elementos de grande subjetividade condiz, além de tudo, com o Direito Penal do fato, e não do autor (2012, p 251).
Podemos observar então o quanto é delicado o problema da aplicação da doutrina e os prejuízos que tais equívocos podem trazer. Essa alteração nos quesitos das circunstâncias judiciais demonstra o pouco manejo com a influência da Criminologia e da Política Criminal no Direito Penal europeu do qual somos adaptação. Na verdade importamos o modelo, porém negligenciamos o conteúdo.
Quando o legislador incorporou a “personalidade” e a “conduta social” não entendia que o juiz deveria ter formação em psicologia ou sociologia ou ainda, que nos autos tivesse que, por algum acaso, existir um laudo psiquiátrico com alguma previsão de diagnóstico sobre o acusado. Quis apenas o antigo legislador, na sua intimidade com os modelos europeus por nós imitados, que o juiz nacional também tivesse a possibilidade de identificar que, certo modus vivendi, poderia ser pernicioso ao convívio social. Através da percepção sobre tal modo de viver em comunidade e os hábitos mais marcantes da personalidade de uma pessoa poderia o juiz estipular com mais precisão a pena e, com isso, a sua maior individuação.
Ainda sobre tal questão equivoca-se aquele que confunde a doutrina do direito penal do autor, algo tão comum aqui no Brasil. O Direito Penal do Autor volta-se para o que o indivíduo é enquanto categoria de raça e nacionalidade. Exemplo: ser judeu. É em Zaffaroni e Nilo Batista (2006), que encontramos uma adaptação de tal doutrina, visando denunciar uma interpretação do Direito a partir das relações de classe. Porém, é preciso ter cuidado com os arroubos libertários, pois, não estamos levando em consideração a pessoa quando falamos em crime próprio? Quando julgamos determinados crimes como, por exemplo, crimes contra criança, não estamos sempre considerando o fato e autor?
Confundir o entendimento de doutrinas e, principalmente o seu uso, conduz a equívocos problemáticos. Muito mais subjetivista é a distância costumeiramente existente entre pena mínima e máxima no nosso Direito Penal. Essa distância é sim, um preceito objetivo para julgamentos que envolvem valores de classe e renda. Nesse sentido, basta lembrar as polêmicas geradas pelo cálculo da dosimetria na famosa Ação Penal 470 apelidada de mensalão.
O artigo 76, do Projeto, traz a previsão de o juiz fixar pena de alimentos aos dependentes da vítima conforme o Código Civil, na hipótese de homicídio e outros crimes que afetam a vida. Nesse ambiente está a previsão de que o tempo máximo de encarceramento passa para quarenta anos. Em princípio estão mantidos os trinta anos. Entretanto, essa alteração alcança os casos de pena unificada, quando na lei em vigor, pode implicar que o segundo crime permaneça impune pelo limite de tempo máximo para encarceramento. Esta alteração atinge principalmente aqueles crimes cometidos após o início da pena do crime anterior. Outra inovação importante é sobre a Confissão Convergente, que passa a ter efeito redutor da pena e não apenas o de atenuante genérica.
Por fim, no tange à Parte Geral do “Projeto”, inovação também marcante é a proposta de utilização do plea bargain americano que amplia as possibilidades de transação jurídica durante o processo com o objetivo de torná-lo célere. Segundo consta na exposição de motivos:
[...] a transação durante o processo, não para evitá-lo, mas para abreviá-lo. Seguiu-se, com adaptações à realidade nacional, [...] A barganha respeita o devido processo legal, mas oferece alternativa para que este não se esvazie de conteúdo e se sustente apenas na indisponibilidade ou demora de um rito (2012, p. 267, 268).
III – As Novas Percepções Sobre Crimes e o Brasil no Cenário Internacional – Parte Especial
Esta sem dúvida uma etapa importante do trabalho. Desde a sua apresentação a Comissão coloca a importância do Brasil se adequar as regras internacionais oriundas de documentos internacionais às quais o país tornou-se signatário. Outra questão importante que precisa ser assinalada é sobre alterações em tipos penais já existentes e a incorporação de outros tantos.
