Introdução
Como se sabe, em regra, a contratação de serviços de publicidade por órgãos e entidades da Administração Pública Federal deve ser precedida de regular procedimento licitatório, conforme determina o art. 2º, caput, da Lei nº 8.666/93, salvo ressalvas expressamente previstas em lei.
Nesse sentido, o artigo 25, II, da Lei de Licitações e Contratos estabelece que é “vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação”.
Desenvolvimento
A regra geral é polêmica e ainda gera controvérsias no seio doutrinário e jurisprudencial. Marçal Justen Filho, ao lecionar sobre o tema[1], é bem categórico quanto aos termos preconizados na novel legislação, vejamos:
“A Lei insiste na vedação à contratação direta de serviços de publicidade e divulgação. Trata-se de um equívoco (...). O problema está na impossibilidade de julgamento objetivo nessa área. A grande evidência reside em que, sendo obrigatória a licitação, o critério decisivo de seleção acaba sendo a criatividade, a qual envolve avaliação meramente subjetiva. No final das contas, o critério de seleção continua a ser a subjetividade e a preferência da Administração Pública. Como já afirmado, melhor seria promover a contratação direta, obrigando a Administração a justificar suas escolhas. Muito pior é a atual situação, em que a escolha (subjetiva, em última análise) é exteriorizada como produto de um julgamento objetivo. A vedação a contratações diretas nesse caso é um grande exemplo de como boas intenções produzem, muitas vezes, péssimas soluções legislativas”.
Ao tratar sobre o tema, o legislador ordinário regulamentou a regra geral ao editar a Lei nº 12.232, de 29 de abril de 2010, que dispõe sobre normas gerais para licitação e contratação pela Administração Pública de serviços de publicidade prestados por intermédio de agências de propaganda, de modo que, nessas hipóteses, não há que falar em contratação direta.
Em análise de situação concreta, porém, o Tribunal de Contas da União[2] permitiu a contratação direta, por inexigibilidade de licitação, com a extinta empresa RADIOBRÁS, para a prestação de serviços de publicidade legal, entendendo, para tanto, que, pela excepcionalidade da medida, decorrente da exclusividade da prestação dos serviços, bem como pela ausência de regulamentação expressa em lei, afastou o disposto no inciso II, do artigo 25, da Lei de Licitações e Contratos, que veda a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação.
Registre-se, contudo, que a possibilidade de contratação direta somente é possível para a aquisição de serviços de publicidade legal, entendidos como sendo aqueles referentes a publicação de avisos, balanços, relatórios e outros a que os órgãos e entidades da administração pública federal estejam obrigados por força de lei ou regulamento (art. 8º, §1º, da Lei nº 11.652/08). Para as demais hipóteses, notadamente aquelas referentes a contratações de agências de propaganda, deve haver, obrigatoriamente, a instauração de prévio procedimento licitatório, nos termos da Lei nº. 12.232, de 29 de abril de 2010.
Nesse sentido, o Tribunal de Contas da União, ao caracterizar os serviços de publicidade, determinou, por meio do Acórdão nº 2.356/2006-Plenário, que a Administração se abstivesse de utilizar os contratos de propaganda e publicidade para contratações de eventos não inseridos em campanha publicitária da Administração, tais como ornamentação de hall do edifício da Petrobrás, inauguração de imóveis, entre outros, “realizando, nesses casos, o devido certame licitatório, nos termos exigidos pela legislação pertinente”.
Por meio do mesmo Aresto, determinou que a Administração se abstivesse “de utilizar os contratos de propaganda e publicidade para contratações de serviços que não são caracterizados como ações de divulgação, tais como a retirada de adesivos de testeiras em postos de gasolina, realizando o devido certame licitatório, nos termos exigidos pela legislação pertinente”.
Ainda, por meio do Acórdão nº 101/2008-Plenário, o TCU, ao vincular os serviços de publicidade aos seus próprios fins, recomendou à Administração que não implementasse como ações de publicidade aquelas que não estivesses estritamente vinculadas aos fins educativo, informativo ou de orientação social, ou que, direta ou indiretamente, caracterizassem promoção pessoal de autoridade ou servidor público por meio de nomes, símbolos ou imagens , em consonância com o parágrafo único do art. 1º do Decreto 4.799/2003.
Essa última recomendação, aliás, assume especial relevância com a proximidade do período eleitoral, já no próximo ano (2014) e guarda consonância com os limites impostos pela legislação, no que se refere aos atos praticados pelo administrador público em ano eleitoral.
Nesse sentido, a alínea “b” do inciso VI do artigo 73 da Lei nº 9.504/97, que prevê que nos três meses que antecedem as eleições, com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado, é proibido autorizar publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral.
Ademais, não devem constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades e servidores públicos, nos termos do § 1º do artigo 37 da Constituição Federal, que assim dispõe:
§ 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.
Acrescente-se, ainda, que o artigo 74 da Lei nº 4.320/64 prevê como abuso de autoridade a violação à regra constitucional mencionada.
