I – INTRODUÇÃO.
Trata-se de suposta divergência entre decisões conflitantes proferidas inicialmente pelo Tribunal de 2ª instância em sede de liminar nos autos de um agravo de instrumento impugnando decisão não concessiva da liminar e posterior sentença elaborada por juiz de 1º grau em que confirma a decisão negativa da liminar.
II – DESENVOLVIMENTO.
Passa-se a analisar uma suposta contradição entre uma sentença que não suspendeu a exigibilidade da multa aplicada em processo administrativo punitivo e uma decisão proferida em sede de liminar nos autos de um agravo de instrumento no tribunal competente, cujo conteúdo era justamente a concessão do referido efeito suspensivo à exigibilidade da multa e seus consectários legais (por exemplo, não inscrição em Dívida Ativa, não inscrição em cadastros de inadimplentes e etc).
Pois bem, em face desta divergência, mostra-se que não é possível impugná-la por meio de embargos de declaração. Vejamos, o Código de Processo Civil é claro ao dispor, no art. 535, I, que cabe o recurso de embargos de declaração quando na sentença ou no acórdão houver obscuridade ou contradição. Isto implica afirmar categoricamente que a contradição ou obscuridade deve ser dentro da mesma peça processual, ou seja, a sentença deve ser contraditória entre a sua própria fundamentação e o seu dispositivo, mas não foi isso que ocorreu in casu.
Verifica-se do suposto caso levantado neste artigo que a sentença foi objetiva e clara ao dispor na fundamentação que não merece guarida o pedido de atribuição de efeito suspensivo à cobrança da multa administrativa e no dispositivo da mesma sentença consta indeferimento do pedido, quer dizer que a sentença não cabe reparos, eis que não há contradição ou obscuridade.
Esse também é o entendimento pacificado da jurisprudência nacional, ao decidir que os embargos de declaração só devem ser conhecimentos se a contradiçãocorresponder à fundamentação e ao dispositivo da mesma peça processual, vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE IRREGULARIDADES NO ACÓRDÃO. SUSPENSÃO DE EXECUÇÃO DE SENTENÇA MANDAMENTAL. ART. 4º DA LEI Nº 4.348/64. DECISÃO DE TRIBUNAL LOCAL. ANÁLISE FÁTICA DA LESÃO À ORDEM, À SAÚDE, À SEGURANÇA E À ECONOMIA PÚBLICAS. REEXAME DA MATÉRIA DE FATO: IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 07/STJ. PRETENSÃO DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. INCABIMENTO. DESOBEDIÊNCIA AO ART. 535 DO CPC. ANÁLISE DE VIOLAÇÃO DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS.
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5. As funções dos embargos de declaração, por sua vez, são, somente, afastar do acórdão qualquer omissão necessária para a solução da lide, não permitir a obscuridade por acaso identificada e extinguir qualquer contradição entre premissa argumentada e conclusão.
(STJ: EDAG 200302234098; EDAG - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO – 571439; Relator JOSÉ DELGADO; DJ DATA:27/09/2004 PG:00235)
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONTRADIÇÃO E JULGAMENTO EXTRA PETITA INOCORRENTES. OBJETIVOS DE PREQUESTIONAMENTO E DE ATRIBUIÇÃO DE EFEITOS INFRINGENTES DO JULGADO. EXIGÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 535 DO CPC. 1. A contradição que justifica o manejo dos embargos de declaração é apenas aquela existente dentro do próprio acórdão embargado, entre a fundamentação do julgado e a sua conclusão, e não a divergência de interpretação da lei entre o órgão julgador e o embargante, sobre a matéria.
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4. Embargos de declaração conhecidos, mas rejeitados.
(TRF 1: EDAG 200201000280686; Relator DESEMBARGADOR FEDERAL ANTÔNIO EZEQUIEL DA SILVA; DJ DATA:16/07/2004 PAGINA:31)
Não obstante tudo isso, acrescenta os ensinamentos do professor Fredie Didier Jr.[1] que afirma ser a decisão contraditória quando traz proposições entre si inconciliáveis. O principal exemplo é a existência de contradição entre a fundamentação e a decisão.