A primeira dessas alterações se refere exatamente ao homicídio. Sabiamente a Comissão elimina a abstração jurídica chamada homicídio simples. Pode haver no mundo real um homicídio que se caracterize apenas por matar alguém? Tal conceito só caberia no homicídio culposo. Ao matar alguém imbuído de dolo, necessariamente se faz presente a qualificadora, motivo fútil ou torpe. Há até que se questionar se matar simplesmente alguém, por motivo fútil, se isso também não é torpe? Nas palavras da Comissão:
Nenhum homicídio é simples. A única alteração proposta pela Comissão de Reforma Penal em relação ao homicídio, “crime rei”, do caput do art. 121, é relacionada com o seu nomen juris. Atualmente, falar-se em homicídio simples. A sugestão é que se fale apenas em homicídio. Não há simplicidade no ato de matar. Ceifar-se a vida de outrem é, sempre, o fim de um sonho, de uma história em progresso, de um mundo. Para a família e os amigos da vítima, bem assim para toda a sociedade, é dor que não se acomoda a descrições (2012, p. 274).
Nesta mesma espécie de crime aparece em artigo próprio a eutanásia 122 que continua crime, porém com a possibilidade de não aplicação da pena e, a ortotanásia no §2° na condição de exclusão de ilicitude. Outra alteração de suma é a que ocorre no infanticídio. Quando passa a prever que: “Parágrafo único. Quem, de qualquer modo, concorrer para este crime, responderá nas penas dos tipos de homicídio” (2012, p. 280).
Ao mesmo tempo há que se buscar entender o novo cenário geopolítico da América Latina que coloca as novas hermenêuticas jurídicas como dimensões importantes a serem observadas. Aumentos e diminuições de penas, regras de progressão, classificação de crimes, interpretações e adaptações doutrinarias que apontam para o teor da ofensividade criminal, tudo está fortemente vinculado a uma política criminal cujo sentido ideológico é agora mera e visivelmente político-partidário.
Alguns exemplos são dignos de nota. São eles: “Uso e Tráfico e Drogas”, “Aborto”, “Terrorismo” e “Crime Organizado”. Para aqueles que defendem que o uso de drogas é um direito de todo e qualquer cidadão, que possa expressar livremente a sua vontade, cabem algumas informações para incrementar tal debate.
De acordo com o Novo Código:
Tráfico de drogas
Art. 212. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar: Pena – prisão, de cinco a quinze anos e pagamento de quinhentos a mil e quinhentos dias-multa.
§ 1º Nas mesmas penas incorre quem:
I – importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de
drogas;
II – semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas;
III – utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas.
Exclusão do crime
§2º Não há crime se o agente:
I – adquire, guarda, tem em depósito, transporta ou traz consigo drogas para consumo pessoal;
II – semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de drogas para consumo pessoal.
§3º Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, à conduta, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, bem como às circunstâncias sociais e pessoais do agente.
§4º Salvo prova em contrário, presume-se a destinação da droga para uso pessoal quando a quantidade apreendida for suficiente para o consumo médio individual por cinco dias, conforme definido pela autoridade administrativa de saúde (2012, 98 e 99).
Sobre esse assunto reina uma mistura intrigante que tramita entre a hipocrisia e o completo desconhecimento sobre o fenômeno a respeito do qual tantos juristas ousam opinar. Legisladores, juristas e usuários/dependentes parecem desconhecer que o uso das drogas nunca foi, desde ao menos a segunda metade do século XX, um crime de menor potencial ofensivo. Quem compra drogas seja na condição de usuário, como dizem, seja como dependente químico, contribui para o financiamento dos mais diversos tipos de crime espalhados pelo mundo inteiro. Homicídios, tráfico de pessoas, prostituição, tráfico de armas, lavagem de dinheiro, terrorismo, guerrilhas que, inclusive, recrutam crianças como soldados, tudo isso é financiado diretamente pelo consumo de drogas.
A lucratividade das drogas começa pelo dinheiro de quem compra. É com esse dinheiro que o traficante compra a arma que vai utilizar nos milhares de homicídios que assombram países inteiros, como o Brasil. É através do dinheiro adquirido com a compra das drogas, que todos os grupos terroristas são financiados. É preciso destacar essa questão. Todos os grupos terroristas que atuam no mundo são financiados pelo consumo de drogas. A ditadura cubana sempre foi mantida pelo tráfico da cocaína, toda a tragédia do Haiti, inclusive as origens dos conflitos políticos que geraram a sua mais recente guerra civil foi a disputa pelo tráfico que contaminava e mantinha a economia do país.
