Muito já se discutiu em doutrina sobre a constitucionalidade das medidas de segurança e a justiça da sua aplicação e de seu cumprimento.
Os aspectos que mais geram acaloradas discussões são as condições às quais os agentes, doentes mentais, são submetidos durante o tratamento e também o prazo de duração da medida de segurança.
Sobre o primeiro aspecto, as condições de cumprimento, é fato notório que o Estado não oferece qualidade para o tratamento das pessoas submetidas a medidas de segurança. Aliás, o Estado falha como provedor e mantenedor da saúde como um todo. Se as pessoas que se alinham corretamente à lei, sem infringi-la, já são alvos da falta de estrutura dos hospitais e postos de saúde, quem dirá os infratores da lei penal, por muitos tidos como escória e não merecedores de qualquer assistência.
Hospital de custódia e tratamento psiquiátrico não passa de uma expressão eufemística utilizada pelo legislador da Reforma Penal de 1984 para definir o velho e deficiente manicômio judiciário. Nestes locais os agentes vivem em estado constante de letargia, provocado pelo uso de medicamentos e ainda assim se tem notícias de que, frequentemente, os internos tentam dar fim à própria vida, geralmente por enforcamento.
As estruturas físicas destes locais são precárias, por vezes indignas. Os profissionais da saúde que lá trabalham nem sempre tem a necessária paciência ou, até mesmo, a humanidade de tratar com decência os pacientes submetidos a tratamento. Muitos dos pacientes são abandonados à própria sorte, mesmo dentro do “estabelecimento adequado”.
A lei fala em estabelecimento adequado. Mas o que seria “estabelecimento adequado”? A lei não diz, mas dá uma pista quando fala que o internado tem direito de ser recolhido a estabelecimento dotado de características hospitalares. Lamentavelmente, o Estado entende que os manicômios judiciários apresentam “características hospitalares” e por isso têm sido considerados “estabelecimentos adequados”.
Evitando a generalização, eis que deve haver algum estabelecimento que seja realmente adequado, o fato é que alguns hospitais de custódia não têm a menor estrutura, seja física ou seja de pessoal, para desenvolver tratamentos eficazes contra os distúrbios mentais apresentados pelos inimputáveis, ou mesmo pelos semi-imputáveis. Mas mesmo assim estas pessoas são trancafiadas nestes estabelecimentos, privadas de suas liberdades, do convívio familiar e social e a melhora do estado de saúde nem sempre é perceptível.
Isso não fere a dignidade da pessoa humana? Não fere a Constituição de 1988?
Cremos que sim.
Também fere a Constituição a previsão do art. 97, § 1º, do CP, ao estabelecer que a medida de segurança terá tempo indeterminado.
Com efeito, o art. 5º, inciso XLVII, alínea “b”, da Constituição, proíbe a instituição de penas de caráter perpétuo. Isto é um direito fundamental do indivíduo. No entanto, admitir que a medida de segurança tenha prazo indeterminado, como pretende o legislador, fere de morte esta disposição constitucional.
A medida de segurança, como sanção penal que é, deve sujeitar-se a todos os princípios informadores da pena, sobretudo os constitucionalmente estabelecidos. Se a Carta Magna proíbe penas de caráter perpétuo, porque razão a medida de segurança poderia assumir tal caráter? Inadmissível.
Por esta razão o dispositivo do Código Penal é alvo de severas críticas da doutrina, não sem razão. E para amenizar este absurdo previsto em lei desenvolveram-se duas correntes sobre o prazo máximo de duração da medida de segurança.
Uma, adotada pelo STF, preceitua que se o imputável é protegido pelo limite de trinta anos para cumprimento da pena privativa de liberdade, com muito mais razão também deve ser o inimputável (ou semi-imputável), doente mental, que não pode ser submetido indefinidamente a internação.
Já o STJ, em julgamento realizado em 2009, firmou o seguinte entendimento:
HABEAS CORPUS. PENAL. EXECUÇÃO PENAL. MEDIDA DE SEGURANÇA. PRAZO INDETERMINADO. VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL DE PENAS PERPÉTUAS. LIMITE DE DURAÇÃO. PENA MÁXIMA COMINADA IN ABSTRATO AO DELITO COMETIDO. PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA PROPORCIONALIDADE. ORDEM CONCEDIDA. 1. A Constituição Federal veda, em seu art. 5º, inciso XLII, alínea b, penas de caráter perpétuo e, sendo a medida de segurança espécie do gênero sanção penal, deve-se fixar um limite para a sua duração. 2. O tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado, à luz dos princípios da isonomia e da proporcionalidade. 3. Ordem concedida para declarar extinta a medida de segurança aplicada em desfavor do paciente, em razão do seu integral cumprimento. (grifo acrescido)
A posição adotada pelo STJ encontra maior respaldo na doutrina, especialmente no que diz respeito à medida de segurança de internação em hospital de custódia. Com efeito, se uma pessoa culpável, dotada de livre arbítrio e responsável por uma conduta reprovável, pode ser apenada até o limite previsto em lei, não há razão para permitir que um indivíduo portador de doença mental receba uma medida de segurança por período superior.
BIBLIOGRAFIA
BITENCOURT, Cézar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, vol. 1, 17ª ed., São Paulo, Saraiva, 2012.
MASSON, Cleber Rogério. Direito penal esquematizado – parte geral – vol. 1, 3ª ed., São Paulo, Método, 2010.
NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial, 7ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2011.
Website www.senado.gov.br, acessado em 17/09/2013
Website www.wikipedia.com.br, acessado em 17/09/2013.
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