Ademais, superando esse ponto, tem-se de afirmar, também, que não existe contradição entre análise exauriente proferida em sentença e análise superficial presente em liminar de Agravo de Instrumento. Por mais que o recurso tenha sido julgado pela instância superior, a sentença foi concedida com base em estudo profundo e completo dos autos.
A jurisprudência dos Tribunais Nacionais é pacífica no sentido de que a sentença de mérito faz perder o objeto do Agravo de Instrumento que decide a liminar e, portanto, deve prevalecer, sem que haja qualquer tipo de contradição, vejamos:
PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO - LICITAÇÃO - CORREÇÃO MONETÁRIA - OUTORGA DE CANAL DE RÁDIO DE FREQÜÊNCIA MODULADA - RECURSO ESPECIAL EM QUE SE DISCUTE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA DEFERIDA NO TRIBUNAL LOCAL EM SEDE DE AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO JÁ SENTENCIADA NA ORIGEM COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO - PERDA DO OBJETO DO RECURSO ESPECIAL - RECURSO ESPECIAL NÃO-CONHECIDO. 1. Perde o objeto o recurso especial interposto contra decisão em agravo de instrumento quando já proferida sentença na origem. Jurisprudência predominante do STJ. 2. O julgamento da causa na origem esgota a finalidade da antecipação da tutela, uma vez que substituiu tal julgado após a cognição exauriente. Julgado improcedente o pedido, fica a liminar deferida no Tribunal a quo, em sede de agravo de instrumento, automaticamente revogada com eficácia extunc, ainda que silente a sentença a respeito. Recurso especial não-conhecido porque prejudicado.
(STJ: RESP 200401337430; Relator HUMBERTO MARTINS; DJ DATA:18/10/2006 PG:00230)
PROCESSUAL CIVIL - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DA PARTE IMPETRANTE. AGRAVO REGIMENTAL DA FN. MANDADO DE SEGURANÇA. LIMINAR. PROLAÇÃO DE SENTENÇA SUPERVENIENTE. PERDA DE OBJETO. 1. Existindo sentença mandamental superveniente, não mais persiste qualquer interesse recursal no agravo de instrumento, embargos de declaração e/ou agravo interno, interpostos contra decisão liminar antecedente e já superada. 2. Em suma: "a superveniência de sentença em mandado de segurança induz a perda de objeto do agravo de instrumento impugnando liminar deferida em writ, à luz do art. 7º, §3º, da Lei n.º 12.016/2009, que dispõe que "os efeitos da liminar, salvo se revogada ou cassada, persistirão até a prolação da sentença". (AGA 0038120-98.2010.4.01.0000/MT, Rel. Desembargador Federal Luciano Tolentino Amaral, Sétima Turma,e-DJF1 p.184 de 25/02/2011). 3. Agravo regimental e embargos de declaração julgados prejudicados.
(TRF 1: AGA- AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO, DESEMBARGADOR FEDERAL REYNALDO FONSECA, e-DJF1 DATA:30/03/2012 PAGINA:537)
PROCESSO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. SUPERVENIENTE PROLAÇÃO DE SENTENÇA. PERDA DO OBJETO DO RECURSO. 1. A sentença proferida no processo substitui a interlocutória decisão que concede ou nega pleito de antecipação dos efeitos da tutela ou medida liminar, passando ela, a sentença, a produzir seus próprios efeitos, sem espaço para que continue atuando aquela decisão provisória que, uma vez substituída pelo ato decisório da demanda, desaparece do cenário jurídico, encampada se por ele confirmada, ou revogada, expressa ou implicitamente, caso contrária ao provimento jurisdicional extintivo do feito, com ou sem resolução de mérito. 2. Agravo regimental não provido.
(TRF 1: AGA 200801000245916, DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MOREIRA ALVES, e-DJF1 DATA:24/02/2012 PAGINA:400)
AGRAVO - NEGATIVA DE SEGUIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO - PROLAÇÃO DE SENTENÇA - AUSÊNCIA SUPERVENIENTE DE INTERESSE RECURSAL. 1. É provisória a decisão liminar por subsistir até o momento em que proferida a sentença acolhendo ou rejeitando a pretensão deduzida em Juízo, caso por outro motivo não venha a ser antes desse momento modificada ou revogada 2. Com a prolação da sentença, há ausência superveniente do interesse recursal no julgamento do agravo de instrumento, porquanto a decisão liminar fora substituída pela sentença. Eventual inconformismo deverá ser submetido a este Tribunal pelo meio processual adequado para a solução da controvérsia apresentada em Juízo.
