Após a implantação, no Brasil, do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (PDRAE) e da Emenda Constitucional n.º 19/1998, o Estado passa de produtor de bens e serviços em direção ao Estado Regulador. Trata-se de uma forma de organização econômico-social do Poder Público, o qual indica a desmobilização de recursos estatais materiais e humanos, desvinculando-os do desempenho direito e imediato de atividades materiais, em prol do poder estatal de controle das atividades privadas. Assim, devolve-se à iniciativa privada o protagonismo econômico e social.
O Estado Regulador passa a exercer um controle, fiscalização e normatização sobre as atividades privadas. A regulação passa a ser entendida num sentido além do econômico, pois é social, constituindo-se como um conjunto de regras de conduta e de controle da atividade econômica pública e privada e das atividades sociais não exclusivas do Estado, com a finalidade de proteger o interesse público.
Ainda, o novo modelo de Estado privatiza suas empresas e entidades encarregadas de intervenção direta na atividade econômica. Tratou-se também do estabelecimento de parcerias com o Terceiro Setor em relação às atividades que correspondem aos espaços públicos não estatais, em que serviços públicos, como saúde, educação, cultura, pesquisa científica, entre outros, deixam de ser atividades exclusivas do Estado.
A atividade reguladora do Estado está prevista, entre outros dispositivos, no art. 174 da Constituição Federal, o qual dispõe:
Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.
Para desempenhar a atividade de regulação, foram criadas as Agências Reguladoras, que são consideradas autarquias em regime especial. Essas, por sua vez, são dotadas de competência para o estabelecimento de normas de regulação da atividade econômica.
Devemos destacar que a Constituição Federal, em seu art. 84, VI, especificou taxativamente as hipóteses nas quais são admitidos os chamados regulamentos autônomos, que retiram do próprio texto constitucional seu fundamento de validade.
Nesse contexto, com exceção dos decretos autônomos, os decretos e regulamentos de execução da lei e autorizados pela lei não devem exacerbar o limite estabelecido no comando legal, em atenção ao princípio da legalidade.
Assim, às Agências Reguladoras compete apenas regular as atividades econômicas nos limites legais, não podendo inovar na ordem jurídica.
Em atenção ao princípio da legalidade, as agências reguladoras devem disciplinar as atividades a que se propõem, dentro dos limites legais, expedindo os respectivos regulamentos. Contudo, limitar o poder normativo pela lei em sentido formal a tornará ineficaz, pois o processo legislativo é, por natureza, mais lento. Para que possam efetivamente exercer sua finalidade constitucional, necessitam ter poder, ou seja, normatizar as atividades econômicas dentro dos parâmetros legais.
A Constituição Federal, em seu art. 37, prevê que a administração pública obedecerá, entre outros, aos princípios da legalidade e eficiência. A Teoria Geral do Direito, atualmente, entende que os princípios são espécies de normas jurídicas, ao lado das regras. É possível se extrair consequências jurídicas dos princípios, pois possuem força normativa. Portanto, deve-se entender que as agências reguladoras devem se submeter ao princípio da legalidade, mas sem se esquecer do princípio da eficiência.
Citamos trecho extraído da obra de Leila Cuéllar,
Questão importante a ser salientada relaciona-se com a fixação do conteúdo e dos limites do poder normativo das agências, tendo em vista especialmente os princípios da separação dos poderes e da legalidade, previstos na Constituição brasileira.
(...)
Verifica-se, portanto, que quando se fala em poder das agências reguladoras para emitir normas de natureza e eficácia abstratas, admite-se a competência normativa das agências e nunca a competência legislativa.
(...)
Deve-se frisar, no entanto, que se trata de um poder normativo/regulamentar temperado, adaptado ao sistema jurídico brasileiro, “não podendo (i) inovar de forma absoluta, ab ovo, na ordem jurídica, (ii) contrariar a lei e o direito, (iii) desrespeitar o princípio da tipicidade, (iv) impor restrições à liberdade, igualdade e propriedade ou determinar alteração do estado das pessoas, (v) ter efeito retroativo (em princípio). Além disso, a expedição de regulamentos deve ser fundamentada, precisa respeitar a repartição de competências entre os entes da Federação, e se submete a controle pelo Poder Judiciário.
Assim, em tempos de administração gerencial, preocupada com a eficiência, para que seja respeitada a Constituição Federal, as leis devem traçar os limites gerais da atividade regulatória, deixando para os regulamentos expedidos pelas agências reguladoras as questões específicas, práticas, atendendo ao princípio da legalidade e da eficiência ao mesmo tempo. Entretanto, a lei, como comando geral e abstrato, deve estabelecer os parâmetros, utilizando cláusulas gerais, standards, permitindo que os regulamentos tratem dos casos concretos, respeitando a realidade do momento.
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