Farc, ELN, AUC, Sendero Luminoso, IRA, ETA, HIZBOLLAH, HAMAS, JIHAD Islâmica, Al Qaeda e PCC – Primeiro Comando da Capital - são alguns grupos terroristas dos mais conhecidos pelos brasileiros e, todos eles, financiados prioritariamente pelo consumo e tráfico de drogas.
De nada adianta descriminalizar o uso de drogas e até o seu comércio. Esse debate, tantas vezes distorcido, desvia o foco do problema e da atenção. Mesmo que tudo venha ser descriminalizado, homicídios e terrorismos continuarão acontecendo porque o financiamento continuará sendo o consumo, por ser intenso e por isso lucrativo. Portanto, o problema está nas pessoas consumirem um produto que legalizado ou não é intensamente lucrativo e que por isso financia diversos tipos de crimes e atrocidades no mundo inteiro.
Por tudo isso, reduzir as conseqüências de determinadas condutas ao prejuízo especificamente do agente é não conhecer o fenômeno sobre o qual, tantos “especialistas” se debruçam e falam. Basta ver o alarde que é dado para a 11.343/06 que traz tantos dispositivos já inaugurados pela 6.368/76, inclusive a previsão de políticas públicas de prevenção e tratamento. Desde ao menos a 10.409/02 já se percebe, naquele contexto, uma forte tendência em transferir o problema da droga para a dimensão da saúde pública. Além disso, o advento da 9.099/95 incrementa o debate sobre descriminalização do consumo de drogas. Infelizmente, no mundo inteiro, a descriminalização do uso de drogas vem sendo acompanhada do aumento do seu consumo e todas as conseqüências decorrentes do problema da dependência que já se tornou uma epidemia e por que não dizer, uma pandemia. Ao contrário do que propagandeiam os discursos libertários, a descriminalização, ou seja, a (des)proibição, tem sido acompanha do aumento do consumo em quantidade e intensidade e, com isso, o aumento de todos os crimes antes citados, financiados pelo consumo de entorpecentes e que ocorrem em todos os continentes.
Atrelado a esse problema aparece o Crime Organizado. Aqui no Brasil tal fenômeno se desenvolve exatamente nas entranhas do Estado ou diante do seu corrompido e inoperante aparato de segurança e vigilância.
Além disso, como já havia mostrado Bastos Neto, tanto em “Uma Hermenêutica do Crime” (2006), como em “Crise do Estado e Segurança Nacional” (2011), a dificuldade, aqui no Brasil, de identificarmos no mundo real o fenômeno em questão. Apontar para a favela como esclarece o referido autor não passa de uma interpretação tendenciosa para mudar o foco de atenção e minimizar o problema dos tantos “escândalos” que ocorrem nesse país.
E ainda, a dificuldade de legislarmos em função do que foi previsto, tanto na Convenção de Viena (1988) e na Convenção de Palermo (2000-2003), mostrou que o desinteresse que já havia sido denunciado pela CPI do Narcotráfico de 1999 persistia, adentrando o século XXI.
Em nosso atual contexto, a Comissão esteve sensível para o novo fenômeno criminal que, aqui no Brasil, veio a ser denominado como Milícia, que está previsto §2º do artigo 256.
Organização Criminosa
Art. 256. Organizarem-se três ou mais pessoas, de forma estável e permanente, para o fim específico de cometer crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a quatro 114 anos, mediante estrutura organizada e divisão de tarefas, com hierarquia definida e visando a auferir vantagem ilícita de qualquer natureza: Pena – prisão, de três a dez anos, sem prejuízo das penas relativas aos crimes cometidos pela organização criminosa.
§1º A pena aumenta-se até a metade se a organização criminosa é armada, se um ou mais de seus membros integra a Administração Pública, ou se os crimes visados pela organização tiverem caráter transnacional (2012, p. 114, 115).
O Terrorismo segue o rastro semelhante dos crimes anteriores. Em “Crise do Estado e Segurança Nacional” (2011), Bastos Neto mostrou algumas dificuldades quanto ao processo de elaboração de um conceito e, por conseguinte a criação de um tipo penal. A própria origem diferenciada do “Terrorismo de Estado” do “Terrorismo Revolucionário”, implica que, o tipo penal ideal, teria de abarcar duas perspectivas completamente diferentes.