(TRF 3: AI 00062071020114030000; DESEMBARGADOR FEDERAL MAIRAN MAIA; e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/02/2012)
AGRAVO DO ARTIGO 557, § 1º DO CPC. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA O INDEFERIMENTO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. EFEITO SUSPENSIVO ATIVO CONCEDIDO. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. DECISÃO QUE RECONHECE A PERDA DE OBJETO DO RECURSO. EXPLICITAÇÃO DA REVOGAÇÃO EX TUNC DA LIMINAR. I - Mantida a decisão agravada julgando prejudicado o agravo de instrumento, por ter se esvaído seu o objeto com a superveniente prolação da sentença de improcedência do pedido no feito principal, pois as conseqüências jurídicas da decisão interlocutória já se encontram superadas. II - Com a prejudicilidadedo agravo de instrumento, em razão da sentença de improcedência do pedido no feito principal, resta revogadaextunc a liminar que deferiu a tutela antecipatória, eis que afastada a verossimilhança do pleito ante a cognição exauriente proferida em 1º grau. Precedentes no Colendo Superior Tribunal de Justiça. III - Acolhimento do agravo legal tão somente para que a decisão agravada seja integrada, a fim de explicitar a revogação extunc da liminar concedida no presente agravo de instrumento. IV - Agravo legal parcialmente provido.
(TRF 3: AI 00722308919984030000; DESEMBARGADORA FEDERAL ALDA BASTO; e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/10/2011 PÁGINA: 464)
PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO -SENTENÇA PROFERIDA NA ORIGEM - MANDADO DE SEGURANÇA - RECURSO PREJUDICADO - PERDA DE OBJETO - DECISÃO MONOCRÁTICA - ARTIGO 557 DO CPC - AGRAVO LEGAL IMPROVIDO. I - Perde o objeto o agravo de instrumento ainda que nele tenha sido deferida a liminar, ficando revogada tal decisão, tendo em vista a superveniência da sentença que denegou a segurança pleiteada. II - A sentença proferida nos autos do mandado de segurança substitui aquela decisão anterior, fazendo com que eventual modificação seja alcançada somente por meio de recurso de apelação, uma vez que houve extinção do processo com o julgamento do mérito. III - Agravo legal improvido.
(TRF 3: AI 00121008420084030000; DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES; e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/12/2010 PÁGINA: 129)
A propósito, verifica-se que sentença, além de ser posterior à liminar nos autos de agravo de instrumento, ela é proferida com conhecimento e análise total e profunda dos autos, enquanto a liminar no referido recurso é uma análise superficial da fumaça do bom direito e do perigo da demora.
Na sentença, o magistrado não verificou só o fumus boni iuris, como deve ser em liminares, ele analisou o direito em si, em sua integralidade, para decidir pela não suspensão da cobrança da multa e suas consequências, portanto, como não há contradição, deve prevalecer a sentença.
III – CONCLUSÃO.
Por todo o exposto,não pode afirmar que existe contradição entre liminar em Agravo de Instrumentodecidido peloTribunal de 2ª instância e posterior sentença de juiz de 1º grau, posto que a divergência deve existir dentro da mesma peça processual e não foi o caso, bem como a sentença posterior mostrou um conhecimento exauriente da lide e a liminar era um conhecimento perfunctório, assim deve prevalecer a sentença que indeferiu o pedido de suspensão da exigibilidade da multa aplicada corretamente.
IV – REFERÊNCIAS.
DIDIER JR. Fredie. Curso de Processo Civil. Salvador, Podivm. 2007
Sites: www.trf1.jus.br
Procuradora Federal lotada na PFE/Anatel, pertencente à Gerência de Contenciosa desta Agência. Sou Especialista em Direito Administrativo e em Direito Constitucional.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MORELO, Ludimila Carvalho Bitar. Decisões contraditórias entre liminar em agravo de instrumento e posterior sentença Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 fev 2013, 06:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/33946/decisoes-contraditorias-entre-liminar-em-agravo-de-instrumento-e-posterior-sentenca. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
Por: PRISCILA GOULART GARRASTAZU XAVIER
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