Registre-se que o Órgão Consultivo não é órgão decisório e sim órgão de assessoramento jurídico, apto a corroborar ou orientar os contornos da decisão administrativa, mas não a defini-la com seu posicionamento jurídico prévio. Desta sorte, não é atribuição do Órgão Jurídico manifestação em autos onde não se identifica a decisão administrativa a ser tomada.
Não pode a Administração Pública se eximir em decidir alegando desconhecimento da Lei, haja vista o art. 3º do Decreto-Lei 4.657/142 e o princípio da legalidade (art. 37 da CF/88 e art. 2º., caput, da Lei 9.784/1994), nem se imiscuir em definir os critérios técnicos do assunto alegando que a matéria técnica se mistura com a jurídica.
Perceba que toda matéria técnica, dentro da Administração Pública, se confunde com a jurídica, posto que todos os atos administrativos necessariamente devam submeter-se ao princípio da legalidade.
Ademais, é obrigação do servidor público conhecer as Leis e aplicá-las, não sendo atribuição do Órgão Jurídico a orientação prévia da confecção dos atos administrativos (nem poderia ser), posto ser poder-dever do próprio servidor basear sua conduta na Lei e nos ditames jurídicos do ordenamento em que ele se insere.
Ao órgão jurídico compete, como já dito alhures, chancelar a conduta da Administração ou orientá-la quanto à legalidade do ato, mas nunca substituir sua obrigação de conhecer e basear suas decisões na Lei. Quaisquer dúvidas sobre o assunto consulte o art. 116, III, da Lei 8.112/1990 e inciso XIV, alínea q, do Decreto 1.171/1994.
Outrossim, a Lei 9.784/1994 determina expressamente que:
Art. 2o. A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:
I - atuação conforme a lei e o Direito;
(...)
VII - indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão;
Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:
I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;
Destarte, vê-se que é obrigação do agente público não só conhecer a lei, mas também motivar juridicamente os seus atos, sendo descabida a alegação de que a o Órgão Jurídico deve se manifestar preliminarmente por ser matéria eminentemente jurídica e não técnica, salvo nas situações em que a dúvida jurídica suscitada seja condição para a tomada da decisão técnica, caso em que deve ser explicitada de forma individualizada e com questionamentos específicos, deixando clara a situação excepcional.
O técnico tem que embasar suas conclusões em normativos e fundamentar juridicamente sua decisão, cabendo à Procuradoria Jurídica verificar a legalidade do ato, e a subsunção dos seus fundamentos jurídicos ao tema analisado, mas nunca determinar qual a decisão a ser tomada.
Tanto é assim que o normativo da ANTAQ exige, preliminarmente à análise jurídica, fundamentação TÉCNICA e CONCLUSIVA da unidade organizacional consulente, bem como a fundamentação jurídica utilizada para que haja apreciação do Órgão Jurídico, senão vejamos o art. 17 da Resolução 2.121/2009 – ANTAQ:
Art. 17. As consultas formuladas pelas Unidades Organizacionais deverão ser autuadas e identificadas pelo número do Sistema de Controle e Acompanhamento de Processos - SICAP com o assunto, o nome do interessado e do órgão consulente, devendo o processo ter as suas folhas numeradas e rubricadas antes de sua remessa ao órgão jurídico e conter:
I - fundamentação técnica e conclusiva do órgão ou autoridade consulente;
II - informação sobre os atos e diplomas legais aplicáveis ao caso;
III - explicitação da dúvida jurídica;
IV- menção às opiniões contrárias que evidenciam a dúvida jurídica suscitada, quando for o caso; e
V - eventuais documentos que facilitem a compreensão e o exame da matéria.
§ 2º Não serão conhecidas as consultas formalizadas em desconformidade com o disposto nos incisos deste artigo ou com o seu parágrafo primeiro.
Por fim, pondo uma pá de cal no assunto, consoante o enunciado 07 do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia Geral da União - AGU, cuja observância é exigida através da Portaria Conjunta Nº 01, de 23 de outubro de 2012, há orientação no sentido de que o Órgão Consultivo não dê manifestações conclusivas sobre temas que invadam o conhecimento técnico alheio, senão vejamos:
Boa Prática Consultiva – BPC nº 07
Enunciado:
O Órgão Consultivo não deve emitir manifestações conclusivas sobre temas não jurídicos, tais como os técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade.
Fonte
É oportuno que os Advogados Públicos não invadam área de conhecimento técnico alheio ao Direito, para, por exemplo, dissentir da classificação feita por idôneo agente público acerca do objeto licitatório. A observação não inviabiliza que o Advogado Público expresse sua opinião ou faça recomendações, ressalvando a tecnicidade ou discricionariedade do assunto. A prevalência do aspecto técnico ou a presença de juízo discricionário determina a competência da autoridade administrativa pela prática do ato, bem como sua responsabilidade por ele.
Conclusão
Desta sorte, repito, deve a Administração Pública tomar a decisão, fundamentando juridicamente os seus atos, e submetê-los, quando necessário ou exigido por lei, ao seu Órgão Jurídico de Assessoramento, mas nunca outorgar sua decisão a uma manifestação jurídica.
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