A questão é difícil de ser tratada e se observarmos com atenção o Estatuto de Roma, que deu origem ao Tribunal Penal Internacional, veremos que foi dada mais atenção ao genérico “Terrorismo de Estado”. Já a Convenção Interamericana Contra o Terrorismo volta-se para o “Terrorismo Revolucionário”. Em Terrorismo e Criminalidade Política (1981), Heleno Fragoso assevera:
“o terrorismo constitui, sem dúvida, um dos fenômenos mais inquietantes de nosso tempo, desafiando os governantes e conduzindo os juristas à perplexidade. [...] A visão complexiva do objeto de estudo, abordado na perspectiva jurídica e criminológica, corresponde, a nosso ver, uma visão metodológica moderna e valiosa, no quadro de dogmática jurídico-penal em crise” (1981, p. 01 e 03).
Porém, atualmente pouco tem servido as teorias explicativas que abordaram o “terrorismo” dos anos de 1960 e 1970. Agora o “Novo Terrorismo” não quer derrubar o “sistema”, mas servir-se e incorporar-se a ele. Em nosso contexto Lopes Guimarães aborda a questão da seguinte forma:
Essa dificuldade de definição do terrorismo em relação a todas as suas facetas é indicativa, fatalmente, de críticas ferrenhas em razão da provável mácula nos princípios da legalidade e da tipicidade, pois o tipo tenderá a ser por demais aberto. [...] Assim, constantemente, para tal combate, serve-se a norma interna de figuras penais do direito comum, como os crimes de incêndio e de explosão (2007, p.18 e 19).
Aqui no Brasil, além das costumeiras celeumas jurídicas a respeito de tudo, no que diz respeito ao terrorismo, temos uma dificuldade talvez maior que é identificar o fenômeno na realidade fática. Tratar os ataques do PCC em São Paulo de 2006 além de todos os lançamentos de granadas incendiárias em transporte coletivo para fazer retroceder ordens de governo, tudo isso ser tratado como problema social ou é ignorância sobre o que se fala ou manifestação de interesses outros.
Terrorismo
Art. 239. Causar terror na população mediante as condutas descritas nos parágrafos deste artigo, quando:
I – tiverem por fim forçar autoridades públicas, nacionais ou estrangeiras, ou pessoas que ajam em nome delas, a fazer o que a lei não exige ou deixar de fazer o que a lei não proíbe;
II – tiverem por fim obter recursos para a manutenção de organizações políticas ou grupos armados, civis ou militares, que atuem contra a ordem constitucional e o Estado Democrático; ou
III – forem motivadas por preconceito de raça, cor, etnia, religião, nacionalidade, sexo, identidade ou orientação sexual, ou por razões políticas, ideológicas, filosóficas ou religiosas.
§ 1º Sequestrar ou manter alguém em cárcere privado;
§ 2º Usar ou ameaçar usar, transportar, guardar, portar ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenos, conteúdos biológicos ou outros meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa;
§ 3º Incendiar, depredar, saquear, explodir ou invadir qualquer bem público ou privado;
§ 4º Interferir, sabotar ou danificar sistemas de informática e bancos de dados; ou
§ 5º Sabotar o funcionamento ou apoderar-se, com grave ameaça ou violência a pessoas, do controle, total ou parcial, ainda que de modo temporário, de meios de comunicação ou de transporte, de portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações públicas ou locais onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações de geração ou transmissão de energia e instalações militares: Pena – prisão, de oito a quinze anos, além das sanções correspondentes à ameaça, violência, dano, lesão corporal ou morte, tentadas ou consumadas (2012, p. 108, 109).
Por fim, um dos temas mais polêmicos da atualidade, aborto. É bem conhecido o fato de que todos os países que aprovaram o aborto como um direito em suas legislações, o fizeram por uma questão de controle de natalidade. Sobre este problema, o discurso de direito da mulher sempre escondeu outros interesses capitaneados por organismos internacionais, inclusive a ONU.
