O caso Amarildo (RJ), trucidado pela polícia militar (conforme acusação do Ministério Público), assim como o dos muitos militares assassinados pelos grupos organizados, são frutos de uma só política: a do extermínio. Fazem parte do mesmo enredo ensanguentado e cruel, que marca a humanidade desde seus primórdios. Os discursos político-criminais neopunitivistas (desequilibrados, desproporcionais, irracionais: discursos da lei e da ordem, da tolerância zero, do “direito” penal do inimigo, do populismo penal etc.) já são muito contestados (nunca conseguiram unanimidade). A “política criminosa” de extermínio do inimigo é, no entanto, muito mais grave: é deplorável, abominável, rastejante, inqualificável.
Conta, entretanto, com amplo apoio midiático e dos populares, sobretudo nas pesquisas e redes sociais. Prova evidente de que vivemos ainda num rematado selvagerismo (muito próximo ao estado de natureza, descrito por Hobbes em 1651 – Leviatã, cap. XIII). Cultura atrasada, típica de país eticamente degenerado, desmoralizado (já em escala nitidamente escatológica).
O discurso radical, irracional, é o seguinte: “inimigo bom, é inimigo morto”. Isso atualiza o clássico antigo “slogan” “bandido bom, é bandido morto”, que tem grande apoio da população (43%) (Disponível em: http://portal.mj.gov.br/sedh/biblioteca/livro_percepcoes/percepcoes.pdf. Acesso em: 20.04.2013. p. 249):
A política criminosa de extermínio do inimigo não é uma teoria de Política criminal, muito menos de uma Política ostensiva do Governo, sim, uma prática (uma política) social transversal ou paralela ao Estado. É transversal quando emana (veladamente, em regra) de segmentos de dentro do poder público (grupos de policiais exterminadores, por exemplo). É paralela quando decorre de grupos armados ou organizados, fora do Estado (dessa política de extermínio se encarregam, por exemplo, as milícias e os “tribunais” internos dos grupos organizados, que acusam e julgam os extermináveis). É militar matando suspeito, é o grupo organizado dizimando policiais, é a milícia matando drogados, são drogados matando os pais. Em síntese, como todos não são da classe dominante, é pobre matando pobre! Guerra de todos contra todos (Hobbes). Desgraça infinita! Mortes antecipadas (Zaffaroni).
Em pleno século XXI, contando a política de extermínio com 43% de apoio, não há como não concluir: vivemos uma sociedade ainda muito doente, eticamente degenerada, moralmente depauperada! A nossa salvação depende de um deus bondoso, deus da concórdia, deus da misericórdia, deus piedoso, compreensivo, humanizado, em suma, um deus da Paz, para substituir o deus da guerra, do ressentimento, da vingança, do extermínio, da crueldade, da maldade.
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