No entanto, importante dizer que a recomendação não deve ser interpretada no sentido de que a divulgação das atividades-fim da Administração devam deixar de ser atualizadas de forma absoluta, já que o princípio da publicidade dos atos administrativos exige o contrário. O que se deve fazer é harmonizar esses atos com um outro princípio, de ordem constitucional, o da impessoalidade, evitando, assim, a postagem de mensagens e informações que acarretem promoção pessoal, através de publicidade institucional de atos, programas, serviços e campanhas.
Sobre o tema, traz-se à baila a lição do professor Francisco de Assis Vieira Sanseverino, em sua obra “O “uso da máquina pública” nas campanhas eleitorais – Condutas Vedadas aos agentes públicos”, página 104:
Finalmente, via de regra, no site do órgão público ou da entidade da administração pública, há espaços para divulgação de suas notícias, informações sobre acontecimentos ou fatos relevantes. De um lado, é verdade que as atividades da administração pública, dirigidas ao público em geral, devem prosseguir.
Por outro lado, incidirão as vedações nas situações em que o conteúdo da notícia (a) consistir na publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas; e (b) caracterizar também a promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.
(destaque no original)
Registre-se, ainda, que o Tribunal Superior Eleitoral firmou entendimento no sentido de que a publicação de atos oficiais ou meramente administrativos, não caracteriza publicidade institucional, por não apresentarem conotação eleitoral[3], podendo ser legitimamente praticados pelos agentes públicos.
Voltando à hipótese de contratação de publicidade legal, entende-se que, sendo a extinta RADIOBRÁS prestadora exclusiva dos serviços de publicidade legal aos órgãos e entidades da Administração Pública Federal, verifica-se que a contratação direta por inexigibilidade de licitação é, pelo menos em tese, possível e regular.
Todavia, após a incorporação da extinta RADIOBRÁS pela EBC – Empresa Brasileira de Comunicação, a regulamentação legal, antes ausente, atribuiu nova “roupagem” às contratações referentes a serviços de publicidade legal, ao dispor que é dispensada a licitação para a contratação da EBC para a contratação de atividades relacionadas ao seu objeto. Confira-se, nesse sentido o teor do art. 8º, § 2º, II, da Lei nº 11.652, de 07 de abril de 2008, verbis:
Art. 8o Compete à EBC:
(...)
VI - prestar serviços no campo de radiodifusão, comunicação e serviços conexos, inclusive para transmissão de atos e matérias do Governo Federal;
VII - distribuir a publicidade legal dos órgãos e entidades da administração federal, à exceção daquela veiculada pelos órgãos oficiais da União;
(...)
§ 2o É dispensada a licitação para a:
I - celebração dos ajustes com vistas na formação da Rede Nacional de Comunicação Pública mencionados no inciso III do caput deste artigo, que poderão ser firmados, em igualdade de condições, com entidades públicas ou privadas que explorem serviços de comunicação ou radiodifusão, por até 10 (dez) anos, renováveis por iguais períodos;
II - contratação da EBC por órgãos e entidades da administração pública, com vistas na realização de atividades relacionadas ao seu objeto, desde que o preço contratado seja compatível com o de mercado.
Cumpre destacar que a contratação direta de serviços de publicidade legal não impede que a Administração Pública Federal certifique-se que os preços oferecidos pela EBC estão compatíveis com os de mercado, conforme orientação firmada pela Corte de Contas no Acórdão 689/2007-Plenário, vejamos:
9.2. esclarecer que a orientação firmada na Decisão 538/99 - Plenário não afasta a necessidade de o administrador público certificar-se de que os preços oferecidos pela Radiobrás estão compatíveis com os de mercado, considerando o volume dos serviços a serem contratados, conforme exigem o arts. 25, § 2º, e 26, parágrafo único, inciso III, da Lei 8.666/93, obrigatoriedade esta que vincula tanto o administrador contratante do serviço de publicidade legal quanto a própria Radiobrás, a quem não é dada a possibilidade de cobrança de preços acima dos praticados no mercado, por força do monopólio legal instituído a seu favor.”, devendo, para tanto, o administrador público negociar junto ao veículo de comunicação descontos e condições econômico-financeiras mais vantajosas do que simplesmente aquelas estabelecidas na tabela pública de preço e de informar à Radiobrás esses descontos e condições obtidos para efeito de faturamento;
Conclusão
Desse modo, conclui-se que, como regra geral os serviços de publicidade devem ser precedidos de regular procedimento licitatório, ressalvando-se, contudo, aqueles referentes à publicidade legal, que, em tese, podem ser objeto de contratação direta.
[1] Marçal Justen Filho. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 13ª edição, página 359.
[2] Nesse sentido, DECISÃO nº 538/1999-TCU-Plenário.
[3] Nessa linha, Ac. De 7.11.2006 no AgRgREspe no 25.748, rel. Min Caputo Bastos e AC. no 25.086, de 03/11/2005, rel. Min. Gilmar Mendes.
Procurador-Chefe Nacional do DNIT. Pós-graduado em Direito Público.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Tiago Coutinho de. Serviços de publicidade prestados à Administração Pública e sua forma de contratação Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 jan 2014, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/37968/servicos-de-publicidade-prestados-a-administracao-publica-e-sua-forma-de-contratacao. Acesso em: 22 nov 2024.
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