INTRODUÇÃO
Questão relevante e tormentosa que, reiteradamente, envolve a análise de processos administrativos de licitações e contratações públicas, refere-se à contraposição comumente feita entre os princípios da proposta mais vantajosa e o da vinculação ao instrumento convocatório, nas hipóteses em que são, aparentemente, inconciliáveis.
DESENVOLVIMENTO
Tal orientação, embora defendida por parte da doutrina, não parece ser a que mais se amolde, necessariamente, ao interesse público que deve permear a efetivação dessa forma de contratação.
Para aclarar a conclusão que a seguir virá, entendo pertinente trazer à baila uma breve consideração a respeito dos princípios mencionados. Comecemos com o postulado da vinculação ao instrumento convocatório, que deflui do disposto no caput do art. 41, da Lei de Licitações e Contratos, verbis:
“Art. 41. A Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada.”
A redação do dispositivo é impositiva e não abre brechas para questionamentos: O edital vincula a Administração em todos os seus termos, seja quanto às regras de fundo quanto àquelas procedimentais.
Isso porque, sob certo ângulo, o edital é o fundamento de validade dos atos praticados no curso da licitação, na acepção de que sua desconformidade com os atos administrativos praticados no curso do procedimento se resolve pela declaração de invalidade desses últimos.
Todavia, por óbvio que a extensão do vício dependerá da análise do caso concreto, sendo que, quando se tratar de descumprimento de mero formalismo, ou mesmo de erro material, o princípio da vinculação ao edital poderá, a depender, ser relativizado, a fim de resguardar o interesse maior, que é a melhor contratação sob a ótica da Administração Pública.
De outro lado, parece claro que os motivos que, porventura, destoem dos termos do edital e que não consubstanciem-se em meros erros formais ou materiais configuram-se como falhas importantes, aptas a afetarem todo o resultado final da proposta, ainda que para a um valor reduzido, se comparado com o originariamente oferecido.
Pois bem. Passemos agora a um breve estudo sobre o princípio da busca pela proposta mais vantajosa para a Administração.
A regra encontra-se insculpida já no art. 3º da Lei nº 8.666/93, que assim dispõe:
“Art. 3o A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional, e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, daimpessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidadeadministrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamentoobjetivo e dos que lhes são correlatos.”
Atentemos para o que dispõe a Lei. O que se exige da Administração é que busque sempre a melhor proposta. Não há, no teor do dispositivo, qualquer menção expressa a menor preço. Por óbvio que uma proposta com valor reduzido em relação às demais, a princípio, aparenta ser aquela que de fato melhor represente o interesse público.
Todavia, tal pressuposto não reflete a realidade quando o preço ofertado não foi formulado com base nos requisitos impostos pela Administração. Nesse caso, com toda certeza, o menor preço não equivalerá à melhor proposta.
Portanto, por melhor proposta deve se entender não somente aquela que oferecer o menor preço, mas também, e principalmente, a que guardar consonância com os requisitos impostos pela Administração como necessários à sua elaboração. Nesse sentido, de nada adianta uma proposta que apresente valor reduzido se, na sua elaboração, não foram obedecidos os critérios previstos expressamente no edital.
Entender de modo contrário equivaleria a ferir o princípio da isonomia, pois, a adoção de critérios diferentes geraria, conseqüentemente, propostas com valores distintos, o que poderia, em tese, permitir que os licitantes que não se valeram das imposições consignadas no edital obtivessem benefícios em relação aos demais, cumpridores das condicionantes previstas no ato convocatório.
Fosse assim, seria mais lógico e prudente sepultar de vez o tipo de licitação “técnica e preço” do ordenamento jurídico, pois, desse modo, a Administração teria sempre em mãos a menor proposta, sem que fosse necessária a avaliação dos critérios técnicos para se efetivar a contratação.
Ocorre que menor proposta não confunde-se com melhor proposta, conforme já relatado. Esta é muito mais abrangente e engloba em seu âmago além do aspecto financeiro, critérios outros que possibilitam a avaliação do administrador quanto aos aspectos técnicos da obra ou serviço que será contratado.
Desse modo, torna-se forçoso concluir que a análise da fase de classificação não deve levar em conta somente o menor preço ofertado, mas também os aspectos técnicos que garantirão a futura execução do objeto a ser contratado, principalmente quando tratar-se de aquisição de serviços intelectuais fundados em licitação do tipo “técnica e preço”.
CONCLUSÃO
Para finalizar, conclui-se que os princípios da vinculação aos termos do edital e da proposta mais vantajosa não se contrapõe, necessariamente.
Pelo contrário, como regra se complementam, pois este é precedido por aquele. Vale dizer, portanto, que somente haverá melhor proposta se os requisitos previstos no edital restarem cumpridos quando da sua elaboração.
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