A internacionalização do Direito nos níveis que estão acontecendo leva a um questionamento sobre a soberania nacional e ao mesmo tempo em que medida as tais “questões”, “discussões”, “demandas sociais” ou mesmo reivindicações de direitos são espontâneas ou são bancadas por capital estrangeiro com forte lobby, inclusive no Congresso Nacional.
Objetivo estratégico III:
Garantia dos direitos das mulheres para o estabelecimento das condições necessárias para sua plena cidadania.
Ações programáticas:
Responsáveis: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República; Ministério das Cidades; Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
g) Apoiar a aprovação do projeto de lei que descriminaliza o aborto, considerando a autonomia das mulheres para decidir sobre seus corpos.
Responsáveis: Ministério da Saúde; Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República; Ministério da Justiça
Parceiros: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República
Recomendação: Recomenda-se ao Poder Legislativo a adequação do Código Penal para a descriminalização do aborto (2012, p. 90, 91 e 92).
Não por acaso dentre outras recomendações do PNDH – 3 aparece no projeto do Novo Código Penal, o seguinte dispositivo:
Exclusão do crime
Art. 128. Não há crime de aborto:
I – se houver risco à vida ou à saúde da gestante;
II – se a gravidez resulta de violação da dignidade sexual, ou do emprego não consentido de técnica de reprodução assistida;
III – se comprovada a anencefalia ou quando o feto padecer de graves e incuráveis anomalias que inviabilizem a vida extra-uterina, em ambos os casos atestado por dois médicos; ou
IV – se por vontade da gestante, até a décima segunda semana da gestação, quando o médico ou psicólogo constatar que a mulher não apresenta condições psicológicas de arcar com a maternidade.
Parágrafo único. Nos casos dos incisos II e III e da segunda parte do inciso I deste artigo, o aborto deve ser precedido de consentimento da gestante, ou, quando menor, incapaz ou impossibilitada de consentir, de seu representante legal, do cônjuge ou de seu companheiro (2012, p. 58 e 59).
O Plano Nacional de Direitos Humanos – 3 é a terceira versão, que o governo Lula recebeu de braços abertos para ser implantado no Brasil. As versões I e II foram implantadas no Brasil no governo de FHC. Foi quando aqui no Brasil começou a aparecer o discurso do “ter direitos” nas versões das ONGs e movimentos sociais, completamente financiados por capital estrangeiro e, também, para atender a interesses estrangeiros no Brasil.
A própria expressão “direitos humanos” faz parte do título do Plano como forma de intimidar posicionamentos contrários ao conteúdo do PNDH – 3. Em todos os países da América Latina estão sendo implantadas versões semelhantes. Daí, por exemplo, tanta coincidência que, nesse momento outros países da América Latina, estão também descriminalizando o aborto.
A independência reprodutora da mulher não aparece com as propostas de descriminalização do aborto e sim, com o aparecimento da pílula, no século passado. Além disso, é possível perceber uma tendência de desconstrução do Direito moderno na sua versão atual, com o objetivo de fragilizar valores que impedem o reconhecimento do direito de abortar.
Já é antiga, por exemplo, a questão do reconhecimento do feto na condição de pessoa para o Direito Civil. Entretanto, o bem-jurídico vida é de fundamental importância não só para a preservação humana sobre a face da terra, mas também para a preservação da dignidade da pessoa.
Confundir o direito de abortar com o direito da mulher usar o seu corpo como bem entenda é um argumento pequeno. Primeiro, que num momento como o nosso em que existem tantos métodos de contracepção é inaceitável a alegação de que o “Direito reprime a mulher”. Segundo, o Direito cobra, apenas, tanto para a mulher como para o homem, a obrigação de ter uma vida sexual livre, porém, responsável. Sendo a vida um bem indisponível, não há questionamentos sobre o fato de que o corpo é da mulher. Entretanto, se nem a vida da mulher é disponível para ela mesma, não há que se discutir sobre a disponibilidade da vida que carrega no ventre e, que por isso mesmo, demanda tantos e todos os cuidados.
É evidente que a proposta de reconhecimento do direito ao aborto tal como está no Projeto visa diretamente a população pobre. É evidente que se trata de uma abertura para a instauração de política não mais de segregação, mas de eliminação mesmo de um número daquela população que é causa da maior parte das despesas do SUS e, em seguida, da Previdência Social.
IV – Conclusão
O cenário atual tanto no Brasil como no mundo atestam por uma crise de valores, instituições, Estado e também, o Direito. A questão já não é mais constatar essa crise. O desafio está em encontrar suas causas. São naturais ou artificiais? As tais mudanças no Direito, por exemplo, estão sendo induzidas por um natural fluxo do tempo, ou estão sendo provocadas por grupos de pressão, que escondem seus reais interesses das populações e povos?
Aqui no Brasil, esses desafios que se tornaram universalizados, são agravados pelas adaptações que por aqui fazemos daquilo que importamos da Europa e dos Estados Unidos. De fato, a modernidade é uma invenção européia e não é nisso que reside o problema. É muito mais a cultura dos arranjos toscos e da intelectualidade de meia polegada que faz com que tudo por aqui se agrave em função da incompetência floreada.
A questão do crime organizado é um bom exemplo. O debate que se desenvolveu aqui no Brasil, não ocorreu em nenhum outro país. Em todos os lugares o crime organizado vem sendo combatido com veemência. No exemplo do mensalão ainda usou-se o tímido tipo de “formação de quadrilha” diante de uma flagrante existência de “organização criminosa”.
Quanto aos debates sobre a legislação em vigor, não se falou em norma penal em branco ou em tipo penal aberto, simplesmente afirmou-se, não havia tipo. O que é necessário entender é que muitos dos crimes do século XXI, na sua maioria sempre existiram, mas por terem dimensão globalizada põe em desafio o princípio da taxatividade.
A possibilidade de descrição de uma conduta típica num mundo em que organizações criminosas se articulam via celular em cidades, entre países ou continentes, onde emails e redes sociais provocam a derrubada de ditaduras é preciso repensar a adequação de alguns princípios que orientam a estrutura e dinâmica do Direito Penal.
É preciso dotar o Direito Penal de mais coerência no sentido, inclusive, de evitar que incoerências levem a equívocos sobre a função do Direito Penal na sociedade. Qual o problema em se entender a estrutura do crime como bipartite e a análise culpabilidade, que Roxin dá o significado de “responsabilidade penal”, situar-se apenas a respeito da penalidade?
Onde está a lógica de que se um adolescente matar alguém não é homicídio? Não seria mais lógico admitir o homicídio e por ser menor de dezoito anos cumprir medida de segurança aqui chamada de medida socioeducativa?
Qual coerência em ter um crime prescrito com pena de prisão que, além de não ser cumprida, a pena alternativa não gera antecedente? Onde está a dimensão preventiva do Direito Penal?
Referências:
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___________________ Crise do Estado e Segurança Nacional: Nova geopolítica num contexto de terrorismo, crime organizado, democracia e liberdade. Salvador, Dinâmica, 2011
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Bacharel em Direito - FBB; Bacharel em Ciências Sociais - UFBa; Mestre em Sociologia - UFBa; Professor universitário e de faculdades; Atualmente leciona em cursos de graduação: Direito e Serviço Social; Leciona em cursos de pós-graduação: Agência Brasileira de Análise Criminal - ABACRIM, Curso de Especialização em Segurança Pública - (CESP-PMBa), Curso de Especialização em Gestão Estratégica de Segurança Pública - (CEGESP-PMBa); Autor de Livros especializados, artigos acadêmicos e crônicas. Coordenador do Observatório de Estudos Criminais - Salvador - Ba.; Coordenador do Seminário em Direito Penal, Literatura e Hermenêutica: Coordenador Adj. do Curso de Especialização em Ciências Criminais e Sistemas Prisionais - Dom Petrum.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NETO, Osvaldo de Oliveira Bastos. Apontamentos e Reflexões Sobre o Direito Penal Brasileiro: comparações entre o Código Penal vigente e o projeto do "Novo Código Penal" Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 fev 2013, 07:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/33821/apontamentos-e-reflexoes-sobre-o-direito-penal-brasileiro-comparacoes-entre-o-codigo-penal-vigente-e-o-projeto-do-quot-novo-codigo-penal-quot. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: LEONARDO DE SOUZA MARTINS
Por: Willian Douglas de Faria
Por: BRUNA RAPOSO JORGE
Por: IGOR DANIEL BORDINI MARTINENA
Por: PAULO BARBOSA DE ALBUQUERQUE MARANHÃO
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